Acórdão nº 590/16.6PSLSB-A.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução13 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa.

I.

RELATÓRIO: 1.Após primeiro interrogatório judicial de arguido detido (art. 141.º, do CPP) e na sequência de promoção do Ministério Público nesse sentido, a Mm.ª Juíza de Instrução - da 1.ª Secção de Instrução Criminal (J4) da Instância Central e Comarca de Lisboa - determinou que o arguido J.

ficasse a aguardar os ulteriores termos processuais em prisão preventiva.

  1. O arguido, inconformado com tal decisão, interpôs o presente recurso, que motivou, formulando as seguintes conclusões (transcrição): 1º-A prisão preventiva aplicada ao recorrente, nos termos do disposto no art. 202, n° 1 alínea a) do C.P.P., é ilegal por inexistência de fortes indícios da prática por este, dos oito crimes de roubo agravado que lhe são imputados. O tribunal aplicou a prisão preventiva sustentando a indiciação em prova proibida, e sem que estivessem reunidos os requisitos do art. 202, n° 1 alínea a) do C.P.P. pois não existem, contrariamente ao afirmado, fortes indícios de que tenha sido o recorrente o autor dos fatos.

    1. -O Tribunal recorrido fundamentou a aplicação da medida de coação, por um lado na forte indiciação que refere resulta das imagens de videovigilância conjugadas com os depoimentos dos ofendidos e os autos de reconhecimento pessoal, bem como a apreensão do vestuário usado pelo arguido no dia dos fatos, e nos perigos que se evidenciam do fato de não ter profissão remunerada, ter sido já julgado e condenado pela prática de um crime de idêntica natureza em pena de prisão efetiva, de ter confessado ter comprado um medicamento Tramal retard - (que lhe era também prescrito no E.P.) quando se encontrava em liberdade condicional, sendo a abstinência um dos deveres a que está sujeito no âmbito da sua colocação em Liberdade condicional no processo 6851/10.OTXLSB-A.

    2. -Na ausência de indícios diretos de que foi o recorrente o autor dos fatos investigados nos NUIPCS 496/16.9PTLSB, 339/16.3PZLSB, 28/16.9PJLRS, 988/16.OPYLSB, 145/16.5PILRS, 175/16.7PBLRS onde foram visualizadas imagens de videovigilância e inquiridas testemunhas que não identificam e reconhecem qualquer suspeito - não é válido substituir em termos factuais a exigência de fortes indícios art. 202º nº 1 do C.P.P pela suposição de uma situação de toxicodependência motivadora dos ilícitos anteriores e eventualmente atuais e caracterizá-la como de fortes indícios, nos termos e para os efeitos do art. 202, nº 1 do C.P.P. e para suporte da afirmação posterior de que existe perigo em razão da personalidade do arguido de continuação da atividade criminosa, nos termos do art. 204 alínea c) do C.P.P., mormente porque à altura em que foi realizado o interrogatório não existiam nos autos elementos sobre o estado de dependência do recorrente - o que foi ordenado nesse ato, já efetuado com resultados negativos.

    3. -Os três autos de reconhecimento pessoal realizados, pelas testemunhas A.S., C.S. e I.C. constantes fls. 195 a 200 dos autos, são nulos nos termos do art. 147, nº 7 do C.P.P porque realizados com preterição das formalidades previstas no nº 2 desse artigo.

    4. -Esta norma dispõe que "nas situações em que a identificação não for cabal - entendendo-se cabal aquela que satisfaça o critério probatório da fase processual em tenha lugar, nesta fase a dos indícios suficientes (Paulo Pinto de Albuquerque in Código de Processo Penal Anotado à Luz da CRP e da CEDH 4ª Edição Atualizada, anotação 6ª ao art. 147º, a pag. 423 - que deva ser feita quando chamando-se duas pessoas que apresentem as maiores semelhanças possíveis, inclusive de vestuário, com a pessoa a identificar, esta, colocada ao lado delas deve apresentar-se nas mesmas condições em que poderia ter sido vista pela pessoa que procede ao reconhecimento".

    5. -Nesses reconhecimentos o arguido foi colocado ao lado de J. D. e A.F. ambos agentes da PSP com características físicas diferentes, de tom de pele, cor de olhos, idade e fisionomia, e que no momento do reconhecimento envergavam peças de roupa diferentes (inclusive na cor, trajando roupas de cor azul e beje), sendo visível no momento do primeiro interrogatório para o MP, para o defensor e para o Mto. JIC que o arguido se apresentava (detido desde o dia anterior) de camisola vermelha, que usava desde o momento da detenção, sendo que uma das testemunhas (I. C. que reconheceu positivamente o recorrente tinha anteriormente feito um reconhecimento fotográfico atípico, como a própria reconhece no auto de inquirição de testemunha de 21 de abril de 2016, em reconhecimento de fls. 144 dos autos, "posteriormente foi confrontada com imagens recolhidas pelo sistema de vídeo vigilância apresentadas pelo Dr. Bruno onde compararam o indíviduo que atendeu dias antes a comprar o Tramal com o suspeito que efetuou o roubo" que como é sabido influencia necessariamente o reconhecimento pessoal com vista a identificar o autor do ilícito "Commitment effect" na doutrina anglo saxónica.

    6. -Na ausência, de prova válida e de indícios diretos de que foi o recorrente o autor dos fatos investigados nos NUIPCS 496/16.9PTI.SB, 339/16.3PZLSB, 28/16.9PJLRS, 988/16.OPYLSB, 145/16.5PILRS, 175/16.7PBLRS onde apenas foram visualizadas imagens de videovigilância e inquiridas testemunhas que não identificam qualquer suspeito - não é válido substituir em termos factuais a exigência de fortes indícios art. 202º nº1 do C.P.P pela suposição de uma situação de toxicodependência motivadora dos ilícitos anteriores e eventualmente atuais e caracterizá-la como de fortes indícios, nos termos e para os efeitos dessa norma bem como para a confirmação posterior de que existe perigo em razão da personalidade do arguido de continuação da atividade criminosa, mormente porque à altura em que foi realizado o interrogatório não existiam nos autos elementos sobre o estado de dependência do recorrente - o que foi ordenado nesse ato, já efetuado e com resultados negativos.

    7. -Quanto aos demais meios de prova, como por exemplo a apreensão de vestuário usado pelo arguido no dia dos fatos nenhum elemento foi indicado na descrição dos fatos comunicados, nenhum reconhecimento de objetos foi mencionado, com resultado positivo, para que se possa considerar comunicada nos termos e para os efeitos do art. 194, n° 7, do C.P.P. matéria de fato ilícita deles resultante, ou que os mesmos sirvam de suporte probatório quer para a indiciação da pratica dos crimes de roubo, quer para a existência de perigo de continuação da atividade criminosa, nos termos da alínea c) do art. 204 do C.P.P., como um perigo atual e existente que resulte dos autos, para além das ilações que se retiram da mencionada condenação anterior e da suspeita de toxicodependência motivadora dos roubos.

    8. -O que tem de se invocar desde já, é que o recorrente em algumas das datas indicadas nos fatos comunicados encontrava-se a prestar trabalho contratado, para pessoas determinadas que poderão no decurso do inquérito indicar os locais e as horas precisas em que o mesmo trabalhou na construção e reabilitação urbana em Loures e em Cascais. Saiu em liberdade com motivações diferentes para a vida que não a reincidência nos roubos que o levaram à prisão no passado, não obstante ter afirmado espontaneamente ao tribunal recorrido ter consumido por uma vez drogas em momento anterior à sua saída do E.P. em L.C., fê-lo na plena consciência de que não seria por isso que uma vez em liberdade iria reincidir na pratica de crimes de roubo.

    9. -Por tudo isso e porque foi ordenada a realização imediata a exame pericial para despiste da toxicodependência nos termos do art. 154, n° 3 do C.P.P. tendo este exame sido já realizado e dado um resultado negativo para drogas das tabelas IA, IB e IC, a sua junção ao apenso de recurso é requerida para que o Tribunal superior afira da inexistência dos fundamentos dos perigos que se julgavam erradamente existir à data da aplicação da medida.

    10. -Inexístem motivos de fato e de direito para manter a prisão preventiva aplicada ao recorrente, o despacho recorrido deve ser revogado, nulo na parte que indeferiu a arguição de nulidade dos reconhecimentos, devem os mesmos ser considerados prova proibida e ser imediatamente revogada a prisão preventiva do recorrente.

  2. -Admitido o recurso, respondeu o Ministério Público, concluindo do seguinte modo: 1.Nestes autos existem fortes Indícios de que J.

    praticou oito crimes de roubo (agravado), previstos e punidos pelo artigo 210.°, n° 1 e 2, al. b) do Código Penal com referência ao disposto no artigo 204.°, n° 2, al. f) do mesmo código.

  3. Os fortes indícios resultam da análise conjugada de toda a prova recolhida no inquérito, com base nas regras da experiência, da normalidade, da lógica e da natureza.

  4. O arguido invoca a inexistência desses fortes indícios, mas não aponta qualquer vício ao raciocínio efectuado pelo Tribunal Recorrido na apreciação da prova recolhida nem invoca qualquer circunstância que não tenha sido analisada e tomada em consideração por aquele tribunal ou que devesse ter sido por ele valorada em sentido diverso.

  5. De entre a prova recolhida encontram-se três reconhecimentos pessoais positivos efectuados pelas ofendidas A.S., C.F. e I.C..

  6. Esses reconhecimentos foram realizados com estrita observância do formalismo imposto pelo artigo 147 ° do Código de Processo Penal.

  7. A ausência das maiores semelhanças possíveis entre o arguido e os figurantes da linha de reconhecimento que o arguido invoca para concluir pela nulidade ou, em bom rigor, pela ausência de valor dos reconhecimentos pessoais efectuados não se verifica.

  8. A exigência da existência das maiores semelhanças possíveis entre os participantes no reconhecimento visa garantir, por um lado, que entre eles não existam assimetrias acentuadas, mormente em razão do género, da raça e mesmo da sua aparência externa, como seja em relação ao vestuário, que viciem esse reconhecimento presencial.

  9. E visa garantir, por outro lado, que não sejam criadas ou...

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