Acórdão nº 3392/09.2TBCSC.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DA CONCEI
Data da Resolução27 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: Amélia ... ... ...

, Maria ...a ... ... ... ...

e José ... ... ...

, vieram intentar, em 30.4.2009, contra M.. ... ... ...

, ação de despejo sob a forma sumária alegando, para tanto e em síntese, que sendo donos do 1º andar “A” do prédio urbano sito na Rua das ..., nº …, S. Gabriel, Cascais, que foi dado de arrendamento ao R. em 1.9.1984, para sua habitação, o mesmo deixou de aí ter residência permanente desde há pelo menos 5 anos. Pedem seja decretada a resolução do contrato e o R. condenado à entrega imediata da fração aos AA., completamente livre e desocupada de pessoas e bens, bem como a pagar as rendas que vencerem na pendência da causa e a indemnização a que alude o artigo 14, nº 2, do NRAU.

Contestou o R., excecionando a ilegitimidade dos AA. e impugnando a factualidade alegada, mais sustentando que mantém no locado a sua residência e que não dispõe de outra habitação. Conclui pela improcedência da causa e pede, em reconvenção, a condenação dos AA. a pagar-lhe a quantia de € 23.415,00 respeitante ao custo das benfeitorias necessárias por si realizadas na fração que ao senhorio incumbia suportar.

Os AA. apresentaram réplica, respondendo à matéria da exceção e da reconvenção, invocando a ineptidão quanto a esta por não terem sido concretizadas quais as obras realizadas ou o valor em que as mesmas importaram. Impugnam, de qualquer modo, os factos alegados e pedem a condenação do R. como litigante de má-fé.

A convite do Tribunal, o R. aperfeiçoou, por duas vezes, a reconvenção e os AA. responderam.

Foi proferido despacho saneador, concluindo-se pela legitimidade das partes e conferindo-se, no mais, a validade formal da instância. Procedeu-se, ainda, à seleção da matéria de facto com organização de base instrutória.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença, em 26.6.2015, nos seguintes termos: “(...) julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada, e em consequência: - Declaro resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre AA. e R. referente ao 1.º andar do prédio urbano sito na Rua das ..., n.º …, S. Gabriel, Cascais; -Determino que o R. proceda à entrega imediata aos AA. da referida fracção, livre de pessoas e bens; -Condeno o R. no pagamento das rendas vencidas na pendência da presente acção e até ao trânsito em julgado da presente sentença e que não se mostrem já pagas.

-No demais absolvo-o do contra si peticionado.

Julgo improcedente, por não provado, o pedido reconvencional formulado pelo R. contra os AA.

Vai o R. absolvido do pedido de condenação como litigante de má-fé.

Custas pelos Autores (10%) e RR. (90%) - (artigo 527º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil).

(…).” Inconformado, recorreu o R.

, culminando as alegações por si apresentadas com as conclusões a seguir transcritas: “ 1.A douta sentença sob impugnação é objecto pelo recorrente de crítica tanto no que concerne à apreciação da prova gravada pelo tribunal “a quo”, como no que toca à decisão de direito.

  1. O presente recurso versa a douta sentença que julgou a acção parcialmente procedente, declarando resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre autores e réu, determinando a entrega da fracção e ainda que julgou improcedente o pedido reconvencional do réu, para pagamento das obras realizadas no locado.

  2. Entende o recorrente existe matéria de facto que foi dada como provada e que resultou de uma deficiente interpretação, análise e valoração da prova.

  3. Entende o recorrente que estão incorrectamente julgadas as respostas dadas aos artigos 1º a 4º, 6º, 12º a 14º e 18º a 21º da base instrutória.

  4. O tribunal não tomou em consideração os depoimentos das testemunhas Fernanda …, José ….. e Catarina ..., testemunhas que prestaram os seus esclarecimentos sobre os factos de forma clara, esclarecendo o tribunal que o ... ... ... ..., reside na Rua das ..., nº …-1º andar A, em Cascais, desde 01 de Setembro de 1984, 6.E que ultimamente vive sozinho, que visita os filhos em Portugal e no estrangeiro, que com eles passa algum do seu tempo, pernoitando nas suas habitações ou de amigos, que por esse motivo ausenta-se de Cascais, mas que sempre ali regressa, pois é a sua única residência.

  5. Esclareceram ainda que por mais de uma vez, a expensas do recorrente, porque embora os senhorios tivessem sido alertados para os problemas no locado estes nada fizeram, foram realizadas obras de recuperação do telhado da casa, pois as telhas partidas e os barrotes apodrecidos causavam infiltrações que foram causa do apodrecimento dos tectos em estuque, das caixas dos estores e do armário da cozinha.

  6. Da análise do depoimento das testemunhas entende o recorrente que, para além de não se poder aceitar que se dê como provado, porque isso não resultou da prova produzida que o R. deixou de dormir no locado, de receber os seus amigos, de aí comer e fazer a sua higiene desde Abril de 2005, 9.Também não pode aceitar-se que não seja dado como factualmente assente que o recorrente solicitou à A. Amélia que reparasse os telhados, substituísse as madeiras podres devido às infiltrações e ela nada fizesse. Ainda para mais quando a testemunha Fernando ... foi clara ao afirmar que tais factos ocorreram na sua presença e deles tem conhecimento directo.

  7. Tendo o douto tribunal considerado que os depoimentos das testemunhas Fernanda ... e José ... foram isentos e espontâneos e entre si consentâneos, mal se compreende que a factualidade contida nas respostas aos quesitos 1º a 4º da base instrutória, não tivesse sido dada como não provada, pois se os depoimentos foram pelo tribunal considerados como isentos, espontâneos e sem qualquer reserva registada, têm uma aplicação global em toda a matéria a que responderam.

  8. Ora, assim sendo se os depoimentos foram considerados, e bem, para responder aos factos nºs 13 a 18, igualmente considerados o deveriam ter sido para responder aos nºs 8 a 12 dos factos provados.

  9. O que se assim tivesse acontecido, a resposta seria necessariamente outra, ou seja, aqueles factos incluiriam a matéria dada como não provada.

  10. Porque, parece-nos claro que a resposta dada aqueles quesitos resulta “exclusivamente”, da inspecção ao local no início da audiência de discussão e julgamento e a que as testemunhas indicadas pelos AA se foram ajustando.

  11. A casa estava mobilada, a cama estava aberta e no caixote do lixo estava um jornal diário “correio da manhã”, não havia correio na caixa, nem por baixo da porta de entrada no rés-do-chão, não havia publicidade panfletária nos mesmos locais, o que evidenciava que diariamente, quer um, quer outra dali eram retiradas, o que prova que a casa é habitada com carácter de permanência. 15.O fornecimento de energia eléctrica mantinha-se naquele dia e ainda hoje ligado, o mesmo acontecendo relativamente ao fornecimento de águas.

  12. Relativamente ao facto de não existirem alimentos no frigorífico, não é nem nunca poderia ser um elemento indiciador da falta de habitabilidade, já que se o recorrente se ausenta para estar com as filhas por motivos de saúde, como bastas vezes referido pelas testemunhas, natural é que não tenha comida em casa e que desligue os electrodomésticos, por uma questão de segurança.

  13. O conceito de residência permanente deve ser equacionado com o grau de vida do arrendatário e consequente incidência em relação ao arrendado, devendo ser entendido tendo em atenção o aspecto subjectivo referido ao próprio morador. O que é necessário é que possa concluir-se é que o arrendatário tem no arrendado o seu lar, que tem nele instalada a sua vida doméstica, a ele regressando logo que a sua vida o permita. E isso provou-se relativamente ao Réu, que embora tenha uma vida em constantes viagens, visita de amigos e familiares, a verdade é que é este o seu lar, é esta a única residência que todos lhe conhecem e à qual ele sempre volta.

  14. Relativamente às obras ficou demonstrado pelos depoimentos das testemunhas arroladas pelo recorrente, que estas se mostravam absolutamente necessárias para o bom uso do locado, pois é impensável que se habite um espaço onde chove e se tenham de colocar alguidares no sótão, para receber as águas das chuvas, as quais provocaram a deterioração das madeiras, do estuque dos tectos e das pinturas. Obras que apesar de solicitadas aos senhorios, estes nada fizeram.

  15. Ora, na senda do defendido quanto à resposta a oferecer aos quesitos 1º a 4º e 6º, cotejado com a factualidade acima descrita e que consideramos que não foi feita prova, não poderá ser declarado resolvido o contrato de arrendamento do prédio sito na Rua da ..., nº 319, 1º andar A, Cascais.

  16. Em face do exposto e subsumindo o direito à factualidade que deveria ter sido dada como não provada, artigos 1º, 2º, 3º, 4º, e 6º da base instrutória, deverá a presente decisão ser revogada e, em...

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