Acórdão nº 178/06.0PTCSC.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelANA FILIPA LOUREN
Data da Resolução22 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM EM CONFERÊNCIA, NA 9ª SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA RELATÓRIO A arguida D...

, devidamente identificada nos autos, foi condenada através de sentença proferida no processo da Comarca de Cascais- Instância Local- secção criminal- Juiz 3, em 21.12.2015, pela pratica em autoria material e na forma consumada de um crime de ofensa grave por negligência, p. p. pelo artº 148º nº 1 e 3, com referência ao artº 144º als. C) e d) ambos do Código Penal, na pena de 160 dias de multa á razão diária de €8,00, o que perfaz o montante de €1280,00. Foi ainda julgado parcialmente procedente, por parcialmente provado o pedido cível deduzido pela demandante e condenada a demandada “ Companhia de Seguros - X,SA...” a pagar à demandante a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais, o montante de €31 722,58, acrescido de juros vencidos e vincendos, a contar da data da notificação da demandada e até efectivo e integral pagamento.

Não se conformando com a sentença proferida, veio a assistente, L..., devidamente identificada nos autos interpor recurso daquela sentença a folhas 1667 e seguintes, apresentando entre o mais as seguintes conclusões: CONCLUSÕES: - I - A recorrente louva a sentença recorrida, na douta fundamentação e rigor normativo dos conceitos sob que apreciou, antes de mais, a natureza dos danos e relevância geral que tiveram.

- II - Não concorda, contudo, com a estimativa levada, pela sentença recorrida, às verbas de ressarcimento dos prejuízos causados pelo dano se saúde (em devir) e pelos danos não patrimoniais.

- III - Com efeito, a sentença recorrida não teve em conta que as duas classes de prejuízos foram igualmente potenciadas pela demorada pendência da causa (até agora, já lá vão mais de 9 anos), num caso em que a vítima era uma senhora da idade de 82 anos, independente, solicita para com o próximo, de tal forma que continuava a exercer a enfermagem pro bono e com êxito.

- IV - Contudo, vê-se agora a recorrente relegada a um lar de idosos, com uma incapacidade físico-psíquica incontornável de 23 pontos, segundo a medicina-legal.

- V - Assim, à usura da longa demora do processo, junta-se a dor, não só individual como social, da perda de alguém, senhora de si, não obstante a idade, e cheia de experiência, que passará a invernia da vida, prosaica, inútil e institucionalizada.

- VI - Este foco exige, na estimativa indemnizatória, que a idade de 82 anos, seja levada ao regulador equidade (que a lei impõe) não em défice indemnizatório, mas em acréscimo.

- VII - Não foi este o critério da sentença recorrida, muito pelo contrário.

- VIII - E é assim que a recorrente propõe, para o ressarcimento dos prejuízos decorrentes do dano sinistral de saúde (em devir), o montante de € 20.000,00, do dobro do que foi fixado na sentença recorrida.

- IX - Com efeito, o valor vivente da ofendida, sem a deficiência contraída no sinistro, era do dobro da comum senectude, relegada de hábito ao descanso e saudade.

- X - Do mesmo modo e pelas mesmas razões, a recorrente propõe, para ressarcimento dos prejuízos decorrentes dos danos do sinistro, não patrimoniais, o montante de € 40.000,00, também do dobro do que foi fixado na sentença recorrida.

- XI - É que a dor física e moral sentida pela recorrente foi muito diferente da dor física e moral que poderia ter atingido alguém dos 80 anos, cuidado pela família, pelos amigos ou pelas instituições: a recorrente cuidava… - XII - Entende, por isso, a recorrente que só o conforto de receber estas duas verbas somadas ao montante dos danos patrimoniais – € 1.722,58 – pode, de alguma forma, equalizar as devastadoras consequências e prejuízos de vida, físico-psíquicos, de ânimo e de angustiosa tristeza, por se ver inválida, decorrentes das lesões que directa e necessariamente contraiu no sinistro.

- XIII - Por outro lado, os juros de mora a que a seguradora deverá ser condenada, contados por referência ao montante da indemnização – € 61.722,58 –, hão-de ser estimados a partir da data do sinistro e não da data da notificação da sentença recorrida, visto o disposto no art.º 805.º/2/b CC.

- XIV - Com efeito, o crédito não pode ser considerado ilíquido, por força de se terem apresentado a um observador comum, desde logo, quer a extensão e figura físico-psíquica das lesões sofridas pela recorrente, quer a profundidade de (des)ânimo em que se situaram as consequências que o bonus pater familias logo lhe atribuiria.

- XV - Por consequência, a douta sentença recorrida, não obstante o brilho da argumentação em que se sustenta, infringiu o disposto nos art.ºs 496.º/1/3, 564.º/2 e 805.º/2/b, todos do CC.

- XVI - Deverá ser reformada, no sentido das propostas de estimativa da indemnização, contidas nestas conclusões.

- XVII - Por fim, no que diz respeito à condenação crime, a pena de multa aplicada à arguida na sentença recorrida não se mostra ajustada ao perfil do caso e do cometimento, que exigem a pena de prisão, naturalmente substituída por multa.

- XVIII - Na verdade, quer as exigências de prevenção geral, decorrentes da prática de uma contra-ordenação grave (a que corresponderia inibição de conduzir, caso não tivesse prescrito, e conduz, no limite, à cassação da carta), contra-ordenação causal dos efeitos devastadores das lesões contraídas pela vítima do atropelamento, quer as exigências de prevenção especial, em ordem a reordenar a conduta rodoviária da arguida, incluindo a conduta de defesa judicial por incidentes estradais (posto que apresentou uma versão inverídica do acidente), propõem o mínimo da pena de prisão, i.e., prisão de 1 mês, consideradas também as atenuantes da fundamentação da sentença recorrida (e na medida certa em que não são incluídas na crítica desta minuta).

- XIX - Mas na substituição da prisão de 1 mês por multa, patamar penal imediato ao que a sentença recorrida elegeu, vistos os art.ºs 41.º/1 e 43.º/1 (art.º 148.º/1) do C.Penal, o montante diário deverá ser de € 15,00, dado que, segundo as regras da experiência comum, uma Gestora de Recurso Humanos beneficia de ordenado que assim o justifica. - XX- A recorrente propõe que a substituição da prisão por multa tenha conexa a obrigação de a arguida frequentar formação de ética rodoviária geral, e aplicada no domínio da defesa penal por acidentes de viação. Vossas Excelências, com douto suprimento, tomando estas conclusões por convincentes, julgarão procedente o recurso: farão, com a reforma da pena e do montante da indemnização, a costumada JUSTIÇA! O recurso foi só admitido a folhas 1702, em 26.O4.2016.

MºPº junto da primeira instância respondeu á motivação do recurso apresentado pela assistente ( na qual suscita uma questão prévia/ falta de interesse em agir da assistente quanto á escolha da pena e sua medida), pugnando a final dever ser mantido na íntegra a decisão recorrida, apresentando as seguintes conclusões: 1. A assistente L...interpôs recurso da sentença proferida nos presentes autos, na qual a arguida D...

foi condenada pela prática, como autora material, de um crime de ofensa à integridade física grave por negligência, previsto e punido pelo art. 148.º, n.ºs 1 e 3 e art. 144.º, alíneas c) e d) ambos do Código Penal, na pena de 160 dias de multa à taxa diária de € 8,00, perfazendo a multa global de € 1.280,00.

  1. Muito embora se reconheça as consequência particularmente gravosas que o acidente em causa nestes autos acarretou para a assistente e também para o seu único filho, no nosso entendimento, a assistente não tem, nesta parte - quanto à medida da pena aplicada- um interesse concreto e próprio em agir, na justa medida em que a pena aplicada à arguida não lhe traz qualquer desvantagem, nem lhe acarreta a frustração de um interesse legítimo, pelo que, como tal, nesta parte o recurso não deverá ser apreciado.

  2. A pena concreta aplicada à arguida recorrente, apresenta-se como ponderada e adequada, sendo que, para além de satisfazer a finalidade punitiva das penas, protege, de forma efectiva os bens jurídicos tutelados pelas normas incriminadoras violadas.

  3. A taxa diária fixada - € 8,00 - é justa e proporcional, sendo excessivo, salvo o merecido respeito, o valor de € 15,00, proposto pela recorrente.

  4. Deverá, pois, ser mantida a sentença recorrida.

    No entanto V. Excªs Farão a habitual Justiça.

    A demandada cível “ Fidelidade- Companhia de Seguros S.A.”, respondeu nos termos que aqui se dão por reproduzidos a folhas 1718 até 1724, pugnando a final que seja negado provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.

    Também a arguida a folhas 1728 a 1734, respondeu ao recurso, pugnando pela improcedência do mesmo.

    Remetidos os autos para o Tribunal da Relação de Lisboa, a Digna Procuradora Geral Adjunta em douto parecer, louva-se em que seja julgado improcedente o recurso apresentado, estribando-se na resposta apresentada pelo MºPº, junto da 1ª instância.

    Foi cumprido o artº 417º nº 2 do C.P.P., tendo a arguida e o demandado civel silenciado.

    Efectuado o exame preliminar, determinou-se que o presente recurso fosse julgado em conferência.

    Colhidos os vistos legais foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º 3, alínea c) do mesmo diploma, cumprindo agora apreciar e decidir.

    Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso.

    FUNDAMENTAÇÃO De acordo com o disposto no artigo 412° do Código de Processo Penal e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de Outubro de 1995, o objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

    As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no n.º 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal, ou de alguma das causas de...

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