Acórdão nº 10356/12.7TCLRS.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução09 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

1–RELATÓRIO: Massa Insolvente da Sociedade ““V..., Lda"., intentou a presente ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra S. Lopes e Manuel..., alegando, em suma, que a sociedade “V..., Lda"., foi declarada insolvente em 4 de novembro de 2009, na sequência do que a administradora da insolvência procedeu à apreensão de diversas frações autónomas pertença da desta sociedade, entre as quais a identificada pela letra “H”, correspondente ao 3º andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua..., freguesia da..., concelho de..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ..., inscrito na matriz predial urbana respetiva ...

Tal fração tem vindo a ser ocupada pelos réus sem qualquer título que a tal os legitime.

A privação de utilização da fração é causa de prejuízos para a autora, pelos quais pretende ser indemnizada à razão de € 650 a € 700 por mês, desde a data em que foi ocupada pelos réus e até à data em que dela saírem, sendo aquele montante mensal equivalente ao valor médio das rendas praticadas na zona relativamente a frações com características semelhantes àquela que constitui o objeto dos presentes autos.

A autora conclui assim a petição inicial: «Deve a presente ação ser julgada procedente, por provada e, em consequência, reconhecido à A. o direito de propriedade sobre a fracção autónoma designada pela letra “H”, correspondente ao 3º Esqº do prédio urbano no regime de propriedade horizontal sito na Rua... (anteriormente designada ...), em..., concelho de ..., serem os RR. condenados à restituição da posse do imóvel correspondente à descrita fracção, livre de pessoas e bens e a pagar à A., uma quantia a título indemnizatório, que se estima poder ser do valor de € 700 mensais, por ser o valor de mercado da fracção autónoma em questão. pela ocupação e fruição do imóvel mensalmente até à data, bem como, do montante de € 700 mensais desde a entrada da presente acção judicial e até à respectiva entrega à A., acrescido de juros moratórios vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento (…)».

* Ambos os réus foram citados para os termos da ação.

Foi apresentada contestação a fls. 96-111, na qual figuram ambos os réus como contestantes.

No entanto, a contestação apenas foi considerada válida relativamente à ré S. Lopes, uma vez que o réu Manuel... não juntou procuração a favor do ilustre advogado subscritor daquele articulado.

Nessa contestação a ré S. Lopes pugna para que: - a ação seja julgada improcedente, por não provada, com a sua consequente absolvição do pedido; - a autora seja condenada «no pagamento de uma indemnização à R., por se ter provado ser uma litigante de má fé, tendo-lhe causado prejuízos com a presente acção , o que se estima em € 3000,00 (três mil euros)».

* Na audiência prévia a que se reporta a ata de fls. 208-211 foi indicado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

* Realizou-se a audiência final, na sequência do que foi proferida sentença que: a)- Declarou a autora proprietária da fração autónoma designada pela letra “H”, correspondente ao 3º andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua ..., freguesia da ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Odivelas sob o nº ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...; b)- Condenou os réus a restituírem a fração autónoma à autora, livre de pessoas e de bens; c)- Condenou os réus, a título de indemnização, a pagarem à autora a quantia mensal de € 650,00 (seiscentos e cinquenta euros), desde setembro de 2008 até à entrega efetiva do imóvel identificado na alínea a), acrescida de juros de mora a contar da citação; d)- Absolveu a autora do pedido de condenação como litigante de má-fé.

* Inconformada com o assim decidido, a ré S. Lopes interpôs recurso de apelação, concluindo as respetivas alegações do seguinte modo: - (…) - (…) - (…) - Entende a Recorrente existir uma questão prévia que deve ser apreciada pelo (…) tribunal ad quem, desde logo porque o Réu Manuel... não se encontra notificado da data da audiência de julgamento e, bem assim, da decisão decorrente daquela.

– Note-se que, em 12 de Maio de 2014, a Recorrida e o Réu apresentaram Contestação à presente acção, tendo junto, naquela altura, Procuração apenas a favor da ora Recorrente.

– Em 30/05/2016 o Réu Manuel... foi notificado para, querendo, “(…) ratificar o processado, nos termos e com a cominação prevista no art. 48° nºs 1 e 2 do C.P.C." carta que veio devolvida em 17/06/2016.

– Novamente em 13/10/2016, foi o Réu Manuel... notificado da data da Audiência Previa, agendada para o dia 3/11/2016. Novamente, a carta veio devolvida - carta que veio novamente devolvida em 31/10/2016.

– Ora, na sequência da realização da Audiência Prévia, foi designado o dia 5/01/2017 para a realização da audiência de Julgamento, sendo que, novamente, o Réu Manuel... não foi notificado, nem se encontrava representada por mandatário judicial.

– O mesmo se diga em relação à Sentença proferida em 24/03/2017 e notificada aos mandatários da Ré em 04/04/2017.

– Conforme preceitua o artigo 58º, nº 1 do CPC, têm as partes o direito de se fazer representar por advogado em todas as acções de valor superior à alçada do tribunal da relação (€ 15.000,01) - e o presente processo declarativo tem como valor da causa a quantia de € 79.514,00 (setenta e nove mil, quinhentos e quatorze euros).

– Razão pela qual não se compreende por que motivo não foi o ora Réu notificado, tando da data da audiência prévia, como da data da audiência de julgamento e correspondente sentença para, querendo, exercer os direitos que a lei processual civil lhe confere.

– Acresce que, de acordo com o mesmo normativo legal - artigo 220º, nº 1 do CPC - as partes devem ser notificadas dos despachos que designam dia para qualquer acto em que o Interessado deva estar presente, mas também devem ser notificadas das sentenças, de modo a que, sendo afectados pelas suas decisões, possam delas reagir, exercendo os direitos processuais que a lei lhes confere.

– E tais direitos encontram-se precludidos pelo facto de o Réu não ter sido notificado dos actos a que a lei determina a sua notificação, de tal forma que caso a sentença transite em julgado, ter de restituir a fracção que adquiriu e que considera como sua - ou seja, viu-lhe ser negado o princípio do contraditório, ao abrigo do disposto pelo artigo 3º, nº 1 do Código de Processo Civil.

– Ora, in casu, estamos perante uma violação grave ao princípio do contraditório presente no artigo 3º, nº 1 do CPC, uma vez que nenhuma decisão (mesmo interlocutória) pode ser proferida pelo Juiz sem que, previamente, tenha sido permitido quanto à mesma e relativamente ao sujeito processual contra quem é ela dirigida, uma ampla e efectiva possibilidade de discussão (de a discutir, de a contestar e de a valorar).

– A ratio do princípio do contraditório consagra que todas as partes devem ser previamente ouvidas antes que o juiz tome uma qualquer decisão - a não ser assim estaríamos perante as chamadas "decisão-surpresa".

– Com efeito, tendo-se verificado que este princípio não foi observado, estamos perante uma nulidade que influi directamente sobre a decisão da causa, nos termos do disposto pelo artigo 195º, nº 1 do Código de Processo Civil.

– Face ao que se deixou dito, é imperioso concluir que tal omissão susceptível de Influir na presente decisão, demonstrada que está a gritante violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, expressamente consagrados nos artigos 3º, nº 3º e do Código de Processo Civil e também no artigo 13º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa, só pode conduzir à nulidade da decisão em causa.

– Para além desta questão prévia, entende a Recorrida que o tribunal a quo analisou erradamente a recusa da A. em trazer aos autos documentação que lhe pertencia e que era essencial para a descoberta da verdade material.

– Isto porque a Recorrida, nos requerimentos enviados em 18/12/2015, 13/07/2016 e também na audiência prévia realizada em 3/11/2016, requereu que a Recorrida viesse juntar aos autos a documentação respeitante ao contrato de promessa realizado entre Sérgio... e a Sociedade “V..., Lda", bem como o documento comprovativo do pagamento da quantia de € 209.495,12 (duzentos e nove mil, quatrocentos e noventa e cinco euros e doze cêntimos). Requereu, também, que fosse junta a documentação respeitante à contabilidade da Requerida para aquilatar se, efectivamente, foi paga aquela quantia decorrente daquele contrato que foi celebrado.

– A Recorrida nunca o veio fazer, pelo que, em sede de audiência prévia, ditou para a acta um requerimento no qual, sinteticamente, se limita a dizer que tais documentos não estão em sua posse.

– Desse requerimento respondeu a Recorrido dizendo que, ao abrigo do disposto no artigo 429º do Código de Processo Civil, essa documentação pertencia à parte contrária, sendo que é ela quem tem o ónus da sua junção aos autos.

– Para além do mais, resulta do artigo 430º do CPC, que manda aplicar o disposto no nº 2 do artigo 417º, onde expressa se indica que a recusa em apresentar documentação que esteja na posse da parte contrária determina a inversão do ónus da prova (artigo 344º, nº 2 do CC).

– Note-se que a junção destes documentos se mostra essencial para demonstrar a posse legítima da Recorrente e, em consequência, o seu direito de retenção do bem imóvel nos termos do disposto pelo artigo 759, do Código Civil.

– É que só essa documentação é susceptível de provar, como alega a Recorrida na sua Contestação, que Sérgio...celebrou um contrato promessa com a Recorrida, pagando-lhe o respectivo preço e, como tal, tendo adquirido uma expectativa real de aquisição do referido imóvel.

– E que, por via do contrato de cessão de posição contratual celebrado em 25/01/2007, entre o mesmo Sérgio... e a Recorrida, foi transferida para a esfera jurídica da promitente compradora, ora Recorrente, que...

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