Acórdão nº 5525/16.3T8VNG.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelANA PAULA CARVALHO
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 6ª Seção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO A. C. F. S. V. instaurou acção de processo comum contra a Caixa Geral de Depósitos, S.A., formulando os seguintes pedidos de condenação da ré: - A reconhecer que o autor não lhe deve a quantia de €5.576,66 nem quaisquer outras, nomeadamente referentes a juros e despesas de cobrança decorrente da utilização do cartão de crédito “CARTÃO CAIXA GOLD” nº10006896970, no dia 2 de Agosto de 2013; - A comunicar à Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal que o autor nada deve a título de utilização do cartão de crédito “CARTÃO CAIXA GOLD” nº10006896970.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento, e foi elaborada a sentença, com o seguinte dispositivo: «Destarte, julga-se parcialmente procedente a presente acção e, em consequência, condena-se a ré Caixa Geral de Depósitos, S.A.: - A reconhecer que o autor A. C. F. S. V. não lhe deve a quantia de €5.576,66 nem quaisquer outras, nomeadamente referentes a juros e despesas de cobrança decorrente da utilização do cartão de crédito “CARTÃO CAIXA GOLD” nº10006896970, no dia 2 de Agosto de 2013; e a sua responsabilidade relativa à referida operação de pagamento não autorizada se limita ao montante de €150,00.

- A comunicar à Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal que o autor nada deve a título de utilização do cartão de crédito “CARTÃO CAIXA GOLD” nº10006896970, salvo o montante já indicado supra.

* Não se conformando, a ré apresentou recurso de apelação, em que pugna pela alteração da decisão recorrida, com a sua absolvição do pedido.

A apelante formula as seguintes conclusões das alegações de recurso: 1. «O autor não provou qualquer dos fundamentos em que baseava esta acção, designada e principalmente que não foi ele que efectuou as operações em causa, nem tal consta da matéria provada.

  1. Sem prova deste pressuposto, nunca a acção poderia proceder.

  2. A sentença lavra, pois, num erro essencial, que é o de aplicar o regime de utilização indevida de cartão, sem que haja sido feita prova sobre a invocada utilização, assim violando os arts. 70º e ss do RJSPME.

  3. Ao invés, pela prova testemunhal feita e pelos documentos juntos, provou que quem utilizou o cartão em causa teve que conhecer os elementos que do mesmo constam, ou seja, nome do titular do cartão, nº de cartão de crédito, data de validade e nº de código de verificação do cartão (inscrito no verso) (CVC).

  4. A sentença recorrida considera provado a transmissão pelo ordenante de pelo menos 3 desses elementos, mas não leva tais factos à matéria provada, quando o deveria ter feito, por serem factos relevantes, invocados pela Ré na sua contestação.

  5. As operações nunca poderiam ser realizadas sem a indicação deste código de verificação, pois o “Card Validation Value” é o número inscrito no verso do cartão de crédito utilizado como elemento de segurança no processamento das autorizações em que o cartão não está presente (o que foi o caso; as operações foram realizadas através da Internet).

  6. Este é um facto notório, do conhecimento de todos os que utilizam a net para realizar operações bancárias, facto que a Ré não aceita que possa ser desconhecido de um tribunal em pleno séc. XXI.

  7. Ora, das duas uma: como as operadoras que realizaram as operações nunca invocaram, nem o A. o fez, que as mesmas não foram autenticadas, bem ao invés, como resulta da documentação junta aos autos, é errada a conclusão da sentença de que a ré não logrou provar que a operação de pagamento foi integralmente autenticada.

  8. Mas ainda que assim não fosse, o certo é que alguém terá tido que aceder a pelo menos 3 dos 4 elementos pessoais, o que só pode ter acontecido por o A. ter violado os deveres contratuais assumidos, permitindo que terceiros utilizassem o seu cartão, permitindo-lhes o acesso direto ou indirecto ao mesmo.

  9. Todavia, a sentença acaba por afastar a responsabilidade do A. aplicando o nº 2 do art. 71º, considerando, pois, que a utilização autenticada, como foi o caso, não é suficiente para prova do dolo ou negligência grave do titular do cartão.

  10. Sem qualquer suporte de prova feita nos autos, e mesmo sem invocação do A., a sentença decide ter havido uma «não grosseira negligência no dever de guarda do cartão».

  11. Como os dados que permitem o pagamento foram fornecidos ao prestador do serviço e como não se provou existência de qualquer fraude informática, a única conclusão que poderia o tribunal retirar era a de que o cartão foi utilizado pelo A. ou por quem este permitiu que a ele acedesse, sem, portanto, tomar as devidas cautelas e sem cumprir as obrigações assumidas perante a Ré.

  12. Não há neste domínio qualquer inversão do ónus da prova. Aquele que pretende desresponsabilizar-se do pagamento, o A., teria que invocar e provar pelo menos de que tomou todas as medidas necessárias para que não ocorresse utilização abusiva do cartão.

  13. Ao contrário do que resulta da sentença, o artº 71º, nº 2 não faz recair sobre a Ré a prova do dolo ou da negligência grave, nem tal poderia acontecer, por ser prova hercúlea.

  14. O Banco não pode saber como o cliente usa o cartão. Defender isto é defender a fraude e o abuso pro aporte do autorizador do cartão, único com o «domínio do facto».

  15. Ora, o que resultou provado nos autos foi apenas e tão só que se o cartão foi utilizado por terceiro tal só pode ter acontecido porque o A. não cumpriu as obrigações que para si resultam da lei e do contrato, designadamente do art. 11º do contrato relativo ao cartão.

  16. Mas ainda que assim não fosse, o A. que acaba por provar a sua negligência grave.

  17. Segundo a tese defendida pelo A. na p.i., os débitos na sua conta através da utilização de cartão de crédito não foram ordenados por si, nem por terceiro que tivesse tido acesso ao cartão, pois o mesmo era muito pouco utilizado e estava quase sempre fechado num cofre.

  18. Mas, como resulta da sentença, nada se provou sobre este fundamento.

  19. O A. reconhece que o cartão estava na sua posse, pois foi o próprio que o entregou na Agência da CGD de Vilamoura, após ter sido alertado pela Ré de...

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