Acórdão nº 20329/16.5T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelEDUARDO PERTERSEN
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes que compõem este colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório[1] JF e mulher, RF, ambos nos autos melhor identificados, vieram instaurar a presente acção declarativa, com processo comum, contra Banco, SA, peticionando a final a condenação do réu a pagar aos autores a quantia de 52 991,44€, acrescida de juro à taxa supletiva legal para as operações comerciais, desde a citação até integral pagamento.

Alegam, em síntese que o BANCO, SA, à data dos factos, era detido totalmente pela XXX e tinham ambos o mesmo presidente de conselho de administração.

Desde pelo menos 1993 que o BANCO, SA estava registado como intermediário financeiro; tinha o dever de categorizar os autores como investidores não qualificados. O BANCO, SA, em Setembro de 2004 lançou uma operação de emissão de obrigações subordinadas SLN Rendimento Mais 2004, a 10 anos, cujos valores captados serviram para reforçar os rácios de capital do BANCO, SA.

Foram dadas instruções aos funcionários para não ser entregue aos clientes a nota informativa do produto e para ser vendido como um sucedâneo de um depósito a prazo.

Os autores acreditaram tratar-se de investimento seguro, 100% garantido e, em 11/10/2004 o autor marido subscreveu o boletim de subscrição de uma obrigação SLN Rendimento Mais 2004, no valor de 50 000€, já previamente preenchido, pensando tratar-se de uma variante de depósito a prazo mas melhor remunerado.

Não foi dada aos autores nota informativa da operação, mas os funcionários do banco informaram que se tratava de produto sem qualquer risco, que o banco garantia o retorno dos valores em causa e que os podiam resgatar em qualquer altura, o que convenceu os autores.

Aos autores não foi dito nem sabiam que o empréstimo só poderia ser reembolsado a partir de 27/10/2014; se o soubessem, não teriam aceitado subscrever o produto, o que era do conhecimento dos funcionários do banco.

Os valores mobiliários em causa não estavam à data depositados em qualquer conta de valores mobiliários escriturais do BANCO, SA ou da SLN.

O BANCO, SA não forneceu informação sobre a relação que tinha com a SLN.

O BANCO, SA violou os deveres de protecção e de informação, induzindo os autores a contratar em erro nos termos em que o fizeram.

Contestou o réu invocando a excepção de ineptidão da petição inicial e a excepção de prescrição do direito dos autores, ao abrigo do artº 324º do CVM, alegando que eles tiveram conhecimento da alegada subscrição abusiva desde início de 2009.

Impugnou no essencial a factualidade invocada pelos autores.

Confirmou que o autor subscreveu uma Obrigação SLN 2006, tendo perfeito conhecimento do produto em causa, tendo-lhe sido explicada a sua natureza, condições de remuneração, reembolso e liquidez; sabia que não estava a contratar um depósito a prazo ou sequer um produto equivalente.

Foi informado ao autor que a única forma de obter liquidez antes do prazo de 10 anos seria através de cedência das obrigações a um terceiro.

Os autores receberam sempre o extracto mensal no qual figuram a obrigação na sua carteira de títulos e receberam os cupões de juros e nunca efectuaram qualquer reclamação. Tendo tido conhecimento do alegado engano doloso à data da nacionalização do banco, agem em venire contra factum proprium.

Negou ter garantido o pagamento da emissão das obrigações.

Alegou não serem devidos juros comerciais em caso de procedência da acção.

Convidados para o efeito, os autores responderam por escrito às excepções.

Em audiência prévia julgou-se improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial, relegou-se para a decisão final o conhecimento da excepção de prescrição. Foi fixado à causa o valor de €52.991,44. Foram enunciados o objecto do litígio e os temas de prova.

Procedeu-se à audiência final, com gravação da prova nela prestada.

Subsequentemente, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo o réu do pedido, e condenando os autores em custas.

Inconformados, os Autores interpuseram o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões: A. Não pode deixar de ser havido como um facto publico e notório o modus operandi do Banco réu nas relações que mantinha com os seus clientes, o qual, em ordem ao seu financiamento consistiu em seduzir meros aforradores com produtos financeiros com remuneração superior à comummente praticada por outros operadores financeiros.

B.

E, em ordem a esse desiderato, convencerem tais aforradores que os produtos vendidos eram meros sucedâneos de depósito a prazo, mobilizáveis a qualquer tempo, com eventual perda de juros, o que não correspondia á verdade.

C. Aliás, a douta sentença assim também o considerou.

D. A relação de confiança que se estabelece entre o intermediário financeiro e o cliente releva, para efeitos de responsabilidade contratual, se ocorrerem danos em virtude de falta de informação detalhada fornecida pelo intermediário.

E. No caso de o cliente não ser um investidor institucional ou experiente, carece objetivamente de particular proteção, nomeadamente em termos de informação.

F. A atividade de recolha e difusão de informação é uma atividade que pode ser lesiva para outrem, nomeadamente para o cliente, se a informação prestada for falsa ou deficiente, e tiver levado o seu destinatário a tomar decisões que, a final, se revelam danosas para si.

G. Nas relações entre o Banco e o cliente, existe uma relação de confiança de onde resulta um dever específico de veracidade das informações espontaneamente prestadas.

H. Sempre que se verifique uma situação de prestação de informações incorretas, competirá ao Banco ilidir a presunção de culpa resultante do artigo 799.º, n.º 1 do C.C., demonstrando que o cumprimento defeituoso considerado não procedeu de culpa sua.

I. Sempre que a informação seja imposta, quer por obrigação principal, quer por obrigação secundária, estabelecida pela relação negocial entre o Banco e o cliente, haverá que aplicar as regras da responsabilidade obrigacional.

J. A prestação de informação pelo Banco nunca é desinteressada, visando antes que o recetor da informação, ao determinar-se por esta, adquira confiança na competência do Banco que lhe prestou a informação e reforce a sua relação como cliente desse Banco.

K.

A al. b) dos factos não provados deveria ter recebido a resposta de “provado”, por via do cotejo das certidões comerciais juntas aos autos (Docs. 1 e 3 da p.i.) com o depoimento da testemunha TC L.

Os depoimentos das testemunhas TCe JP impunham que as als. c) e e) dos factos não provados tivesse recebido a resposta de “provadas”.

M.

As declarações das testemunhas TCe CG, cotejadas com o teor do Doc. 6 da petição inicial, a fls 4, impunham que as als. d) e i) dos factos não provados tivessem merecido a resposta de “provadas”.

N.

Relativamente à al. f) dos factos não provados, as declarações da testemunha CG, impunham que a mesma tivesse sido dada por “provada”.

O.

A al. g) dos factos não provados, deveria ter sido dada por “provada”, uma vez que a tanto o impunham as declarações das testemunhas TC, CG e JP P.

Os depoimentos das testemunhas TC, CG e LM são deveras elucidativos de que os funcionários do Banco réu acreditavam na segurança do produto que vendiam sem terem noção de que produto efetivamente se tratava, pelo que a al. m) dos factos não provados deveria ter merecido a resposta de “provada”.

Q.

A resposta positiva à al. n) dos factos não provados impunha-se por inferência e por ilações tiradas de toda a restante prova produzida, conjugada com o depoimento da testemunha CG, uma vez que a esta, questionada se a autora mulher teria aceite ficar com o produto financeiro dos autos caso lhe tivesse sido explicado que o mesmo consistia numa obrigação subordinada, respondeu convictamente “Não”.

R. A al. o) dos factos não provados, deveria também ter merecido a resposta de “provada”, uma vez que o documento junto pelos autores na sua resposta às demonstra inequivocamente que, na data em que os mesmos subscreveram a compra de 1 obrigação SLN Rendimento Mais 2004, o Banco réu nem sequer a tinha depositada numa qualquer conta de valores mobiliários escriturais.

S. Questão fundamental para a economia do presente recurso: “Aos clientes era dito que se tratava de um produto semelhante a um deposito a prazo” (7 dos factos provados) e “Foi dito à autora mulher que poderia resgatar o capital investido, em qualquer altura, mediante a cedência da Obrigação SLN Rendimento Mais 2004 a terceiros”(11 dos factos provados).

T.

Se nos recordarmos dos depoimentos de TCe de CG, os quais confirmaram que equiparavam o produto financeiro dos autos a um depósito a prazo e que o mesmo se destinava a “clientes tradicionais aforradores”, não vislumbramos como se pode fundamentar a improcedência da acção… U. Apenas tendo em conta a matéria de facto dada como provada, impunha-se que a ação tivesse sido julgada procedente.

V. Se lhe acrescentarmos a matéria de facto incorretamente dada por não provada e que deveria ter merecido a resposta de “provada”, então a douta decisão recorrida começa a raiar a flagrante e gritante injustiça, sobretudo quando se limita a qualificar tudo como “um negócio ruinoso”.

W. Dando-se como provada a factualidade supratranscrita, não pode afirmar-se que os autores não foram enganados ao subscreverem o produto «SLN Rendimento Mais 2004», convencidos que se tratava de um mero sucedâneo de depósito a prazo, e que, pelo contrario, os empregados do Banco “Agiram, pois, de boa-fé, salvaguardando os interesses dos autores no momento do investimento”.

X. Sobretudo, tendo presente que foi dada à autora mulher a garantia de que o produto SLN Rendimento Mais 2004 de um mero sucedâneo de depósito a prazo se tratava, e que tal produto era a qualquer tempo mobilizável.

Y. A douta sentença enferma de vício de contradição profunda entre a factualidade dada como provada e a decisão de direito que tais factos mereceram, pelo que padece da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT