Acórdão nº 1316/06.8TBOER.L2-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelIL
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: MG intentou acção especial e prestação de contas contra AF, Alegou, em síntese, que em 25/10/2001 constituiu sua procuradora a ré concedendo-lhe poderes para a representar na partilha dos bens deixados por óbito de sua mãe, nomeadamente no que se refere a um apartamento. A ré, no âmbito do referido mandato, outorgou escritura de compra e venda do referido imóvel e recebeu o respectivo preço. Em 21/03/2002 a autora constituiu sua procuradora a ré concedendo-lhe poderes para em seu nome com livre e geral administração civil, gerir e administrar tudo quando diga respeito à fracção correspondente ao 4º andar letra “AQ”, lote 4 do prédio em regime de propriedade horizontal sito na Vila X Alvor, para em seu nome deliberar e votar as propostas apresentadas pela assembleia de condóminos, legalmente convocadas, assinando e praticando tudo o que necessário for aos indicados fins e para a representar em juízo. E a ré com poderes de procuradora para tanto adquirira em nome da autora por escritura outorgada no 2º Cartório Notarial de Lisboa em 31 de Julho de 2001, a referida fracção autónoma. A ora ré no âmbito do mandato concedido efectuou um sem número de actos e negócios em nome e por conta da autora, designadamente a outorga de contratos de mediação para arrendamento em vilegiatura com a empresa TT - Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda com sede na Rua Y, em Oeiras, recebendo as rendas e efectuando compras de artigos de decoração para a fracção da autora. Em 21/03/2002 a autora constituiu sua procuradora a ré concedendo-lhe todos os poderes para, com livre e geral administração cível, reger e gerir todos os bens em Portugal; e, abrir e movimentar contas correntes em bancos, casas bancárias ou outros estabelecimentos de crédito, incluindo a Caixa Geral de Depósitos, podendo por consequência depositar e levantar capitais, sacar e endossar cheques, assinar recibos, solicitar saldos e extractos de contas, requisitar módulos de cheques, bem como representa-la em juízo. A ré no âmbito do mandato concedido efectuou um sem número de negócios em nome e por conta da autora, recebendo valores, movimentando a conta bancária da autora, comprando artigos de decoração, contratando serviços de construção civil na da Quinta da PP em Lagos. A ré deu de arrendamento a Quinta da PP em diversos períodos, recebendo as respectivas rendas. No âmbito dos mandatos conferidos pela autora á ré, para que esta praticasse negócios em nome e por conta daquela, a ré levantou da conta bancária da autora e foram entregues à ré pela autora por diversas vezes, o montante global de 261.890,22 €. A venda do apartamento pertença da herança da mãe da autora sito na Rua MT na Bobadela, em Sacavém, teve o preço de 87.289,53 €, que a ré recebeu para utilizar no âmbito do mandato. As rendas recebidas pela ré pelos dos dois imóveis da autora no período compreendido dos anos de 2002 a 2004, entregues e pagos pela mediadora TT - Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda e por hospedes particulares, ascenderam a um valor superior ao montante de 19.724,10 €. A autora entregou numerário á ré no âmbito dos mandatos para a administração dos seus bens e interesses, tudo em montante superior ao valor de 368.873,95 €. Os mandatos conferidos pela autora à ré foram todos e sempre gratuitos, baseando-se a atribuição do mandato numa relação de amizade de infância e de confiança da autora na ré. A ré, interpelada em Junho de 2005, para prestar contas da sua administração não as prestou. Nos termos do disposto no art. 1161º d) do Código Civil o mandatário é obrigado a prestar contas findo o mandato ou quando o mandante as exigir.

Conclui pedindo a citação da ré para no prazo de 30 dias apresentar as suas contas ou contestar a acção, sob cominação de não poder deduzir oposição às contas que a autora vir a apresentar.

A ré apresentou contestação e deduziu pedido reconvencional.

Alegou, em suma, que não existe obrigação de prestar contas uma vez que já as prestou por duas vezes, das quais resulta um saldo a favor da ré. Com o recurso à via judicial sem qualquer fundamento válido que legitime a sua causa de pedir, litiga a autora com inequívoca má-fé, pelo que, para além da condenação nas custas do processo, deverá ser também condenada em multa. A ré, contudo apresenta novamente as contas. Impugna algumas das verbas alegadas pela autora, como receitas. A autora sempre assumiu perante a ré e diversos terceiros, amigos de ambas, que sempre seriam da sua responsabilidade as despesas de deslocação, hotéis, gasolinas, portagens, quilómetros, desgaste dos veículos, telefonemas, faxes, correios, fotocópias, manutenção das despesas de alimentação aquando das estadias fora de Lisboa, fazendo sempre questão de prevenir a ré que sempre que necessário, para além das remunerações que liquidasse, a canalizadores, estucadores, carpinteiros, técnicos, floristas, caseiros e jardineiros, empregadas domésticas, empregados de cemitério, gratificasse os mesmos. A autora sempre lhe disse que metade das rendas recebidas deveria reservá-las para si, como pequena e simbólica retribuição gratuita. A ré despendeu no uso do mandato que lhe foi conferido e em benefício exclusivo da autora o montante de Euros 378.618,12 e esta só lhe entregou a quantia de € 309.930,40, pelo que, autora tem perante a ré um saldo devedor de € 68.687,72. A título de reconvenção a ré alegou que verificadas que estejam as contas prestadas, deverá a autora, ora reconvinda, ser condenada a pagar à ré reconvinte, a quantia de €uros 68.687,72, ou a que vier a ser verificada por este tribunal.

Conclui pela improcedência da acção, quer face às excepções quer à impugnação deduzidas, e em consequência, absolver-se a ré dos pedidos contra ela formulados, condenando-se a autora nas custas do processo e multa por litigância de má-fé, conhecendo da reconvenção contra ela deduzida.

A autora respondeu, alegando, em suma que há confissão das verbas de receita no montante de € 309.930,40, pelo que a excepção deve ser julgada improcedente por não provada. A autora não aprovou nem aceitou os documentos entregues pela ré, porque não foram apresentadas em forma de conta corrente, com especificação da proveniência das receitas e a aplicação das despesas, bem como o respectivo saldo. No respeitante às despesas apresentadas pela ré, há viciação de documentos, há fabricação de despesas, há despesas injustificadas, há imputação de despesas pessoais da ré à autora, há duplicação de despesas e de documentos, no valor de muitas dezenas de milhares de euros, resultando em flagrante e ilícita vantagem patrimonial para a ré que sabe não ter direito.

Pugna pela inadmissibilidade da reconvenção.

A ré respondeu, alegando que ocorreu aprovação tácita das contas apresentadas ao longo dos anos. A ré vive basicamente em Gouveia com a sua mãe, onde ajuda no negócio familiar e que daí directamente se deslocava para o Algarve.

Pugna pela admissibilidade da reconvenção e conclui como na contestação.

A ré apresentou articulado superveniente, aumentando o valor do pedido reconvencional, no sentido de a autora ser condenada a pagar-lhe compensação pelos serviços prestados, no valor de € 46.489,56, acrescido de IVA, que deve ser cumulado ao pedido já formulado na reconvenção, totalizando esta € 115.177,28.

A autora respondeu confirmando a contestação já apresentada nos autos e pugnou pelo indeferimento do articulado superveniente.

Foi proferida SENTENÇA que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 68.709,23.

Não se conformando com a sentença, dela recorreu a ré, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: A)– A autora conferiu à ré diversas procurações, todas elas com poderes específicos, designadamente, para comprar ou para vender determinado bem, devidamente identificado na respectiva procuração.

B)– Assim, os poderes conferidos por cada uma destas procurações extinguiam-se com o acto de compra ou venda, nela especificado e estes mandatos ficavam anexadas à respectiva escritura de compra ou de venda.

C)– Em 21 de Março de 2002 a autora conferiu à ré uma procuração concedendo-lhe todos os poderes para, com livre e geral administração cível, reger e gerir todos os bens em Portugal; e abrir e movimentar contas correntes em bancos, casas bancárias, ou outros estabelecimentos de crédito, incluindo a Caixa Geral de depósitos, podendo por consequência depositar e levantar capitais, sacar e endossar cheques, assinar recibos, solicitar saldos e extractos bancários, solicitar módulos de cheques, bem como representá-la em juízo.

D)– É pois esta a data (21-03-2002) a data a partir da qual está a ré obrigada a informar ou a prestar contas à autora, pelos seus actos de administração.

E)– Porém, não foi com base neste pressuposto fundamental e determinante que a matéria processual foi apreciada em juízo.

F)– Logo na relatório da sentença condenatória se verifica um erro pois o tribunal a quo refere que a ré, com poderes conferidos pela procuração que a autora lhe conferira, adquirira em 31 de Julho de 2001 uma fracção autónoma, mas como facilmente se alcança nem pode ter sido a procuração datada de 25/10/2001, nem a procuração que lhe confere amplos poderes datada de 21/03/2002, ambas aí referidas.

G) Na matéria de facto provada, ponto 12, refere-se que na data de 02/01/2002 ocorreu uma transferência de € 21.175,05 para a conta da ré, o que não corresponde à verdade, pois tal quantia foi transferida para uma conta da autora, sediada no BES, agência do Alto do Restelo, como o demonstram os documentos nºs 1 e 6 dos autos.

H)– Esta quantia monetária destinou-se a dar provisão à conta da autora que estava com um saldo negativo de 19.929,20€, pois esta estava a adquirir a sua propriedade na Quinta da PP, Lote 26, cuja escritura foi outorgada em 03/02/2002, conforme doc 1 e 6 dos autos, não tendo este valor chegado à disponibilidade da ré.

I)– No ponto 14 da...

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