Acórdão nº 12361/15.2T8ALM.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 01 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução01 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados: Valdemar S. intentou a presente acção declarativa de condenação, sob forma de processo comum, contra N Seguros, S.A., pedindo a condenação da R. no pagamento de indemnização no valor global de € 293.317,90, acrescida de juros a contar desde a data da citação até integral pagamento, sendo aquela indemnização composta pelos seguintes valores parcelares: a)- € 4.470,95 + € 1.250,00 – cirurgia a realizar e respectivo pós-operatório; b)- € 3.782,81 – perdas salariais; c)- € 190.000,00 – danos patrimoniais futuros; d)- € 50.000,00 – dano biológico; e)- € 40.000,00 – danos não patrimoniais; f)- € 1.114,14 – despesas médicas e medicamentosas.

Alega o A. que ocorreu um embate entre um veículo ligeiro de mercadorias e o motociclo por si conduzido, cujo responsável foi o segurado da R., porquanto invadiu a faixa de rodagem do A., cortando-lhe a sua linha de marcha. Deste acidente resultaram danos patrimoniais e não patrimoniais, designadamente incapacidade permanente geral de 32,90 pontos, com incapacidade total absoluta para a profissão habitual, prejuízo de afirmação pessoal de grau 1/5, quantum doloris de grau 5/7, dano estético de grau 2/7 e prejuízo sexual de grau 1/5.

Regularmente citada, a R. contestou, assumindo a responsabilidade pelo sinistro, mas divergindo da avaliação do dano efectuada pelo A., com fundamento, designadamente, em que o ligeiro défice funcional permanente do A. não implica qualquer limitação de natureza profissional.

Com dispensa de audiência prévia procedeu-se ao saneamento da causa, bem como à fixação do objecto do litígio e dos temas da prova, sem reclamações.

Realizou-se a audiência final, com observância das legais formalidades, no decurso da qual foi apresentado articulado superveniente pelo A., o qual foi admitido.

No articulado superveniente o A. requer a ampliação do pedido, no sentido da condenação da R. no pagamento dos suplementos de turno e patrulha até à idade normal da reforma, que neste momento na PSP se situa nos 60 anos, o que se traduz num total de € 33.551,88.

A R. respondeu, sustentando que o A. não ficou com qualquer rebate profissional em virtude do acidente e que desconhece se os suplementos se manteriam até à idade da reforma.

Mais solicitou o A. a condenação da R. por litigância de má-fé, tendo esta pugnado pela improcedência do pedido.

Após a conclusão da audiência final foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: “Em face do exposto e tudo ponderado, o Tribunal decide julgar a presente ação parcialmente procedente, e em conformidade: 1.

– Condena a R. N Seguros, S.A., a pagar ao A. Valdemar [S.]: i) indemnização: a)- pelos custos associados à cirurgia ao joelho e respetivo pós-operatório, € 5.720,95; b)- por perdas salariais, no valor de € 3.782,81; c)- por dano patrimonial futuro, no valor de € 190.000,00; d)- por danos não patrimoniais, no valor de € 40.000,00; e)-por despesas médicas e medicamentosas, no valor de € 1.114,14; ii)- juros de mora: a)- sobre as indemnizações aludidas em a), b) e e), desde a data da citação até à presente data, à taxa de 4%, e desde a presente data até efetivo e integral pagamento, à taxa legal; b)- juros de mora sobre as indemnizações aludidas em c) e d), desde a data da presente decisão até efetivo e integral pagamento, à taxa legal; 2.- Absolve, no mais, a R. do pedido, assim como absolve a R. do pedido de condenação como litigante de má fé”.

Quer o A., quer a R., recorrem desta decisão final.

Quanto ao A., termina a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: A)– Apesar de a Mm.ª Juíza “ad quo” ter entendido que o facto de o Autor não estar em condições de receber tais subsídios não lhe é imputável, por ser consequência de um acidente pelo qual é responsável um terceiro, veio a determinar que não há razões para considerar previsível o recebimento desses suplementos até à idade da reforma. Pois, o Autor enquanto agente da PSP poderia requerer a mudança de serviço ou ser proferida decisão oficiosa nesse sentido, para serviço que não fosse compatível com o recebimento de tais subsídios.

B)– Acontece que, não resultou demonstrado que o Autor tivesse requerido a mudança de serviço nem tenha sido proferida decisão oficiosa nesse sentido, ou seja, o Autor mantinha e manteve sempre interesse em estar a exercer as funções que exercia e que pelas quais lhe eram devidos tais subsídios de turno e de patrulha.

C)– Pelo que, também não estará correto afirmar que não há razões para considerar previsível o não recebimento desses suplementos até à idade da reforma, sendo certo que era essa a intenção do Autor e cuja continuidade lhe foi completamente vedada pelas lesões sofridas em consequência do acidente em causa. Tanto mais que nem se poderá afirmar que é impossível a realização de tais serviços até à idade da reforma, pois tal acontece com cerca de 90% dos seus colegas de trabalho.

D)– E o Autor viu essa possibilidade vedada aos 40 anos de idade.

E)– Que, tendo em conta o explanado no Art.º 562º do C.C., «quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação», acrescentando o art.º 563º do C.C. que «a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria se não fosse a lesão».

F)– Logo, a impossibilidade de o Autor poder vir a realizar o seu trabalho habitual, do qual resultava o recebimento dos subsídios de turno e de patrulha, merece tutela jurídica e deve o mesmo ser compensado por tais subsídios até à idade da reforma, tendo em conta que é mais certo que o Autor pudesse realizar o mesmo serviço até à idade da reforma do que o seu contrário.

G)– Assim, o valor peticionado a título de dano emergente por perdas salariais até à idade da reforma, ou seja, por mais 17 anos, deverá ser atendido, condenando-se a Ré a pagar ao Autor o valor de € 33.551,88 (€ 164,47 x 204 meses).

H)– Por outro lado, decidiu a Mm.ª Juíza “ad quo” nada fixar a título de Dano Biológico, porquanto poderia estar a incorrer numa duplicação de indemnizações, uma vez que já havia fixado o dano patrimonial futuro e o dano não patrimonial.

I)– A Jurisprudência mais recente do STJ tem entendido que o Dano Biológico visa a compensação ao lesado pela incapacidade permanente geral, correspondente à afetação definitiva da capacidade física e/ou psíquica, com repercussão nas actividades da vida diária, incluindo familiares, sociais, de lazer e desportivas, a qual até pode não ter sequer expressão em termos de incapacidade para o trabalho.

J)– Que, por força do comummente decidido por vários Acórdãos do STJ, em que se destaca o Acórdão do STJ datado de 11-12-2012, o dano biológico decorrente das sequelas das lesões sofridas, perspetivado não como fonte de uma perda de rendimentos laborais, mas antes como diminuição global das capacidades gerais do Autor, envolvendo uma verdadeira capitis deminutio para a realização de quaisquer tarefas, que passam a exigir-lhe um esforço acrescido compensado, precisamente, com o arbitramento desta indemnização.

K)– Assim como, o Dano Biológico, também não poderá ser confundido nem reduzido a danos morais, pois o dano biológico visa também compensar prejuízos de natureza patrimonial provenientes das consequências negativas ao nível da atividade geral do lesado.

L)– E, dúvidas não restam de que o Autor terá que ser vigiado medicamente e efectuar terapêutica medicamentosa, bem como tratamentos de Medicina Física e de Reabilitação, na tentativa de minimizar as queixas álgicas, que terão períodos de exacerbação, para além da vigilância em ORL, reabilitação vestibular, e eventual acompanhamento/reabilitação psicológica, Cfr quesito 14 dos factos provados.

M)– Pelo que, o Douto Tribunal “ad quo” deveria ter dado provimento ao valor peticionado pelo Autor a título de dano biológico, de € 50.000,00, o qual refira-se, peca por defeito e não por excesso, tendo em conta a realidade do Autor que ficou com a sua vida quer laboral quer pessoal completamente desfeita em consequência do acidente em causa.

N)– A douta Sentença recorrida violou, assim o disposto nos artºs 495º, 562º e 566º todos do Código Civil e alínea b) do n.º 1 do art.º 615º do C.P.C.

Quanto à R., termina a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: 1)– A Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, porquanto na mesma não houve uma apreciação correcta dos pressupostos de direito e de facto constantes dos presentes autos.

2)– Considerou o tribunal a quo como provados os factos nºs 11º, 12º, 13º, 14º, 15º, 18º, 19º, 23º, 28º, 31º, 33º, 34º, indicados na sentença.

3)– Não pode a Recorrente concordar com tal entendimento já que o que consta naqueles artigos são meras transcrições do Parecer Médico-legal junto pelo Recorrido na Petição Inicial, cujas conclusões não correspondem à verdade factual, estando as mesmas manifestamente extrapoladas.

4)– Entendeu o tribunal a quo dar credibilidade ao Parecer Médico-Legal da Dra. R...M..., em vez de valorizar o Relatório final de Avaliação do Dano em Direito Civil, elaborado pelos serviços clínicos da Recorrente, o que não se compreende.

5)– Atendeu o tribunal a quo ao Parecer Médico-Legal da Dra. R...M... pelo facto de esta ser médica especialista em medicina legal, na componente de avaliação de dano em direito civil, porque o mesmo contem uma descrição pormenorizada acerca do conteúdo da percentagem de incapacidade e por incluir uma indicação exaustiva dos elementos clínicos do Recorrido e por ser auxiliado por outros dois relatórios médicos do Dr. P...C... e do Dr. P...M... e pela Avaliação Psicológica da Dra. M...M... e C...M..., facto que, para o tribunal a quo, foi achado como relevante.

6)– O Médico da Recorrente ouvido em audiência de julgamento, Dr. J...L... tem vasta experiência como médico especialista em ortopedia ao contrário da...

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