Acórdão nº 14202/16.4T8LSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução22 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Em 02.6.2016 Manuel e mulher, Maria intentaram ação declarativa de condenação com processo comum contra Banco Bic Português, S.A.

Os AA. alegaram, em síntese, que em outubro de 2004 tinham um depósito a prazo, no valor de € 55 000,00, na agência em Leiria do antecessor do ora R., BPN – Banco Português de Negócios, S.A.. Por essa altura o A. marido foi contactado por um funcionário da dita agência que o convenceu a aplicar o valor do dito depósito a prazo, que se vencia em 25.10.2004, numa obrigação SLN Rendimento Mais 2004, no valor nominal de € 50 000,00, tendo essa quantia (€ 50 000,00), sido debitada, em 25.10.2004, na conta de depósitos à ordem dos AA.. O A. foi aliciado para tal operação com a indicação de que o tal produto tinha características similares às de um depósito a prazo, mas melhor remunerado. Para esse efeito o A. deslocou-se à agência, onde se limitou a assinar um documento intitulado “Comunicação de Cliente”, já preenchido. Em 08.5.2006 o A. recebeu um telefonema do seu gestor de conta no banco R., o qual lhe disse que subscrevera em seu nome duas obrigações SLN 2006, similares ao produto de 2004, no valor de € 50 000,00 cada uma. Era um produto totalmente garantido, com características semelhantes às de um depósito a prazo, só que melhor remunerado. O valor das duas obrigações foi debitado na conta dos AA., a partir de um depósito a prazo e de depósitos à ordem por eles titulados. Desta feita o A. nem sequer assinou qualquer documento. Ora, os AA. não foram informados das características dos aludidos produtos, tendo-os adquirido tão só porque lhes foi afiançado que eram garantidos pelo próprio banco, que, apesar de serem obrigações a dez anos, podiam ser resgatados a qualquer altura, apenas com penalização nos juros, tal como sucede nos depósitos a prazo. Não lhes foi entregue qualquer nota informativa dos produtos em questão, sendo certo que os empregados do R. tinham instruções para as não facultar aos clientes. Os empregados do R. bem sabiam que os AA. eram avessos ao risco, que apenas colocavam as suas poupanças em depósitos a prazo, e que se os AA. conhecessem as verdadeiras características das ditas obrigações, nomeadamente o que constava nas ditas notas informativas, acerca da subordinação, liquidez e reembolso antecipado, não as teriam subscrito. Após a crise do sub-prime e a nacionalização do BPN os AA., como outros, tentaram reaver o dinheiro investido nas ditas obrigações, sem sucesso. Os empregados do banco tranquilizaram os AA., dizendo-lhes que a breve trecho haveria uma solução, e que era preferível aguardarem, continuando a receber os juros semestrais contratados, que a SLN, agora Galilei, ia pagando, por intermédio do banco. Só que, tendo a Galilei iniciado um processo de revitalização, foi recusada a homologação do plano de recuperação apresentado, pelo que os AA. desistiram de receber da Galilei o valor do seu investimento, sendo certo que os empréstimos deveriam ser reembolsados em outubro de 2014 e abril de 2016, respetivamente. A SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA, pagou os juros referentes às obrigações SLN Rendimento Mais 2004 até 30.9.2015 e os referentes às obrigações SLN 2006 até 30.4.2015. De resto, só em finais de 2015, quando preparavam a presente ação, é que os AA. receberam do banco documento escrito com as condições de aplicação das quantias, o prazo, a rentabilidade, as condições de movimentação e demais informação relevante e legalmente exigida para esse tipo de operações.

Os AA. entendem que o R., por força da violação das obrigações legais e contratuais que tinha para com os AA. enquanto banco e intermediário financeiro, é responsável, solidariamente com, atualmente, a Galilei, SGPS, S.A., pelos prejuízos que lhes causou, correspondentes ao valor do capital e juros de mora vencidos e bem assim juros de mora vincendos a contar da citação, à taxa supletiva para as operações comerciais.

Os AA.

terminaram pedindo que o R. fosse condenado a restituir aos AA. a quantia de € 160 111,43, acrescida de juros à taxa supletiva legal para as operações comerciais, contados sobre € 150 000,00, desde a citação e até integral e efetivo pagamento.

O R.

contestou a ação, invocando a ineptidão da petição inicial e a prescrição do crédito dos AA., aceitando que os AA. haviam subscrito as referidas obrigações e que foram recebendo os respetivos juros e que ainda não lhes foi restituído o respetivo capital, mas impugnando tudo o mais, nomeadamente que os AA. tivessem sido enganados ou de alguma forma induzidos a investir num produto de risco, ou que lhes tivesse sido omitida alguma informação relevante, aquando da concretização dos negócios em questão. Negou, em suma, qualquer responsabilidade no sucedido e na falta de pagamento invocada, tendo concluído pela sua absolvição do pedido.

A convite do tribunal, os AA.

responderam à matéria de exceção, pugnando pela sua improcedência.

Foi proferido saneador em que se julgou improcedente a arguição de ineptidão da petição inicial e se relegou para final a apreciação da exceção de prescrição.

Foi identificado o objeto do litígio e procedeu-se à enunciação dos temas da prova.

Realizou-se audiência final e em 31.3.2017 foi proferida sentença em que se julgou a ação improcedente e consequentemente se absolveu o R. do pedido.

Os AA. apelaram da sentença, tendo apresentado alegações em que formularam as seguintes conclusões: A. Não é aceitável e nem sequer é defensável que se considere que um banco presta informação verdadeira, actual, clara e objectiva quando vende a investidores não qualificados, simples aforradores, uma obrigação subordinada, dizendo aos clientes que se trata de um produto semelhante a um depósito a prazo.

  1. Reputa-se, quase como um facto público e notório, o modus operandi do Banco réu nas relações que mantinha com os seus clientes, sobretudo quando acaba de ser tornado público que Oliveira, o chefe da quadrilha, cabeça da SLN e do BPN, foi condenado a 14 anos de prisão e que Luís, o numero dois do BPN e o gestor da área financeira da SLN, foi condenado a 8 anos e meio de prisão, ambos pela prática, entre outros, do crime de burla qualificada.

  2. Tal modus operandi, em ordem ao seu financiamento consistiu, como é do conhecimento comum, em seduzir meros aforradores com produtos financeiros com remuneração superior à comummente praticada por outros operadores financeiros.

  3. E, em ordem a esse desiderato, convencerem tais aforradores que os produtos vendidos eram meros sucedâneos de depósito a prazo, mobilizáveis a qualquer tempo, com eventual perda de juros, o que na realidade não era verdade.

  4. Sendo certo que a douta sentença assim também o considerou.

  5. Foram carreadas para os autos provas inequívocas e irrefutáveis que impunham resposta diversa (a de “provados”) aos factos vertidos nas alíneas b); c); f) e g), esta última em parte, dos factos não provados.

  6. Quanto à matéria da al. b) dos factos não provados, do cotejo da pág. 4 do documento n.º 6 da petição inicial (a nota interna do produto “SLN 2004”) consta que “o prospecto da emissão deverá ser entregue a todos os clientes que o solicitem” com o depoimento de Teófilo, que afirmou que “as instruções que havia era para entregar só se o cliente solicitasse”, impunha-se que a mesma tivesse recebido a resposta de “provada”.

  7. A redação A todos os clientes que o solicitem, por si só, inculca desde logo a ideia de que a ficha técnica só deverá ser mostrada em casos extremos, uma vez que o cliente comum, confiante e incauto, nunca a solicitará.

    I. A resposta de “provado” á matéria de facto da al. c) dos factos não provados impunha-se em resultado dos depoimentos de Teófilo (referência aos telefonemas de Oliveira, á pressão para vender, ao sistema especifico de incentivos), Saúl (empenhamento de toda a estrutura do Banco com base em informação falsa, pressão para vender”), João, (pressão que vinha de cima tremenda para a comercialização dessas aplicações), cotejados com a nota interna do produto SLN 2004 (doc. 6 da petição inicial).

  8. A resposta de “provado” á matéria de facto de parte da al. g) dos factos não provados impunha-se em resultado dos depoimentos de Teófilo (referência á similitude com a venda das obrigações BPN 2003 e à insistência na similitude do produto com um depósito a prazo, o facto o cliente alvo ser aquele de depósito a prazo), Saúl, (de novo a referência ao depósito a prazo, ao capital garantido e ao risco banco, a falta de entrega do prospecto, a omissão da característica da subordinação e o seu desconhecimento das características do produto vendido) e João, (referencia ao depósito a prazo e á garantia do banco, bem como á pressão na venda).

  9. A resposta de “provado” á matéria de facto da al. f) dos factos não provados impunha-se em resultado dos depoimentos de Teófilo, Saúl e João, que foram unânimes em referir que o autor marido só queria depósitos a prazo, mas com taxas altas, cotejados com o facto de o Banco réu não ter carreado para os autos qualquer prova de que os autores haviam comprado ou vendido obrigações, no BPN ou em outros Bancos.

    L. Se é certo que o banco réu juntou, uma “comunicação de cliente” relativa á subscrição de 2004, assinada pelo autor marido, não juntou qualquer documento relativo á subscrição de 2006.

  10. O depoimento das testemunhas supra descritos não deixa duvidas: o cliente visado era aquele cliente tradicional, de depósito a prazo, que queria produtos sem risco de capital, como os autores e que nunca compraria as obrigações dos autos, devidamente informado.

  11. Nenhum dos factos alegados nos &s 16.º a 18.º; 24.º; 55.º; 58.º a 64.º; 68.º; 73.º; 77.º e 78.º da petição inicial foi impugnado pelo réu, na sua contestação.

  12. Ao contestar, deve o réu tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor, sendo certo que se consideram admitidos por acordo os factos que não forem...

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