Acórdão nº 588/12.3TCFUN.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelISABEL FONSECA
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa.

I.–RELATÓRIO: Ação Declarativa com forma de processo comum.

/////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////// Autor/apelado C. – Promoção Imobiliária, Lda.”, declarada insolvente em 9 de julho 2014.

*************************** Réus/apelantes João... e mulher, Idalina...; Caixa, S.A.

//////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////// Pedido.

Deve: “a)– Declarar-se a extinção da garantia pelo cumprimento da obrigação a que a A. se encontra adstrita (boa execução da obra) e, em consequência ordenar-se à Caixa, S.A. que se abstenha de proceder ao pagamento da mesma.

Se assim não se entender: b)– Declarar-se que a mesma apenas abrange a boa execução da obra de construção da moradia permutada e que não estão reunidos os pressupostos legais e contratuais do accionamento total da garantia, ordenando-se a redução para o valor que o Tribunal vier apurar ser o necessário para proceder às reparações adequadas das eventuais desconformidades da moradia em relação ao mapa de encargos.

c)– Condenar-se os RR. João .. e mulher a pagarem à A. os juros que esta pagou e vier a pagar à R. CAIXA, S.A. desde Dezembro de 2010 até à entrega da garantia ou ao trânsito em julgado da presente acção”.

Causa de pedir.

A autora celebrou, em 17 de novembro de 2008 – juntamente com os seus sócios-gerentes e respectivos cônjuges – com a “Caixa, S.A.” um contrato de garantia bancária para garantir a boa execução das obras de construção de uma moradia objeto de permuta entre si e os aqui réus, João... e Idalina....

A referida garantia bancária foi emitida, em 22 de dezembro de 2008, até ao montante máximo de € 450.000,00, com a finalidade de garantir a boa execução das obras de construção da moradia permutada e, não obstante a construção ter sido efetuada em conformidade com o solicitado pelos réus João... e Idalina..., sempre com a supervisão e acompanhamento do réu marido e sem que tenham, alguma vez, dado a indicação de que a obra não estaria em conformidade com o acordado, estes acionaram a garantia em 13/06/2011.

A moradia foi construída e encontra-se em perfeitas condições de entrega aos réus; estes, apesar disso, acionaram a garantia junto da “Caixa, S.A.”, recusando aceitar a obra, alegando que os acabamentos efetuados não foram os acordados e que o prazo de entrega não foi, igualmente, cumprido pela autora.

Oposição.

Dos réus João... e Idalina...: A garantia bancária foi assinada para garantir, não só a boa execução das obras, mas também a entrega da fracção nas condições acordadas, o que não foi cumprido pela autora.

Da ré Caixa, S.A.: Recebeu a interpelação para pagamento da Garantia Bancária e não procedeu a esse pagamento por força da decisão proferida em sede de Procedimento Cautelar instaurado pela autora. Desconhece os factos que pautaram a relação entre a autora e os réus João... e Idalina...

Reconvenção.

Os réus João... e Idalina... peticionam a condenação da autora e da ré Caixa, S.A. a: - “Reconhecer que a garantia foi accionada em Junho de 2011, sem que nada possa opor-se à sua execução e em consequência deve ser pago aos Réus o valor de 450.000€ mais os juros legais devidos desde essa data até ao efectivo pagamento”; - “[R]reconhecer que a garantia bancária prestada não caduca a 22 de Dezembro de 2012 devendo esse prazo ser considerado suspenso até ao trânsito em julgado da decisão do presente processo ou do pagamento da mesma; - “[s]olidariamente a indemnizar os Réus por valor a fixar em sentença pelos prejuízos causados, lucros cessantes e danos morais que se vierem a provar, e em consequência - Ser dado sem efeito o registo da titularidade do direito de propriedade da identificada fracção D no nome dos Réus”.

Indicando como valor do pedido reconvencional a quantia de 450.000 €.

Incidente de intervenção.

Por decisão proferida a 09/04/2015 foi admitida a intervenção principal provocada, como associados da autora, de JP..., Lídia... e Paulo...

Nenhum dos intervenientes apresentou contestação, sendo o JP... e o Paulo... representados pelo M.P. porque foram citados editalmente.

Saneamento.

Proferiu-se o despacho de fls. 383-392, com o seguinte teor: “A nulidade arguida pela “Caixa, S.A.”, através do requerimento entrado em juízo sob a Ref.ª Citius 396413 (11874022) e datado de 10/12/2012 (fls. 130), mostra-se sanada pelo despacho proferido sob a Ref.ª Citius 1341180, datado de 11/12/2012 (fls. 140), que sanou as irregularidades de notificação, conforme se extrai do teor do requerimento da “Caixa, S.A.”, entrado em juízo sob a Ref.ª Citius 410036 (12289069), datado de 28/01/2013 (fls. 142-144).

* Da Réplica: (…) Em face do exposto, por tempestiva e legalmente admissível, admito a réplica.

* Da Tréplica: (…) Assim sendo, admite-se a tréplica.

* Da reconvenção apresentada pelos Réus João... e Idalina...contra a Co-Ré “Caixa, S.A.” e contra a Autora: No seu articulado de contestação, os Réus deduziram pedido reconvencional contra a Autora e, bem assim, contra a co-Ré “Caixa, S.A.”, peticionando se reconheça que a garantia bancária em causa se mostra válida e exigível e se condenem Autora e Co-ré a ressarci-los dos danos morais e lucros cessantes que se vierem a liquidar em execução de sentença.

A reconvenção, actualmente regulamentada pelos artigos 266º e 583º, ambos do Código de Processo Civil (e anteriormente prevista nos artigo 274º e 501º), consubstancia a formulação de um pedido do Réu contra o Autor, conduzindo ao enxertamento de uma contra-acção na lide, que se cruza com a acção proposta pelo Autor.

De acordo com o ali previsto, para que se possa admitir a reconvenção, esta tem de cumprir os requisitos processuais e substantivos aí enunciados.

Assim, para que se possa admitir a reconvenção é necessária a competência absoluta do tribunal, a identidade subjectiva das partes, a indicação do valor da causa e a correspondência da forma do processo. Quanto a este último requisito processual de admissão, haverá que ter em mente, o disposto pelo n.º 3 do referido artigo 266º, que determina não ser exigível este último requisito, quando a diferença provenha apenas do valor diverso dos pedidos ou quando o juiz a autorize, ao abrigo do disposto no artigo 37º, n.º2 e 3, do Código de Processo Civil.

A fim de ser admitida, a reconvenção tem ainda de obedecer a requisitos substantivos. De facto, exige-se que o pedido reconvencional apresente autonomia em relação a uma mera defesa, ao mesmo tempo que se não prescinde de uma conexão entre o pedido reconvencional e o pedido do autor. Não se compreenderia que o Réu pudesse enxertar na acção pendente uma outra que em nada estivesse conexa com ela. Assim, exige-se uma ligação entre pedido do autor e pedido reconvencional, quer seja através do facto jurídico que serve de fundamento à acção ou à defesa, quer seja através do pedido de compensação de dívidas ou de uma indemnização por benfeitorias ou despesas relativas à coisa cuja entrega é pedida, quer seja através de um pedido de reversão a favor do Réu do efeito jurídico pretendido pelo Autor.

Estes os requisitos necessários para que se possa aceitar a dedução de reconvenção.

Tendo em consideração tudo quanto supra se deixa exposto, uma primeira conclusão se retira.

O legislador não quis – e isso passou expressamente para a letra da lei – que se pudessem cruzar acções entre co-Réus.

Na verdade, a Reconvenção configura um cruzamento de acções, sendo que por força da sua admissão deixa de existir uma só acção e passam a existir duas acções cruzadas no mesmo processo. Esse cruzamento de acções só pode ser admitido em certos termos, sob pena de se poder facilmente subverter toda a disciplina do processo. Há pressupostos de admissibilidade da reconvenção de carácter processual, de carácter substancial e, também – face ao teor expresso do preceituado pelo artigo 266º, n.º1, do Código de Processo Civil – de ordem de identidade subjectiva das partes, embora em posições invertidas. – Antunes Varela, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, págs. 324/326.

Do que supra se deixa exposto se extrai que, embora se admita a intervenção de outras pessoas que, de acordo com os critérios gerais aplicáveis à pluralidade de partes, possam associar-se aos litigantes ou intervir ao lado deles, a verdade é que a reconvenção deve ser sempre dirigida à parte que ocupa, na lide, posição contrária àquela que o reconvinte ocupa.

Assim sendo, por legalmente inadmissível, não se admite a reconvenção deduzida contra a Co-Ré, Caixa, S.A.

* No que respeita ao pedido apresentado contra a Autora, temos que o mesmo assenta na alegação de que o cumprimento da garantia bancária é devido, não podendo a mesma considerar-se como caduca. Os Réus parecem, assim, pretender sustentar a sua alegação, no disposto pelo artigo 266º, n.º1, alínea a), do Código de Processo Civil, já que o seu pedido emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção.

Apreciando e decidindo.

Por contrariar a regra da imutabilidade da instância, os requisitos substantivos de que a reconvenção depende assumem carácter excepcional, devendo ponderar-se a alegação à luz do que neles expressamente se consagra. Tendo em mente o que vem de dizer-se e ponderada a alegação apresentada pelos Réus, no seu pedido reconvencional, concluímos que o pedido por si apresentado possui a conexão necessária para ser admitido, tendo em consideração o expressamente previsto pelo artigo 266º, n.º1, alínea a), do Código de Processo Civil.

Acresce que a reconvenção foi identificada, deduzida separadamente na contestação e foi indicado o respectivo valor. Assim sendo, em face do expressamente previsto pelo artigo 266º, n.º1, alínea a), do Código de Processo Civil), admito a presente reconvenção, no que respeita à Autora, relativamente ao primeiro pedido (reconhecimento de accionamento da garantia bancária) e ao segundo pedido...

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