Acórdão nº 24992/17.1T8LSB.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelLEOPOLDO SOARES
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: AAA intentou [1]Procedimento Cautelar Comum não Especificado contra “TAP – Transportes Aéreos , S.A.” Pede que o tribunal decrete, sem a audição da requerida, a suspensão do Protocolo celebrado entre ambos em 30 de Maio de 2012.

Alegou (para além da sua legitimidade para a propositura do procedimento em apreço ) , em síntese, que:[2] - o Protocolo celebrado , em 30 de Maio de 2012, entre requerente e requerida, viola o disposto no art. 51.º, do Código do Trabalho; - o Protocolo viola o direito a amamentação, de duas horas diárias; - também viola o disposto no art. 60.º, do Código do Trabalho; - o Protocolo é inválido, por violar normas de natureza imperativa; - em 29 de Setembro de 2017, foi comunicada à requerida a intenção de denúncia do Protocolo, com produção de efeitos a 1 de Novembro de 2017, sendo-lhe, pois, concedido um prazo razoável para que pudesse adaptar o seu planeamento à nova realidade; - a requerida, contudo, rejeitou a denúncia, mantendo a vigência de um Protocolo ilegal; - em virtude da posição de inflexibilidade da requerida, centenas de tripulantes encontram-se privados de exercer de forma cabal os seus direitos, sendo que várias trabalhadoras viram as suas licenças de gozo parental complementar recusadas por, alegadamente, não respeitarem um período mínimo de 30 dias; - o Protocolo que foi validamente denunciado, viola disposições de natureza imperativa e não é susceptível de produzir quaisquer efeitos, atenta a falta de depósito e publicação no BTE; - a manutenção da vigência do Protocolo configura uma quotidiana violação dos direitos dos trabalhadores e causa graves constrangimentos na vida pessoal dos mesmos, visto não conseguirem compatibilizar a sua vida profissional com a sua vida familiar; - os trabalhadores vêem-se induzidos a não assumirem os efeitos da denúncia do Protocolo com receio de instauração de procedimentos disciplinares com vista ao despedimento com justa causa; - caso os efeitos do Protocolo não venham a ser suspensos em data anterior a 1 de Dezembro de 2017, os tripulantes serão impedidos de usufruir das licenças parentais nos termos por si definidos, tendo de gozar as mesmas da forma que lhe é imposta pela requerida, sendo que todos quantos entendam que a denúncia do Protocolo produziu efeitos se encontram numa situação de pré-despedimento.

Refira-se que arrolou seis testemunhas.

[3] Em 21 de Novembro de 2017 , foi proferida decisão que ( na parte para aqui relevante ) teve o seguinte teor:[4][5] “ II.

Cumpre apreciar liminarmente, nos termos do art. 226.º, n.º 4, al.

  1. do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art. 1.º, n.º 2, al.

a), e 32.º, do Código de Processo do Trabalho.

  1. –Estatui o art. 362.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável à generalidade dos procedimentos cautelares, quer comuns quer especificados, ex vi do art. 376.º, do mesmo diploma legal, «[s]empre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado».

    As situações mais comuns que presidem à propositura de um determinado procedimento cautelar destinam-se a tutelar ou a acautelar uma possível lesão de direitos subjectivos1 inscritos na esfera jurídica do requerente no momento em que deduz a sua pretensão.

    A providência cautelar surge como antecipação e preparação duma providência ulterior; prepara o terreno e abre o caminho para uma providência final.

    A providência cautelar, nota Calamandrei, não é um fim, mas um meio; não se propõe dar realização directa e imediata ao direito substancial, mas tomar medidas que assegurem a eficácia duma providência subsequente, esta destinada à actuação do direito material2.

    A tutela antecipatória ou conservatória de um determinado direito está, desde logo, condicionada pela alegação – e subsequente prova –, ainda que sumárias, a realizar pelo requerente, da probabilidade séria de existência do direito (fumus bonis iuris) e do fundado receio de lesão grave do mesmo a que se associa, por necessário, a sua difícil reparação (periculum in mora).

    Relativamente ao primeiro dos apontados requisitos, a lei apenas exige a aparência da existência do direito invocado, ou seja, a probabilidade da sua existência.

    Basta, portanto, a formulação de um juízo de verosimilhança sobre os factos em que se funda3.

    E isto porque o conhecimento exaustivo do direito invocado tornaria o processo tão moroso como a acção principal, assim se frustrando o objectivo pretendido pelo requerente.

    Assim, apenas é exigido o que a doutrina designa por summaria cognitio, que se traduz na forma abreviada de produção e julgamento da prova relativa à existência do direito4.

    Já quanto ao segundo requisito, a lei determina que o receio seja fundado, isto é, apoiado em factos que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento, a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo5.

    O critério de avaliação deste requisito não pode assentar em simples conjecturas ou em juízos puramente subjectivos do juiz ou do credor, mas antes basear-se em factos concretos que, de acordo com as regras de experiência, aconselhem uma decisão cautelar imediata, como factor potenciador da eficácia da acção declarativa ou executiva.

    Doutro passo, só as lesões graves e dificilmente reparáveis têm a virtualidade de permitir ao tribunal a tomada de uma decisão que coloque o requerente a coberto da previsível lesão6, o que bem se compreende, uma vez que, o decretamento de uma determinada providência, com a consequente intromissão na esfera jurídica do requerido, muitas vezes sem que lhe tenha sido dada oportunidade de se pronunciar, só se compatibiliza com uma lesão grave e de difícil reparação.

    O receio daquele que solicita o decretamento da providência terá que ser fundado, isto é, alicerçado em factos que permitam afirmar, rigorosa e objectivamente, a seriedade e actualidade da ameaça e a consequente necessidade de adopção de medidas tendentes a evitar o prejuízo7.

    Como considerava o Prof. Alberto dos Reis8, a aferição do justo receio deve fazer-se a partir de um «juízo de certeza, de verdade, de realidade», daí que não constitua razão bastante para o decretamento de uma providência cautelar a prova de factos que consubstanciem uma mera perturbação da existência ou do exercício do direito em apreço. A temida violação do direito deverá ser de modo a pôr em causa a existência do direito ou o seu exercício, exigindo-se ainda que a lesão seja de difícil reparação.

  2. –In casu,vejamos se a causa de pedir e o pedido formulado pelo requerente é idóneo ao decretamento da providência que requer.

    Em primeiro lugar, não pode o tribunal deixar desde já expresso que, não obstante o pedido final requerido – o de suspensão dos efeitos do Protocolo celebrado entre o requerente e a requerida – o que, em bom rigor, resulta da sua causa de pedir é que seja emitido um juízo, praticamente final, quanto ao objecto do litígio, situação que, como se sabe, é incompatível com a natureza de um procedimento cautelar. Na verdade, não só o requerente pede ao tribunal que, em rectas contas, declare a nulidade do Protocolo celebrado entre si e a requerida aos 30 de Maio de 2012, como inste a requerida a, pura e simplesmente, deixar de o aplicar, sujeitando à apreciação do tribunal, praticamente de uma forma definitiva e não meramente cautelar, questões como a invalidade desse protocolo, por, no seu ver, violar normas de carácter imperativo, a validade da denúncia que operou em relação ao mesmo e a ausência da sua eficácia, decorrente de não ter sido publicado no BTE.

    Vale o exposto por dizer que o que o requerente pretende é uma decisão praticamente definitiva quanto à validade e efeitos jurídicos do Protocolo, sendo que a natureza cautelar de uma providência se não destina a dar realização directa e imediata ao direito substancial, mas antes a emitir um juízo, fundado na aparência da existência de um direito, meramente provisório.

    De todo o modo, o tribunal não deixará, naturalmente, de se deter nos requisitos que presidem ao decretamento do procedimento cautelar, analisando as questões que, no ver do requerente, impõe que o tribunal decrete a suspensão do acima identificado Protocolo.

    A primeira questão a analisar prende-se, evidentemente, com a probabilidade séria de existência do direito (fumus bonis iuris), sendo que, para o efeito, tece o requerente uma série de argumentos que, no seu ver, se destinam à sua demonstração.

    Numa primeira linha de argumentação, sustenta o requerente que o Protocolo que celebrou com a requerida é inválido por conter disposições que contrariam normas de natureza imperativa.

    Sustenta o requerente, em primeiro lugar, que a cláusula 1.ª do Protocolo, mormente as suas alíneas b) e c), violam o disposto no art. 51.º, do Código do Trabalho, na justa medida em que neste último preceito se não consagra qualquer período mínimo de gozo da licença parental nem qualquer período de gozo obrigatório em determinados meses.

    Ora, é verdade que o art. 51.º, do Código do Trabalho, com a epígrafe “licença parental complementar”, não estabelece qualquer período mínimo ou máximo de gozo da licença parental complementar, estabelecendo que a mesma poderá ter a duração de três meses e que pode ser gozada de forma consecutiva ou interpolada.

    Todavia, não crê o tribunal que o citado preceito vede a possibilidade de as partes, ao abrigo da liberdade contratual, estabelecerem períodos mínimos de duração da licença parental complementar, mormente quando o trabalhador ou trabalhadora pretendam o seu gozo interpolado.

    O que por via do citado preceito se pretende é que o direito ao gozo da licença parental complementar, em qualquer uma das suas modalidades, seja um direito efectivo, estando o...

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