Acórdão nº 582/16.5T8AGH.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Maio de 2018
Magistrado Responsável | PEDRO MARTINS |
Data da Resolução | 03 de Maio de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados: F, T e C, intentaram a presente acção contra o Centro, pedindo que seja anulada a deliberação tomada na reunião da assembleia geral extraordinária do Centro, realizada no dia 08/01/2016, de destituição dos autores de membros da direcção, respectivamente, dos cargos de vice-presidente, tesoureiro e vogal.
Para tanto, em síntese, alegaram factos que constituem a ocorrência de várias irregularidades, determinantes da anulabilidade da deliberação.
O Centro contestou, quer impugnando os factos alegados pelos autores, quer os efeitos que deles os autores pretendem retirar, quer excepcionando outros que tornariam irrelevantes os vícios invocados, pugnando pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.
Depois de realizado o julgamento, a acção foi julgada procedente por provada e, consequentemente, foi anulada a deliberação em causa.
O Centro recorre desta sentença, arguindo uma nulidade processual, impugnando vários pontos da decisão da matéria de facto e recorrendo da decisão da matéria de direito.
Os autores não contra-alegaram.
* Questões que importa decidir: da nulidade processual; se a deliberação não devia ter sido anulada e se há factos relevantes para a decisão desta questão que devam ser dados como provados e, outros, eliminados.
* Da nulidade processual Diz o Centro: Não teve “conhecimento do ofício e auto da PSP datado de 05/05/2017 (expediente da PSP de fls. 150 a 154v = 140 a 144) onde consta uma participação e dois aditamentos.” “Só o teve aquando da feitura das alegações e o recebimento das transcrições a 20/08/2017. Até aí, não teve qualquer intervenção no processo ou foi notificado para qualquer termo dele e, por isso, encontra-se em tempo para arguir a referida nulidade. Convém esclarecer que estes documentos foram solicitados pela Srª juíza na 2.ª sessão e última do julgamento.” E os documentos não são inócuos, porque o tribunal se serve “dos mesmos para fundamentar a motivação da sentença, nomeadamente, os depoimentos das testemunhas da ré - A e N - desconsiderando os mesmos o que é rotundamente errado.” Tinha o direito de exercer o contraditório e não o pôde exercer.
“A omissão da notificação é uma irregularidade que influiu bastante na apreciação da prova e na motivação referente à avaliação da credibilidade da testemunha e, por isso, deve ser anulado tudo o relacionado que dependa da credibilidade da testemunha, nomeadamente os factos que a testemunha interveio, nos termos do art. 195/1 e 2 do CPC.” No despacho em que se pronunciou sobre a admissão do recurso, a Srª juíza esclareceu: Tendo sido arguida a nulidade por alegadamente o Centro não ter sido notificado do teor da documentação constante de fls. 140 a 144, cumpre referir que tal não corresponde à realidade, uma vez que, pese embora tal notificação não conste expressamente da acta da sessão da audiência de julgamento que teve lugar no dia 09/05/2017, constante de fls. 145 a 149 (omissão, por mero lapso, pela qual nos penitenciamos), resulta claramente das alegações finais do mandatário dos autores que foi dado conhecimento aos mandatários das partes, durante essa sessão da audiência de julgamento, do teor da referida documentação.
Com efeito, o referido mandatário dos autores refere nas suas alegações o seguinte (concretamente no minuto 39:02 a 40:30): “E eu lembrou-me inclusivamente um pormenor que há pouco li e que achei absolutamente espantoso. É que, no expediente da PSP, no expediente que chegou a este Tribunal há pouco tempo existe um aditamento elaborado pelo Sr. comandante da esquadra da polícia e esse senhor diz assim, diz que a D. E, Sr. presidente deste Centro, o procurou, discutiu com ele a conduta dos Srs. agentes da PSP na ida ao local e depois de várias tentativas de esclarecimento diz o Sr. comandante da esquadra da PSP, a senhora em causa tomou a liberdade de insinuar que eu estou equivocado quanto às competências desta Polícia, bem como ao comportamento dos agentes no local, pondo mesmo em causa a honestidade e profissionalismo destes, alegando que os mesmos vasculharam e retiraram documentos sem consentimento de ninguém.”, sendo que esta última parte corresponde ipsis verbis ao teor da parte final do 8º parágrafo do aditamento constante de fls. 142.
De onde resulta claramente que foi realizada a notificação do teor dessa documentação às partes na referida sessão da audiência de julgamento, não existindo, por isso, a omissão de qualquer formalidade essencial que influa na decisão da causa, geradora de nulidade.
Decidindo Desde logo, não é verdade que “estes documentos tenham sido solicitados pela Srª juíza na 2.ª sessão e última do julgamento”. A última sessão de julgamento ocorreu a 09/05/2017 e os elementos em causa foram pedidos na sessão de 02/05/2017.
De qualquer modo, sendo uma invocação de uma nulidade processual, o Centro tinha, em princípio, o prazo geral de 10 dias para a arguir a partir do momento em que dela teve conhecimento (art. 149 do CPC). Dizendo o Centro que teve conhecimento dela a 28/08/2017, o prazo de 10 dias começaria a correr a contar de 28/08/2017, pelo que terminaria a 07/09/2017. Ora, o Centro só a arguiu no recurso, interposto a 16/09/2017, quando já ultrapassado o prazo.
E isto na melhor das hipóteses para o Centro.
É que, por um lado, não interessa o momento em que o advogado do Centro começa a fazer as alegações ou recebe as transcrições… Mas sim, quando muito, quando recebeu a sentença da qual resultava a omissão invocada (art. 199/1 do CPC), da qual omissão, como é evidente, podia ter conhecimento com a leitura da sentença, agindo com a devida diligência. Ora, a sentença foi notificada por carta de 20/06/2017, quase três meses antes da arguição.
E, por outro, nem esta última data importava, porque, como resulta dos elementos referidos pela Srª juíza, o advogado do Centro não podia ter deixado de ouvir as referências que o advogado dos autores fez, nas alegações, ao expediente da PSP, pelo que, nesse momento, para o caso extraordinário de, a si, ao contrário do que aconteceu com o advogado dos autores, não ter sido dado conhecimento de tal expediente, tinha então conhecimento dessa omissão e devia tê-la logo arguido (art. 199/1, início, do CPC).
Assim, a arguição da nulidade processual é extemporânea e não há que lhe dar seguimento.
* Foram os seguintes os factos dados como provados e que interessam à decisão destas questões: 1. Tendo por objecto a recolha e apoio a idosos, o Centro é uma instituição particular de solidariedade social, sem fins lucrativos, sob a forma de associação de solidariedade social, criada por tempo indeterminado e mediante escritura pública lavrada em 04/07/1998.
2. Na sequência da publicação do DL 172-A/2014, de 14/11, o Centro procedeu a uma alteração aos seus estatutos, passando os mesmos a ter a redacção constante de fls. 63 verso a 71v dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida.
Entre eles, importam os seguintes: Art. 8: um dos direitos dos associados é participar nas reuniões da assembleia geral.
Art. 29: “1. A Assembleia Geral deve ser convocada com, pelo menos, 15 dias de antecedência, pelo Presidente da Mesa ou seu substituto, nos termos do artigo anterior; 2. A convocatória é afixada na sede da associação e remetida, pessoalmente, a cada associado através de correio electrónico ou por meio de aviso postal.
3. Independentemente das convocatórias, é dada publicidade à realização das assembleias gerais nas edições da associação, no sítio institucional da instituição e em aviso afixado em locais de acesso ao público nas instalações e estabelecimentos da associação, bem como através de anúncio nas assembleias dominicais.
4. Da convocatória deve constar o dia, a hora, o local e a ordem de trabalhos da reunião.
5. Desde que contemplada nos estatutos, a convocatória da assembleia geral pode ser efectuada através de correio electrónico.
6. Os documentos referentes aos diversos pontos da ordem de trabalhos devem estar disponíveis para consulta na sede e no sítio institucional da associação, logo que a convocatória seja expedida, por meio de aviso postal para os associados.” Art. 32: 1 - “Sem prejuízo do disposto no número anterior, são anuláveis as deliberações tomadas sobre matéria estranha à ordem do dia, salvo se estiverem presentes ou representados na reunião todos os associados no pleno gozo dos seus direitos sociais e todos concordarem com o aditamento.” 3. Os autores são associados do Centro, com as quotas anuais em dia.
4. Em Dezembro de 2014, os autores foram eleitos, respectivamente, como vice-presidente, tesoureiro (suplente) e vogal da direcção do Centro.
5. No dia 05/01/2016, foi enviado um e-mail, proveniente do endereço centro@gmail.com, para várias pessoas, designadamente, para os autores, com o assunto “convocatória”, com o seguinte teor: “Bom dia, Solicito a vossa atenção para o documento em anexo. Cumprimentos.” 6. Da convocatória que, como ficheiro anexo, acompanhava esse e-mail, sob a denominação de “convocatória.pdf (126KB)”, subscrita pelo presidente da AG, R, e datada de 23/12/2015, constava a convocação, a requerimento de 10% de associados, para uma AGE, a realizar em 08/01/2016, tendo como ordem de trabalhos o seguinte ponto único: “Apreciação e decisão do comportamento de alguns membros da direcção na gestão do Centro”.
7. Após receberem o referido e-mail, os autores comunicaram ao Centro por escrito que pretendiam consultar, na antevéspera do dia da reunião, ou seja, no dia 06/01/2016, os documentos referentes à ordem de trabalhos.
8. Porém, no dia 06/01/2016, a consulta dos documentos não foi facultada por A, empregada do Centro, a qual referiu não possuir nem ter conhecimento de qualquer tipo de documentação solicitada e que não estava autorizada a dar qualquer palavra passe sem o consentimento prévio da presidente da direcção, apresentando cópia do documento constante...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO