Acórdão nº 2427/15.4T8LSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelFARINHA ALVES
Data da Resolução03 de Maio de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa Mário e Maria, residentes na Rua (…), 8.º D.to, em Lisboa, intentaram contra N. Natividade, residente no 9.º D.to do mesmo prédio, a presente ação declarativa de condenação pedindo que a mesma fosse condenada a cessar imediatamente o ruído incomodativo produzido por si e pelo seu animal de companhia e a indemnizar os AA. no montante de € 15.000,00.

Alegaram, em síntese, que a Ré, entre as 07h e 08h da manhã, produz ruídos incomodativos e perturbadores propositadamente com o objetivo de perturbar a saúde física e mental dos AA, o que tem conseguido, causando danos manifestos na sua saúde e descanso, danos estes que merecem ser compensados patrimonialmente.

Situação que se mantém desde Novembro de 2012.

A Ré contestou, alegando que o barulho que faz entre as 07 e as 8 da manhã cinge-se ao normal e estritamente ao necessário a levantar-se, tomar banho, vestir-se e sair de casa por forma a ir trabalhar, não fazendo qualquer barulho de forma propositada ou com intenção de prejudicar os seus vizinhos.

E que também o seu cão, de raça pequena e já adulto, não faz barulhos desadequados.

Tendo concluído pela improcedência da ação.

E, alegando que a atuação dos AA. lhe tem causado danos, pediu, em reconvenção, que os mesmos fossem condenados a pagar-lhe a quantia de € 15.000,00, na proporção de 50% cada um.

Os Autores contestaram a reconvenção, defendendo a sua inadmissibilidade e, subsidiariamente, a sua improcedência.

Em audiência prévia, foi julgada improcedente a exceção de inadmissibilidade da reconvenção; foi fixado o valor da causa; foi identificado o objeto do litígio e foram enunciados os temas da prova; foram indicados os meios de prova e foi designada data para julgamento.

A final foi proferida sentença, com a seguinte decisão: «Pelo exposto, julgando a acção improcedente por não provada e a reconvenção parcialmente procedente por provada, decide-se: - Absolver a Ré N. Natividade do pedido contra si formulado pelos AA.

- Absolver a A. Maria do pedido reconvencional contra si formulado pela A.

- Condenar o A. Mário no pagamento à Ré N. Natividade da quantia de 6.250,00 € a título de danos não patrimoniais.

Custas por AA. e R. na proporção do decaimento.

» Inconformado, o autor Mário apelou do assim decidido, tendo apresentado alegações, rematadas por conclusões, onde impugna a decisão sobre matéria de facto e, consequentemente, a decisão de direito, defendendo a procedência da ação e a improcedência da reconvenção.

A apelada contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso.

Sendo o objeto dos recursos delimitado, em regra, pelas respetivas conclusões, e não se suscitando a apreciação de qualquer questão que seja do conhecimento oficioso do tribunal, no presente recurso está em causa a alteração da decisão sobre matéria de facto, e a subsequente valoração da matéria de facto alterada.

Apreciando: I – A impugnação da decisão sobre matéria de facto O Apelante identifica como incorretamente julgados os factos julgados provados nos pontos n.ºs 13, 18, 19, 21, 22, 24, 27, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 37, 38, 39, 40, 43, 44, 45 e 46 do elenco da matéria de facto provada. E os julgados não provados nas alíneas a), b), c), d), f), g), h), i), j), m), n), o) e q), do elenco da matéria de facto não provada.

Ao primeiro grupo de factos impugnados deverá ser aditado o ponto 28, efetivamente impugnado, como se pode ver a fls. 17 das alegações.

Diversamente, não foi identificada impugnação em relação aos seguintes pontos de facto: 18. A Ré tem tijoleira no corredor e na sala, um dos quartos tem chão de cortiça e a outra alcatifa.

  1. A tijoleira está na sua casa há mais de quinze anos.

  2. O prédio onde vivem tem quarenta anos e não tem boa insonorização.

  3. O cão habita com a A. já há cerca de seis anos.

  4. Os AA. apesar da amizade que os ligava à Ré nunca falaram pessoalmente com ela.

  5. Por chamarem a polícia municipal causaram à Ré atrasos na saída para o trabalho.

    Assim, a impugnação da decisão sobre matéria de facto incide sobre os seguintes factos, julgados provados: 13. No dia 05/08/2014, por mão do Sr. Agente Principal Rui P., foi a R. notificada para fazer cessar o ruído produzido.

  6. O que os AA. ouvem são os passos da Ré, o chuveiro, o levantar dos estores, e outros barulhos comuns ao acordar e à rotina diária.

  7. Sai para a rua para passear o seu cão e depois vai para o ginásio onde pratica desporto.

  8. O cão não ladra quando a dona sai, mas apenas quando pressente a presença de estranhos no patamar.

  9. Os AA. passaram a esperar a Ré à porta do prédio e olhar-lhe para os sapatos.

  10. A denúncia a Ré ao IASFA – entidade senhoria dos AA. e Ré podia terminar numa acção de despejo à Ré caso o IASFA se bastasse com a denúncia dos AA.

  11. Quando a Ré sai de casa, o A. marido que se encontra à espera, segue-a batendo palmas.

  12. O A. ronda a porta da Ré.

  13. O A. já esperou a Ré no seu carro, e quando esta sai do prédio, arranca a alta velocidade, passando junto à Ré.

  14. A ré sente-se controlada e vigiada pelo A. marido e receia pela sua segurança.

  15. A Ré cada vez mais chega tarde a casa porque não se sente bem.

  16. A Ré pediu ao seu filho mais novo para voltar a viver consigo por uns tempos pois receava ser abordada por agentes da PSP e PM, estando sozinha em casa.

  17. O A. pressionava a Policia Municipal para que esta agisse mesmo quando lhe era dito que não havia motivos para tal ou quando os agentes constatavam que o barulho não se verificava.

  18. O A. marido divulga pelos vizinhos que a Ré é barulhenta e ruidosa.

  19. O A. faz declarações públicas dizendo que a Ré tem “transtorno da personalidade anti-social”, que é uma “prevaricadora” e que é “ruidosa e malformada” que é uma pessoa que produz barulho excessivo.

  20. A Ré tem vergonha dos seus vizinhos e sente-se humilhada e ofendida pelo A.

  21. Tendo tido igualmente necessidade de recorrer a um médico e de tomar medicação para controlo da ansiedade e tensão.

    E sobre os seguintes factos, julgados não provados:

    1. Desde há cerca de dois anos, que a R. se tem comportado de forma a prejudicar as boas relações de vizinhança, produzindo ruídos desnecessários e incomodativos.

    2. Quase diariamente, de há dois anos a esta parte, a R. por volta das 07.00 horas, calça uns sapatos que sabe serem ruidosos, e que ecoam no chão de tijoleira, que entretanto colocou no apartamento, enquanto faz rotina matinal, até cerca das 08.00 horas.

    3. A R. arrasta e bate com as portas dos roupeiros, fecha as gavetas com força, abre os estores com violência, arrasta objetos no chão ou deixa-os cair, tudo durante esse mesmo período e até sair de casa.

    4. Aos fins-de-semana a R. a partir das 07.00 começa a fazer limpezas, com ou sem uso do aspirador, perturbando o repouso e a tranquilidade dos vizinhos.

    5. O cão da R., normalmente por volta das 06.00 da manhã, começa em correrias incessantes.

    6. As unhas do animal raspam no chão de tijoleira, durante todo o período em que está em casa, e até ir à rua, e após o seu regresso.

    7. Logo que a R. sai de casa, o animal começa a ladrar freneticamente, e a latir ruidosamente, sendo que na maior parte das vezes, o fez por cerca de mais uma hora, depois de a dona sair, o que acontece por volta das 08.00 horas.

    8. Os AA. são abruptamente acordados às 07.00 horas – e por vezes incomodados logo após as 06.00 horas – e pelo menos até às 09.00 horas, são perturbados com barulho excessivo proveniente da fração da R.

    9. Os AA. não incomodam ninguém, e têm o máximo respeito pelos seus vizinhos, observando os períodos de descanso de cada um deles.

    10. Os AA. tentaram diversas vezes chegar à fala com a R., por via telefónica e pessoalmente, sendo que esta sempre se esquivou a conversar sobre o assunto.

    11. No dia 05/08/2014 o Sr. Agente Principal Rui P. presenciou barulhos efetuados pela Ré que eram excessivos.

    12. A R. agrava o seu comportamento de cada vez que é interpelada.

    13. Em consequência de tais factos, os AA. sofreram diversos desequilíbrios emocionais, angústia e dor, quer porque sofriam diretamente com o ruído produzido.

    14. E descalça sistematicamente os sapatos ruidosos que usa na sua residência desde cerca das 07.00 até quando se ausenta, cerca das 08.00, saindo com sapatos de sola silenciosa.

    Em relação ao ponto de facto n.º 13, apenas está em causa a correção, para o dia 01-07-2014, da data em que a Ré foi notificada nos termos que ali constam.

    Confirmando-se, em face do documento invocado pelo Recorrente, que é essa a data correta, devendo-se a lapso a indicação divergente que consta nesse ponto de facto.

    Havendo, pois, que corrigir esse lapso.

    No mais, o Recorrente, valorando de forma diferente a prova produzida, em especial a testemunhal, defende a alteração do sentido das respostas dadas aos factos impugnados. Pretendendo ver julgados provados os factos que foram alegados para fundar a ação, e não provados os factos em que assentou a procedência da reconvenção.

    O primeiro grupo de factos impugnados respeita aos ruídos produzidos na casa da Ré, pela própria e pelo seu cão, matéria em relação à qual a decisão recorrida julgou provado que: 21. O que os AA. ouvem são os passos da Ré, o chuveiro, o levantar dos estores, e outros barulhos comuns ao acordar e à rotina diária.

  22. Sai (aos fins-de-semana) para a rua para passear o seu cão e depois vai para o ginásio onde pratica desporto.

  23. O cão não ladra quando a dona sai, mas apenas quando pressente a presença de estranhos no patamar.

    E julgou não provado que:

    1. Desde há cerca de dois anos, que a R. se tem comportado de forma a prejudicar as boas relações de vizinhança, produzindo ruídos desnecessários e incomodativos.

    2. Quase diariamente, de há dois anos a esta parte, a R. por volta das 07.00 horas, calça uns sapatos que sabe serem ruidosos, e que ecoam no chão de tijoleira, que entretanto colocou no apartamento, enquanto faz rotina matinal, até cerca das 08.00 horas.

    3. A R. arrasta e bate com as portas dos roupeiros, fecha as gavetas com força, abre os estores com...

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