Acórdão nº 84/07.0TVLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelARLINDO CRUA
Data da Resolução03 de Maio de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]: I - RELATÓRIO 1 – I e mulher N, residentes na Rua …., intentaram a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum ordinário (acção de impugnação pauliana), contra: - F e mulher N (1ºs. Réus), residentes na Rua ……… ; - A e mulher Z (2ºs. Réus), residentes na Rua ……………., deduzindo o seguinte petitório:

  1. Que se declare a ineficácia das cessões de quotas identificadas nos artigos 1º a 9º (cf., documentos 1 e 3), reconhecendo-se a possibilidade dos Autores impugnantes executarem no património dos 2ºs. Réus as identificadas quotas ; b) Que se declare o direito dos Autores a praticarem sobre as aludidas quotas todas as medidas conservatórias de garantia patrimonial do seu crédito.

    Para tanto, alegaram, em resumo, o seguinte: § No dia 26/10/2006, os 1ºs Réus cederam aos 2ºs Réus a totalidade do capital social da sociedade G, Lda., bem como duas quotas de que eram titulares na sociedade E, Lda. ; § Tendo tais cessões sido efectuadas por preços iguais aos valores nominais das quotas ; § E, através de tais cessões, os 2ºs Réus passaram a ser titulares, directa ou indirectamente, da totalidade do capital social daquelas sociedades ; § Sendo a E, Lda., a proprietária do edifício onde está instalado o Hotel M ; § E a G, Lda., a sociedade que gere e explora tal Hotel ; § Os Autores e 1ºs. Réus, por escrito datado de 01/01/2016, outorgaram contrato promessa de Cessão de Quotas e Acordos Complementares, tendo por base as quotas supra enunciadas ; § Acordando na entrega, pelos Autores aos 1ºs Réus, do sinal no montante de 2.600.000,00 € ; § Tendo logo, no acto da assinatura do contrato, pago aos 1ºs Réus a quantia de 1.582.906,80 € ; § Sendo que, desde logo, por deliberação da assembleia-geral de 11/01/2006, foi o Autor marido designado gerente da G, Lda., em substituição na gerência do 1º Réu marido F ; § Em 11/10/2006, às ocultas dos Autores, os 1ºs Réus lavraram acta da assembleia-geral da G, Lda., na qual deliberaram destituir o Autor marido da gerência, designando um gerente “de palha” ; § E, paralelamente, desapossaram os Autores do Hotel, impedindo-os de entrarem nas instalações do mesmo ; § Incumprindo, de forma frontal e definitiva, o contrato celebrado em 11/01/2006 ; § O que fizeram em virtude de terem negociado com os 2ºs Réus os mesmos bens (quotas) ; § Em virtude de tal incumprimento dos 1ºs Réus, têm os Autores o direito de exigir-lhes, em dobro, as quantias entregues a título de sinal e princípio de pagamento ; § Os actos impugnados foram outorgados dolosamente com o fim de impedir a satisfação do crédito dos Autores ; § Pois os 1ºs Réus não possuem em Portugal património suficiente para responder por tal avultado crédito dos Autores ; § Os 1ºs e 2ºs Réus são sócios e amigos de longa data ; § Sendo que os 2ºs Réus sabiam do negócio que os 1ºs Réus tinham celebrado com os Autores ; § Tendo todos os Réus agido concertadamente e com plena consciência de que estavam a lesar os direitos dos Autores, quando outorgaram as cessões de quotas ora impugnadas ; § Ou seja, tiveram plena consciência de que com as cessões de quotas tornavam difícil ou impossível a satisfação do crédito dos Autores ; § Os Réus quiseram apenas simular as cessões de quotas e os cessionários, 2ºs Réus, são meros “testas de ferro” dos 1ºs Réus ; § Sendo que os 2ºs Réus não pagaram sequer o preço que declaram nas escrituras (500.973,09 €) ; § Pois o que celebraram foram negócios gratuitos, destinados exclusivamente a colocar no lugar dos 1ºs Réus os 2ºs Réus , quanto à titularidade do capital social das duas sociedades.

    2 – Devidamente citados, vieram os 2ºs. Réus apresentar contestação, alegando, em súmula, o seguinte: Ø Desconhecem os termos e condições em que os Autores vieram negociar e a assinar com os 1ºs Réus o referenciado contrato promessa de Cessão de Quotas ; Ø Remonta ao ano de 2004 o interesse do 2º Réu marido em adquirir uma participação social nas identificadas sociedades ; Ø Fruto de ter pago a totalidade do sinal perante os anteriores donos das quotas, na sequência de contrato-promessa entretanto celebrado, e cuja participação cedeu aos 1ºs Réus, bem como de empréstimo que lhes efectuou posteriormente, os 1ºs Réus ficaram com uma dívida perante o 2º Réu ; Ø A qual, em Março de 2005, ascendia ao montante de 2.470.000,00 € ; Ø Em Janeiro de 2006, o 2º Réu teve conhecimento que havia nova gerência no Hotel e que o mesmo iria ser vendido ; Ø Pelo que interpelou de imediato o 1º Réu, já que tinha uma quantia avultada para receber ; Ø Tendo então tomado conhecimento do contrato promessa outorgado com os ora Autores ; Ø Tendo então contactado com estes, e reunido posteriormente com os mesmos em 19/04/2006, onde expôs a sua situação, dando-lhes conhecimento do crédito que tinha sobre os 1ºs Réus ; Ø E pedindo-lhes que o informassem da data e local da outorga da escritura de cessão das quotas das sociedades, de forma a que, no acto do pagamento do remanescente do valor, pudesse ver de imediato o seu crédito satisfeito ; Ø No início de Outubro de 2006, o 1º Réu marido contactou o 2º Réu marido e deu-lhe conta do incumprimento contratual dos ora Autores ; Ø Mencionando que, por causa desse incumprimento, a venda já não se iria realizar, o que colocava o Hotel M em difícil situação financeira ; Ø Pelo que, receando a não satisfação do seu crédito, que se situava na quantia de 2.170.000,00 €, os 2ºs Réus propuseram aos 1ºs Réus a compra do Hotel, através da alienação total do capital social das firmas E e G, pelo preço global de 5.000.000,00 €, incluindo neste o preço de todas as despesas com as obras de ampliação do Hotel e sua remodelação ; Ø O que foi aceite pelos 1ºs Réus em 20/10/2006 ; Ø Que lhes apresentaram cópia de uma carta de destituição de gerente, datada de 11/10/2006, bem como cópia de uma carta enviada aos Autores, comunicando a cessação dos efeitos do contrato promessa, por incumprimento deste ; Ø O que convenceu os 2ºs Réus que o negócio tinha ficado sem efeito ; Ø E determinou a cessão das quotas ora impugnada ; Ø As quais foram efectivamente realizadas e declaradas pelo valor nominal das quotas e não pelo valor real do negócio, por exigência dos 1ºs Réus, que invocaram questões relacionadas com mais-valias, a que os 2ºs Réus acederam ; Ø Conforme demonstram, o negócio foi efectivamente realizado pelo preço de 5.000.000,00 €, tendo os 2ºs Réus sempre actuado em plena boa fé ; Ø E, poucos meses após a aquisição, os 2ºs Réus já injectaram no referido estabelecimento mais de 350.000,00 € ; Ø Situação que só se compadece com quem efectivamente adquiriu tais firmas com o objectivo de nelas exercer a sua actividade.

    Concluem pela total improcedência da acção, devendo os Réus ser absolvidos do petitório deduzido.

    3 – Citados, vieram os 1ºs Réus apresentar contestação, aduzindo, em súmula, o seguinte: · Em Dezembro de 2005 o Hotel necessitava de efectuar obras de elevado valor, não só fruto da degradação existente, como ainda para obter o devido licenciamento ; · Não tendo capacidade económica para realizá-las e tendo uma dívida para com os 2ºs Réus superior a 2.000.000,00 €, os 1ºs Réus decidiram ceder as quotas nas duas identificadas sociedades pelo preço de 6.000.000,00 € ; · Após terem sido procurados por vários interessados, os Autores contactaram-nos em Dezembro de 2005, afirmando-se igualmente interessados na aquisição do “Hotel M” ; · Após inteirarem-se da situação do Hotel, os Autores solicitaram uma redução do preço, fruto do elevado valor que calculavam necessário para a realização das obras ; · Propondo o valor de 5.500.000,00 €, o que foi aceite pelos 1ºs Réus ; · Acordando no pagamento do sinal de 2.600.000,00 €, sendo que o demais montante de 2.900.000,00 € seria pago no acto da realização da escritura definitiva ; · Pelo que, de imediato pagaram, a título de sinal, o montante de 1.582.906,80 €, retendo a demais parte – 1.017.093,20 € - para pagamento das dívidas ao Banif, BCP e Banco Popular ; · Foi então outorgado contrato promessa de cessão das quotas, acordando-se que a escritura seria celebrada no prazo de 90 dias a contar da data aposta no contrato (01/01/2006), e que, se a escritura não pudesse ser celebrada nesse prazo, poderia ainda ser realizada até ao máximo de 180 dias após o prazo inicial acordado, ou seja, até 01 de Outubro de 2006, sem penalização para os Autores, ou com ela, dependendo de a escritura ser celebrada até 01 de Julho de 2006, ou depois dessa data até ao prazo limite de 01/10/2006 ; · Nunca se tendo combinado ou sequer falado que a escritura poderia ser celebrada no prazo de 1 ano ; · Os Autores não procederam á regularização do passivo com que se tinham comprometido ; · Sendo que o empréstimo autorizado em assembleia-geral da G destinava-se à realização das obras necessárias, e nunca ao financiamento da operação de aquisição das quotas sociais ; · Os Autores nunca tiveram a intenção de pagar a restante parte do preço acordado, com dinheiro próprio, nem de efectuar obras, no valor de 4.500.000,00 € ou aproximado ; · Tendo incumprido o acordado com os Réus promitentes cedentes ; · Pelo que, chegados ao termo final para a realização da escritura definitiva atinente ao contrato promessa, cuja marcação incumbia aos Autores, estes não tinham liquidado as dívidas bancárias (que fazia parte do pagamento do sinal), o pagamento à E e não tinham procedido à marcação da escritura pública, de forma a pagarem a restante parte do preço, entrando assim em incumprimento ; · E, no exercício da gerência, o Autor marido gerou conflitos com várias entidades (fornecedores, bancos, empreiteira, agências), com os trabalhadores e mesmo com os clientes que se relacionavam com o Hotel ; · Levando a que este tivesse perdido clientela e sofrido perdas; · O que levou à destituição do Autor marido como gerente do Hotel ; · E, em 17/10/2006, os 1ºs Réus remeteram aos Autores carta a...

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