Acórdão nº 769/12.0GAMMV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | ALCINA DA COSTA RIBEIRO |
Data da Resolução | 08 de Outubro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em Conferência, na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra ***** I – RELATÓRIO 1 - Por sentença datada de 23 de Setembro de 2013, foi o arguido, A... , com sinais nos autos, condenado pela prática, em concurso material e concurso efectivo, de: - dois crimes de injúrias, previstos e punidos pelo artigo 181.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 70 dias de multa; à taxa diária de €7,00 para cada um.
- um crime de ameaça agravado, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, 155.º, n.º 1, alínea a), por referência ao artigo 131.º, todos do Código Penal, na pena de 110 dias de multa à taxa diária de €7,00.
Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado pela prática dos sobreditos crimes na pena única de 205 (duzentos e cinco) dias de multa à taxa diária de €7,00 (sete euros).
2 - Inconformado com esta condenação, dela recorreu o arguido, formulando as seguintes conclusões:
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Em 26 de Junho de 2013, o tribunal de primeira instância prolatou a sentença condenatória do arguido.
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Porém, a gravação da acareação levada a cabo entre o assistente e as testemunhas, B...e C..., não a registou com audibilidade.
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Por despacho de 12.07.2013, julgo nulo o acto de acareação por deficiência de documentação das declarações prestadas oralmente.
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Em 23 de Setembro de 2013, a primeira instância proferiu nova sentença na qual condenou o arguido, por dois crimes de injúria e um crime de ameaças agravado.
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O art. 328º do CPP estipula a regra da continuidade da audiência, admitindo algumas excepções de descontinuidade, mitigadas por determinado prazo, mais concretamente, o nº 6, que impõe que «o adiamento não pode exceder os 30 dias» e estabelece como consequência para a sua não observação, a perda de eficácia da prova já realizada.
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No caso dos autos, decorreram mais de 30 dias entre a segunda sessão de julgamento (26 de Junho de 2013) e a terceira sessão de julgamento em que se procedeu à repetição da acareação.
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Deve, pois, ser declarada a invalidade do julgamento e a nulidade insanável da sentença.
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Os pontos de factos nºs 1, 2º, 5º, 8º e 9º não podiam ter sido dado como provados como o foi em primeira instância.
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O Tribunal da primeira instância não valorou nem as declarações do arguido, A..., nem o depoimento da testemunha C..., tendo considerado este depoimento inconsistente, manifestamente parcial e interessado, na clara tentativa de desresponsabilizar o arguido.
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Porém, esta testemunha prestou um depoimento firme, convicto e credível.
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Não existe contradição entre os depoimentos de A... e C....
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O depoimento prestado pela C... perante D... mostrou-se, ao contrário, do que se lê, na sentença, inequívoco, seguro e firme.
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O motivo pelo qual o tribunal de primeira instância descredibilizou o depoimento de C... – o tentar desviar o objecto de acareação para outros assuntos (procurando deliberadamente criar dúvida sobre o carácter dos assistente e da testemunha B...) deveria, contrariamente, ter servido para credibilizar o depoimento daquela testemunha.
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O depoimento do assistente não merece qualquer credibilidade pela notória contradição e incoerência demonstrada no mesmo.
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Contrariamente ao considerado a sentença, a distância a que se encontrava a testemunha, B..., não lhe permitia ouvir com clareza o que as pessoas diziam.
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No que toca aos factos nºs 5º, 8º e 9º, não poderiam ter sido dado como provados, porquanto o comportamento processual do assistente leva a crer que o mesmo deu mais relevância aos insultos do que à suposta ameaça à sua integridade física, porque apresenta queixa dos factos no segundo dia seguinte à ocorrência dos primeiros, enquanto espera aproximadamente um mês para apresentar a queixa dos factos alegadamente ocorridos em 17 de Novembro de 2012.
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Tal revela que o assistente não poderia ter sentido medo, receio ou temor ou insegurança, porque o comportamento normal do ser humano intimidado seria denunciar a situação de imediato, o que não ocorreu no caso dos autos.
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Devem, pois, os factos tidos como provados nos nºs 2, 3, 5, 8 e 9 serem julgados não provados. 3 – O Ministério Público em primeira instância defendeu a manutenção da decisão recorrida, concluindo que: I. No caso dos autos não foi excedido o intervalo de trinta dias entre as várias sessões da audiência.
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Num primeiro momento, realizou-se a audiência e, finda a produção de prova, efetuadas as alegações orais e dada ao arguido a oportunidade para fazer as últimas declarações, foi designada data para a leitura da sentença, após o que foi declarada encerrada a audiência, como determina o n.º 2 do artigo 361.º do Código de Processo Penal.
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Sucede que, o arguido suscitou a inaudibilidade dos depoimentos prestados aquando da acareação realizada, e em deferimento desta pretensão, foi designada nova data para repetição daquele ato e proferida douta sentença, porquanto o Tribunal a quo não considerou que tivesse havido perda de eficácia da prova produzida, e andou bem, pois não houve adiamento da audiência.
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É nosso parecer que na hipótese dos autos, de necessidade de repetição de prova oralmente produzida devido a deficiente gravação que a torna imperceptível, não se aplica o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 11/2008, de 29.10.2008 (publicado no Diário da Republica, I, 11.12.2008), por se tratar de um caso de reabertura da audiência (para repetir os depoimentos deficientemente gravados), e aquele visar apenas as situações de adiamento.
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Tal como dispõe a segunda parte do n.º 6 do artigo 328.º do Código de Processo Penal, a audiência que foi adiada, retoma-se, a que foi encerrada reabre-se, em obediência ao disposto nos artigos 371.º e 371.º – A, ambos do Código de Processo Penal.
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Eleger um meio de prova como sendo mais credível do que outro é a manifestação pura da apreciação da prova, que no caso foi realizada atendendo às regras da lógica, da razoabilidade e princípios da experiência.
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O elenco dos factos dados como historicamente verificados merece a nossa adesão e bem assim a motivação da decisão recorrida, por ser clara, suficiente, objetiva e assente numa valoração racional e coerente da prova produzida.
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Do texto da decisão recorrida não se vislumbra qualquer incoerência factual ou lógica, antes evidenciando racionalidade, uma vez que as conclusões estão fundamentadas com recurso à utilização de meios de prova legais e às regras da experiência comum.
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Também o dever de fundamentação foi cumprido, em termos que...
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