Acórdão nº 244/11.0TBTBU.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução21 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I. Relatório No Tribunal Judicial de Tábua, A...

, S.A., com sede na Av. (....), Lisboa, instaurou contra B....

, casado, residente na Rua (....), Custóias, a presente acção declarativa de condenação, a seguir a forma ordinária do processo comum, pedindo a final a condenação do réu no pagamento da quantia de € 55.751,58 (cinquenta e cinco mil, setecentos e cinquenta e um euros e cinquenta e oito), acrescida dos juros à taxa legal, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Em fundamento alegou, em síntese útil, ter celebrado com C... contrato de seguro do ramo “casa”, titulado pela apólice n.º 588805001, nos termos do qual assumiu, para além do mais, o risco de incêndio, tendo por objecto a casa de habitação situada no Lugar (...), em Tábua, propriedade do tomador do seguro.

Mais alegou que a referida casa veio a sofrer extensos danos em consequência de incêndio que deflagrou no dia 6/1/2009, provocado com culpa pelo ora réu, pai do segurado, que ali se deslocara, tendo abandonado o local deixando acesas a lareira, salamandra e velas, indiferente ao facto do local se encontrar repleto de materiais inflamáveis, tudo conforme consta da sentença condenatória proferida no âmbito do processo 12/09.9 GATBU em 10/03/2011, já transitada em julgado.

Da peritagem e orçamentação -efectuadas pela empresa L...., S.A., no que alega ter despendido €1 649,50- resultou que a reparação dos danos provocados pelo incêndio, incluindo a substituição dos objectos e mobiliários destruídos, ascendia a €54.247,08 quantia que, em cumprimento do contrato celebrado, satisfez ao C... deduzida da franquia fixada, no montante de €145,00.

Sucede que, aquando do pagamento da referida indemnização, o lesado C... declarou exonerar a Autora “de toda e qualquer responsabilidade que diga respeito ao mesmo sinistro, sem excepção alguma, subrogando-a em todos os direitos, acções e recursos”. Por força da sub-rogação voluntária assim operada, adquiriu a demandante os direitos do sub-rogante nomeadamente o direito de acção contra o aqui réu, tendo direito a ser reembolsada dos montantes despendidos, no valor global de € 55.751,58 (cinquenta e cinco mil, setecentos e cinquenta e um euros e cinquenta e oito) que reclama.

* Citado o ré, invocou ter actuado com mera negligência (inconsciente), tal como foi considerado na sentença proferida no âmbito do processo-crime invocada pela autora. Uma vez que a esta só assiste o direito a ser reembolsada quando o terceiro lesante tiver actuado de forma dolosa, não lhe assiste, no caso, tal direito contra o contestante.

Com tais fundamentos, concluiu pela improcedência da acção e sua consequente absolvição.

Juntou aos autos documento comprovativo do pedido de apoio judiciário formulado.

* Prosseguiram os autos com selecção dos factos assentes e organização da base instrutória, peças que se fixaram sem reclamação das partes.

Teve lugar audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo como da respectiva acta consta, vindo a final a ser proferida sentença que, na parcial procedência da acção, condenou o réu a pagar à autora a quantia de a quantia de €54.102,08 (cinquenta e quatro mil, cento e dois euros e oito cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

Inconformado, apelou o réu e, tendo apresentado alegações, rematou-as com as seguintes conclusões: “1.ª- O Tribunal condenou o Recorrente ao pagamento da quantia de 54.102,08€, à Recorrida, A..., S.A., em virtude desta ter despendido tal quantia com o incêndio ocorrido na habitação de C..., filho do Recorrente; 2.ª- Para tanto, baseou-se o Tribunal na prova documental junta aos autos em conjunto com a prova testemunhal produzida.

  1. - Entende o Recorrente estar-se perante o paradigma consagrado no n.º 2, do artigo 412.º, do Código de Processo Civil: “Também não carecem de alegação os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções; quando o tribunal se socorra destes factos, deve fazer juntar ao processo documento que os comprove.” 4.ª- Teve o Tribunal a quo conhecimento (e prova) da existência da relação de parentesco, e da vivência em economia comum, entre o segurado e o ora Recorrente: seu pai.

  2. - Vários são os documentos constantes dos autos que isso mesmo atestam: a. o requerimento de apoio judiciário junto aos autos com a contestação onde, no mais, é referido (pág. 1) ser o segurado dependente do recorrente e fazendo o mesmo, parte do seu agregado familiar; b. nesse mesmo documento, pág. 4, pode constatar-se a assunção do pagamento de propinas, por parte do Recorrente, de ambos os descendentes, nele se incluindo o tomador do seguro: C....

    1. as diversas notificações relativas à apólice de seguro foram sempre enviadas pela Recorrida para a direcção do segurado que é, e sempre foi, a casa de morada de família do Recorrente: Rua (....), Custóias.

    2. As próprias notificações judiciais realizadas pelo Tribunal ao segurado, C..., foram, também elas sempre dirigidas para a casa do Recorrente, bem sabendo que era aí que vivia o segurado: Rua (....), Custóias.

  3. Bem sabia a Recorrida e o Tribunal que o segurado C...residia com o seu pai, ora Recorrente, em economia comum, na morada do agregado familiar: Rua (....), Custóias.

  4. Objectivamente, no ponto 3. do Requerimento de Apoio Judiciário acima referido e constante dos autos, pode constar-se expressamente que são indicadas todas as pessoas que vivem em economia comum (…) e aí figura, sem qualquer margem de dúvida, o seu cônjuge e os dois filhos de ambos, concretamente o segurado, C... e sua irmã, D...

  5. Também a sentença penal que foi junta aos autos elucida que “…a casa do seu filho C...., que se encontra descrita na Conservatória do Registo Predial de Tábua sob o número (...), destinada exclusivamente a habitação e composta por cave, rés-do-chão e sótão, mas não estava a ser habitada pelo próprio nem por outras pessoas.” 9.ª A decisão sob censura refere também que “o Réu actuou com culpa, na forma negligente (…)”, ou seja, está assim cumprido o pressuposto intimado pelo n.º 4, do artigo 136.º, do Regime Jurídico do Contrato de Seguro: o pressuposto da ascendência e da exigibilidade do não dolo.

  6. Este artigo veio alinhar o regime nacional com a solução comum no direito comparado próximo, ao fixar a exclusão da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT