Acórdão nº 653/10.1TBPMS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução14 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A... , intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra “B..., L.da”, já ambos identificados nos autos, formulando os seguintes pedidos: A. Ser declarada, nos termos do disposto no artigo 372.º do CC, a falsidade do instrumento de acta de reunião da assembleia geral de sócios, da ré, lavrada em 31 de Março de 2010, em instrumento notarial pela Notária C... do Cartório Notarial da Batalha e com referência ao respectivo ponto da ordem de trabalhos constante da convocatória datada de 12 de Março de 2010; B. Ser, em consequência, declarado o mesmo documento destituído de qualquer força probatória da vontade social da sociedade, ora ré, no que se refere à matéria que consta da acta da dita assembleia geral; C. Ou, se assim não se entender, ser declarada nula, nos termos do artigo 56.º, n.º 1, al.s a) e d), 2.ª parte, a deliberação ali tomada, por violação do disposto no artigo 63.º, al.s f) e g) e 222.º, todos do CSC; D. Ser a mesma deliberação declarada ainda nula, nos termos dos artigos 56.º, n.º 1, c), por violação do disposto nos artigos 222.º, 260.º, n.º 1 e 261.º, todos do CSC e ainda artigo 4.º do Contrato da ré; E. Ser anulada, nos termos do artigo 58.º, al. a), a referida deliberação, por violação do disposto no artigo 385.º, n.º 1, ex vi 248.º, n.º 1, todos do CSC e; F. Ser anulada, nos termos do artigo 58.º, n.º 1, al. a), a mesma deliberação por violação do disposto no artigo 54.º, ambos do CSC.

Para tanto alega, em síntese, o seguinte: - Que a gerente D... convocou uma Assembleia Geral para 14 de Dezembro de 2005, objecto de impugnação em acção pendente no 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Porto de Mós (Processo n.º 127/06.5TBPMS); - Que a referida gerente remeteu carta ao Autor a convocá-lo para Assembleia Geral para 31 de Março de 2010 com a seguinte ordem de trabalhos: 1- Deliberar sobre o mandato judicial e ratificação dos procedimentos judiciais pendentes que envolvem a sociedade e o sócio A..., bem assim a sociedade “E..., Lda.”; - Que no dia 31 de Março de 2010 compareceram na sede da sociedade Ré a notária, o Autor e D... e o Autor apresentou um conjunto de considerações para que ficassem a constar como ponto prévio da ordem de trabalhos; - Que o capital social correspondente à quota de €299,28 não esteve representado porque não esteve presente qualquer representante desta quota; - Que os titulares da referida quota indivisa de €299,28 não foram convocados; - Que o documento em que D... informa que a posição detida pelo marido e pai dos titulares será representada por esta apenas diz respeito à quota de €249.249,31 e a metade indivisa da quota de €299,28 e que nunca foi nomeada como representante da metade indivisa de que é titular o Autor; - Que o facto de não existir representante comum da referida quota indivisa de €299,28 não foi expressamente constatado pela notária na acta da Assembleia Geral em causa, antes pelo contrário, declarou estar representado o capital social na sua totalidade e por isso esta acta é falsa porque não corresponde à realidade; - Que na Assembleia de 31 de Março de 2010 não foi validamente deliberada a existência de impedimento de voto do Autor; - Que o Autor, na qualidade de sócio votou contra e não consta da acta que esse voto tenha sido rejeitado; - Que não foram devidamente escrutinados os votos emitidos na Assembleia Geral em apreciação, porque não consta se a deliberação foi rejeitada e, nesse caso, quais os votos correspondentes, dela não constando o resultado das votações, e existir desconformidade entre os titulares do capital social e os votos emitidos; - Que a deliberação tomada é totalmente inexistente porque resulta de Assembleia Geral sem quórum constitutivo; - Que a deliberação seria sempre nula por flagrante desconformidade entre a deliberação e o art. 4.º do Pacto Social porque a administração da sociedade e a sua representação em juízo e fora dele, activa e passivamente serão exercidas pelos dois sócios, não bastado por isso a assinatura de um deles para vincular a sociedade (cfr. art. 56.º, n.º 1, al. c), do CSC) porque se exige a representação em juízo pelos dois sócios; - Que se constata a violação do princípio da unidade de voto consagrada no art. 385.º, do CSC; - Que é feito constar como segunda vertente da deliberação a de “habilitar aquele advogado com procuração forense para representar a sociedade nos referidos processos ou outros que tenham por objecto conflitos com o referido imóvel”, o que é autónoma da matéria que se fez constar da convocatória”; - Que foram inscritas pela notária afirmações e conclusões não conformes com a realidade.

Por sua vez, em sede de contestação, a Ré pede a improcedência da presente acção e consequente absolvição, bem como, a condenação do Autor em litigância de má-fé em multa e indemnização a favor da Ré em montante não inferior a €20.000,00.

Para tal efeito, a Ré admite a generalidade dos factos resultantes de documentos, bem como, impugna as conclusões jurídicas que o Autor retira de tais factos e apresenta a sua versão dos acontecimentos enquadrando-os em determinado contexto, alegando essencialmente o seguinte: - Que estavam efectivamente presentes os sócios titulares da totalidade do capital social, porque este está dividido em três quotas sendo que uma delas pertence ao Autor, a outra à sócia D... em representação dos co-herdeiros do falecido I..., bem como, a terceira quota pertence metade ao Autor e a outra metade à sócia D... em representação dos co-herdeiros do falecido I...; - Que resulta à evidência que não foi designado pelos co-titulares da participação um representante comum, nem tal seria possível atentas as posições antagónicas manifestadas, mas nada obsta a que se apresente mais do que um titular a exercer o direito de voto; - Que a convocatória se dirigiu ao Autor como sócio, seja na dupla qualidade de titular como contitular das quotas em causa, cumprindo-se a lei, senão teria de cair no preciosismo de ter de se enviar ao mesmo sócio tantas convocatórias consoante cada participação social; - Que a acta contém as posições nela manifestadas pelos sócios e não padecem de qualquer vício ou falsidade; - Que não havendo acordo quanto ao sentido de voto dos contitulares, prevalece a opinião da maioria dos contitulares presentes, desde que representem pelo menos metade do valor da quota, o que é o caso; - Que foi alcançada a maioria atento o conflito de interesses do Autor que o impede de votar; - Que todos os titulares foram regularmente convocados e encontrava-se presente a totalidade do capital social; - Que consta expressamente da acta a existência do conflito de interesses e que o Autor não pode intervir nessa deliberação, aliás, o contrário – admitir esse sócio a votar – é que seria ilegal por violar o art. 58.º, n.º 1, al. a) e b) do CSC; - Que na Assembleia Geral em causa apenas estavam presentes dois sócios em representação da totalidade do capital social, o Autor votou contra a aprovação da deliberação, apesar do impedimento de voto e que D... votou positivamente a proposta de deliberação e essas posições constam expressamente na acta; - Que o sentido da deliberação está expresso quando a sócia D... vota favoravelmente a proposta porque esta representa 50% da totalidade do capital social, a única não impedida de votar; - Que poderá questionar-se se a invalidação do voto do Autor por imposição do art. 151.º, do CSC, deveria ter sido expressamente considerado pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral e por este feito exarar em acta, mas este, ora Autor, não o fez; - Que não se contabilizam os votos de quem estava impedido de o fazer, não sendo necessária qualquer acção de impugnação da deliberação negativa; - Que a assembleia geral de sócios pode deliberar sobre todos os assuntos que interessem à sociedade, mesmo de gestão que normalmente seriam da competência dos gerentes; - Que a Assembleia Geral não se pronunciou nem deliberou sobre matéria que não estivesse contida na convocatória; - Que estavam presentes os dois únicos sócios que representam a totalidade do capital social, o Autor compreendeu todo o alcance da convocatória em causa e a deliberação, não reproduzindo a ordem de trabalhos nem tendo que o fazer, contém-se nas fronteiras por aquela definidas; - Que mesmo que o Autor tivesse algum direito nas suas pretensões, este actuou em claro e manifesto abuso de direito porque o seu propósito com a presente acção é evitar que a sociedade de que é sócio e gerente e contra a qual litiga, faça valer em juízo direitos que lhe assistem, de grande expressão patrimonial, cujo benefício o Autor pretende fazer reverter para si e para sociedades familiares que representa e tutela; - Que o Autor actua com litigância de má-fé porque utiliza o presente processo para tentar impedir e desmobilizar a Ré e os outros sócios de prosseguirem interesses sociais importantes.

Após a realização de audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, em que se decidiu pela tempestividade da contestação deduzida pela ré e pela regularidade da representação da sociedade demandada, através do mandato judicial conferido pela gerente D... e procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e controvertida, de que não houve reclamação.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, após o que foi proferida a sentença de fl.s 710 a 749, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e se julgou a acção improcedente, por não provada e, em consequência se absolveu a ré do pedido, bem como se decidiu inexistir má fé por banda de qualquer das partes, ficando as custas a cargo do autor.

Inconformado com a mesma, interpôs recurso o autor A...

recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 957), rematando as respectivas motivações, com...

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