Acórdão nº 63/11.3MAFIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelALICE SANTOS
Data da Resolução03 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra.

No processo comum singular, acima identificado, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que julgou a acusação parcialmente provada e procedente e, consequentemente: - Absolveu o arguido A... da prática, em co-autoria material, de um crime de Furto qualificado na forma tentada nos termos previstos nos artigos 23.º e 204.º, n.º 1, alínea f) do Código Penal; - Condenou o arguido A...pela prática de um crime de Furto qualificado na forma tentada –nos termos previstos nos artigos 23.º e 204.º, n.º 1, alínea f) do Código Penal – na pena de 7 meses de prisão; - Condenou o arguido G... pela prática de um crime de Furto qualificado na forma tentada –nos termos previstos nos artigos 23.º e 204.º, n.º 1, alínea f) do Código Penal – na pena de 7 meses de prisão; - Absolveu o demandado A... e G... do pedido de indemnização civil deduzido contra si por H...; Inconformado com esta decisão, dela interpôs recurso o arguido, A..., sendo que na respectiva motivação conclui:

  1. Foi o Recorrente condenado a 7 meses de prisão efetiva pela prática de um crime de furto qualificado na forma tentada, porquanto no dia 6 de Janeiro de 2012, pelas 6h00, o mesmo se dirigiu aos viveiros designados SÃO JULIÃO, munido de fato de mergulho e, com o auxílio de uma rede de emalhar, apanhou, no interior dos tanques 30 quilos de robalos. Sendo que ao aperceber-se da presença no local de G..., o Recorrente saiu do local e pôs-se em fuga, deixando no interior do tanque a rede de emalhar com os 30 quilos de robalos, os quais ostentavam um peso médio de 600 gr, assumindo, cada quilo o preço de € 7,00 e que, assim sendo, foram restituídos ao seu proprietário.

  2. Do registo criminal do Recorrente constam 5 condenações por condução sem habilitação legal, 1 condenação por furto qualificado, 1 condenação, como autor, em concurso real e efetivo, de um furto qualificado na forma tentada e um furto simples.

  3. Aquando a prática dos factos que levaram à sua condenação atual, o Recorrente encontrava-se a cumprir pena de 2 anos e 2 meses de prisão suspensa por idêntico período, a que foi condenado por sentença proferida em 6 de Outubro de 2010 e transitada em julgado em 5 de Novembro de 2010, como autor de um crime de furto qualificado, por reporte a factos praticados em 10 de Março de 2010.

  4. Do relatório social para determinação de sanção elaborado por reporte ao Recorrente consta, designadamente, que "O processo de desenvolvimento de A... foi inserido num agregado familiar numeroso, desestruturado, com elevados problemas associados ao consumo de estupefacientes e álcool, que se veio a problematizar, há cerca de 2 anos, pelo envolvimento do arguido na toxicodependência. Expressando algum sentido crítico em relação ao seu percurso criminal, o arguido procura transmitir uma imagem positiva, valorizando o seu compromisso laboral, no qual se mantém afastado de contextos de risco, bem como o acompanhamento ao nível da problemática aditiva através da Equipa de Tratamento da Figueira da Foz, que integrou no âmbito da anterior condenação com regime de prova. Pelo exposto, em caso de condenação, e no âmbito da suspensão de execução de pena, avalia-se como imprescindível, no sentido de minimizar as necessidades de reinserção social e com vista a um estilo de vida socialmente responsável, que A... mantenha o acompanhamento ao nível das substâncias ilícitas." e) Do teor do Relatório Social é possível, ainda, verificar que o Recorrente demonstra estar a operar uma mudança de atitude e de comportamento procurando ajuda para combater a sua problemática da toxicodependência e lutando por manter uma situação profissional estável procurando todas as oportunidades de trabalho que possam surgir. Tudo isto demonstrando que interiorizou o desvalor de todo o historial da sua conduta criminal.

  5. O Recorrente é pai de um menor de 8 anos com o qual, apesar de estar à guarda e cuidados da mãe, contacta nos períodos acordados.

  6. Na sentença ora recorrida, mais propriamente na determinação de medida concreta da pena, o Tribunal a quo considerou baixa a gravidade do ilícito praticado.

  7. A pena aplicada é desadequada e excessiva para realizar as finalidades da punição, na medida que ultrapassa a medida da culpa e é desproporcional face à gravidade do facto e à personalidade do Recorrente.

    1) O art. 70 CP estabelece, com clareza, uma preferência pelas penas não privativas da liberdade, sempre que tal se mostre possível, elegendo como critério da escolha da pena a melhor prossecução adequada e suficiente das finalidades da punição. Sendo que na aplicação deste preceito importa ter em atenção o disposto no art.9 402 CP que atribui à pena um fim utilitário de proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

  8. As penas curtas de prisão introduzem o condenado no meio criminógeno, altamente estigmatizante, que, por obedecer a valores e princípios próprios, é capaz de corromper e perverter os objetivos pretendidos com a sanção aplicada ao agente, afastando-o, cada vez mais, do comportamento que de si é esperado, ou seja, o espaço prisional, mais do que reabilitativo e sobretudo estigmatizante.

  9. O Tribunal a quo podia e devia ter considerado as razões e as circunstâncias atenuantes que, devidamente ponderadas, deveriam possibilitar a substituição da pena de prisão efetiva por uma pena não privativa da liberdade, nomeadamente por prestação de trabalho a favor da comunidade (artigo 582 CP).

    1) A convicção do Tribunal a quo não foi racionalmente objetivada e logicamente motivada, verificando-se uma contradição na sua fundamentação, já que, por um lado, se conclui que: - "as condutas não assumem gravidade desmesurada... Efectivamente, não obstante tratarmos de Furto no interior de estabelecimento industrial, convém não esquecer que estamos em fase de espaço ao ar livre ( ... ) e que o alvo da conduta se traduzia em género alimentício e não apresentava como ostentando valor considerável"; - está em causa uma "gravidade baixa dos ilícitos praticados pelos arguidos"; - depõe a favor do Recorrente "o reduzido valor dos objectos a subtrair a cifrar-se num total de C 210,00; o facto de a totalidade dos objectos subtraídos (... ) terem sido restituídos ao ofendido e a circunstância de o estabelecimento objecto da sua actuação se traduzir em viveiros a funcionar ao ar livre"; - "Com pertinência para ajustar a medida da pena preventiva" o Tribunal descortinou, "a mover-se em sentido favorável" para o Recorrente o seu "enquadramento familiar e labora!" No entanto e, por outro lado, tendo em conta que o Recorrente praticou o ilícito em causa nos presentes autos em período de suspensão de execução de pena de prisão que lhe havia sido aplicada, entendeu o Tribunal a quo que tal facto demonstra insensibilidade e insusceptibilidade, por parte do Recorrente, de ressocialização em liberdade e que por tal razão se mostra necessária a execução efetiva e continuada da pena de prisão.

  10. A aplicação da pena de substituição de trabalho a favor da comunidade privilegia um adequado recurso às medidas não privativas de liberdade e permite o equilíbrio necessário e desejável entre a proteção da ordem pública e a reparação dos prejuízos causados à comunidade pela prática da infração, tendo em consideração as necessidades de reinserção social do delinquente.

  11. A pena de prestação de trabalho a favor da comunidade não foi, pelo Tribunal a quo, considerada como possibilidade de pena substitutiva da pena de prisão, ou seja, não foi dado ao Recorrente a oportunidade de, em cumprimento de uma pena, poder realizar um trabalho positivo e educativo que, salvo melhor opinião, tutela de forma adequada o bem jurídico protegido pela norma incriminadora e facilita a socialização do infrator, coisa que a prisão, manifestamente não fará.

  12. O douto Tribunal a quo não poderia ter deixado de considerar, em especial, a aplicação ao caso em apreço da prestação de trabalho a favor da comunidade, pois que, ao mesmo tempo que tal medida constitui um meio de expiação do ilícito praticado pelo agente, alivia a comunidade dos encargos económicos inerentes à pena de prisão e fomenta no condenado o sentimento de pertença e de membro útil e ativo na comunidade em que se insere.

  13. Ao contrário da pena de prisão efetiva, a aplicação de tal pena substitutiva permite, ainda, que não sejam cortados laços familiares e sociais, possibilitando ao arguido o contacto direto, diário e permanente com os familiares, a continuação da sua atividade profissional e o cumprimento dos compromissos pessoais, profissionais e financeiros assumidos, o que tem necessariamente de ser tido em consideração.

  14. O cumprimento da pena de prisão transporta consigo o risco sério de dessocializar forte e irremediavelmente o Recorrente, para além de prejudicar, seriamente, a sua integração social.

  15. Os factos dados como provados na Douta Sentença recorrida e a integração tanto social como profissional de que faz prova o Recorrente permitem concluir que a substituição da pena de prisão pela prestação de trabalho a favor da comunidade realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição pelo que poderia e deveria o Tribunal a quo ter substituído a pena de prisão por prestação de trabalho a favor da comunidade, nos termos do art 58° CP, cujos pressupostos de aplicação se consideram integralmente preenchidos, subordinada essa pena de substituição a observância de regras de conduta.

  16. Na medida em que na Douta Sentença ora recorrida não foi dada preferência à pena não privativa de liberdade - prestação de trabalho a favor da comunidade - capaz de, no presente...

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