Acórdão nº 253/07.3TBLMG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelFRANCISCO CAETANO
Data da Resolução02 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

Relatório A...

, residente nos Estados Unidos da América, propos contra seu irmão B...

, residente no lugar (...), Lamego, acção com forma de processos especial de prestação de contas, requerendo que o mesmo apresente as contas relativas a todos os actos que praticou desde 20 de Junho de 1963 a coberto dos poderes de administração dos seus bens, conferidos através de procuração para agir em nome dele e que, entretanto, revogou em 13 de Setembro de 2004.

O R. contestou, desde logo excepcionando a nulidade do processo por ineptidão da petição inicial, por falta de descrição dos bens da titularidade do objecto da administração e impugnou, em suma, a obrigação de prestar contas.

O A. respondeu, concluindo como na petição inicial e pediu a condenação do R. como litigante de má fé, em multa e indemnização não inferior a 10 UC.

Afigurando-se não poder a causa ser sumariamente decidida, foram mandados seguir os termos subsequentes ao processo comum ordinário.

Entretanto o A. foi convidado a concretizar a matéria de facto da petição, convite que declinou.

Designada audiência preliminar, na respectiva acta foi exarado o despacho saneador e seleccionada a matéria de facto assente e controvertida.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi respondida a matéria de facto da base instrutória e, proferida sentença, foi a acção julgada parcialmente procedente e o R. condenado a prestar contas ao A., mas apenas, com fundamento em abuso de direito, desde a citação, ou seja, 30.4.07, até à data da sentença.

Inconformados, recorreram ambas as partes, apresentando alegações que remataram com as seguintes conclusões: I.

O Réu a) – A petição inicial é inepta por falta e ininteligibilidade da causa de pedir dado o A. não haver descriminado os bens e direitos sobre que recai a pretendida prestação de contas; b) – A sentença recorrida, se a matéria de facto vertida nas alín.s I) a S) se reporta aos 2 prédios constantes da alín. F) dos Factos Assentes, porque litigiosa a sua propriedade, sobre eles não pode ocorrer qualquer prestação de contas, pelo que, relativamente a tais factos, houve erro de julgamento; c) – O tribunal a quo fez errada interpretação dos art.ºs 192.º, n.º 2, alín. a) e 668.º, n.º 1, alín. a), do CPC.

II.

O Autor a) – O apelante revogou a procuração em 2004 pelo que, deixando de produzir efeitos desde essa data, não tem interesse na obtenção de informações acerca da gestão do seu património a partir de então; b) – Pela relação de confiança subjacente à relação entre as partes é legítimo o pedido de prestação de contas face ao período a partir do qual foi conferida a procuração; c) – Não se encontram preenchidos os pressupostos do regime do abuso de direito na modalidade do “venire contra factum proprium”; d) – A decisão recorrida é uma decisão-surpresa, não tendo o abuso de direito sido alegado nem discutido pelas partes pelo que, afrontando o princípio do contraditório, incorreu em nulidade; e) – Violou ainda o disposto nos art.ºs 573.º e 1161.º, alín. d) do CC e 3.º do CPC, pelo que deve ser revogada e determinada a prestação de contas desde 20.6.1963 até à data de revogação da procuração.

O A., enquanto recorrido, respondeu às alegações do R., no sentido da manutenção da sentença no tocante à obrigação de prestação de contas por banda deste desde a outorga até à revogação da procuração.

O R. não respondeu às alegações do A.

Dispensados os vistos, cumpre decidir, sendo questões a apreciar: I.

Quanto à apelação do R.: a) – A nulidade processual por ineptidão da petição inicial; b) – A impugnação, por erro de julgamento, da matéria de facto das ali.s ) I) a S) da sentença.

II.

Quanto à apelação do A.

  1. – Desde quando e até quando deve o R. prestar contas (revogação do mandato); b) – O abuso de direito na modalidade do “venire contra factum proprium”; c) – Se a sentença violou o princípio do contraditório ao conhecer oficiosamente e sem audição prévia das partes da excepção do abuso de direito.

    * 2.

    Fundamentação 2.1.

    De facto Foram os seguintes os factos dados como provados na sentença recorrida: - A) Encontra-se junto a fls. 13 escrito designado de "Procuração", no que ora interessa, com o seguinte teor: Que no ano de mil novecentos e sessenta e três, aos vinte dias do mês de Junho, no escritório, na cidade de East Providence, Estado de Rhode Island, Estados Unidos da América do Norte e perante D... - Notário e as testemunhas adiante nomeadas e assinadas, comparece A..., operário, e sua mulher C..., doméstica, e seu tio F..., operário, solteiro, maior, residentes em (...), do Estado de Rhode Island, pessoas cuja identidade reconheço, por serem conhecidas das testemunhas e estas de mim pelos próprios. E disseram que constituem seu procurador em todo o território da República Portuguesa, B..., casado, empregado comercial, residente em (...), Queluz, a quem concedem todos os poderes em Direito permitidos para em nome deles outorgantes como se presentes fossem e com livre e geral administração civil, reger e gerir todos os seus bens e direitos, praticando, sem excepção nem limitação alguma, todos os actos próprios dessa administração ou a ele inerentes; e especialmente para ajustar e liquidar contas activas e passivas, receber rendas, saldos, fundos, juros, dívidas, rendimentos, géneros, heranças e tudo mais o que lhes pertencer, em qualquer parte, em qualquer tempo, e por qualquer via e titulo que seja, assim como passar recibos e quitações de todas as quantias de dinheiro, valores e objectos que receber; aceitá-los do que entregar ou pagar; fazer compra ou arrematação em hasta pública ou particularmente, de quaisquer bens e direitos, mobiliários ou imobiliários, pagando os preços ou convencionando a forma e prazo de pagamento e registando as transmissões na...

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