Acórdão nº 536/2002.C1-A de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelCARVALHO MARTINS
Data da Resolução02 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I - A Causa: U (…), divorciada, nif. 109354117, residente (…) Lisboa, Ré, nos autos de acção ordinária que correu termos sob o n.° 536/2002, no 2.º Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz (TJFF), em que foram RECORRIDOS L (…) e mulher M (…), veio, ao abrigo do disposto nas als. b) e c) do art.°771.° do Código de Processo Civil (CPC), interpor RECURSO DE REVISÃO do acórdão proferido em 26.01.2010 pelo Tribunal da Relação de Coimbra (TRC) e já transitado em julgado, alegando e concluindo, nos termos constantes de fls. 2-30 dos Autos, que, no que em termos nucleares e sinópticos, se reconduzem a: (…) ** Legal e tempestivamente notificados, os recorridos L (…) e mulher M (…), vieram apresentar resposta, de fls. 146-157 dos Autos, pugnando pela manutenção da decisão, por sua vez, em sinopse destacada, expressando que (…) II. Os Fundamentos: Colhidos os Vistos legais, cumpre decidir: São ocorrências materiais, com interesse para a decisão da causa que: Haver sido o seguinte teor da decisão constante da sentença proferida pelo TJFF em 20.06.2006 e confirmada em 26.01.2010 pelo acórdão revidendo proferido pelo TRC em 26.01.2010: a. “Decisão. - Pelo exposto,” b. “A -julgo parcialmente procedente a acção inicial - em que são Autoras L (…) e mulher, M (…) e Ré U (…) e marido J (…) -, em função do que: declaro os Autores legítimos e exclusivos proprietários e possuidores do prédio descrito em a., mas cujo logradouro é continuo à área coberta e tem a profundidade de 8 metros; -- condeno os Réus a tal reconhecer e a destruir o barracão e tudo quanto têm em tal logradouro, bem como a absterem-se de todo e qualquer acto que possa perturbar o exercício pelos Autores do seu direito de propriedade; e, c. -B -julgo improcedente o pedido reconvencional dele absolvendo os Autores; d. C -Como litigante de má fé condeno a Ré a pagar a multa de 20 (vinte) uc e indemnização a favor dos Autores---- e. Custas por Autores e Réus na proporção do decaimento”. -.

9. O processo principal teve duas sentenças proferidas pelo TJFF (Circulo), três acórdãos produzidos pelo TRC e um acórdão proferido pelo STJ, sendo que, 10. A decisão transitada em julgado foi o acórdão do TRC, datado de 26.01.2010, que confirmou a segunda sentença do TJFE.

50. A existência do poço, desaparecido sob as construções (barracão, anexos ou galinheiros como já foram designadas neste processo), só foi recordada (pela recorrente) quando se descobriu o recibo de sinal (Doc. 2-A) no espólio de documentos do falecido J (..) quando da elaboração do pedido do apenso “A” ; 69. A recorrente junta aos presentes autos também outro documento lavrado pela Câmara Municipal da Figueira da Foz CMFF), que é, (70.) uma certidão, datada de 18.08.2010, 71, onde se pode ler: “... M (…), Chefe de Divisão Administrativa do Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal da Figueira da Foz. CERT/FICO, no uso de competência subdelegada, em cumprimento do meu despacho proferido em treze de Agosto de dois mil e dez, exarado no processo numero oitocentos e trinta e sete de mil novecentos e cinquenta e nove, em nome de J (…)...

---Foi constatado por aqueles serviços a existência de anexos com uma área aproximada de quarenta m2 no logradouro da habitação, confinante com as construções vizinhas a nascente.

---As referidas construções constam do processo administrativo a folhas numero vinte e sete, sendo que a mesma se refere a um extracto do levantamento aerofotogrometico da Câmara Municipal, carta duzentos e trinta e nove de três de Julho de mil novecentos e oitenta e um” 131. A recorrente requereu uma inspecção ao logradouro para verificação da existência do poço e da sua exacta localização, bem como para evidenciar as inclinações dos beirais e a condução das águas pluviais para dentro do prédio dos recorridos, e também uma peritagem às construções existentes no mesmo para análise dos materiais nelas empregues.

132. Expressando que “o que justifica a reabertura do processo, a REVISÃO do processo, é a descoberta do poço, qual documento natural, e a certeza de que os depoimentos das testemunhas arrolados pelos recorridos são falsos”.

134. Requer ainda “deverem os recorridos ser condenados como litigantes de má-fé, em multa e indemnização, nos termos dos art°s. 456 e 457 do CPC, sendo esta a favor da recorrente e englobando todas as despesas a que deram causa com todo o processo decorrido e em curso”.

- . Os recorridos requerem “dever a recorrente ser condenada como litigante de má fé, em pesada multa e numa indemnização a favor dos recorridos em montante não inferior ao valor do recurso, ou seja, € 30.000”. ** Nos termos do art. 684°, n°3, e 690°,n°1, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n°2, do art. 660°, do mesmo Código.

Das conclusões, ressaltam as seguintes questões elencadas, na sua formulação originária, de parte, a considerar na sua própria matriz: I.

O que justifica a REVISÃO do processo, é (1) a descoberta do poço, qual documento natural, e (2) a certeza de que os depoimentos das testemunhas arrolados pelos recorridos são falsos”.

Apreciando, diga-se não corresponder a «um excesso de originalidade se (se) disser que o direito se nos revela hoje fortemente problemático. E no sentido exactamente de que se volveu um problema - e problema radical. É que não suscita já só a interrogação pela determinação e a fundamentação do seu ser direito, i. é tanto a interrogação ontológica (ontológica» no sentido tradicional ou de intenção verdadeiramente só ôntica, e a traduzir-se em diversos ontologismos) como a interrogação pelo seu fundamento normativo. Pois seja embora esse já um perguntar que ao direito em si se dirige, e por isso se pretende fundamental, não deixa ele de pressupor subsistente (e subsistente num qualquer seu essencial sentido) o direito interrogado e que apenas se haveria de ontologicamente e fundamentantemente compreender. Ora é esta tranquilidade de pressuposição (pressuposição de ser e de sentido, ainda que porventura por esclarecer esses mesmos ser e sentido) que não pode ser a nossa hoje. A problematicidade actual do direito vai ao ponto de atingir inclusivamente a sua subsistência, o qua tale do direito, ao pôr justamente em causa não só o seu verdadeiro sentido, mas a possibilidade mesma do seu sentido» (A. Castanheira Neves, O Direito hoje e com Que Sentido? O problema actual da autonomia do direito, Instituto Piaget, 2002, pp.9-10).

Tal concepção permite, em particular, a este respeito, considerar - como no referencial de Cunha Gonçalves, Tratado de Direito Civil, Vol XV., Coimbra, 1945, p. 162 - que o conceito de documento “é extensivo a cousas que não são escritos” (XII, 623). Precisamente no referencial de “noção de documento” do artigo 2420.° do Código de 1867, que era consideravelmente ampliada.

Além dos escritos a que esse preceito se refere, são ainda documentos uma fotografia, um disco gramofónico, uma fita cinematográfica, um desenho, uma planta, um simples sinal convencional, um marco divisório, etc. (cfr. art. 368.º).

Em todo o caso, retrospectiva feita - especifique-se -, essencial à noção de documento é a função representativa ou reconstitutiva do objecto. Uma pedra, um ramo de árvore ou quaisquer outras coisas naturais, não trabalhadas pelo homem, não são documentos na acepção legal. Podem ter interesse para a instrução do processo, mas constituirão objecto de um outro tipo de prova (a prova por apresentação de coisas móveis ou imóveis, por inspecção judicial, etc.) (Pires de Lima, Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 1967, p.236).

Podendo, assim, dizer-se que, documento, como a) noção ampla e rigorosa: é todo o objecto elaborado pelo homem (opus) para representar outra coisa ou facto. No termo “coisa” incluem-se as pessoas; e a representação ou imagem pode ser verbal, gráfica, plástica, etc; b) num conceito mais vasto abrange os sinais ou contramarcas e até os próprios indícios; c) Noção restrita e usual: é Iodo o escrito que corporiza uma declaração de verdade ou ciência (declaração testemunhal: destinada a representar um estado de coisas) ou uma declaração de vontade (declaração constitutiva, dispositiva ou negocial: destinada a modificar uma situação jurídica preexistente) (M. Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, 222).

Com tal tessitura conceitual, a noção de documento a que se refere a al. c) do art, 771.º do Cód. Proc. Civil (696º NCPC) ultrapassa também a mera corporização de uma declaração de verdade ou ciência, isto é, uma declaração testemunhal destinada a representar um estado de coisas, pelo que não deve reduzir-se a um documento em sentido estrito.

Haverá é de tratar-se, ainda, de um documento decisivo, dotado, em si mesmo, de tal força que possa conduzir o juiz à persuasão de que só através dele a causa poderá ter solução diversa daquela que teve. Razões que levam a considerar encontrar-se nas condições previstas naquela disposição e poder, na dimensão considerada - funcionar para os fins correlativos - a pretexto de caber na noção lata do art. 362º do Cód. Civil (Ac. STJ, 15-3-1974: BMJ, 235.º-219) —, a descoberta (existência) de um poço, tido por “desaparecido sob as construções (barracão, anexos ou galinheiros como já foram designados neste processo)”, alegado como fundamento de revisão, para efeitos de apreciação conexa.

- Quanto à invocada pretensa “certeza de que os depoimentos das testemunhas arrolados pelos recorridos são falsos”, a (possível) pretexto de acobertamento pela al. b) do art.771º CPC (696º NCPC) - quando se verifique a falsidade de documento ou acto judicial, de depoimento ou das declarações de peritos ou árbitros, que possam, em qualquer dos casos, ter determinado a decisão a rever, não tendo a matéria sido objecto de discussão no processo em que foi proferida - , tal se configura como impossível categórico de integração em...

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