Acórdão nº 287/12.6JACBR-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelORLANDO GON
Data da Resolução17 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra Relatório Por despacho de 18 de Julho de 2014, proferido pela Ex.ma Juíza de turno, no 2.º Juízo, do Tribunal Judicial da Comarca de Mangualde – ora integrado na Comarca de Viseu – foi decidido indeferir as irregularidades processuais invocadas pelo arguido A...

no seu requerimento apresentado de folhas 563 a 565 dos autos.

Inconformado com o douto despacho de 18 de Julho de 2014, dele interpôs recurso o arguido A..., concluindo a sua motivação do modo seguinte: 1. Através de despacho datado de 15/07/2014 e de fls. 546 designou o tribunal recorrido o dia 23/07/2014 para que se procedesse à audição dos arguidos para a alteração do seu estatuto coactivo, conforme promoção do M.P. que antecedeu.

  1. Por ter tal diligência sido agendada para as férias judiciais e ao arrepio do estatuído no art. 103°/1 do C.P.P., veio o ora Recorrente arguir a irregularidade do dito despacho.

  2. O tribunal a quo entendeu não assistir razão à arguição do Recorrente por três distintos motivos: em primeiro lugar, o despacho de fls. 546 havia sido proferido antes do início das férias judiciais; em segundo lugar verificava-se a excepção à disciplina do n.º 1 do art. 103° C.P.P. prevista na parte final da alínea a) do n.º 2 do mesmo artigo; e, finalmente, também se verificava a excepção ao 103°/1 C.P.P. prevista na alínea f) do mesmo n.º 2.

  3. Salvo o devido respeito, entende o Recorrente que qualquer das razões apresentadas pelo tribunal recorrido para indeferir a arguição de irregularidade apresentada pelo primeiro carece de sentido e de aplicabilidade ao caso concreto.

  4. Desde logo, uma vez que não se arguiu a irregularidade do despacho de fls. 546 com fundamento na data em que o mesmo foi proferido (mas, antes, na data que aí se consignou para a realização da diligência de audição dos arguidos), é irrelevante se tal despacho foi proferido antes ou durante as férias judiciais (que se iniciaram a 16/07/2014).

  5. Depois, parece-nos evidente que esta audição dos arguidos para alteração do seu estatuto coactivo - quando tal alteração (de acordo com a promoção do M.P. que a peticionou) é para que lhes seja aplicada medida mais gravosa do que aquelas a que estavam sujeitos (aliás, a mais gravosa de todas, a prisão preventiva) -, não cabe no conceito de actos processuais indispensáveis à garantia da liberdade das pessoas, sendo, por isso mesmo, inaplicável in casu a alínea a) do art. 103°/2.

  6. Com efeito, a garantia da liberdade não pode senão ser encarada numa vertente positiva (digamos assim).

  7. Ou seja, um acto é indispensável à garantia da liberdade das pessoas somente e sempre que o que se pretende com o acto é colocar o arguido numa situação mais benéfica do que aquela em que se encontra (por exemplo, revogando determinada medida de coacção ou sujeitando-o a medida menos gravosa do que a que esteja submetido).

  8. Finalmente, cremos que também não é aplicável a alínea f) do dito n.º 2 do art. 103° C.P.P.

  9. É verdade que, como sustentam parte da doutrina e jurisprudência, tal alínea se aplica a todos e quaisquer actos que sejam reputados de necessários (e, por isso, urgentes).

  10. Não obstante, por ser uma excepção que opera ope judicis, tem, Obrigatoriamente, que ser expressamente alegada e também fundamentada.

  11. Ou seja, se efectivamente o tribunal recorrido entendeu que a diligência que pretendia agendar era de considerar um acto necessário/urgente (que tinha que ser marcado durante as férias judiciais), tinha que o ter expressamente mencionado no despacho de fls. 546, justificando-o como exige o art. 97°/5 do C.P.P.

  12. Pois, como exige este preceito normativo, Os Actos Decisórios São Sempre Fundamentados.

  13. Ora, o que é facto é que no despacho de fls, 546 o tribunal a quo não indica considerar a diligência a cuja marcação procede necessária/urgente, limitando-se a proceder ao respectivo agendamento.

  14. E não se pode admitir que para colmatar tal “falha” seja suficiente dizer-se posteriormente e na sequência de invocação, pelo aqui Recorrente, da irregularidade do dito despacho que se considera a mencionada necessidade/urgência do acto agendado (e continuando sem se explicar o porquê de tal entendimento).

  15. Pelo que resulta evidente que seja qual for o prisma por que se encara a questão o despacho de fls. 546 é irregular - pois não cabe em qualquer das excepções que a lei prevê para a realização de actos judiciais em período de férias judiciais.

    Nestes termos e nos melhores de Direito, deve o despacho recorrido ser revogado e substituído por um outro que determine, nos termos do art 123°/1 do C.PP. a irregularidade do despacho de fls. 546 dos autos, com as devidas e legais consequências.

    O Ministério Público na Comarca de Mangualde respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pela sua rejeição, porque interposto de despacho irrecorrível, já que é mero expediente ou, assim não se entendendo, pela sua improcedência.

    O Ex.mo Procurador-geral adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido de que deverá ser negado provimento ao recurso e, consequentemente, confirmada a douta decisão recorrida.

    Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do C.P.P., tendo o arguido na resposta ao douto parecer mantido a sua posição de que deve ser julgado procedente o recurso.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    Fundamentação O despacho recorrido, de 18 de Julho de 2014, tem o seguinte teor: « Por despacho proferido em 15.07.14 constante de fls. 546 foi designada data para audição dos arguidos tendo em vista a alteração do seu estatuto coativo.

    Notificado de tal despacho, veio o arguido A... invocar a irregularidade de tal despacho e da própria diligência ali agendada caso a mesma tenha lugar, dando conta de que tal diligência foi agendada para férias judiciais e não se trata de ato urgente que tenha lugar em férias judiciais, referindo ainda que os autos não têm natureza urgente e que, como tal o despacho está ferido de irregularidade.

    O Ministério Público pronunciou-se no sentido do indeferimento da invocada irregularidade nos termos que constam da promoção que antecede.

    Desde logo, e como bem se refere na douta promoção que antecede, haverá que ter em conta que o despacho em causa não foi proferido em férias judiciais mas antes, pelo que, não se nos afigura qualquer irregularidade que o afete.

    Nos termos do art. 103.°, n.º 1 do C.P.Penal, os atos processuais, em regra, têm lugar nos dias úteis, às horas de expediente dos serviços e fora das férias judiciais. Porém tal regra encontra exceção no n.° 2 do mesmo preceito legal onde se dispõe quais os atos que se podem praticar fora desse período, sendo que se prevê na alínea f) os atos de mero expediente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT