Acórdão nº 98/11.6TBSCD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ANTUNES
Data da Resolução17 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

Relatório.

M… e cônjuge, G…, propuseram, no Tribunal Judicial da Comarca de Santa Comba Dão, contra A…, acção declarativa constitutiva, com processo comum, ordinário pelo valor, pedindo que fosse proferida sentença nos termos do art.830º,nº1 do C. Civil que produza os efeitos da declaração de venda dos bens imóveis identificados no art.º 1º da petição inicia, nos termos e condições exaradas no contrato promessa de compra e venda sub judice.

Fundamentaram esta pretensão no facto de, por escrito particular, denominado contrato promessa de compra e venda, celebrado no dia 10 de Fevereiro de 1991, no qual acordaram em se submeter à execução específica, terem prometido comprar e a ré lhes ter prometido vender, pelo preço de 10 000 000$00, valor que lhe entregaram naquela data e de que a ré deu quitação, 1/3 indiviso de um prédio urbano, 1/2 indiviso de seis prédios rústicos e 1/3 indiviso de outro prédio rústico, devendo a escritura ser outorgado logo que a ré, com a antecedência de 15 dias, fosse notificada, e de a ré, apesar de notificada por carta registada com aviso de recepção, recebida no dia 27 de Dezembro de 2010, não ter comparecido, no dia 14 de Janeiro de 2011, pelas 14 00 horas, no cartório da notária …, em Santa Comba Dão.

A ré defendeu-se por excepção peremptória, invocando, com fundamento na falta do reconhecimento notarial das assinaturas dos outorgantes e da menção da existência, no tocante ao prédio urbano, da licença de utilização ou de construção, a nulidade do contrato promessa e, por impugnação, alegando, designadamente que, apesar de ter declarado ter recebido dos autores o sinal e pagamento da venda, tal pagamento nunca foi feito, razão pela qual não compareceu no cartório notarial.

A autora replicou, designadamente que o prédio urbano foi inscrito na matriz no ano de 1937, estando, por isso, dispensado de licenciamento camarário.

Seleccionada a matéria de facto e já depois de finda, na audiência final, a produção da prova pessoal, a Sra. Juíza de Círculo de Viseu, por despacho de 3 de Setembro de 2013 - com fundamento em que compulsada a matéria vertida na base instrutória é nosso entendimento que em face da pretensão dos autores e não obstante a matéria vertida na alínea J) da factualidade assente e no art 4º da referida base, se mostra útil e necessário à boa decisão da causa proceder à sua ampliação nos termos do art. 650,nºs 1 e 2,al.f), do C.P.C. (redacção antiga) de modo a que se inclua na mesma a matéria alegada por aqueles no artigo 5º da petição inicial - aditou à base instrutória, sob o nº8, o seguinte artigo: “Os autores, enquanto promitentes-compradores e conforme clausulado no contrato referido na alínea J), entregaram à ré na data da celebração do contrato promessa de compra e venda a quantia de 10.000.000$00 (dez milhões de escudos)? E depois de, por despacho de 3 de Outubro de 2013, ter resolvido que até à prolacção da sentença os autos continuarão a seguir o estatuído no regime processual antigo e não à luz das disposições legais do NCPC – decisão que não foi objecto de impugnação - a Sra. Juíza de Círculo decidiu a matéria de facto controvertida, tendo julgado não provado, designadamente o ponto de facto aditado à base instrutória.

A sentença final da causa julgou improcedente a excepção peremptória da nulidade mas – com fundamento em que não lograram os autores, na verdade, como lhes incumbia, a prova de que, conforme clausulado no contrato, cumpriram a prestação a que também estavam adstritos por força do mesmo contrato: no caso a entrega à ora ré da quantia de dez milhões de escudos atinente ao preço global dos prédios objecto de venda, o que se extrai da resposta negativa ao art.8º (aditado), da base instrutória, e que não tendo os autores logrado a prova de tal pagamento, pressuposto para que de acordo com o mencionado contrato fosse realizada a escritura pública de compra e venda, não pois concluir-se no sentido do alegado incumprimento por banda da ré e, consequentemente, proferir-se sentença em que se declare a execução específica do contrato, pelo que outra solução não resta que concluir no sentido de não se encontrarem verificados os requisitos da requerida execução especificado - julgou a acção improcedente.

É esta sentença que os autores impugnam no recurso ordinário de apelação – no qual pedem se profira acordão que, revogando a decisão ora impugnada, julgue a presente ação totalmente provada e procedente proferindo-se, para tanto, decisão que, nos termos do artigo 830º, nº 1 do Código Civil, produza os efeitos da declaração negocial do faltoso – tendo encerrado a sua alegação com estas conclusões: … Na resposta, a apelada – depois de obtemperar que o Tribunal deu como provado que os recorrentes não procederam ao pagamento do valor do sinal e preço que alegadamente entregaram – concluiu, naturalmente, pela improcedência do recurso.

  1. Factos provados.

    … 3.

    Fundamentos.

    3.1.

    Delimitação objectiva do âmbito do recurso.

    Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada, expressa ou tacitamente, no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (artº 635 nºs 2, 1ª parte, 3 e 4 do nCPC).

    A sentença impugnada desamparou a pretensão material dos autores – emissão da sentença constitutiva substitutiva da declaração negocial da apelada, integrante do contrato de compra e venda definitivo prometido – por esta única razão: o não cumprimento, pelos apelantes, do ónus da prova do pagamento do preço, do contrato definitivo prometido, logo convencionado na promessa. Esta conclusão seria imposta, no ver da sentença contestada, pela resposta de não provado encontrada para o ponto de facto nº 8 – inserto na base da prova por ampliação – no qual se perguntava se autores entregaram à ré na data da celebração do contrato promessa de compra e venda a quantia de 10.000.000$00.

    Dito doutro modo: a sentença apelada deteve a execução específica da prestação de emissão, pela apelada, da declarações negocial integrante do contrato definitivo prometido, por julgar procedente a exceptio non adimpleti contractus, assente no não cumprimento, pelos autores, da sua obrigação de pagamento do preço (artºs 428 e 830 nº 5 do Código Civil).

    Os recorrentes acham, porém, que um tal facto não era controvertido, estando, antes, plenamente provado por força de confissão extrajudicial escrita.

    Nestas condições, tendo em conta os parâmetros da competência decisória desta Relação representados pelo conteúdo da decisão impugnada e das alegações das partes, as questões concretas controversas que importa resolver são as de saber se: a) O tribunal de que provém o recurso incorreu, num error in iudicando por erro na selecção do objecto da prova, traduzido na errada consideração de que o facto relativo ao pagamento da quantia de € 48.879,79 é um facto controvertido e, portanto, necessitado de prova; b) Se se verificam, no caso, os pressupostos de que a lei faz depender a execução específica da obrigação de facto jurídico positivo que, para a apelada, emerge do contrato promessa.

    O primeiro problema vincula, naturalmente, à análise da força probatória material do documento que cristaliza as declarações de vontade integrantes do contrato promessa; o segundo reclama, evidentemente, o exame dos pressupostos da emissão da sentença ex- artº 830 do Código Civil.

    3.2.

    Erro sobre o objecto da prova.

    Contrato promessa é o contrato pelo qual as partes, ou uma delas, se obriga a celebrar novo contrato – o contrato definitivo (artº 410 nº 1 do Código Civil)[1].

    Distinção relevante é a que separa o contrato promessa monovinculante e o contrato promessa bivinculante: no primeiro apenas uma das partes se encontra adstrita à obrigação de celebrar o contrato definitivo; no segundo essa obrigação vincula ambos os contraentes (artº 411 do Código Civil).

    Do contrato promessa emergem simples prestações de facto jurídico positivo: a obrigação de emitir, no futuro, as declarações de vontade integrantes do contrato definitivo prometido.

    Na espécie sujeita é irrecusável que os recorrentes e a recorrida concluíram, entre si, um contrato promessa bivinculante...

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