Acórdão nº 669/10.8TBGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelS
Data da Resolução17 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra A Autora intentou contra a Ré a presente acção declarativa com processo ordinário, pedindo: - O reconhecimento de que entre a Autora e o Ré se estabeleceu um acordo comercial que consistia na venda de produtos lácteos aos clientes da Autora; - O reconhecimento de que a Ré terminou de forma injustificada o acordo comercial existente com a Autora, incorrendo em responsabilidade contratual; - O reconhecimento de que a Ré se apropriou de forma ilícita dos clientes da Autora; - a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia global de € 10.390.251,93, a título de prejuízos patrimoniais e não patrimoniais sofridos com a cessação do acordo.

- a condenação da Ré a pagar-lhe os danos emergentes da desvalorização comercial que sofreu, em função da resolução contratual, cujo valor deverá ser relegado para execução de sentença.

Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese: A Autora é uma sociedade anónima, cuja designação foi alterada a partir de 2008, cujo objecto social consiste na produção, engarrafamento, importação e exportação de bebidas e matérias-primas inerentes à actividade.

A Autora decidiu dedicar-se à comercialização, em nome individual, de leite, queijos, manteigas, bolos e iogurtes, cuja actividade durou até ao final da década de 70, através da empresa L..., responsável pela comercialização em Portugal de iogurtes sob a designação de “...”, ao abrigo de um contrato, com exclusividade, para determinadas zonas do distrito de Setúbal.

No início da década de 80 a empresa I..., posteriormente adquirida pela Ré, manifestou interesse em adquirir a carteira de clientes da Autora, no sentido de começar a vender aos clientes da Autora os seus iogurtes, pelo que ficou acordado que a Autora passaria a exercer a sua actividade, ao abrigo de um acordo comercial, com exclusividade, para o distrito de Setúbal, na comercialização daqueles iogurtes.

Esta relação foi-se sempre desenvolvendo, de modo a que a Autora ia sempre adquirindo produtos à I..., procedendo, posteriormente à sua venda, transporte e facturação aos clientes que faziam parte da sua carteira, tendo esta relação comercial se mantido inalterada, mesmo depois da aquisição executada em 1989 pela empresa D..., que manifestou a intenção de continuar o contrato, tendo garantido, através dos seus representantes, que nenhum iogurte seria vendido sem intervenção directa da Autora.

Deste modo, manteve-se a relação comercial, sendo que os clientes da Autora continuaram a efectuar-lhe as encomendas, que por sua vez adquiria os produtos à Ré, procedendo em termos finais à sua venda, transporte, entrega e facturação.

A carteira de clientes da Autora foi sendo aumentada durante as décadas de 70 e 80, tendo deixado de comercializar mais de 50% de produtos alimentares que comercializava, a pedido da Ré, mediante a contrapartida de ser representante exclusiva desta na zona de Setúbal.

Actualmente, a actividade da Ré no distrito de Setúbal assenta nos clientes que a Autora lhe colocou à disposição, sendo certo que apesar de a partir de determinada altura a facturação ser efectuada directamente pela Ré, tal procedimento não era para a generalidade dos clientes, tendo, de qualquer forma, continuado as encomendas a ser feitas directamente à autora.

Em 2007 a Ré contactou a Autora, transmitindo-lhe a sua intenção de pôr fim às relações comerciais que haviam durado cerca de 28 anos.

Apesar de ter recebido toda a clientela da Autora, com as vantagens daí advenientes, tendo sido interpelada para compensar a Autora, nunca manifestou disponibilidade de efectuar qualquer pagamento.

A Ré deve indemnizar a Autora pelo valor da clientela, no montante de € 8.755.827,54, correspondente ao valor médio das vendas efectuadas por esta nos último cinco anos, bem como pelas despesas que fez no desenvolvimento desta relação comercial, designadamente com a aquisição de um terreno e equipamentos, respectivamente nos valores de € 300.000,00 e € 343.532,76 e ainda com o despedimento de funcionários que, em virtude da cessação do contrato, deixaram de ser necessários.

Alega ainda prejuízos para a sua imagem e reputação, decorrentes do facto da Ré ter referido, junto dos seus clientes, que a Autora não seria o melhor exemplo e outros prejuízos patrimoniais em virtude de ter ficado sem clientes e sem produtos para vender, que contabiliza, respectivamente em € 7.500,00 e € 939.391,63.

Finalmente, alega que sofreu desvalorização comercial, com o consequente prejuízo que não está ainda em condições de contabilizar, relegando a liquidação deste prejuízo para execução de sentença.

Conclui que a Ré se apropriou da sua clientela, praticando actos de concorrência desleal, aproveitando-se da sua situação de inferioridade, incorrendo em responsabilidade obrigacional.

A Ré contestou, invocando a excepção de incompetência territorial.

Ainda por excepção invocou a caducidade do direito de indemnização da clientela peticionado pela Autora, por ter já decorrido mais de um ano desde a cessação do contrato e comunicação efectuada pela Autora no sentido de exigir o pagamento de indemnização, até à data da instauração da presente acção.

Por impugnação, sustentou não ser verdade o descrito pela Autora, alegando em síntese: Nunca pretendeu adquirir nem adquiriu qualquer carteira de clientes da Autora, sendo as relações comerciais entre as duas sociedades sempre mantidas em moldes abertos, nos termos que descreve e sem qualquer obrigação de exclusividade.

A ampliação da clientela não se deveu à Autora, mas antes ao trabalho da Ré e seus colaboradores, bem como à qualidade dos produtos.

O trabalho efectuado pela Autora limitava-se à operação de recepção, transporte e entrega de mercadorias, cobrando como preço uma percentagem sobre o valor das mesmas.

Em 5 de Junho de 2007 comunicou à Autora que iria assumir a entrega da mercadoria no ... de Setúbal e Almada a partir de 5 de Novembro de 2007, cessando os serviços logísticos da Autora, pelo que, após essa comunicação, a Autora informou a Ré que deixaria de lhe remeter os valores em dívida, o que fez relativamente aos valores vencidos entre 30 de Setembro e 30 de Outubro de 2007 e aos vencidos depois de 31 de Outubro de 2007.

Por esse motivo, em 20 de Novembro de 2007 a Ré avisou a Autora de que, caso não efectuasse os pagamentos em dívida, suspenderia os fornecimentos e cessaria a relação comercial, pelo que, não tendo a Autora cumprido as suas obrigações, a Ré suspendeu as relações comerciais e resolveu o contrato.

Não corresponde à verdade o valor de vendas que a Autora refere, sendo que nunca impôs também a aquisição de quaisquer bens ou equipamentos, pelo que se esses investimentos foram efectuados, integram o risco próprio do negócio por parte da Autora, a que a Ré é totalmente alheia.

Deduziu pedido reconvencional, dando por reproduzido o alegado na contestação, alegando que por força dos fornecimentos de iogurtes não pagos pela Autora, tem um crédito sobre esta de € 120.649,14, cujo pagamento peticiona, acrescido dos respectivos juros, que ascendem a € 29.021,23.

Concluiu pela improcedência da acção.

A Autora respondeu, concluindo pela improcedência das excepções e do pedido reconvencional e, no mais, concluiu como na petição inicial Foi admitido o pedido reconvencional.

No despacho saneador julgou-se improcedente a excepção da incompetência territorial.

Veio a ser proferida sentença que julgou a causa nos seguintes termos: » julgar a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, absolver a ré “D..., S.A” dos pedidos contra si deduzidos pela autora “G..., S.A.”.

» julgar parcialmente procedente o pedido reconvencional deduzido pela ré contra a autora e, em consequência, condenar a autora “G..., S.A” a pagar á ré “D..., S.A” o montante de € 120.649,14, acrescido de juros de mora às taxas legais em vigor, sendo os mesmos devidos, relativamente à quantia de € 73.694,81, desde 20 de Novembro de 2007 até integral pagamento; e relativamente à quantia de € 46.954,33 desde a citação até integral pagamento, absolvendo a autora do demais peticionado.

» julgar improcedente o pedido deduzido pela ré de condenação da autora como litigante de má-fé.

A Autora inconformada com a decisão interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: ...

A Ré apresentou resposta, pugnando pela confirmação da decisão.

  1. Da junção de “relatório técnico e parecer jurídico” pela Recorrente Já após a distribuição do recurso e quando o processo se encontrava concluso à Relatora para elaboração de projecto de acórdão, a Autora, invocando o disposto no art.º 651º, n.º 1 e 2, do C. P. Civil, veio proceder à junção aos autos de um documento que apelidou de relatório técnico e parecer jurídico, alegando que ao contrário do que consta da douta sentença, os valores peticionados pela Ré/Reconvinte (ora recorrida) por referência às facturas relacionadas entre os pontos 36 a 52 dos factos considerados provados na douta sentença, não se encontravam em débito por parte da A./Reconvinda (ora recorrente) e, consequentemente, não podia tal facto fundamentar a rescisão contratual efectuada pela D..., SA.

    A Ré veio opor-se à junção desses documentos, alegando, além do mais, que a sua junção é extemporânea.

    Segundo consta da nota introdutória desse documento, subscrito por um revisor oficial de contas e por um jurista, o mesmo reporta-se a aspectos meramente contabilísticos e financeiros e, em nenhum momento se refere a aspectos...

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