Acórdão nº 1594/11.0TBFIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução16 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.

Em 16/06/2011[2], J… e mulher, R… (AA. e Apelantes subordinados), demandaram a seguradora Companhia de Seguros A…, S.A.

(R. e Apelante), invocando a ocorrência em 20/10/2008 de um acidente de viação (choque em cadeia) envolvendo a viatura dos AA. (conduzida e tripulada por estes, respectivamente A. marido e A. mulher), UC…, e a viatura PQ… cujos riscos de circulação eram cobertos pela R. Daí que, imputando os AA. a culpa exclusiva do evento ao condutor do PQ, formulem os seguintes pedidos (fundados em responsabilidade civil extracontratual do condutor da PQ, transferida para a R.): “[…] a) Declarar-se o segurado da R. exclusivo responsável pelo acidente em causa e, consequentemente, ser esta condenada a pagar aos AA. a título de danos patrimoniais a quantia de €8.040,08, conforme tudo consta já devidamente descriminado no presente articulado[[3]]; b) Mais deve a R. vir a ser condenada a pagar ao A. marido a quantia de €2.500,00 e a A. mulher a quantia de €1.500,00 a título de danos não patrimoniais[[4]].

  1. Deve ainda a R. ser condenada a pagar juros de mora sobre as referidas quantias, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação até integral pagamento.

[…]”.

1.1.

A R. contestou impugnando fundamentalmente os valores dos danos, designadamente rejeitando a reparação da viatura, opondo ao valor desta (€5.730,11) o valor venal e dos salvados (respectivamente €600,00 + €100,00)[5].

1.2.

Foi o processo julgado pela Sentença de fls. 121/134 – esta constitui a decisão objecto do presente recurso – no sentido da parcial procedência, condenando-se a R., nos seguintes termos: “[…] A) A pagar aos AA. a quantia de €5.898,42, acrescida de juros de mora calculados desde a data da prolação desta sentença, à taxa legal de 4%, de acordo com a Portaria n.º 291/2003, até efectivo e integral pagamento[[6]]; B) A pagar ao A. marido a quantia de €100,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora calculados desde a data da prolação desta sentença, à taxa legal de 4%, de acordo com a Portaria n.º 291/2003, até efectivo e integral pagamento; C) A pagar à A. mulher a quantia de €100,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora calculados desde a data da prolação desta sentença, à taxa legal de 4%, de acordo com a Portaria n.º 291/2003, até efectivo e integral pagamento; D) Absolve-se a R. do demais peticionado.

[…]”.

1.3.

Inconformada com a fixação indemnizatória do valor da reparação e não do valor venal da viatura, recorreu a R., concluindo o seguinte a rematar a motivação: “[…] 1.3.1.

O A., recorrendo subordinadamente [invocou os artigos 633º, nºs 2 e 5 do Novo Código de Processo Civil, sendo aplicável o artigo 682º do Código de Processo Civil (CPC)], formulou, por sua vez, as seguintes conclusões: “[…] II – Fundamentação 2.

Relatado o essencial do iter processual que conduziu à presente instância de recurso, cumpre apreciar os fundamentos da apelação, da principal e da subordinada, tendo em conta que as conclusões formuladas pelos Apelantes – transcrevemo-las respectivamente no antecedente item 1.3. e 1.3.1.

– operaram a delimitação temática do objecto dos dois recursos, isto nos termos dos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC) – ou, se se entendesse aplicável o Novo CPC, nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º deste[7]. Assim, fora das conclusões só valem, em sede de recurso, questões que se configurem como de conhecimento oficioso. Paralelamente, mesmo integrando as conclusões, não há que tomar posição sobre questões prejudicadas, na sua concreta incidência no processo, por outras antecedentemente apreciadas e decididas (di-lo, em qualquer dos casos, o artigo 660º, nº 2 do CPC, ou o artigo 608º, nº 2 do Novo CPC). E, enfim – esgotando a enunciação do modelo de construção do objecto de um recurso –, distinguem-se os fundamentos deste (do recurso) dos argumentos esgrimidos pelo recorrente ao longo da motivação, sendo certo que a obrigação de pronúncia do Tribunal ad quem se refere àqueles (às questões-fundamento) e não aos diversos argumentos jurídicos convocados pelo recorrente nas alegações.

Pressupondo ambos os recorrentes a imputação delitual do acidente ao condutor segurado da R. [no sentido operante nos termos do artigo 483º do Código Civil (CC)] e não discutindo os factos por referência a outra visão da prova (não convocando a esta apelação, pois, o nº 1 do artigo 712º do CPC), constituem fundamentos dos dois recursos os seguintes: (a) O recurso da R.

– o recurso principal – contesta exclusivamente que a indemnização por danos materiais respeitante ao veículo se realize pelo valor da reparação e não pelo valor venal, considerando aquela forma de indemnização em dinheiro (valor de reparação), excessivamente onerosa (artigo 566º, nº 1 do CC).

(b) O recurso subordinado dos AA.

, por sua vez, discute o valor dos danos não patrimoniais e a circunstância destes não terem incluído a fixação de um valor pela privação de uso da viatura dos (aos) AA.

2.1.

Os factos a considerar – os factos que a instância que nos precedeu considerou provados e que aqui damos por assentes – são os seguintes: “[…] 2.2. (a) Quanto ao recurso principal da seguradora R.

Como antes dissemos, refere-se este recurso à indemnização reportada aos danos causados na viatura dos RR., tendo presente tratar-se esta de uma verdadeira old timer com escasso valor comercial (um Renault 9 a gasolina, dos anos 80 do século passado, registando bem mais de 150.000 Km).

Convoca esta impugnação, criticando a R. o ponto de vista adoptado na Sentença (nos trechos de fls. 125/131[8], com expressão na decisão), a vexatia quaestio da indemnização pelo valor venal da viatura sinistrada (a forma aqui defendida pela seguradora), assente no conceito de perda total, como alternativa à indemnização pelo custo da reparação (conforme foi entendido na Sentença ora apelada), sendo certo – e vale a este respeito o item 7º dos factos acima transcritos – não ser impossível, embora custe aproximadamente €5.900,00 (valor actualizado) a reparação/recuperação do veículo (cujo valor venal é de €600,00).

Convergindo com a opção da Sentença, consideramos correcta a escolha do valor de reparação da viatura[9], salvo situações de absoluta desproporção do valor da reparação no confronto com o valor venal da viatura – e não é este o caso que aqui se nos depara –, o que implica que o primeiro valor seja objectivamente muito elevado e não apenas “mais elevado”, quando posicionado num confronto percentual pré-definido com o valor venal da viatura. Note-se que, aludindo a um valor percentual pré-definido, estamos a pensar no argumento aqui construído pela R. assente na convocação como regra geral do artigo 41º do Decreto-Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto (que aprovou o Regime do Sistema de Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel):Artigo 41º Perda total1 - Entende-se que um veículo interveniente num acidente se considera em situação de perda total, na qual a obrigação de indemnização é cumprida em dinheiro e não através da reparação do veículo, quando se verifique uma das seguintes hipóteses: a) Tenha ocorrido o seu desaparecimento ou a sua destruição total; b) Se constate que a reparação é materialmente impossível ou tecnicamente não aconselhável, por terem sido gravemente afectadas as suas condições de segurança; c) Se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100% ou 120% do valor venal do veículo consoante se trate respectivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos. 2 - O valor venal do veículo antes do sinistro corresponde ao seu valor de substituição no momento anterior ao acidente.

3 - O valor da indemnização por perda total corresponde ao valor venal do veículo antes do sinistro calculado nos termos do número anterior, deduzido do valor do respectivo salvado caso este permaneça na posse do seu proprietário, de forma a reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à indemnização.

4 - Ao propor o pagamento de uma indemnização com base no conceito de perda total, a empresa de seguros está obrigada a prestar, cumulativamente, as seguintes informações ao lesado: a) A identificação da entidade que efectuou a quantificação do valor estimado da reparação e a apreciação da sua exequibilidade; b) O...

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