Acórdão nº 139/14.5SBGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução15 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo comum com intervenção do tribunal colectivo, da Comarca da GUARDA - Instância Central - Secção Cível e Criminal – Juiz 1.

*** Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra No processo supra identificado, foi julgado o arguido A...

, filho de (...) e de (...) , natural da (...) -Guarda, nascido a 09/02/1973, divorciado, auxiliar da acção médica, residente na Rua (...) , Guarda e actualmente detido no EPR da Guarda, ao qual vinham imputados: -Um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.º 1, al. b) e n.ºs 4 e 5 do Código Penal (CP), na pessoa da sua ex-companheira B... .

- Um crime de injúria agravada, p. e p. pelo art. 181.º, n.º 1 e 184.º, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, al. l), todos do CP (na pessoa do agente da PSP F... ); - Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro (relativamente a bastão com 62 cm de comprimento).

* A demandante Unidade Local de Saúde da Guarda, EPE, deduziu pedido de reembolso contra o arguido no montante de € 85,91, acrescido de juros desde a citação até integral pagamento, pelos cuidados de saúde que prestou a B..., no montante de € 85,91, em consequência dos factos praticados pelo arguido.

* O tribunal colectivo julgou a acusação parcialmente, e, em consequência decidiu: - Absolver o arguido A...

da prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. no art. 86.º, n.º 1, d), da Lei 5/2006 de 23 de Fevereiro.

- Condenar o arguido: . Pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.ºs 1 e 2 do CP, na pena de 3 (três) anos de prisão.

. Pela prática de um crime de injúria agravada, p. e p. pelo art. 181.º, n.º 1 e 184.º, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. l), todos do CP, na pena de 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias de prisão.

.

Em cúmulo jurídico foi condenado o arguido na pena única de 3 (três) anos e 1 (um) mês de prisão.

* Julgando o pedido de reembolso deduzido pela ULS da Guarda, procedente, condenou o arguido no pagamento do montante de € 85, 91 (oitenta e cinco euros e noventa e um cêntimos) e não cento e cinco euros e noventa e um cêntimos, como por lapso consta em extenso do dispositivo e se conclui da fundamentação jurídica do pedido cível a fls. 374, acrescido de juros à taxa legal em vigor desde a citação ate integral pagamento Mais decidiu condenar o arguido A... a pagar à ofendida B... a quantia de € 1 500 (mil e quinhentos euros), acrescida de juros desde o presente acórdão até integral pagamento, ao abrigo do disposto no art. 82.º-A, do CPP.

* Do acórdão interpôs recurso o Ministério Público, no sentido de que o arguido deve ser condenado também pela prática do crime de arma proibida p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro, relativamente à detenção do bastão com 62 cm de comprimento, formulando as seguintes conclusões: «1 - O arguido vinha acusado, além do mais, da prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. na alínea d), do n.º 1, do art. 86.º, do RJAM.

2 - Do texto da acusação consta que "o arguido tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente com murros, pontapés, pauladas com um bastão de madeira (moca) com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3,3 cm de diâmetro na extremidade oposta - tendo aqui um cordão".

"No mesmo dia 24 de maio de 2014, o arguido na habitação onde residia com a sua companheira, para além do martelo e do bastão em madeira já referidos, detinha uma navalha - faca e garfo - em madeira... " e "Agiu sempre de forma deliberada, livre e conscientemente...querendo e sabendo, ainda, que não devia adquirir, possuir ou utilizar na agressão à sua companheira, aqui vítima, o bastão em questão, cuja natureza conhecia, pois que não era titular da licença exigida pela lei, assim o detendo fora das condições legais".

3- O tribunal considerou provado que "desde essa altura (finais de 2013), maioritariamente no interior da residência conjugal, o arguido tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente murros e pontapés, bem como tem-na vindo a ameaçar com o uso de navalhas e ainda com um objeto de madeira com 62 cm. de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3,3 cm de diâmetro na extremidade oposta - tendo aqui um cordão".

"No mesmo dia 25 de maio de 2014, o arguido, na habitação onde residia com a sua companheira, para além do martelo e do objeto em madeira já referidos, detinha uma navalha-faca e garfo, em madeira...".

"O arguido agiu sempre de forma deliberada, livre e consciente...".

4 - Por sua vez, o tribunal considerou ainda que da matéria da acusação não se provou que "o arguido detinha o objeto referido em 2. dos factos provados querendo e sabendo, ainda, que não devia adquirir ou utilizar na agressão à sua companheira aqui vítima, o bastão em questão, cuja natureza conhecia, pois que não era titular de licença exigida por lei, assim o detendo fora das condições legais".

5 - O objeto em causa nestes autos encontra-se examinado, no auto de fls. 130 e 150, do qual resulta que: "trata-se de um pau, originário de uma árvore que pelas suas características afigura-se que seja giesta negral, a qual foi arrancada pela raiz aproveitando a mesma, para lhe dar a forma mais volumosa da extremidade inferior que possui (moca) foi concebida e aperfeiçoada artesanalmente".

"O pau tem cerca de 62 cm de comprimento, com diâmetro da extremidade inferior (moca) cerca de 5,5 e 3,3 cm de diâmetro na extremidade superior (empunhadura), nesta extremidade a 5 cm da mesma, está furado, onde passa um cordel de cor preta, para o mesmo ser envolto no pulso e, assim, ter mais segurança na sua empunhadura".

"No caso em apreço, e atendendo às características do mesmo ter um comprimento adequado ao manuseamento rápido de uma só mão, a extremidade inferior (moca) bastante acentuada, afigura-se que o mesmo não tem qualquer aplicação definida, pois depreende-se que foi construído exclusivamente com o fim de ser utilizado como arma de agressão." 6 - Este objeto constitui um engenho ou instrumento construído exclusivamente com o fim de ser utilizado como arma de agressão, sendo considerado uma arma da classe A, nos termos do disposto na alínea g), do n.º 2, do art. 3.º, do RJAM.

7 - A detenção deste objeto integra a prática do crime de detenção de arma proibida, previsto no art. 86.°, n.º 1, al. d), do RJAM, integrando-se no segmento da norma que refere "quaisquer engenhos ou instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão".

8 - Para o preenchimento do tipo legal de crime em análise, a detenção de qualquer engenho ou instrumento construído exclusivamente com o fim de ser utilizado como arma de agressão não exige o requisito da não justificação da posse.

9- O tipo legal de crime previsto no art. 86.º, n.º 1, al. d), do RJAM, apenas exige, como elemento do tipo, a não justificação da posse para a detenção de "outras armas brancas ou engenhos ou instrumentos sem aplicação definida que possam ser utilizados como arma de agressão".

10 - Ainda que se entenda que o requisito da não justificação da posse é exigido no caso em apreço, em nosso entender, não pode deixar de se considerar que, no caso concreto, a acusação contém esse elemento, na medida em que descreve que o arguido utilizou o objeto como "arma de agressão", o que constitui a não justificação (legitimadora) da detenção do instrumento.

11 - O douto acórdão recorrido, ao absolver o arguido da prática do crime de detenção de arma proibida, não interpretou corretamente o dispostos na alínea g), do n.º 2, do art. 3.º e na alínea d), do n.º 1, do art. 86.°, ambos do RJAM.

12 - Assim, o douto acórdão recorrido deverá ser parcialmente revogado e substituído por outro que condene o arguido pela prática do crime de detenção de arma proibida e proceda à reformulação da pena única resultando do cúmulo jurídico desta pena com as penas parcelares em que foi já condenado - de violência doméstica e de injúria agravada.

* Notificado o arguido afectado pela interposição do recurso, nos termos do art. 411.º, n.º 6 e para os efeitos do art. 413.º, n.º 1, do CPP, não apresentou resposta.

* Nesta instância, os autos tiveram vista da Ex. ma Senhora Procuradora-geral Adjunta, para os feitos do art. 416.º, n.º 1, do CPP, emitindo douto parecer no sentido de que o tribunal a quo não interpretou correctamente o disposto no art. 3.º, n.º 2, al. g) e art. 86.º, n.º 1, do RJAM, ao absolver o arguido da prática do crime de detenção de arma proibida, e, acompanhando os mesmos trilhos do Ministério Público na 1.ª instância, conclui pela procedência do recurso e consequente condenação também por este crime.

* Cumprido que foi o disposto no art. 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, foram colhidos os vistos legais, pelo que cumpre decidir.

Vejamos a factualidade, com interesse para a apreciação das questões suscitadas.

Factos provados: «1.

O arguido residiu, desde finais do ano de 2013, em união de facto, com a ofendida B... , na residência desta, sita na Rua (...) -Guarda.

  1. Desde essa altura, maioritariamente no interior da residência conjugal, o arguido tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente com murros e pontapés, bem como tem-na vindo a ameaçar com o uso de navalhas e ainda com o objecto de madeira com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3.3 cm de diâmetro na extremidade oposta - aqui tendo um cordão.

  2. Desde finais de 2013, até ao dia 24 de Maio de 2014, em várias ocasiões, quando a ofendida não pretendia manter relações sexuais, o arguido “apalpava-a” com muita força na zona genital e nos seios, o que lhe causou fortes dores, tendo o arguido por hábito masturbar-se para cima da mesma, tudo sem consentimento e contra a vontade da vítima.

  3. Durante todo esse...

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