Acórdão nº 70/11.6GCSEI.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA PILAR DE OLIVEIRA
Data da Resolução22 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório No processo comum colectivo 70/11.6GCSEI do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Seia, após realização de audiência de julgamento com documentação da prova oral, foi proferido acórdão em 9 de Julho de 2014 com o seguinte dispositivo: Em face do exposto decidem os Juízes constituídos em Tribunal Coletivo do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Seia: I.

Homologar a desistência de queixa formulada pela sociedade «A..., Lda» pelo denunciado crime de burla, julgando consequentemente extinta a responsabilidade criminal do arguido B..., relativamente ao indicado crime, nos termos do disposto nos artigos 49º, nos 1 e 3, 51º, nº 3, do Código de Processo Penal, 116º, nº 2, e 217º, nº 3, do Código Penal.

II.

Absolver o arguido B... da prática de um crime de burla qualificada.

III.

Condenar o arguido B... , pela prática de: i. Um crime de falsificação ou contrafação de documento p. e p. pelo artigo 256º, nos 1, alínea c), e 3, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; ii. Um crime de falsificação ou contrafação de documento p. e p. pelo artigo 256º, nos 1, alínea c), e 3, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; iii. Um crime de abuso de confiança p. e p. pelo artigo 205º, nº 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.

IV.

Operando o cúmulo jurídico das penas, nos termos do disposto nos artigos 30º e 77º do Código Penal, condenar o arguido B... na pena única de 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão.

Inconformado com a decisão, dela recorreu o arguido B...

, extraindo da respectiva motivação do recurso as seguintes conclusões: 1ª O acórdão recorrido equimozou o sentido profundo da coerência, apreensibilidade, operacionalidade e justeza dos meios e das soluções de que a actividade interpretativa deve servir-se para encontrar a justa e correcta resolução do caso concreto.

  1. E atento o manadeiro fáctico e probatório carreado aos autos, impunha-se uma decisão diversa, no sentido da absolvição do arguido.

  2. A convicção do julgador há-de formar-se, após, uma ponderação serena de todos os meios de prova produzidos, guiado sempre, por padrões de probabilidade, num processo lógico-dedutivo de montagem do mosaico fáctico, perspectivado pelas regras da experiência comum.

  3. Andou, mal o Tribunal "a quo" ao dar como provados os factos descritos nos Pontos 1, 2, 6, 8, 11, 12, 22 e 23 do acórdão recorrido, que estão, incorrectamente, julgados, impondo-se decisão diversa, atenta a prova documental, pericial existente nos autos, bem como, o depoimento testemunhal de: • G..., gravado no sistema digital do Tribunal, à passagem entre as 15 horas e 31 minutos e as 15 horas e 51 minutos, e de D... , gravado no sistema digital do Tribunal, à passagem entre as 15 horas e 51 minutos e as 15 horas e 57 minutos; • Declarações do arguido gravadas no sistema integrado digital da aplicação informática do Tribunal.

    Ressaltam várias contradições na decisão sobre a matéria de facto, que enegrecem o juízo condenatório gizado pelo Tribunal "a quo", nomeadamente: • entre o vertido nos pontos 6 e 7 dos factos provados no Acórdão, com o ponto 3 dos factos não provados; • entre o vertido nos pontos 12. e 23. dos factos provados no acórdão e o ponto 4. dos factos não provados; • entre o vertido nos pontos 7. e 13. dos factos provados no acórdão, e o ponto 5. dos factos não provados; • entre o vertido no ponto 22. dos factos provados no acórdão, e o ponto 6. Dos factos não provados.

  4. O Tribunal "a quo" bordou uma motivação para respaldar a sua decisão, numa retórica, manifestamente, insuficiente, que não cumpre os mínimos de consagração constitucional, do universal dever de fundamentação.

  5. O juiz deve indicar os motivos e as provas que sustentaram a prova que confirmou a hipótese acusatória, mas também, os motivos que levaram a excluir as hipóteses antagónicas e a julgar não atendíveis as provas contrárias invocadas na sustentação da hipótese não admitida.

  6. No caso sub judice, perfila-se vítrea a falta de fundamentação do acórdão, maxime, neste segmento do contraditório, ficando o arguido privado de conhecer o percurso cognitivo traçado pelo Sr. Juiz para desconsiderar a sua tese.

    É aliás, paradigmático disto mesmo, o segmento do acórdão em que desconsiderou as declarações do próprio arguido, com a invocação (infeliz) do seu passado constante do registo criminal.

  7. O acórdão omite, quase em absoluto, as circunstâncias concretas em que os cheques aportaram à esfera jurídica do arguido, e a que título foram os mesmos preenchidos.

  8. A personalidade do agente só pode relevar para efeitos de dosimetria da pena, o que deixa bem claro, que o Tribunal na apreciação crítica da prova, deixou-se enovelar com preconceitos bebidos no extenso registo criminal do arguido.

  9. O acórdão, ora, posto em crise, padece de Nulidade prevista no artigo 379°, n.º 1, alínea a) do CPP, que para os devidos efeitos aqui, expressamente, se invoca, e que é de conhecimento oficioso.

  10. A falta de fundamentação, consubstancia, igualmente, uma violação clara da Lei Fundamental, por equimose dos artigos 20°, 32°, n.º 1, e 205° todos da CRP, prefigurando a interpretação do artigo 374° do CPP no sentido de não incluir-se na estrutura da fundamentação da sentença toda a dimensão contraditória da hipótese apresentada pela Defesa e valoração crítica de todos os meios de prova não atendidos na decisão, bem como, a falta de narração crítica dos factos não provados, claramente inconstitucional por violação dos preditos normativos, imanentes dos princípios da garantia da tutela jurisdicional efectiva, desenvolvido nas garantias de defesa, onde se inclui o direito ao recurso nas garantias do processo criminal.

  11. Não existem elementos probatórios suficientes para a decisão. É manifesta a ausência de prova, e uma evidente e insanável contradição entre os depoimentos das testemunhas, que aliás, nenhuma delas contribuiu para a composição do mosaico fáctico 14ª O que realmente interessava saber, o Tribunal não logrou apurar, e que eram as circunstâncias concretas que fizeram ingressar os cheques na esfera jurídica do arguido, não sabendo, pois, o Tribunal, se foi de forma legítima, ou não.

  12. O acórdão recorrido é, pois, violador do princípio do in dúbio pro reo. Para que o agente seja condenado, é necessário aferir da sua culpabilidade, e esta tem de basear-se em factos concretos e efectivamente provados, sem qualquer espécie de dúvida e para além de qualquer dúvida.

  13. A composição do mosaico fáctico que sustentou a condenação criminal do arguido, operou-se, não com respeito à razoabilidade, lógica, regras da experiência comum, e estrita legalidade, mas na convicção pessoal do Julgador, que diante do vazio probatório, foi construída com palpites, deduções. emoções, ostracizando o princípio informador do nosso processo penal, do in dubío pro reo.

  14. No caso em apreço, torna-se evidente a violação de tal princípio in dúbio pró reo, e consequentemente do princípio da presunção de inocência, tornando a decisão condenatória nula, o que para os devidos efeitos aqui expressamente se invoca.

  15. A violação do princípio em apreço do in dúbio pró reo consubstancia uma afronta do texto constitucional e artigo 6°, n.º 2 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, quando interpretado no sentido oferecido por esta sentença, que o non liquet em matéria probatória desfavorece o arguido e que a violação do princípio do in dúbio pro reo só se coloca quando o juiz da causa confrontado com a dúvida insanável decide contra o arguido, por configurar violação do artigo 32°, n.ºs 1 e 2 da CRP, e emanação do princípio da presunção de inocência, cuja inconstitucionalidade aqui se invoca para os devidos efeitos legais.

  16. Não estão preenchidos, in casu, os requisitos do Tatbestand do crime de falsificação de documento, não tendo o Tribunal "a quo" logrado apurar factualidade suficiente para integrar in totum o tipo legal de crime imputado ao arguido.

  17. No que tange ao crime de abuso de confiança, é apodíctica, in casu, a ausência dos seus elementos tipificadores.

    Desde logo, e é uma justificação radicular, o Ministério Público não logrou carrear aos autos, e muito menos produzir em Audiência de Julgamento, qualquer resquício de prova material que preenchesse o conceito de apropriação ilegítima.

  18. Não basta invocar, de forma displicente, que o veículo não foi entregue no prazo contratualmente fixado, para imputar responsabilidade criminal ao arguido. É preciso demonstrar, em concreto, de forma expressa, explícita e circunstanciada, factos reais que consubstanciem quaisquer actos de inversão do domínio sobre a coisa., e que foi completamente postergado no acórdão condenatório.

  19. Na tarefa de achar a pena do concurso, o Tribunal postergou, em absoluto, o dever de fundamentação, não expondo as razões porque fixou a pena naquela dosimetria.

  20. A concreta e específica fundamentação das razões justificativas de todas as opções que o tribunal efectuou no âmbito do processo de decisão, mesmo que de uma forma concisa, tem que constar expressamente na fundamentação. Uma decisão parcialmente fundamentada tem de ser entendida como não fundamentada, na certeza de que não existe meia fundamentação, conforme explanou o Aresto do TC de 17/04/97.

  21. Inelutavelmente, o acórdão padece de Nulidade prevista no artigo 379°, n.º 1, alínea a) do CPP, que para os devidos efeitos aqui, expressamente, se invoca.

  22. A falta de fundamentação, consubstancia, igualmente, uma violação clara da Lei Fundamental, por equimose dos artigos 20°, 32°, n.º 1, e 205° todos da CRP, prefigurando a interpretação do artigo 374° do CPP no sentido de não incluir-se na estrutura da fundamentação da sentença toda a dimensão contraditória da hipótese apresentada pela Defesa e valoração crítica de todos os meios de prova não atendidos na decisão, bem como, a falta de narração crítica dos factos não provados, claramente...

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