Acórdão nº 959/11.2TBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução14 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A..., Lda., com sede na Av.ª (...) , Coimbra, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário (hoje, comum), contra B...

e C...

, ambos residentes na Alameda (...) , Coimbra, pedindo que estes sejam condenados a pagar-lhe a quantia de € 39.901,92 e juros à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento Alegou para tal, em resumo, que tomou de arrendamento (para fins comerciais), com início a 01/01/2004, uma fracção/loja pertencente em compropriedade aos RR. e a G...

e esposa; tendo todas as negociações decorrido com o aqui R. marido.

Nesse âmbito, a determinada altura (em Julho de 2003), estando o contrato já redigido, o R. marido exigiu que a A. prestasse uma caução de € 40.000,00 – que seria restituída no momento da cessação do contrato de arrendamento e se destinaria, segundo o mesmo, a acautelar o não pagamento de rendas e a danificação da fracção/loja locada, incluindo fachada – exigência a que a A. cedeu, acabando (com a ajuda de terceiros[1], uma vez que estava a iniciar a sua actividade e não tinha meios para satisfazer tal pretensão) por, a tal título, entregar, no dia 6/08/2013, o valor de € 39.901,92; data em que o contrato de arrendamento também foi assinado.

Assim, tendo o arrendamento cessado em 28/02/2011, data para a qual, em Outubro de 2010, exerceu a denúncia do mesmo, vem a A. pedir a restituição dos € 39.901,92; apenas dos aqui RR. por, entretanto, ao entrar em contacto com os outros comproprietários, se haver apercebido que estes não sabiam da sua existência e que o R. B... agiu à revelia deles ao exigi-la, fazendo a referida quantia sua e da R. C... , sua esposa.

Os RR. contestaram.

Por excepção, dizem que a R. mulher é estranha à actividade profissional do R. marido, cujos proventos foram sempre em benefício do próprio, razão porque a R. mulher é parte ilegítima.

Por impugnação, negam a exigência/existência da caução dos € 40.000,00/€ 39.901,92 e que “os cheques para que a A. remete são um artifício usado para não pagar as rendas vencidas e que se encontram em dívida”; tanto mais que a A. iniciou a sua actividade apenas em Janeiro de 2004 e à data de 6 de Agosto ainda não estava constituída.

Em sede reconvencional, pede o R. marido (aceitando que a A. desocupou o locado e entregou as chaves ao outro comproprietário no final do mês de Fevereiro de 2011) que a A. seja condenada a pagar-lhe o montante de € 20.352,00, “a título de rendas vencidas e não pagas e indemnização, à qual acrescem juros à taxa legal, contados desde a citação da A. até efectivo e integral pagamento”.

A A. replicou.

Sustentando, quanto à ilegitimidade, a existência de proveito comum do casal, uma vez que é com os rendimentos de ambos que os RR. satisfazem as necessidades comuns; quanto à falta de personalidade jurídica da A., que desde Julho de 2003 a mesma possuía Certificado de Admissibilidade de Firma, tendo desde tal data até à conclusão do seu processo de constituição sido dados todos os passos – designadamente, a obtenção dum espaço para funcionar – para a colocar a laborar, razão porque, através dos seus legais representantes, tinha perfeita capacidade para fazer o que fez.

Reafirmando o referido na PI sobre a caução exigida pelo R. marido; negando o alegado no pedido reconvencional (explicando que nos meses em que foram pagas quantias/rendas inferiores isso resultou de acordo estabelecido com o R. e o outro comproprietário G... ); e concluindo pela improcedência das excepções e do pedido reconvencional.

Os RR. treplicaram, em que, de útil, reduzem o pedido reconvencional para € 15.068,00 [sendo de € 6.784,00 a título de rendas vencidas e € 6.784,00 de indemnização moratória].

Admitido o pedido reconvencional, foi proferido despacho saneador – em que se julgou a instância totalmente regular (ou seja, julgou-se improcedente a excepção de ilegitimidade da R. mulher), estado em que se mantém – organizada a matéria factual com interesse para a decisão da causa e instruído o processo.

Procedeu-se à realização da audiência de julgamento – já à luz do NCPC – após o que a Exma. Juíza de Círculo proferiu sentença em que concluiu do seguinte modo: “ (…) julgo parcialmente procedentes a presente acção e bem assim o pedido reconvencional e, em consequência: 1. Absolvo a ré mulher do pedido contra si deduzido; 2. Condeno o co-réu marido no pagamento à autora da quantia de € 39.901,92, e bem assim no valor dos juros de mora vencidos, à taxa legal de juros civis, sobre o capital, desde a citação e até efectivo e integral pagamento; 3. Condeno a autora reconvinda a pagar aos réus a quantia global de € 5.906,16 e bem assim o valor dos juros de mora vencidos, à taxa legal de juros civis, sobre o capital, desde a notificação do pedido reconvencional e até efectivo e integral pagamento.

  1. Condeno autora e co-réu marido nas custas do pedido principal e reconvencional, na proporção do decaimento.

  2. Não se vislumbram sinais de litigância de má fé. (…)” Inconformado com tal decisão, interpôs o R. marido recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por outra que julgue a acção totalmente improcedente e que incremente a condenação reconvencional para € 8.034,00, acrescida de 50% de indemnização.

Terminou a sua alegação com uma segunda e quase idêntica alegação a que chamou “conclusões”[2] e que aqui, em face da sua redundância e extensão, não transcrevemos.

A A. respondeu, sustentando, em síntese, que não violou, a decisão de facto e a sentença recorrida, quaisquer normas adjectivas ou substantivas, pelo que deve ser mantida a sentença nos seus precisos termos.

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

* * * II – Fundamentação de Facto Os factos dados como provados na decisão recorrida – logica e cronologicamente ordenados – são os seguintes: A) Por escrito particular denominado “Contrato de Arrendamento – Área Comercial”, datado de 1 de Janeiro de 2004, os RR. ( B... e C... ) e os G... e esposa H... , deram de arrendamento à A. a Fracção Autónoma Designada pelas letras “AM”, correspondente a uma loja, localizada no Rés do Chão, N.º 3, sendo a Terceira a contar do Poente para Nascente, com entrada pela Rua (...) , do Edifício Dois a Nascente, inscrito na respectiva matriz sob o art.º 6263, do prédio Urbano composto pelos Edifícios Número dois a Nascente e Número 1 a Poente, sito na (...) , gaveto para a Rua (...) , Concelho de Coimbra, Freguesia de (...) ; B) O referido contrato foi celebrado para fins comerciais, por um período de seis (6) meses, renováveis por iguais períodos se nenhuma das partes o denunciasse nos termos da lei, com início no dia 1 de Janeiro de 2004; C) A renda mensal inicialmente estipulada era de € 2.500,00, com actualizações anuais, com base no coeficiente legal em vigor, a ser paga por depósito em conta bancária dos Senhorios, no primeiro dia útil do mês imediatamente anterior àquele a que dissesse respeito; D) As rendas mereceram actualizações anuais nos anos de 2005 e 2007, vigorando para o ano de 2005 e 2006, a quantia de € 2.562.50, por mês, e para o ano de 2007 e seguintes a quantia mensal de € 2.642,00; E) A fracção locada correspondia a uma loja destinada a comércio, no rés-do-chão do prédio, descrita na competente Conservatória do Registo Predial de Coimbra, comprada pelo réu no estado de casado com a ré C... no regime de adquiridos, e por G... casado com H...

, aí estando registada a aquisição da fracção a favor de ambos os casais, sem determinação de parte por ap. 36 de 1997/09/01 da descrição nº 2481/19910108 –AM da freguesia de (...) .

  1. Foi o R. B... o condutor de todo o processo subjacente ao aludido contrato, assumindo-se como representante dos interesses dos demais comproprietários (resposta ao facto do artigo 1º).

  2. A dado momento, em circunstâncias não concretamente concretamente apuradas, no início do Verão de 2003, D... e E... , na veste de representantes da sociedade autora, sociedade ainda em constituição, e com vista a garantir o futuro arrendamento da fracção mencionada, em negociação aceitaram prestar uma caução no valor de cerca de €40.000,00. (resposta ao facto do artigo 2º).

  3. Caução essa que seria restituída à A. no momento da eventual futura cessação do referido contrato, se entre ambas as partes tudo estivesse regularizado, e que se destinaria, entre outras coisas, a acautelar o não pagamento de rendas e eventual danificação da fracção locada.

  4. Por alturas da primeira semana de Agosto de 2003 foram, para o efeito entregues ao réu B... , em nome da A. ainda em constituição, os cheques visados n.º 3 193 230 831, n.º 1 393 230 833 e n.º 1 821 006 688 no valor respectivo de € 19.950,00, € 9.975,96 e € 9.975,96 - datados respectivamente de 6-8-2003, 8-08-2003 e 7-8-2003, sacados todos sob o Banco (...) respectivamente sob às contas n.º (...) e N.º (...) e das quais eram respectivamente titulares F...

    e E... ( mãe dos sócios gerentes e um dos sócios gerentes à data respectivamente). (resposta ao artigo 5º).

  5. Aquando da assinatura do contrato pelos representantes da autora - em data não concretamente apurada, entre o Verão de 2003 e o final desse ano - o mesmo já se encontrava assinado pelos RR. e pelos demais comproprietários da fracção.

  6. Em Outubro de 2010, a A. decidiu mudar de instalações tendo para o efeito denunciado o contrato referido em A) ( resposta ao facto do art. 6º).

  7. Para isso, por meio de carta registada com A/R expedida para os RR. e para os demais comproprietários, a A. manifestou a sua intenção de abandonar a fracção locada em 28 de Fevereiro de 2011, mais solicitando que no referido dia os RR. comparecessem na fracção, tendo em vista a entrega das chaves da mesma e a restituição da caução prestada (resposta ao facto do artigo 7º).

  8. Imediatamente, a A. foi contactada pelos demais comproprietários da fracção, Sr. G... e Sra. H... , afirmando desconhecer a existência da caução cuja devolução a A...

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