Acórdão nº 134/05.5IDMGR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução04 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência, na 4ª Secção (competência criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra.

I Nos autos de processo nº 134/05.5idmgr, foi o arguido A...

, por sentença transitada em julgado em 27/02/2012, condenado na pena de um ano de prisão, substituída por 365 dias de multa, à taxa diária de 6,00 euros num total de € 2.190,00.

  1. O arguido não procedeu ao pagamento de qualquer montante, não obstante ter-lhe sido autorizado o pagamento em prestações.

  2. Em 20.5.2014, perante este não pagamento da multa, foi proferido o seguinte despacho[1]: Dispõe o artigo 43.° do CP que: “1 - A pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes. É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 47.° 2 - Se a multa não for paga, o condenado cumpre a pena de prisão aplicada na sentença. É correspondentemente aplicável o disposto no n.º 3 do artigo 49º” Nesta conformidade, não tendo o arguido procedido ao pagamento da pena de multa, determino que o arguido cumpra a pena de um ano de prisão em que foi condenado, nada mais havendo a determinar, uma vez que nada mais foi requerido pelo arguido nem resulta dos autos que o não pagamento da multa não lhe é imputável.

    Notifique e, após trânsito, emita os competentes mandados de detenção”.

    4.

    Entretanto o arguido, ora recorrente, em 4.06.2014, procedeu ao pagamento voluntário da multa no valor de 2190,00€ - fls. 53 a 57.

    5.

    Em 13 de Junho de 2014, o Ministério Público promoveu que se declarasse extinta a pena de multa, pelo cumprimento, pelo arguido, ao abrigo do artigo 475º, do CPP.

    6.

    Em 23.06.2014 foi então proferido o seguinte despacho judicial sobre esta questão: 1. Nos presentes autos, foi o arguido A...... condenado na pena de um ano de prisão, substituída por 365 dias de multa, à taxa diária de € 6, num total de € 2.190 (fls. 1183).

    Por despacho proferido a fls. 1377, foi determinado que o arguido cumprisse a pena de um ano de prisão em que foi condenado, uma vez que não efectuou o pagamento da pena de multa. A fls.

    1382 veio o arguido juntar documento comprovativo do pagamento da multa, no montante de €2.190.

    O Ministério Público promoveu que se declarasse extinta pelo cumprimento a pena em que o arguido foi condenado (fls. 1386).

    Cumpre apreciar e decidir.

    Dispõe o artigo 43.° do CP que: “1 - A pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes. É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 47.° 2 - Se a multa não for paga, o condenado cumpre a pena de prisão aplicada na sentença. É correspondentemente aplicável o disposto no n.° 3 do artigo 49º”.

    Ora, resulta claramente do regime legal em apreço (designadamente, por o normativo em análise remeter apenas para o n.º 3 e não também já para o n.º 2 do artigo 49.°) que, ao contrário do que sucede com a prisão subsidiária, o arguido não pode, uma vez determinado o cumprimento da pena de prisão por falta de pagamento da multa, evitar a execução da prisão através do pagamento da multa. Temos, assim, que, uma vez determinado o cumprimento da pena de prisão por falta de pagamento da multa, não pode já o arguido proceder ao pagamento da multa com vista a evitar o cumprimento da prisão.

    Neste sentido pronuncia-se igualmente a jurisprudência maioritária, da qual são exemplos o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 2/03/2010, em que é relator Brízida Martins, e cujo sumário refere que “1. À pena de multa substitutiva da pena de prisão não é aplicável o mecanismo do artigo 49.°, nº2, do Código Penal, não sendo admissível o pagamento da multa depois de ter sido determinado o cumprimento da pena de prisão de substituição. 2. A partir do momento em que o tribunal ordena a execução da prisão directamente imposta, a multa de substituição desaparece pura e simplesmente, deixa aquela multa de existir.” (disponível em www.dgsi.pt), bem como os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2/03/2011, do Tribunal da Relação de Lisboa de 22/05/20 12 (disponíveis em www.dgsi.pt) e do Tribunal da Relação do Porto de 29/04/2009 (disponível em www.trp.pt). Face ao exposto, determino que, após trânsito, se dê cumprimento ao ordenado a fis. 1377, parte final”.

    7. Desta decisão recorre o arguido A...... , que formula as seguintes conclusões: 1. O Tribunal proferiu um despacho em que ordenou a detenção do Arguido sem que o tivesse ouvido nos termos da lei penal e constitucional.

    2. A forma liminar e despicienda com que o Tribunal demitiu o Recorrente do seu direito em colaborar na determinação da sua liberdade redunda numa manifesta ilegalidade que conduz â nulidade do Despacho.

    3. Viu-se assim, não só o julgador impossibilitado de tomar contacto com o arguida de modo adequado a tirar conclusões sobre a sua culpa, como o próprio se viu impossibilitada de falar em sua defesa, oferecendo à apreciação do Tribunal o que tivesse por relevante para que, em consciência e com respeito pelos princípios fundamentais da Lei, se pudesse chegar a uma decisão nesta matéria.

    4. O Recorrente não foi notificado em momento algum da posição assumida pelo Ministério Público, havendo apenas uma pequena referência à mesma no Despacho recorrido, conhecendo-se, apenas ai mas em absoluto, que promove o Ministério Público a extinção da pena pelo cumprimento.

    5. O Juiz sequer invoca qualquer fundamento atendível para dispensar a audição da Recorrente antes de decretar a sua prisão, demonstrando, assim, o seu poder absolutamente discricionário, com a consequente entrega da intervenção cio arguido ao seu livre arbítrio e ao que eleja como seus critérios de conveniência que sequer enuncia! 6. De facto, não justificando o Juiz a razão de ser da sua decisão em prescindir do contraditório do arguido apenas se pode dizer a sua decisão como infundada e arbitrária, coarctando-se irrazoavelmente as prerrogativas legais do Recorrente em ser ouvido e participar na determinação da sua liberdade, derrogando-se, por outro lado, os normativos legais — e constitucionais — que impõem a legalidade das decisões que constrinjam a liberdade de indivíduos ao exigir a estrita fundamentação dos actos que a tanto conduzam bem como a intervenção colaborante e contraditória do agente.

    7. Existe, por isso, uma decisão nesta sede enfermada de nulidade insanável, o que exclui a admissibilidade legal da decisão recorrida.

    8. O acto de que recorre, enquanto despacho que ordena o cumprimento de uma pena de prisão é entendido como um acto decisório judicial e como tal deve ser sempre e obrigatoriamente fundamentado e deveria especificadamente enunciar todos os elementos de prova em que fundamentou a sua convicção sobre tal determinação.

    9. O dever de fundamentação do despacho que aprecia a determinação de uma pena privativa da liberdade, assume uma importância vital enquanto instrumento de garantia que permite um eficaz direito ao recurso, pois é dele que emana a matéria que permite, ao abrigo do contraditório, a exposição dos fundamentos de facto e de direito do arguido que, na sua óptica, permitem contrariar a decisão.

    10. A exposição sumária, resumida e repleta de lacunas como a do presente Despacho, colide frontalmente com os direitos do arguido, por afectar indubitavelmente o valor do recurso interposto, nomeadamente na confrontação dos motivos justificativos que emanam da convicção do Tribunal para aplicar tal pena, ou seja, na apreciação concreta das questões.

    11. Não poderá bastar-se o Tribunal — e o arguido! — com a indicação de uma norma e elencos jurisprudenciais que mal descreve (e nem podia pois são favoráveis ao arguido), sem indicação factual, concreta e sustentada com a prova produzida, da base que gera a convicção do Mmo. Juiz. O Despacho recorrido, omisso de qualquer fundamentação, sempre impedirá e tomará inviável a defesa do ora Recorrente, pois impede uma correcta defesa do arguido.

    12. Mais, sequer refere o Tribunal qual a mediada da pena que deverá ser cumprida pelo Arguido. 13. O Recorrente assumiu sempre uma postura de preocupação para com o Tribunal, face à pena que lhe foi aplicada, tendo sido sempre a sua intenção proceder ao pagamento da multa em que foi condenado por substituição à pena de prisão.

    14. Por várias vezes tentou, junto do Tribunal, encontrar uma solução para o cumprimento da pena de multa, não tendo, contudo, logrado consegui-lo, tendo o Tribunal mantido sempre uma postura intolerante e arrogante, o que fez com o recorrente apenas tardiamente pudesse fazer o pagamento da pena de multa 15. Quando refere o Mmo. Juiz que não dos autos que o não pagamento da multa não lhe é imputável”, o Recorrente apenas poderá lamentar tal entendimento, por duas razões: primeiro, sempre demonstrou o arguido que tinha vontade de pagar, que sempre foi um cidadão exemplar, bom pai de família, tendo contudo tido um problema grave com a sua empresa que culminou nos dois procedimentos criminais que se identificaram; segundo, ainda que assim não se entendesse, o não cumprimento apenas se poderá imputar ao próprio Tribunal que jamais atendeu às questões e soluções apresentadas pelo Arguido para o cumprimento 1 pagamento da pena de multa em que foi condenado.

    — O Ministério Público, com toda a certeza, tê-lo-á entendido, tanto que promoveu a extinção da pena.

    16. Outra questão importante de valorar. Ao contrário do que refere o despacho recorrido “uma vez determinado o cumprimento...

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