Acórdão nº 3592/13.0TBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução10 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório A C..., SA, com sede na ..., instaurou contra E..., residente na ..., acção declarativa de condenação, pedindo a final a condenação da ré a proceder à entrega, livre e devoluta, da fracção que identifica, e ainda no pagamento da quantia de €52.605,87, na qual liquida os danos causados, acrescida dos montantes, a liquidar, que traduzam prejuízos que se venham a verificar.

    Em fundamento, alegou, em síntese, ser dona da fracção autónoma designada pela letra ..., por tê-la adquirido em venda a que se procedeu no processo de execução fiscal que identifica, facto que fez inscrever a seu favor na Conservatória do Registo Predial competente. Mais alegou que, após a compra, tentou entrar na posse da fracção, o que até ao presente não logrou conseguir dada a oposição da ré, que continua a ocupar o imóvel, embora não detenha título que tal legitime. De facto, disse, embora a Ré invoque um direito de retenção, por via da outorga de um contrato promessa de compra e venda tendo por objecto a venda de tal fracção, não tendo reclamado o seu crédito no processo executivo, não lhe assiste tal direito.

    Mais invocou a existência de prejuízos, em virtude da indevida ocupação, por banda da ré, da fracção reivindicada, o que suporta o pedido de indemnização formulado.

    Regular e pessoalmente citada, a ré apresentou a contestação, na qual, para além do mais, invocou a excepção peremptória da prescrição do direito à indemnização peticionada dado que, assentando na responsabilidade civil por facto ilícito, há muito se mostra decorrido o prazo consagrado no art.º 498.º do Código Civil.

    Mais invocou ter entrado na posse da fracção no ano de 1989, na qual foi investida por acto da sociedade construtora, legítima proprietária do imóvel à data, na sequência de contrato promessa de compra e venda com a contestante celebrado, no âmbito do qual procedeu à entrega da totalidade do preço convencionado. E por assim ser, desde Maio de 1989 que vem exercendo sobre a fracção em causa actos de verdadeira posse pacífica, pública e de boa-fé, de modo que quando a autora reclamou a entrega da fracção, já a contestante a tinha adquirido por usucapião, que expressamente invocou.

    Reconhecendo ter tido conhecimento em tempos da pendência de uma execução, mais alegou ter então invocado o seu direito de retenção, ficando convencida de que tudo se resolvera a seu contento, uma vez que continuou a fruir da fracção sem qualquer estorvo ou impedimento.

    Tendo alegado a realização no imóvel, ao longo dos tempos, de obras de vulto, que lhe aumentaram o valor, constituindo portanto benfeitorias, as quais discriminou, invocou a seu favor o direito de retenção.

    Com tais fundamentos, pediu a sua absolvição dos pedidos formulados pela autora e deduziu reconvenção, em cujo âmbito pediu fosse reconhecido o seu direito de propriedade sobre a fracção reivindicada, por tê-lo adquirido por usucapião, com o cancelamento do registo a favor da reconvinda; subsidiariamente, e para o caso do assim peticionado não ser atendido, pediu o reconhecimento do direito de retenção para garantia do crédito de que é titular, emergente das benfeitorias realizadas na fracção, e que liquidou em €18 355,24.

    A autora replicou, pronunciando-se no sentido da improcedência da excepção da prescrição, alegando quanto ao mais que a ré sempre reconheceu o seu direito de propriedade sobre a fracção e que a adquiriu de boa-fé, expressando por último que o invocado direito de retenção carece de fundamente legal.

    Concluiu pela improcedência das excepções e, bem assim, dos pedidos formulados em via reconvencional.

    Teve lugar audiência prévia e nela foi proferido despacho saneador, aqui se tendo relegado para final o conhecimento da excepção da prescrição, fixado o objecto do litígio e delimitados os temas da prova, sem reclamação das partes.

    Teve lugar audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo, finda a qual veio a ser proferida douta sentença, que decretou a procedência da acção e a improcedência da reconvenção. Em conformidade, condenou a ré a reconhecer a autora C..., SA como legítima proprietária da fracção autónoma designada pela letra ..., e a entregá-la à Autora livre e devoluta de pessoas e bens, mais a condenando no pagamento, a título de indemnização pelos danos causados pela ocupação, a quantia de €58.128,07, acrescida do montante mensal correspondente ao valor da renda actualmente fixada em €348,57 ou o valor mensal que resulte das actualizações dos coeficientes legais de actualização anual das rendas livres até à entrega efectiva da fracção, bem como os juros à taxa legal sobre o montante total da indemnização a partir da citação e até ao efectivo pagamento.

    Inconformada, apelou da sentença a ré e, tendo desenvolvido nas doutas alegações apresentadas as razões da sua discordância com o decidido, sintetizou-as nas seguintes conclusões: ...

    A apelada CGD contra alegou, pugnando naturalmente pela manutenção da decisão.

    Assente que pelo teor das conclusões se fixa e delimita o objecto do recurso, são as seguintes as questões submetidas à apreciação deste Tribunal: i. do erro de julgamento quanto aos factos dados como não provados constantes das als. a), b), c), d) e e) e, bem assim, no que respeita aos factos assentes sob as als. c), d) (parte) e e); ii. indagar se ocorreu igualmente erro de julgamento no que respeita à verificação dos pressupostos da aquisição originária por usucapião invocada pela autora, que deverão ser tidos por verificados; iii. para o caso de assim não se entender, decidir se a autora beneficia do direito de retenção em relação à fracção reivindicada; iv. indagar se operou a prescrição do direito da autora a uma indemnização por danos.

    i. do erro de julgamento na decisão proferida sobre a matéria de facto: ...

  2. Fundamentação De facto Agora estabilizada e lógica e cronologicamente ordenada, é a seguinte a matéria de facto a atender: 1. Em Maio de 1989 a sociedade “R..., Lda.”, representada pelos sócios-gerentes ..., como promitente vendedora, e a Ré, como promitente compradora, celebraram contrato promessa de compra e venda por documento particular junto aos autos para os devidos efeitos legais como documento n.º 1.

    1. Nos termos do referido acordo a primeira contraente, aí designada por “promitentes vendedores”, declarou ser a única proprietária do prédio sito ao Loteamento do ... e nessa qualidade prometeu vender à Ré (designada promitente comprador) o 1.º andar esquerdo, constituído por ... pelo preço total de Esc. 4.500.000$00 (quatro milhões e quinhentos mil escudos.

    2. Mais declararam as outorgantes que “atribuem ao presente contrato eficácia real e subordinam-no ao regime de execução específica (art.º 830º do C.C.)”; 4. As assinaturas de ..., legais representantes da promitente vendedora, foram feitas e reconhecidas no dia 23 de Maio de 1989, no Cartório Notarial de ... e, nessa data, declarado pela “R..., Lda.” “ter já recebido da 2ª outorgante a totalidade do preço a título de sinal e do qual dá quitação”; 5. Os sócios-gerentes da sociedade “R..., Lda.” procederam, naquela data, à entrega à Ré das chaves da fracção “D”.

    3. A escritura não se chegou a realizar, tendo a sociedade construtora alegado na altura a necessidade de obtenção de documentação.

    4. A...

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