Acórdão nº 8/13.6EACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Julho de 2015
Magistrado Responsável | MARIA JOS |
Data da Resolução | 01 de Julho de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do processo comum singular n.º 8/13.6EACBR, que correu termos na Comarca de Coimbra, Tábua – Inst. Local – Sec. Comp. Gen – J1, mediante acusação pública foi o arguido A...
, melhor identificado nos autos, submetido a julgamento, sendo-lhe, então, imputada a prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108.º, n.º 1, com referência aos artigos 1.º, 3.º, n.º 1 e 4.º, n.º 1, alínea g), todos do D.L. n.º 422/89, de 02.12.
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Realizada a audiência de discussão e julgamento, por sentença de 30.01.2015 [depositada na mesma data], o tribunal decidiu: «Neste termos e com estes fundamentos, julgo a acusação totalmente PROCEDENTE e, em consequência CONDENO o arguido A... pela prática de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. arts. 1.º, 3.º, 4.º/1, al. g), 108.º/1 e 115.º, todos do Decreto-Lei n.º 422/89 de 02.12 e, consequentemente: a) CONDENO o arguido na pena de CINCO MESES de prisão; SUBSTITUO a pena de prisão referida em a) pela pena de 170 (CENTO E SETENTA) dias de MULTA, à taxa diária de € 7,00 (SETE EUROS) para um total de € 1.190,00 (MIL, CENTO E NOVENTA EUROS); b) CONDENO o arguido na pena de 150 (CENTO E CINQUENTA) dias de MULTA, à taxa de € 7,00 (SETE EUROS), para um total de € 1.050,00 (MIL E CINQUENTA EUROS); E, ainda, c) Fixo a PENA ÚNICA em 320 (TREZENTOS E VINTE) dias de MULTA, à taxa diária de € 7,00 (SETE EUROS), para um total de € 2.240,00 (DOIS MIL, DUZENTOS E QUARENTA EUROS); (…) Também com os fundamentos supra expostos: DECLARO perdida a favor do Estado e DETERMINO se proceda à destruição, após trânsito, da máquina de jogo apreendida; e DECLARO perdidos a favor do “FUNDO DE TURISMO” os valores pecuniários apreendidos; (…)».
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Inconformado recorreu o arguido, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: a) A sentença recorrida violou os art. 1º, 3.º, 4.º, al. f) e 108.º, n.º 1 do DL 422/89; 127.º do CPP e art.º 374.º do CPP.
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A sentença recorrida é nula porque não analisa a verificação da produção de prova para considerar demonstrado o preenchimento, por parte do recorrente, dos três subelementos do elemento subjetivo do tipo de crime em apreço.
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A sentença recorrida erra quanto à qualificação do jogo em causa, já que qualifica tal jogo como de fortuna ou azar, quando na realidade tal jogo deve ser qualificado como modalidade afim de fortuna ou azar.
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Falece assim a verificação do elemento subjetivo, e tal resulta por ausência absoluta de prova, que, salvo o devido respeito e melhor opinião, as regras de experiência comum não permitem fechar ou dar o salto da falta de prova no que toca ao alegado conhecimento que a recorrente teria do alegado caráter ilícito-criminal do aparelho, da máquina e do jogo apreendido à ordem destes autos. As doutas decisões transcritas permitiriam ao recorrente e a qualquer cidadão médio e comum, refletir de forma diferente daquela que a douta sentença refere como sendo a única possível e obrigatória e que é inequívoco conhecimento das características do equipamento (o douto julgador no que toca a esta apreciação fá-lo por via da utilização da perícia); de que esse mesmo equipamento só pode ser explorado em zonas de jogo concessionadas (impossível ao cidadão comum ter esta perceção cognitiva) e que aquele equipamento com as características em causa e fora de zonas concessionadas pelo Estado, caso seja explorado ou julgado, origina uma conduta criminal/criminosa (igualmente impossível destes elementos constitutivos do elemento subjetivo estarem disponíveis no leque de informação e conhecimento do cidadão comum, mesmo que seja comerciante à 30 anos e a prova desta afirmação é a utilização que o douto julgador faz de um exame que se diz pericial, para colmatar essa falta de prova, no que respeita à explicação e fundamentação desta douta sentença recorrida).
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O recorrente conclui que a sentença recorrida violou as normas constantes dos art.ºs 374.º, n.º 2 do CPP; 1.º, 3.º, 4.º, n.º 1, als. f) e g) e 108º do D.L. 422/89 na redação do D.L. 105/95; igualmente violou o art.º 127º do CPP, porque deu como provado o facto 16 sem ter prova na sua base, socorrendo-se de uma presunção que não é elidível ou ultrapassável pela aplicação das regras de experiência comum.
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O aparelho apreendido nestes autos não permite a exploração de um jogo de fortuna ou azar, mas tão só de um jogo afim de fortuna ou azar, cuja punição se encontra prevista nos arts. 159.º e seguintes do D.L. 422/89, disposições legais não aplicadas ou sequer analisadas pela douta sentença recorrida, não obstante terem sido invocadas na contestação apresentada pelo recorrente, o que determina uma omissão decisória de uma pretensão do recorrente e como tal a nulidade da douta sentença recorrida; g) A douta sentença recorrida erra quanto à qualificação/classificação do jogo inserido no aparelho apreendido à ordem destes autos.
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A pena aplicada ao recorrente é superior à medida da culpa, caso se considere que o recorrente praticou um crime, o que não se concebe, e mostra-se desconforme com a previsão dos art.ºs 70.º e 71.º ambos do CP, que se mostram violados; a pena de multa de 150 dias aplicada ao recorrente mostra-se acima da medida da culpa do recorrente e deve ser reduzida, caso se entenda que o recorrente praticou um crime, o que não se concebe, conforme ponto II deste recurso.
Pelo exposto, entende o recorrente, com o devido respeito, que deve ser absolvido do crime pelo qual foi condenado, revogando-se a douta sentença recorrida, portanto ser de Direito e de Justiça. Caso se não entenda que o recorrente deva ser absolvido, o que não se concebe, deve a pena de multa de 150 dias ser reduzida, porque manifestamente superior à culpa do recorrente.
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Por despacho de 09.03.2015 foi o recurso admitido, fixado o respetivo regime de subida e efeito.
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Ao recurso respondeu a Exma. Procuradora-Adjunta, concluindo: A. O Tribunal a quo realizou uma correta aplicação do direito à matéria de facto provada, a qual não merece qualquer censura; B. Em face da prova e dos meios de prova, o Tribunal a quo não podia ter decidido de forma diversa; C. A Sentença valorou a prova pericial como lhe competia, de acordo com o critério do artigo 163.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Penal; D. A máquina em causa enquadra-se na definição de crime prevista no artigo 108º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 422/89, de 02 de Dezembro (e considerando as definições constantes nos artigos 1.º, 3.º, 4.º, n.º 1, alínea g), e 161º da mesma Lei): atribui pontos e não prémios às jogadas efetuadas; os pontos oscilam entre 1 e 200; os pontos vão sendo registados no mostrador e acumulados; sucedem-se jogadas automaticamente até esgotarem os “créditos” provenientes das moedas introduzidas; no final se houver créditos acumulados o jogador solicita ao explorador a quantia monetária que lhe corresponde; pelo que se trata de uma máquina em tudo semelhante a uma “slot machine” cuja exploração só pode ser realizada em casinos; E. O jogador apenas tem de colocar uma moeda e ativar a máquina carregando num botão, não tendo qualquer outra intervenção em todo o jogo, pelo que o resultado fica exclusivamente dependente da sorte ou do acaso, próprio dos jogos de fortuna e azar; F. Pelo que estamos perante um jogo de fortuna ou azar e o arguido cometeu o crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 422/89 de 02 de Dezembro; G. a sentença proferida pelo Tribunal a quo não enferma de qualquer nulidade, nem violou os artigos 1.º, 3.º 4.º, alínea f) e 108.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 422/89 de 02 de Dezembro e os artigos 127.º e 374.º, n.º 2 do Código de Processo Penal; H. O Tribunal a quo na determinação das penas e da medida das penas considerou todas as circunstâncias, que não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor e contra o agente do ilícito, em respeito pelos artigos 40.º, 71.º, n.º 1 do Código Penal.
Nestes termos e nos melhores de Direito que Doutamente se suprirão, não se deverá dar provimento ao recurso interposto pelo arguido, mantendo-se integralmente a Douta Decisão recorrida, por tal corresponder, in casu, a um ato conforme à Justiça.
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Remetidos os autos à Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, no qual, defendendo assistir razão ao recorrente quanto à não qualificação dos factos como crime de exploração ilícita de jogo, se pronuncia pela procedência do recurso, pugnando pela remessa dos autos à 1.ª instância para que a respetiva conduta seja sancionada em termos contraordenacionais.
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Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do CPP, o recorrente não reagiu.
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Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos foram os autos à conferência, cumprindo, agora, decidir.
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Fundamentação 1. Delimitação do objeto do recurso À luz do disposto no n.º 1 do artigo 412.º do CPP e conforme jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça o âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas da respetiva motivação, sem prejuízo das questões que importe conhecer oficiosamente mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito – [cf. acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19.10.1995, DR, I Série – A, de 28.12.1995].
Assim, perscrutadas as conclusões, as questões colocadas traduzem-se em saber se: - Ocorre nulidade da sentença; - Foi violado o artigo 127.º do CPP; - O jogo em causa nos autos deve, antes, ser qualificado como modalidade afim; - A pena de multa se apresenta desproporcionada.
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A decisão recorrida Ficou a constar da sentença recorrida [transcrição parcial]: «3.1. Factos provados Encerrada a Audiência de Discussão e Julgamento e esgotada a produção de prova, os seguintes FACTOS resultaram PROVADOS: 1. O arguido A... explora, a título individual e com fins lucrativos, o estabelecimento comercial designado por “CAFÉ RESTAURANTE...
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