Acórdão nº 1275/12.8TBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução23 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

J (…) e mulher, M (…), intentaram contra I (…), M (…) e A (…) a ação declarativa, de condenação, com forma de processo ordinário.

Peticionaram: Lhes seja reconhecido o direito de haver para si o prédio vendido, melhor identificado, condenando-se os Réus a reconhecê-lo e substituir os segundos réus na sua titularidade e posse mediante o pagamento pelos autores do preço e das despesas da escritura e IMT, cujo depósito vai ser feito.

Para tanto alegaram: São inquilinos através de um contrato de arrendamento comercial celebrado por escritura de trespasse do rés-do-chão do prédio urbano que identificam.

Por escritura pública lavrada em 31 de julho de 2012, os dois primeiros co-Réus venderam, na proporção de metade indivisa da propriedade plena e usufruto da restante metade indivisa do prédio daquela primeira e a nua propriedade dessa mesma metade indivisa deste último, do prédio supra descrito, ao co-Réu A (…), sem permitir aos Autores o exercício do direito de preferência que a lei lhes confere.

O co-Autor marido – e só este e não a Autora esposa -, foi notificado em 5 de julho da pretensão da venda do referido imóvel ao co-Réu A (…) pelo preço de €220.000,00, referindo aí que o preço deveria estar integralmente pago na data da escritura de transmissão, a celebrar no dia 30 de julho de 2012, pelas 15:00 horas, no Cartório Notarial de Condeixa-a-Nova.

Em tal notificação para o exercício do direito de preferência não constou a forma e tempo de pagamento do preço, nem o valor do sinal pago, não é foi feita a descrição matricial do prédio nem os elementos do registo predial, elemento essencial para a identificação do imóvel, elemento este essencial que influi decisivamente na formação da vontade de preferir ou não preferir. Razão pela qual tal notificação é nula.

A mesma foi dirigida apenas ao cônjuge marido, quando tal direito pertencia a ambos os cônjuges, uma vez que vigora entre eles o regime da comunhão de adquiridos e o direito de arrendamento do estabelecimento comercial pertence a ambos os cônjuges por tal direito ter sido adquirido já na constância do matrimónio. Não foi, por isso cumprido o disposto no artigo 1463º do Código de Processo Civil.

Na referida carta era concedido o prazo de 8 (oito) dias para exercer o direito de preferência. Tal notificação mereceu resposta por parte do autor marido, com data de 13 do mesmo mês, onde expressamente se informou que pretendiam exercer o direito de preferência na aquisição do prédio pelo preço de €220.000,00. Aí também se solicitava que fosse concedida uma dilação de um prazo nunca superior a 60 dias para a celebração da escritura de compra e venda, para que fosse ultimado o processo de financiamento iniciado logo após a notificação para o exercício do direito de preferência.

Apesar de não ter sido obtida qualquer resposta à comunicação do interesse no exercício do direito de preferência, foi em 20 de julho feita uma comunicação, via fax, em aditamento à primeira, informando que estavam criadas todas as condições para que a escritura se realizasse a favor dos autores no dia e hora pré-estabelecidos, tendo sido solicitado que fosse informado de todos os elementos necessários com vista ao pagamento do IMT, já que da notificação inicial para o exercício do direito de preferência não constavam todos os elementos.

Mais se solicitava que fosse indicado o nome da pessoa ou pessoas a quem deveria ser emitido o cheque de pagamento, a fim de ser entregue no ato da celebração da escritura de compra e venda. Apenas em 25 de julho findo foi recebida comunicação apenas em nome do autor marido, negando o direito de preferência que lhe assiste, não deixando, no entanto de referir o seguinte: “se não for encontrada uma solução consensual, que privilegiamos, importa definir quem irá assumir na escritura a qualidade de comprador”.

Em 26 do mesmo mês, via fax, foi enviada pelo autor marido nova comunicação à mandatária dos réus, informando que reitera a pretensão do exercício do direito de preferência e que por isso se apresentaria no dia e hora marcados para que a escritura de compra e venda fosse celebrada para seu nome, indo munido do meio de pagamento necessário.

Por isso, na data marcada para a celebração da escritura, o co-Autor marido apresentou-se no Cartório Notarial de Condeixa-a-Nova a fim de que fosse celebrada a escritura a seu favor, o que na realidade não aconteceu, muito embora tenha sido alertada a Senhora Notária da presença do co-Autor marido através de uma comunicação escrita e alertados os vendedores do direito que assiste, tendo, no entanto, sido vã a pretensão.

Sendo os autores inquilinos do rés-do-chão do prédio em causa, cabia-lhes tal direito por força da alínea a) do nº 1 do artigo 1091º do Código Civil.

Tal direito foi exercido cabalmente dentro do prazo concedido para o efeito. Tal direito foi-lhes negado pelos réus, mesmo sabendo do direito que foi exercido.

Citados os réus apenas co-Réu A (…) apresentou contestação.

Por exceção invocou a caducidade do direito de exercício da preferência porquanto foi-lhe comunicado tanto pela empresa mediadora como pelos co-Réus vendedores que os arrendatários (…)apesar de regularmente notificados para preferir, nada disseram, ou seja, não manifestaram qualquer intenção de aquisição do imóvel e que o aqui Autor apresentou uma resposta ao direito de preferência extemporânea e inconclusiva, ou seja, que tinha operado a caducidade do seu direito à preferência.

Ademais, apenas o Autor J (…) consta como segundo outorgante do contrato de trespasse celebrado. Para que fossem os dois (marido e mulher) partes nesse contrato, teria que se dizer que os segundos outorgantes eram os aqui Autores, (…) casados um com o outro, e não que aquele era casado com esta. Por conseguinte, ao Autor marido, ao contrário do que alega, foi sim permitido exercer o direito de preferência na transmissão do imóvel.

Acontece, porém, que o Autor marido não apresentou a sua resposta à notificação para exercer o direito de preferência dentro do prazo legalmente fixado para o efeito. De facto, tendo sido notificado para preferir, na compra e venda do imóvel, no dia 5 de Julho de 2012, a sua resposta apenas chegou ao conhecimento dos proprietários do imóvel (aqui co-Réus) no dia 17 de Julho de 2012, ou seja, depois de findo o prazo legal de oito dias. Assim, foi extemporânea a resposta do autor à notificação para exercício do direito de preferência.

Ainda que assim não fosse da resposta do Autor não se retira a sua intenção inequívoca em outorgar o contrato de compra e venda do imóvel, pois o mesmo alega que precisa de, pelo menos, sessenta dias para tentar obter um empréstimo bancário para aquisição do imóvel.

Assim, o Autor apresentou, fora do prazo legal, aos proprietários do imóvel uma situação de incerteza quanto à aquisição do imóvel, não declarou que sim, que pretendia exercer o direito de preferência e que tinha s condições necessárias para esse efeito, logo renunciou à preferência.

Mais, a alegada omissão de elementos na comunicação para a preferência não assumiu relevo material ou substancial para o Autor, pois ele só não a exerceu na altura por causas a ele imputáveis.

Deve, com base em todo o supra exposto, ser declarada a caducidade do direito de preferência do autor.

Arguiu ainda a inexistência do direito de preferência na esfera dos Autores porquanto o artigo 1091º, n.º 1, al. a) do Código Civil refere que o arrendatário tem direito de preferência na compra e venda do local arrendado há mais de três anos.

Este normativo consagra o princípio da coincidência do objeto do direito de preferência com o direito preexistente que a justifica. Por isso, ou o direito de preferência se pode exercer apenas em relação ao local arrendado ou não se pode exercer.

Ora, os autores dizem-se inquilinos do rés-do-chão, e os co- Réus vendedores pretendiam alienar todo o prédio urbano e não somente o rés-do-chão. Pelo que, os Autores, arrendatários de parte do prédio, não gozam do direito de preferência na compra e venda da totalidade do prédio.

Por impugnação impugnaram os factos vertidos nos artigos 4º, 6º, 7º, 8º, 15º, 16º, 17º, 21º, 33º a 35º, 45º, 48º, 53º da petição inicial.

De acordo com informação prestada ao Réu comprador pela sociedade mediadora imobiliária e pelos co-Réus vendedores os co-Autores foram regularmente notificados para exercer o direito de preferência na alienação do imóvel e tanto assim é que apresentaram resposta a essa notificação, contudo essa resposta além de ter sido extemporânea foi também uma renúncia ao exercício da preferência, pois os Autores alegaram que não tinham as condições financeiras necessárias para adquirir o bem imóvel.

Por conseguinte, o contrato de compra e venda celebrado entre os três réus é legalmente válido e não pode ser declarado nulo.

Mais, a eventual declaração de nulidade da venda não é oponível ao aqui réu (comprador) por a situação se enquadrar na previsão do artigo 291º do Código Civil. O réu (comprador) é titular de um direito real; esse direito foi adquirido a título oneroso; tem por objeto um bem imóvel sujeito a registo. O réu é portanto terceiro de boa-fé, pois que no momento da aquisição do imóvel aqui em referência, desconhecia, sem culpa, os alegados vícios.

2.

Prosseguiu o processo os seus termos t endo, a final, sido proferida sentença na qual se decidiu: «5.1. Reconhecer o direito de preferência dos Autores na venda do prédio urbano sito em …composto por edifício de cave, rés-do-chão, primeiro, segundo e terceiro andares, inscrito na matriz sob o artigo 640 e descrito na C. R. Predial de Coimbra sob o n.º 170; 5.2. Condenar os …a reconhecerem aos Autores o direito de preferência na venda outorgada …e, em consequência, investir os Autores na posição de compradores, mediante o pagamento ou depósito do preço aí convencionado, que corresponde a quantia de € 220.000,00.» 3.

Inconformado recorreu o réu constestante.

Rematando as suas...

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