Acórdão nº 248/09.2JALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução03 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No [já extinto] 3º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Caldas da Rainha [agora, Tribunal Judicial da Comarca de Leiria – Caldas da Rainha – Instância Local – Secção Criminal] o Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, do arguido A...

, com os demais sinais nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material, de três crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art. 171º, nº 3, a) e b), com referência ao art. 170º, do C. Penal, e de um crime de pornografia de menores na forma agravada, p. e p. pelos arts. 176º, nºs 1, b) e 4 e 177º, nº 6, do mesmo código.

Por sentença de 10 de Julho de 2014 foi o arguido condenado, pela prática dos três imputados crimes de abuso sexual de crianças, na pena de dez meses de prisão por cada um deles, pela prática de um crime de pornografia de menores, p. e p. pelo art. 176º, nºs 1, b) e 4, na pena de quatro meses e quinze dias de prisão, e em cúmulo, na pena única de dois anos e dois meses de prisão, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período com regime de prova e acompanhamento, e ainda na pena acessória de proibição do exercício de funções docentes e outras que obriguem ou possibilitem ter menores sob a sua responsabilidade, educação ou vigilância, pelo período de oito anos. * Inconformado com a decisão, recorreu o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: 1. O arguido não se conforma com a sua condenação como autor de três crimes de abuso sexual de crianças, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 171º, nº 3, als a) e b), com referencia ao artigo 170º, do Código Penal na pena de 10 (dez) meses de prisão por cada crime; 2. O Arguido recorrente não concorda, com a conclusão do Tribunal a quo, que deu como provados os seguintes factos "4 a 11) dos factos dados como provados", porquanto, 3. No entender do arguido recorrente, o depoimento da Testemunha C... , constante da Gravação dia 18/06/2014, foi incoerente fazendo um relato ilógico e não consentâneo com os restantes elementos de prova junto aos autos, e por isso, deveria o Tribunal a quo ter do mesmo tirado as seguintes conclusões: a. O Arguido Recorrente não demonstrou em qualquer fase do factos ter mostrado interesse em conhecer a menor (ponto 4); b. O Arguido Recorrente, Nesse mesmo contacto ciente da idade da menor, questionou a se já tinha maminhas e pelos na vagina (ponto 5) c. O Arguido Recorrente, tenha passados uns dias enviado duas mensagens para conta de correio electrónico com duas fotos suas, sendo uma delas, desnudado dentro de um carro; (Ponto 6) d. O arguido recorrente, tenha Conversado no MSN com a menor; (ponto 8) e. O arguido recorrente, tenha na conversa com a menor perguntado se à mesma se a sua mãe estava em casa (ponto 9) f. Que tenha de forma alguma conversado com a menor no MSN; 4. O Arguido Recorrente entende, com o devido respeito por opinião contrária, que do depoimento de C... o tribunal a quo poderia apenas concluir que: a. Que o seu depoimento não foi esclarecedor dos factos, aliás o mesmo foi contraditório em todas as suas vertentes; b. Que o documento junto aos autos (print das conversações) com a foto da testemunha e respectivo nome, deveria o tribunal apurar quem tratou o mesmo informaticamente e em que moldes o mesmo foi imprimido; c. Facto só provado por técnico informático com conhecimentos técnicos para o efeito; d. Não pode o tribunal considerar um documento válido para efeitos de prova quando tal documento não emana de quem o produz; 5. O Arguido Recorrente entende, com o devido respeito por opinião contrária, que do depoimento das restantes testemunhas de acusação (inspectores da Policia Judiciária) quanto aos factos nada trouxeram ao processo que ajudasse a esclarecer os factos; 6. O Arguido Recorrente entende o depoimento da testemunha não foi credível; 7. O Arguido Recorrente entende que ficaram por provar os factos constantes da acusação e constantes da sentença nos pontos 4. a 11 e que deve levar à sua absolvição.

  1. O Arguido Recorrente, entende que a versão dos factos relatados pela testemunha, documentos e declarações para memória futura estão perfeitamente opostas, mas o tribunal recorrido, fazendo uma errada aplicação do direito, valorizou a versão da testemunha e em consequência condenou o arguido, ou seja, existindo uma situação em que era a palavra do arguido contra a do denunciante, sem outra qualquer prova, deveria o tribunal reconhecer a dúvida e perante duas versões contrárias entre si, o Tribunal a quo condenou o arguido, em clara violação do princípio do in dubio pro reo, do princípio da presunção da inocência, previsto pelo artigo 32º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa; 9. O Arguido Recorrente entende que a prova testemunhal deveria ter sido suportada por prova documental, uma vez que constavam dos autos dados informáticos que apenas poderiam ser comprovados por técnicos, pelo que se verificou ausência total de prova, quanto aos factos susceptíveis dessa prova, designadamente quanto ao registo documental das conversas no MSN; 10. Por outro lado, por aplicação do disposto no artigo 53º, nº 1 e 2, alínea c), do Código de Processo Penal, ao Ministério Público competia sustentar a acusação de forma objectiva, fazendo prova dos factos alegados por si na acusação, não bastando para a prova dos crimes imputados ao arguido a prova testemunhal, pelo que violou a douta sentença, o previsto no aludido artigo, por omissão total de prova quanto a abuso; 11. O Arguido Recorrente entende que as declarações da única testemunha destes factos foram contraditórias quanto à data em que ocorreram os factos e à forma como ocorreram; 12. A motivação da Douta sentença, no caso dos autos, como resulta da sua leitura, é meramente expositiva, não aprofundando as razões que determinaram a formação da convicção do tribunal acerca do acervo fáctico que deu como assente e não assente. A motivação dos factos limita-se a enunciar e elencar testemunhos, não tendo procedido a uma análise crítica dos mesmos, comparando-os, o tribunal a quo bastou-se com as suas certezas, mas não devia esquecer que a decisão deve assentar numa avaliação real dos factos. O grau de certeza afirmado pela decisão não equivale à verdade, nem pode tomar o seu lugar.

  2. O uso de adjectivos como credibilidade, não passa de uso de conceitos genéricos, impregnados de subjectivismo, certezas resultantes da íntima convicção, inescrutável e não racionalizável, portanto, não analisável e incontrolável, em torno do facto a apurar.

  3. O tribunal dá crédito ao arguido apenas na parte relativa à sua actual situação pessoal. Já quanto aos restantes factos relatados, nenhuma credibilidade mereceu, no entender do Tribunal face à restante prova produzida, ora, se nenhum dos depoimentos das testemunhas inquiridas, imputou directamente ao arguido qualquer facto, o tribunal a quo tinha que explicar como chegou à conclusão de que ele foi o agente do crime 15. A imposição do dever de fundamentação tem assento constitucional, art.º 205º n.º 1 da Constituição, devendo ser levado a cabo «na forma prevista na lei», dizendo o art.º 97º, n.º 5 do Código de Processo Penal, que os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão. Concretizando o dever de fundamentação, dispõe o art.º 374º n.º 2 do Código Processo Penal, relativamente aos requisitos da sentença, que ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.

  4. A decisão recorrida, em sede de fundamentação, não procedeu ao exame crítico das provas ou ausência delas, exigido no art.º 374º n.º 2 do Código Processo Penal, como consequência do dever de fundamentação das decisões dos tribunais imposto pelo art.º 205º, n.º 1 da Constituição, violando o disposto nos referidos artigos art.º 205º, n.º 1 da Constituição, art.º 97º, n.º 5 e o art.º 374º n.º 2 ambos do Código de Processo Penal.

  5. O princípio da livre apreciação da prova, previsto no art.º 127º do Código Processo Penal, pressupõe e exige uma indicação dos meios de prova e um complementar e exigente exame crítico, de modo a que permita avaliar o porquê da decisão e o processo lógico mental que possibilitou a decisão da matéria de facto, de acordo como o aí previsto "a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente". Assim, na apreciação da prova, o tribunal é livre de formar a sua convicção desde que essa apreciação não contrarie as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos.

  6. Este Principio não pode colidir com principias fundamentais do direito como o Principio da Presunção de Inocência e ao decidir como o fez o tribunal a quo, violou do disposto no referido artigo 127º do Código de Processo Penal.

  7. No caso dos presentes autos, a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, foi insuficiente para provar os indícios da acusação nos que diz respeito aos crimes de abuso sexual de crianças; 20. O princípio da presunção de inocência é um dos principias fundamentais em que se sustenta o processo penal num Estado de Direito. O que está em causa neste princípio é, na persistência de uma dúvida razoável após a produção de prova em relação a factos imputados a um suspeito, um comando dirigido ao tribunal para «actuar em sentido favorável ao arguido» (cf. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Coimbra, 1981, p. 215).

  8. Na verdade e no caso em apreço a convicção do Tribunal a quo foi fundamentada na prova de que ao arguido havia cometido os factos, no MSN da Menor...

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