Acórdão nº 422/14.0TTLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelFELIZARDO PAIVA
Data da Resolução25 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Coimbra I – Na sua contestação, veio a AUTORIDADE NACIONAL DE PROTECÇÃO CIVIL (ANPC) arguir a incompetência do Tribunal do Trabalho, em razão da matéria, para conhecer do pedido formulado pelo Autor – A...

que consiste em: i) ver declarada a existência entre a Ré e o Autor de um contrato de trabalho por tempo indeterminado; ii) ver declarada a ilicitude do despedimento (alegadamente) verbal do Autor e consequente reintegração; e iii) na condenação da Ré no pagamento das indemnizações devidas pela cessação da Comissão de Serviço).

Para tanto alega, em suma, que entre Autor e Ré existiu, entre 01.07.2008 e 31.05.2013, um vínculo de emprego público, por via da nomeação do primeiro, em comissão de serviço, e respectiva renovação, para exercer funções de Adjunto de Operações Distrital (ADOD) do Comando Distrital de Operações de Socorro de Leiria, sendo que a jurisdição competente para dirimir os litígio emergentes de tal vínculo é a jurisdição administrativa, sendo competentes os Tribunais Administrativos e Fiscais, e não os Tribunais do Trabalho (actuais Secções do Trabalho).

Em resposta, o Autor alega que nunca esteve sujeito a vínculo que o possa reconduzir à forma de contrato de trabalho em funções públicas, concluindo pela improcedência da excepção invocada.

*** III – Na sequência da arguida incompetência absoluta foi proferido a decisão que a seguir se transcreve: “O artigo 64º do Código de Processo Civil prescreve que “São da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional”.

Por sua vez, o artigo 211º da Constituição da República Portuguesa (CRP) dispõe, no seu nº 1, que “Os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais”.

O art. 126º, nº 1, al. b), da Lei da Organização do Sistema Judiciário estabelece que, em matéria cível, compete às secções do trabalho conhecer: “b) Das questões emergentes de relações de trabalho subordinado e de relações estabelecidas com vista à celebração de contratos de trabalho”.

No ordenamento jurídico vigente, o art. 1152º do Cód. Civil dispõe que “Contrato de Trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta”, sendo que, por sua vez, e em termos não substancialmente divergentes, o art. 11º do Código do Trabalho prescreve que “Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob autoridade destas”.

Nos termos do artigo 212º, nº 3, da CRP, “Compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações administrativas e fiscais”.

Os tribunais administrativos e fiscais integram, pois, face à lei fundamental, a categoria dos tribunais com estatuto autónomo e com competência específica para o julgamento dos litígios emergentes de relações administrativas e fiscais.

No mesmo sentido, dispõe o artigo 1º, nº 1, da Lei nº 13/2002, de 19/02 (diploma que aprova o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais - ETAF) que “ Os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”.

Por sua vez, o artigo 4º do ETAF determina o âmbito da jurisdição administrativa, quer através de enumerações dos litígios nela incluídos (cfr. nº 1), quer através dos excluídos (cfr. nºs 2 e 3).

Aí se dispõe, ao que agora nos interessa, na al. d) do nº 3, que “Ficam igualmente excluídas do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal: d) A apreciação de litígios emergentes de contratos individuais de trabalho, ainda que uma das partes seja uma pessoa colectiva de direito público, com excepção dos litígios emergentes de contratos de trabalho em funções públicas” (sublinhado nosso).

* A competência do tribunal em razão da matéria afere-se de harmonia com a relação jurídica controvertida, tal como a configura o autor, ou seja, nos termos em que foi proposta a acção, nomeadamente pelo pedido e pela causa de pedir (vide, neste sentido, entre outros, Acórdãos do STJ de 20/05/1998, in BMJ 477-389, de 12/01/94, in CJ 1994-1-38, de 03/02/87, in BMJ 364-591; na doutrina, vide, a título de exemplo, A. dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 1º, p. 110).

Assim, o critério determinante para se aferir da competência material do tribunal não é tanto o de saber quem pratica o acto ou omissão, mas qual a natureza do acto em causa.

Há, pois, que ter em consideração os termos em que a acção foi proposta e a natureza do acto praticado (vide, neste sentido, Ac. da Relação do Porto de 27/04/2004, disponível in www.dgsi.pt/jtrp), numa outra formulação, torna-se necessário recorrer a certos índices de competência “olhando-se aos termos em que foi proposta a acção – seja quanto aos seus elementos objectivos (natureza da providência solicitada ou do direito para a qual se pretende tutela judiciária), seja quanto aos elementos subjectivos (identidade das partes). A competência do Tribunal – ensina REDENTI – afere-se pelo quid disputatum (quid decidendum, em antítese com aquilo que será mais tarde o quid decisum); é o que tradicionalmente se costuma exprimir dizendo que a competência se determina pelo pedido do Autor” (Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, 1979, p. 91).

* Partindo das considerações que antecedem, importa, pois, apreciar se...

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