Acórdão nº 3079/12.9TBCSC.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Outubro de 2015
Magistrado Responsável | CARLOS MOREIRA |
Data da Resolução | 06 de Outubro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA.
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A Digna Magistrada do MºPº requereu contra J (…) e P (…) a regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente ao filho de ambos T (…).
Alegou, para tanto, que os pais não vivem juntos e que não estão de acordo quanto a tal exercício.
Frustrou-se o acordo na legal conferência.
Foi proferida decisão provisória, tendo o menor sido confiado à mãe.
Tal regime, e em função das vicissitudes várias que se foram sucedendo, foi alterado, tendo, vg., em 18.02.2014, sido alargado o regime de visitas do progenitor ao menor.
Foram instruidos os autos com vários relatórios sociais e médico-psicológicos sobre os pais e alguns seus familiares.
Os pais produziram alegações.
Tendo a mãe ido trabalhar para o Qatar, em Outubro de 2014, alegou no sentido de ser autorizada a levar consigo o menor.
Ou que ele fique confiado à sua tia M (…) e marido J (…), pessoas que convivem com o seu filho desde os 18 meses de idade, pelo prazo de 3 semanas e até que a requerida faça prova nos autos das suas condições habitacionais e de apoio ao T (…).
No entanto, a guarda do menor foi alterada, tendo ele sido confiado ao pai.
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Realizou-se a audiência de discussão e julgamento após o que foi proferida sentença na qual foi decidido: «1 – O menor deverá continuar a residir com o pai, a quem cabe a decisão sobre as questões da vida corrente do menor; 2 - O exercício das responsabilidades parentais no que tange às questões de particular importância para a vida do menor caberá, em conjunto, a ambos os progenitores; 3 - A requerida (progenitora) poderá visitar o menor e estabelecer contato, por telefone ou internet, com o menor, sempre que assim o entenda, sem prejuízo dos respetivos horários de descanso e escolares; 4 - A requerida (progenitora), enquanto se encontrar a residir no estrangeiro, sempre que venha a Portugal, poderá ter o menor consigo até um mês seguido, desde que avise o requerido (progenitor) com 15 dias de antecedência e sem prejuízo dos horários escolares do menor; 5 – A requerida (progenitora) deverá contribuir com o valor mensal, a título de alimentos, de €250, 00, a pagar até ao último dia de cada mês, com início no corrente mês de novembro.
6 - A pensão de alimentos fixada será atualizada anualmente (em Janeiro de cada ano) de acordo com a evolução do índice de inflação publicado pelo INE, com início em Janeiro de 2015.
7 - A progenitora deverá suportar metade das despesas escolares, médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada, mediante exibição do competente recibo/fatura pelo progenitor e a liquidar com a prestação alimentícia do mês seguinte ao da exibição.» 3.
Inconformada recorreu a mãe.
Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) Contra alegaram o progenitor e a Digna Magistrada do Mº Pº, tendo, ambos, pugnado pela manutenção do decidido.
(…) 4.
Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção -, o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª - Nulidade da sentença por falta de fundamentação.
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– Alteração da decisão sobre a matéria de facto.
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– (Im)procedência da ação: atribuição, ou não, da guarda normal do menor à mãe.
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Apreciando.
5.1.
Primeira questão.
5.1.1.
A recorrente invoca a nulidade da sentença com base no artº 615º do CPC.
Porém, e bem vistas as coisas – cfr. fls.1152 - a nulidade a que ela se reporta é a nulidade da decisão sobre a matéria de facto.
Pois que entende que nesta não estão especificados os meios de prova, as razões por que lhe foi atribuida certa relevância e credibilidade, e o peso que tiveram na formação da convição.
E, não obstante, agora, com o NCPC, a decisão sobre a matéria de facto e respetiva fundamentação, não constituir decisão autónoma, antes sendo incluída na sentença, existe, e deve ser atendida, uma diferenciação entre a fundamentação da decisão sobre a matéria de facto e a fundamentação da sentença.
Diferenciação que já era perspetivada e defendida no domínio do CPC anterior, por reporte aos artºs artº 653º nº 2 e a al. b) do nº 1 do artº 668º.
Já então se entendendo que: «aquele primeiro dever aponta exclusivamente para a justificação da concreta base de apuramento da matéria de facto «qua tale», enquanto que o segundo deixa subentender a justificação ou motivação da decisão final «vis a vis» o direito substantivo concretamente aplicável» - cfr. Ac. do STJ de 06.12.2004 dgsi.pt.p.
Este entendimento mantém-se atual, pois que, não obstante a alteração meramente circunstancial/formal de a decisão sobre a matéria de facto constar na sentença, lato sensu, é evidente, que as duas decisões – a sobre os factos provados e não provados e a decisão final - são, na sua génese, natureza e finalidade, lógica e teleológicamente, diferentes, e por isso obedecendo a critérios e requisitos especificos e não necessáriamente coincidentes.
E a tal autonomia aludindo, ou a mesma deles se retirando, os nºs 3 e 4 do artº 607º do CPC, sendo que aquele se reporta à sentença final, stricto sensu, e este se refere à anterior decisão sobre os factos.
Aliás, esta diferenciação repercute-se no sancionamento do vício da falta de fundamentação.
A falta de fundamentação da sentença acarreta a sua nulidade – al. b) do nº1 do artº 615º.
A falta ou insuficiente fundamentação da decisão de facto implica o reenvio do processo à 1ª instância para que esta a efetive – al. d) do nº2 do artº 662º do CPC.
Já no que tange ao vício da omissão de pronúncia ele reporta-se à sentença na sua vertente final.
Assim sendo, apreciemos.
5.1.2.
Da falta ou insuficiente fundamentação da decisão de facto.
Tal como o dever de fundamentação dos sentença, o dever de fundamentação da decisão sobre os factos é a decorrência lógica do disposto nos artºs 205º nº 1 da Constituição e 154º nº 1 do CPC que impõem o dever de as decisões sobre qualquer pedido controvertido ou sobre qualquer dúvida suscitada no processo serem sempre fundamentadas.
A motivação tem, essencialmente, uma dupla finalidade: por um lado convencer os interessados do bom fundamento e da correção da decisão, o que implica a sua legitimação; por outro lado permitir ao tribunal superior, em caso de recurso, a possibilidade da sua sindicância.
Assim, e por um lado, a motivação da decisão sobre a matéria de facto não pode reconduzir-se ao mero enunciado genérico dos meios de prova que conduziram ao resultado enunciado.
O que poderia descambar num mero juízo arbitrário de convicção e, como tal, insindicável, sobre a realidade, ou não, de um facto.
Antes devendo ser especificados os concretos meios de prova, submetê-los a uma análise crítica e explicitado o processo lógico-dedutivo que levou à convicção expressa na resposta, o como e o porquê dessa convicção – cfr. J. Pereira Batista, Reforma do Processo Civil, 1997, p.90 e segs. e Abílio Neto in Breves Notas ao CPC, 2005, p.189.
Mas, por outro lado, esta exigência não deve ser levada a limites de exagero.
Até porque uma fundamentação exaustiva e perfeita é de muito difícil e, por vezes, impossível, consecução.
Destarte, o julgador não é obrigado a descrever, de modo minucioso, o processo de raciocínio ou o iter lógico-racional que incidiu sobre a apreciação da prova submetida ao respectivo escrutínio; basta que enuncie, de modo claro e inteligível, os meios e elementos de prova de que se socorreu para a análise crítica dos factos e decidir como decidiu – cfr. Ac.
da RC de 28.03.2000, CJ 2º, 22 e Acs. do STJ de 06.12.2004, dgsi.pt, ps. 04B3896, de 02.10.2008, p. 07B1829 e de 14.01.2009, p.08S934 .
Assim: «…o que deve e pode exigir-se do julgador é a explicação das razões que objectivamente o determinaram a ter ou não por averiguado determinado facto. Quando o juiz decide que certo facto está provado é porque foi levado a esta conclusão por um raciocínio lógico, que tem de ter, na sua base, elementos probatórios produzidos. O que se determina nesta disposição é que o juiz revele essa motivação, de modo a esclarecer o processo racional que o levou à convicção expressa na resposta…» - Rodrigues Bastos, Notas ao CPC. vol. III, ed. de 2001, em anotação ao artigo 653º.
Ou seja: «o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão…» - M. Teixeira de Sousa, in Estudos sobre o Novo Processo Civil, págs. 348.
Decorrentemente pode considerar-se que se cumpriu a exigência do segmento normativo do nº4 do artº 607º do CPC quando o juiz procedeu a uma explicitação dos diversos meios de prova que serviram para formar a sua convicção, bem como da sua valoração, o que passa pela menção da sua relevância e da razão da credibilidade que lhe mereceram.
O que, repete-se, pode efetivar de uma forma não necessariamente exaustiva, mas suficientemente convincente, de acordo com as regras da experiência comum e da lógica.
Podendo entender-se que estão satisfeitas as exigências legais de fundamentação quando, vg., é indicada a razão de ciência das testemunhas, são referidos os motivos por que mereceram a credibilidade do Tribunal, e é feita a articulação dos depoimentos prestados com os outros meios de prova– cfr. Ac. do STJ de 25.03.2004 cit.
Pois que, nestes casos - e mesmo que na decisão exista alguma deficiência ou insuficiência - ela não poderá taxar-se de arbitraria e será, em todo o caso, e que é o que realmente interessa, sindicável.
Acresce que já no domínio do CPC anterior a doutrina entendia que o então artº 712º nº5 do CPC apenas tinha aplicação: «…quando a resposta não fundamentada seja essencial para a decisão da causa e não hajam, sequer, sido indicados...
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