Acórdão nº 282/12.5TBMGL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução06 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I - A Causa: 1. A (…), divorciada, contribuinte n.º (...) , residente (…), Mangualde, veio intentar acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra J (…), divorciado, contribuinte n.º (...) , residente (…) Mangualde, pedindo que este seja condenado a ver declarada a perda da doação feita ao Réu, do prédio inicialmente descrito sob o n.º527 e inscrito sob o n.º47º, rústico, da freguesia de (...) , desanexando-se o prédio adquirido por compra registado pela apresentação sob o n.º2083 de 30/01/2009, identificado no art.º 5º da petição; a reconhecer a perda desta liberalidade referida, revertendo tal prédio para a A. e a efectuar os pagamentos necessários à desoneração da propriedade revertendo a favor da A., livre de qualquer ónus e encargos, tal prédio.

Alegou para tanto, e em síntese, que tendo vivido como marido e mulher desde 2005, contraiu casamento com o Réu, sem convenção antenupcial, em 25.08.2007, o mesmo veio a ser dissolvido por divórcio, em 28.03.2012, sendo que, dois dias antes do casamento, procedeu à doação de um prédio ao Réu, a qual perdeu justificação com o divórcio ora decretado, pois que não o teria doado se soubesse que se iria divorciar.

Acrescentou que tal prédio lhe havia sido doado pelos seus pais, 9 meses antes, quando já vivia maritalmente com o Réu, com o propósito do extinto casal construir uma moradia para onde os pais da A. pudessem ir residir com eles.

Aduziu que a doação se deu a pedido do Réu, invocando este que se fosse necessário dinheiro para as obras o prédio já estaria na sua titularidade para tratar de empréstimos licenças e demais documentação, ao que aquela acedeu, confiante no projecto, sendo que gorado tal projecto pretende agora o Réu vender o prédio.

Conclui referindo que foi por causa do casamento que doou o prédio em questão, em espirito de liberdade e em consideração ao casamento, o que não teria feito se divorciada, pelo que deve o benefício da doação ser direccionado para os seus filhos e o Réu condenado à reversão da propriedade daquele prédio com os inerentes encargos, nos termos dos arts.º 1791º, n.º1 e 1760º, n.º1, al. b), ambos do Código Civil.

Juntou documentos, arrolou testemunhas e conclui pela procedência da acção.

2. Regularmente citado, o Réu contestou, defendendo-se por excepção e impugnação, alegando que se verifica uma falta de objecto na acção pois a mesma visa, segundo a Autora, declarar a perda da doação de um prédio rústico ao Réu, sendo que, como a própria Autora afirma, tal prédio, na configuração constante da doação, já não existe; acrescentou que tendo casa na freguesia da Freixiosa, onde a A. viveu com aquele e aí constituíram casa de morada de família, não fazia qualquer sentido que o então casal planeasse construir casa no terreno que a A. lhe doou livremente e sem condições, o mesmo tendo sucedido por parte de seus pais àquela (nomeadamente nunca aqueles tendo colocado com condição que tal prédio não pudesse sair da família); estando a A. e R. a viver e a trabalhar em Mangualde nunca iriam viver para Gouveia, tendo de percorrer mais de 20km por viagem para regressar a Mangualde, para trabalhar; ainda que, por hipótese, fosse verdade o propósito das partes construírem casa para depois aí passarem a viver e ainda com os pais da A., não seria sempre desejável que a A. guardasse para si o bem doado e fizesse ela as diligências e assinasse os documentos para a construção(?), não havendo qualquer necessidade de doar o prédio ao R. (até se os planos passavam pelo casamento entre os dois).

Acrescentou que o prédio doado não lhe trouxe um nível de vida a que não estava habituado, pois dele o mesmo não tirou rendimentos, nem sequer o vendeu ainda, antes pagando imposto pelo mesmo.

Explicou que o prédio doado já não existe na configuração constante da doação pois que o artigo doado estava descrito na Conservatória do Registo Predial de Gouveia sob o n.º 527.º e tinha a área de 25.918m2; após a doação, o Réu veio a adquirir uma parcela do prédio contíguo descrito na mesma Conservatória sob o n.º 544, no total de 3.372,10, sendo então que o primitivo prédio descrito sob o n.º 527 passou a ter a área total de 29 290,10m2, o que ainda hoje sucede; esse prédio está inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 47 da freguesia de Vale Cortês da Serra, concelho de Gouveia; assim, o primitivo prédio doado está descrito sob o n.º 527.º, a este o R. anexou parte do prédio descrito sob o n.º 544 e, o novo prédio, que já não o doado pela A., passou a estar descrito sob o n.º 546.º (provindo a actual descrição do prédio n.º 546 da anexação do prédio descrito sob o n.º 527 e parte do prédio descrito sob o n.º 544.º).

No mais, impugnou a matéria alegada e deduziu reconvenção, peticionando que a A. seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 50000,00, a título de benfeitorias que aquele realizou no novo prédio.

Alegou, para tanto, que limpou o mato; colocou novos esteios e cordões para a vinha; plantou videiras e diversas árvores de fruto, passando o mesmo a ter capacidade construtiva; para proceder a legalização dessa anexação, pagou a um topógrafo que se deslocou ao local por duas vezes; suportou ainda as despesas com os registos e a referida escritura pública, sendo que com tais benfeitorias, aquisição de cerca de 3372 metros quadrados e despesas, despendeu não menos de €50.000,00 que fazem hoje parte integrante do prédio que surgiu com a anexação e dele não podem ser retiradas sem que o prédio perca valor, sendo que, a ser dada razão à A., sempre esta teria de proceder por forma a que a aquisição de 3372m2 feita pelo R. ficasse sua única e exclusiva propriedade, desanexando-se do actual prédio e a pagar ao R. o referido valor de benfeitorias.

Conclui pela improcedência da acção.

3. De fls. 76 a 78 foi apresentada réplica pela Autora, onde esta aproveitou para corrigir o pedido inicialmente formulado (nos moldes a que acima já demos conta e que foi admitido por despacho de fls. 172 e 173) e respondeu à reconvenção, defendendo-se por impugnação (a que respondeu o Réu a fls. 81).

Oportunamente, foi proferida decisão, onde se consagrou que: «Pelo exposto e nos termos referidos supra, decide-se julgar a presente acção improcedente e, em consequência, absolve-se o Réu (…)do peticionado pela Autora (…).

Em face do exposto fica prejudicada a demanda reconvencional».

* A (…), A.

nestes autos, não se conformando com a, proferida nos autos, veio dela interpor Recurso de Apelação, alegando e concluindo que: (…) J (…), Réu, notificado das alegações da recorrente, veio apresentar as suas contra-alegações, que pugnaram pela improcedência do recurso interposto, por sua vez concluindo que: (…) * II. Os Fundamentos: Colhidos os Vistos legais, cumpre decidir: Matéria de facto assente, na 1ª Instância, e que consta da sentença recorrida: II.1 Nos termos do art.º 607º, n.º4 do C.P.C., considerando os factos admitidos por acordo, confessados e provados por documentos, realizada a audiência de julgamento, por reporte aos temas da prova, dela resultaram provados os seguintes factos: 1. A Autora e Réu contraíram casamento, sem convenção antenupcial, em 25/08/2007. (artigo 1º da petição inicial) 2. Do referido casamento não nasceram filhos. (artigo 2º da petição inicial) 3. O casamento da Autora e Réu foi dissolvido por divórcio, decretado por sentença de 28/02/2012, e transitado em julgado em 28/03/2012, proferida no âmbito do processo n.º569/11.4TBMGL-A. (artigo 3º da petição inicial) 4. A Autora conheceu o Réu algum tempo antes do casamento, com quem passou a viver “maritalmente” desde início de 2005 a 25/08/2007. (artigo 4º da petição inicial) 5. A Autora em 23/08/2007 (dois dias antes do casamento), realizou a doação ao Réu de um prédio rústico, sito à “ (...) , inscrito na matriz rústica 47º da freguesia de (...) , registado sob o n.º527, composto por terreno de oliveiras, batata, pinhal, árvores de fruto e pastagem e vinha, com 26.665m2 e casa térrea para guarda de Alfaias e produtos agrícolas com 65m2, tendo o Réu anexado, a este prédio, um outro confinante, descrito sob o n.º545, de onde resulta a descrição n.º546. (artigo 5º da petição inicial) 6. A doação referida em 5. teve lugar por escritura pública celebrada no Cartório Notarial de Mangualde junta de fls. 15 a 18, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (artigo 5º da petição inicial) 7. A Autora se soubesse que se iria divorciar do Réu, não teria feito a sobredita doação. (artigo 7º da petição inicial) 8. A Autora recebeu, por doação celebrada em 30/11/2006, dos seus pais, (…), o dito prédio, atribuindo-lhe o valor de 536.42€, nos termos da escritura pública junta de fls. 18 a 21, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (artigos 8º e 9º da petição inicial) 9. Já vivendo em termos análogos aos cônjuges com o Réu. (artigo 10º da petição inicial) 10. Em 30.11.2006, embora os pais da Autora tivessem outro filho, este encontra-se nos EUA e era com a Autora, com quem mais conviviam, devido ao afastamento daquele, durante cerca de 30 anos. (artigo 12º da petição inicial) 11. O prédio doado tinha à data da doação referida em 5. O valor patrimonial de 536,42€. (artigo 17º da petição inicial) 12. O Réu, não obstante se ter malogrado tal projecto e depois de divorciado, pretende agora vender tal prédio. (artigo 19º da petição inicial) 13. Colocando no mesmo, placas, nesse sentido da venda. (artigo 20º da petição inicial) 14. Esta atribuição patrimonial foi em espírito de liberalidade e a Autora não teria intenção de a fazer se já divorciada do Réu. (artigo 23º e 24º da petição inicial) 15. A Autora e o Réu já têm filhos de relações anteriores à que ocorreu entre as partes. (art.º 8º da contestação) 16. O réu tem casa na freguesia da Freixiosa, onde a Autora viveu com aquele e aí constituíram casa de morada de família (artigo 11º da contestação).

17. O terreno em causa foi doado pela Autora...

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