Acórdão nº 35/12.0PFVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução14 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: * No âmbito da Instrução nº 35/12.0PFVIS que corre termos pelo J1 da Inst Central - Sec. Inst. Criminal da comarca de Viseu, o JIC proferiu decisão instrutória de não pronúncia do arguido, com os demais sinais dos autos, por um crime de usurpação, p.p. Artigo 194º, 195º e 197º do CDADC, ou qualquer outro, mantendo o despacho de arquivamento.

* Inconformada com o despacho de não pronúncia recorreu a assistente A... , pedindo a revogação daquele e a sua substituição por outro que pronuncie o arguido pelo aludido crime de usurpação.

Apresentou para tal as seguintes conclusões: “a) Nos presentes autos, entendeu a Meritíssima Juiz "a quo" não pronunciar o arguido B...

pelo crime de usurpação; b) Já que entendeu a Meritíssima Juiz "a quo" não ser necessário o arguido ter autorização dos autores, ou de quem os represente, para proceder à emissão de obras radiodifundidas no seu estabelecimento comercial; c) A recorrente entende que a decisão merece reparo e deverá ser alterada por outra que pronuncie o arguido pela prática de um crime de usurpação; d) Porquanto, em 30 de Junho de 2012, pelas 00h25, o arguido, B... , na qualidade de gerente da sociedade "T ... , Lda.", que explorava o estabelecimento comercial "T ... " promovia a execução pública de obras intelectuais protegidas pelo direito de autor.

e) Para efeito da difusão das obras, o arguido tinha no seu estabelecimento, um equipamento de som, ligado a três colunas, de som através das quais o som era propagado.

f) O arguido não tinha qualquer autorização dos autores, ou da entidade que os representa, a ora Recorrente, para difundir obras intelectuais protegidas para os clientes que estavam no estabelecimento; g) A comunicação da obra em local público é uma utilização diferente da radiodifusão, que implica a obtenção de uma autorização diferente daquela que o autor, ou o seu representante, haviam concedido para efeitos de radiodifusão. Assim, a autorização concedida à entidade de radiodifusão não se estende ao explorador de um estabelecimento comercial, e, por consequência, este não se pode servir da autorização que havia sido concedida àquela; h) Sempre que uma obra radiodifundida seja utilizada em local público, num estabelecimento comercial, como no caso dos autos, será sempre necessária autorização dos autores, certo sendo que a sua falta configura a prática de um crime de usurpação previsto e punido nos termos do artigo 195° do CDADC; i) Termos em que a decisão recorrida deverá ser alterada por outra que condene o arguido pela prática de um crime de usurpação; j) A decisão recorrida sustenta uma interpretação diferente da Lei, que resulta de uma interpretação incorrecta do conceito de comunicação de obra ao público, que tem origem no direito da União Europeia, em particular na Directiva 2001/29/CE; I) A generalidade das legislações internas dos países pertencentes à União Europeia, as quais de baseiam na Convenção de Berna, e, mais recentemente, se sustentam nas Directivas aprovadas e já transpostas para os diversos ordenamentos jurídicos internos, tal como acontece com o ordenamento jurídico português, consagra, de forma muito clara e evidente, o direito dos autores receberem a remuneração que lhes é devida pela comunicação de obras em local público; m) A orientação doutrinária sustentada na decisão de que se recorre coloca em causa o princípio da aplicação harmonizada e coerente do direito de autor na União Europeia, n) Embora este entendimento não ofereça dúvidas à recorrente, caso assim não se entenda, sugere a recorrente que o Tribunal as afaste, colocando as seguintes questões ao Tribunal de Justiça: (i) O conceito de comunicação de obra ao público previsto no artigo 3º n.° 1 da Directiva 2001/29/CE deve interpretar-se como abrangendo a transmissão de obras radiodifundidas, em estabelecimentos comerciais como bares, cafés, restaurantes, ou outros com características semelhantes, através de aparelhos televisores receptores e cuja difusão é ampliada por colunas e/ou amplificadores, configurando, nessa medida, uma nova utilização de obras protegidas pelo direito de autor? (ii) A utilização de colunas e/ou amplificadores, ou seja, de meios técnicos distintos do aparelho televisivo receptor para ampliar a recepção de som influencia a resposta à questão anterior? Termos em que, e nos mais de direito, se requer a V. Exas., Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação de Coimbra, colham a argumentação expendida, revogando a decisão instrutória recorrida, substituindo-a por outra que pronuncie o arguido B... pela prática do crime de usurpação, p. e p. pelos artigos 195° e 197° do CDADC.” Respondeu o MP pugnando pela improcedência do recurso tendo para tal formulado as seguintes conclusões: 1 - Não se verificam in casu condições para revogação da decisão de não pronúncia do arguido.

2 - A instalação das colunas ligadas ao rádio nada acrescentava ou alterava à emissão.

3 - O STJ uniformizou e fixou jurisprudência, no Acórdão n.º 15/2013, de 13/11, publicado no D.R. de 16 de dezembro, considera que a distribuição do som feita por colunas distribuídas por vários pontos do estabelecimento comercial, que ampliam o som, não sendo estas parte integrante do televisor ou radiofonia, não extravasa a mera receção, que é livre, não configurando assim uma nova transmissão do programa.

Assim, mantendo-se a douta decisão que não pronunciou o arguido, farão, Vossas Excelências, como sempre, e mais uma vez, JUSTIÇA.

* Respondeu também o arguido, nos seguintes termos: Parece estar em questão a interpretação do significado do n.º 2 do artigo 149° do CDADC: “Depende (...) de autorização a comunicação da obra em qualquer lugar público por qualquer meio que sirva para difundir sinais, sons ou imagens”. Sendo certo que o n.º 3 acrescenta ainda ser “lugar público todo aquele a que seja oferecido o acesso, implícita ou explicitamente, mediante remuneração ou sem ela e ainda que com reserva declarada do direito de admissão”. O artigo 155° prevê ainda que “É devida igualmente remuneração ao autor pela comunicação pública da obra radiodifundida, por altifalante ou por qualquer outro instrumento análogo transmissor de sinais, de sons ou de imagens”.

Ora, a doutrina e a jurisprudência portuguesas consideram maioritariamente que é necessário distinguir entre a mera receção e a reutilização da obra, que supõe uma certa “estrutura técnica organizativa” (v. Acórdão STJ n.º 15/2013, Diário da República, 1.

a série - N.° 243 - 16 de dezembro de 2013), só neste segundo caso se devendo conferir ao autor da obra direito a remuneração.

Refere o Acórdão do STJ n.º 15/2013 que o n.º 2 do artigo 149.º “tem de reportar-se a situações em que a transmissão acrescenta, modifica ou inova, constituindo assim uma nova utilização da obra. (...) Essa nova utilização passa necessariamente por uma qualquer modificação por meios técnicos na forma de receção, em ordem a aproveitá-la para produzir um efeito visual ou sonoro espetacular, para criar uma encenação que a mera receção do programa radiodifundido não provocaria. Será esse normalmente o caso quando a receção é convertida ela própria num espetáculo, organizado em estabelecimentos públicos, em tomo de eventos desportivos ou musicais, haja ou não entradas pagas, mas publicitado, eventualmente com um arranjo ou decoração especial do espaço, tudo com vista à captação de uma audiência alargada, pelo menos mais alargada do que aquela que normalmente acorreria ao estabelecimento.” (V., neste sentido o Ac. do Tribunal de Justiça da...

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