Acórdão nº 15/11.3TBFND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução20 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

AP (…) e mulher AM (…) instauraram contra JM (…) e outros, ação declarativa, de condenação, com processo ordinário.

Pediram, nuclearmente: Se declare que o contrato de arrendamento no qual o autor é arrendatário se encontra válido e eficaz até 31 de Dezembro de 2015.

Para tanto, alegaram, em sumula: Celebrou o autor com, o pai dos réus, entretanto falecido, contrato de arrendamento rural atinente a prédio que identificam.

Os réus exigiram-lhe que entregasse o prédio até final de dezembro de 2010.

Porém, perante o anuído e a lei aplicável e porque dos réus o autor não recebeu qualquer aviso para a denuncia, o contrato renovou-se em 01.01.2011.

Na verdade, o autor não tomou conhecimento da alegada denúncia por parte dos réus.

Os réus contestaram, por exceção, por impugnação e deduzindo o José, pedido reconvencional.

Alegaram que apenas o réu JM (…) é parte legítima, pois que o prédio em causa apenas a este pertence.

Este réu mais aduziu que os herdeiros, por carta de 24.06.2008, comunicaram ao autor a sua vontade de denunciaram o contrato, não aceitando a sua renovação a partir de 010.01.2011.

Que os autores têm mais propriedades e que apenas querem manter a posse do prédio em causa para receberam as ajudas compensatórias.

Que a ocupação do prédio pelos autores lhes está a causar prejuízos, ainda não quantificados mas não inferiores a 25.000 euros.

Pedem: A improcedência da ação.

E, em reconvenção, que os autores sejam condenados a desocupar o prédio e a indemniza-lo pelos prejuízos sofridos e liquidar oportunamente.

  1. Prosseguiu o processo os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido: «Pelo exposto, ao abrigo do que vai nos artºs 224º, 875º, 1311, 483º e 496º do Código Civil, 542º do Código de Processo Civil, 7º do Código de Registo Predial e 39º, nº 2, alª a), 26º e 30º do DL nº 294/2009, de 13.10: Absolvo o réu JM (…) de todos os pedidos formulados pelos autores AP (…) e mulher AM (…); Condeno os autores/reconvindos AP (…) e mulher AM (…) em todos os pedidos reconvencionais, nomeadamente: 1) Reconhecerem que o prédio em litígio nos autos é pertença do réu JM (…) e a desocuparem-no imediatamente; 2) A indemnizarem o réu/reconvinte JM (…) pela sua ocupação indevida, desde 1 de janeiro de 2011 e até à efetiva entrega do prédio, pelo rendimento do prédio estimado anualmente, dividido por 365 e multiplicado pelo número de dias de ocupação por parte dos autores/reconvindos, a liquidar em execução de sentença; 3) Como litigantes de má fé, fixando-se em 8 UC´s a multa devida.» 3.

    Inconformados recorreram os autores.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) Inexistiram contra alegações.

  2. Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª –Alteração da decisão sobre a matéria de facto.

    1. - Procedência do pedido dos autores e improcedência do pedido reconvencional dos réus.

    2. – Litigância de má fé dos autores.

  3. Apreciando.

    5.1.

    Primeira questão.

    5.1.1.

    Os recorrentes arguiram, nas alegações de recurso, a nulidade da audiência de discussão e julgamento com fundamento na inaudibilidade de várias partes dos depoimentos das testemunhas, máxime de (…).

    O Sr. Juiz a quo conheceu de tal nulidade por que entendeu, sufragado em jurisprudência atinente, que no atual regime processual, a mesma deve ser conhecida em primeira instancia e não na instância recursiva pelo tribunal ad quem.

    E, no seguimento de tal conhecimento, desatendeu tal arguição no entendimento de a mesma se mostrava extemporânea, e julgando-a sanada.

    E, na verdade, assim é.

    Perante o disposto no artº 155º nºs 3 e 4, concatenado com o disposto no artº 630ºnº 2 do CPC, tem de concluir-se, tal como defendido no Aresto desta Relação de 10.07.2014, p.64/13.7T6AVR, citado na decisão, que a nulidade processual inominada decorrente da deficiente gravação, ou da falta de gravação, da prova testemunhal, não é recorrível, mas apenas reclamável perante o juiz do processo.

    Pelo que bem andou o Sr. Juiz ao conhecer de tal invocado vício.

    E dele conhecendo, desatendeu-o, por extemporâneo.

    Este despacho transitou em julgado.

    Temos, assim, que a questão está definitivamente decidida, e que os recorrentes não podem invocar tal nulidade nesta instância recursiva.

    5.1.2.

    Importa, pois, apreciar a questão à luz da prova efetivada, a qual, aliás, na vertente testemunhal, e na sua essencialidade relevante, é percetível e sindicável.

    Assim, e desde logo perante os princípios: Urge ter presente que no nosso ordenamento vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, e fixa a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido -artº607 nº5 do CPC.

    Perante o estatuído neste artigo exige-se ao juiz que julgue conforme a convicção que a prova determinou e cujo carácter racional se deve exprimir na correspondente motivação – cfr. J. Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 3º, 3ªed. 2001, p.175.

    O princípio da prova livre significa a prova apreciada em inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada externamente; mas apreciada em conformidade racional com tal prova e com as regras da lógica e as máximas da experiência – cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 3ª ed. III, p.245.

    Acresce que há que ter em conta que as decisões judiciais não pretendem constituir verdades ou certezas absolutas.

    Pois que às mesmas não subjazem dogmas e, por via de regra, provas de todo irrefutáveis, não se regendo a produção e análise da prova por critérios e meras operações lógico-matemáticas.

    Assim: «a verdade judicial é uma verdade relativa, não só porque resultante de um juízo em si mesmo passível de erro, mas também porque assenta em prova, como a testemunhal, cuja falibilidade constitui um conhecido dado psico-sociológico» - Cfr. Ac. do STJ de 11.12.2003, p.03B3893 dgsi.pt.

    Ademais a convicção do juiz é uma convicção pessoal, sendo construída, dialeticamente, para além dos dados objetivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, nela desempenhando uma função de relevo não só a atividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis e mesmo puramente emocionais – AC. do STJ de 20.09.2004 dgsi.pt.

    Nesta conformidade - e como em qualquer atividade humana - existirá sempre na atuação jurisdicional uma margem de incerteza, aleatoriedade e erro.

    Mas tal é inelutável. O que importa, é que se minimize o mais possível tal margem de erro.

    O que passa, como se viu, pela integração da decisão de facto dentro de parâmetros admissíveis em face da prova produzida, objetiva e sindicável, e pela interpretação e apreciação desta prova de acordo com as regras da lógica e da experiência comum.

    E tendo-se presente que a imediação e a oralidade dão um crédito de fiabilidade acrescido, já que por virtude delas entram, na formação da convicção do julgador, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova, e fatores que não são racionalmente demonstráveis.

    Sendo que estes princípios permitem ainda uma apreciação ética dos depoimentos - saber se quem depõe tem a consciência de que está a dizer a verdade– a qual não está ao alcance do tribunal ad quem - Acs. do STJ de 19.05.2005 e de 23-04-2009 dgsi.pt., p.

    09P0114.

    5.1.3.

    Ademais, e em termos de direito positivo, urge atentar que o impugnante da decisão sobre a matéria de facto tem de cumprir, desde logo liminarmente e com o maior rigor possível, as exigências formais do artº 640º do CPC.

    Das mesmas sobressai a indicação – nº 1 al. b) - dos «concretos meios probatórios constantes no processo ou do registo ou gravação nele realizada que impunham decisão… diversa…» Sendo que -nº2 al. a) - «quando os meios probatórios…tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de rejeição imediata do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o recurso…».

    Acresce que, como constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, o recorrente não pode limitar-se a invocar mais ou menos abstrata e genericamente, a prova que aduz em abono da alteração dos factos.

    E, assim, querendo impor, em termos mais ou menos apriorísticos, a sua subjetiva convicção sobre a prova.

    Porque, afinal, quem julga é o juiz.

    Por conseguinte, para obter ganho de causa neste particular, deve ele efetivar uma concreta e discriminada análise objetiva, crítica, logica e racional da prova, de sorte a convencer o tribunal ad quem da bondade da sua pretensão.

    A qual, como é outrossim comummente aceite, apenas pode proceder se se concluir que o julgador apreciou o acervo probatório com extrapolação manifesta dos cânones e das regras hermenêuticas, e para além da margem de álea em direito permitida e que lhe é concedida.

    E só quando se concluir que a natureza e a força da prova produzida é de tal ordem e magnitude que inequivocamente contraria ou infirma tal convicção, se podem censurar as respostas dadas.

    Sendo que, repete-se, a intolerabilidade destas tem de ser demonstrada pelo recorrente através de uma concreta e dilucidada análise hermenêutica de todo o acervo probatório produzido ou, ao menos, no qual se fundamentou a resposta.

    5.1.4.

    No caso vertente os recorrentes não cumprem suficientemente estas exigências formais e substanciais.

    Desde logo no atinente aos factos provados e constantes na sentença nos pontos 5., 7., 8. e 9.

    Quanto a estes os recorrentes invocam que «Nunca foi claro e evidente ou sequer sugerido aos recorrentes que o prédio em causa tenha passado a pertencer em exclusivo ao réu JM (…).» E que tal apenas terá acontecido com a escritura da partilha, a qual já foi outorgada na pendencia da ação.

    Mas o teor factual de tais artigos vai muito para...

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