Acórdão nº 173/14.5TBCVL-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Janeiro de 2015
Magistrado Responsável | FONTE RAMOS |
Data da Resolução | 27 de Janeiro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 12.02.2014, M (…), S. A., instaurou, no Tribunal Judicial da Covilhã, a presente acção especial de insolvência contra T (…), Lda., requerendo a declaração da insolvência da requerida.
Alegou, em síntese: - No âmbito da sua actividade comercial (comércio por grosso de madeira em bruto e de produtos derivados) efectuou diversos fornecimentos de madeira e outros materiais à requerida (que se dedica à fabricação de outras obras de carpintaria para a construção), a pedido desta, material que se encontra descrito nas facturas identificadas no art.º 7º da petição inicial (p. i.); - Tal material foi entregue à requerida que sobre ele não apresentou qualquer reclamação; - As facturas emitidas tinham data de vencimento a 60 dias, sendo certo que a requerida, pese embora as sucessivas interpelações, nunca efectuou o pagamento do material fornecido, na quantia global de € 15 300,35, acrescida de juros de mora; - A dívida à requerente, só por si, pelo seu montante e pelo facto de estar vencida há mais de um ano, evidencia a situação de insolvência da requerida, pois é demonstrativa da impossibilidade de cumprimento das suas obrigações vencidas; - Além de que, vários outros indicadores apontam no mesmo sentido, como seja o facto da requerida dever avultadas quantias aos seus fornecedores, desconhecendo-se se terá já sido accionada judicialmente pelos credores com vista à cobrança dos seus créditos; - O montante do crédito da requerente e o facto de nunca ter feito qualquer pagamento por conta dos montantes titulados pelas facturas levam a crer que a requerida se encontra impossibilitada de cumprir as suas obrigações vencidas e que suspendeu de forma generalizada o cumprimento das suas obrigações pecuniárias vencidas; - Não sabe, mas tem razões fortes para crer que a requerida será devedora à banca, ao fisco e à segurança social; - Desconhece a existência de quaisquer imóveis na titularidade da requerida; - A situação de insolvência da requerida é actual - é certa a impossibilidade actual e futura de cumprimento de obrigações pela requerida.
A requerida deduziu oposição, tendo alegado, em resumo: - A requerente deduz pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar, fazendo um uso manifestamente reprovável do processo, com o único fim de conseguir um objectivo ilegal: in casu pressionar a requerida a - perante os transtornos que inevitavelmente ocasionam os processos de insolvência, constituindo, presentemente, atento o estado da economia, uma manifesta ignomínia - pagar, sem discutir, o crédito a que requerente se arroga possuir sobre a requerida; - A requerida tem as suas contas devidamente organizadas e contabilisticamente tratadas; - Tem uma autonomia financeira de 37,88 %, sendo proprietária de sete fracções autónomas de um edifício, onde tem a sua sede (fracções com o valor patrimonial tributário global de € 867 450), destinado à indústria e, bem assim, de treze veículos automóveis, sobre os quais não incide qualquer ónus; - Não tem qualquer dívida de natureza fiscal; - Tem a sua situação totalmente regularizada perante a Segurança Social; - Tem, nesta data, depositada em contas à ordem de que é titular sedeadas na C (...) , S. A., B (...) , S.A. e (...) , S.A., uma quantia global que ascende ao montante global de € 161 390,83; - Dispõe ainda da possibilidade de utilizar uma quantia de € 250 000, no âmbito do “contrato de factoring” celebrado com a C (...) , S. A., sendo certo que, nesta data, apenas tem utilizada a quantia de € 82 653,14; - As hipotecas que oneram os imóveis de que é titular garantem apenas, neste momento, a conta corrente caucionada de apoio à tesouraria contratada com a C (...) e a conta corrente de factoring, na medida em que todos os demais créditos junto da C (...) que justificaram a constituição das hipotecas já foram liquidados; - Contratou outros empréstimos a longo prazo, no âmbito dos programas “PME Investe IV”, no montante global de € 211 041,76, cujo cumprimento se encontra a satisfazer de acordo com o contratado; - Quatro das fracções que compõem o imóvel do qual é titular, encontram-se arrendadas, auferindo, a título de rendas, uma quantia global mensal de € 3 150; - Em 31.7.2013, foi distinguida pelo IAPMEI, pela qualidade do seu desempenho e perfil de risco, como “PME Líder 2013”, no âmbito do Programa FINCRESCE; - Aumentou o seu volume de negócios de 2012 para 2013 em mais de 60 %, tendo obtido uma situação líquida (positiva) de € 448 807,20 e um resultado líquido de € 61 318,10; - As sua contas estão aprovadas e depositadas na Conservatória de Registo Comercial; - Para além dos gerentes, possui nos seus quadros dezassete trabalhadores, a quem paga religiosamente os vencimentos; - Os aros, portas e placas em folheados de madeira fornecidos pela requerente encontravam-se manchados e riscados, do que foi de imediato informado o vendedor, o qual se deslocou à obra e constatando aquela circunstância, informou o técnico da requerida que ali se deslocaria para proceder à respectiva substituição, o que nunca sucedeu; - Em 30.3.2012, comunicou à requerente os defeitos dos produtos vendidos, nada tendo sido feito e, em 17.12.2012, respondeu à requerente após a recepção de carta remetida pelo administrador da insolvência da requerente; - É por causa dos defeitos do material fornecido que não paga à requerente, recusando-se a efectuar o pagamento enquanto a requerente não a compensar devidamente pelos prejuízos que padeceu, designadamente, com a substituição dos materiais; - Para além dos presentes autos, não existe nenhuma acção, providência cautelar, injunção ou qualquer outro meio judicial a correr os respectivos termos, que tenha sido instaurado ou requerido contra a requerida; - A insolvência foi dolosamente requerida; - Os meios informáticos e o cruzamento de dados presentemente existentes levaram a que a notícia do pedido de insolvência se espalhasse rapidamente pelas instituições financeiras e outras, fornecedores e clientes, circunstância que afecta o bom nome comercial da requerida, na medida em que esta, perante a notícia, se viu confrontada com a recusa dos mesmos em fornecerem sem que recebam a pronto, o que acarreta dificuldades de tesouraria e na obtenção de fornecimentos de que carece para o desenvolvimento da actividade a que se dedica.
Terminou, solicitando que o Tribunal indefira o pedido de insolvência e que condene a requerente no pagamento de uma indemnização, a liquidar, a fim de serem ressarcidos os danos que lhe causou pelo recurso ao presente meio processual e, bem assim, como litigante de má fé.
A requerente pronunciou-se sobre a matéria de excepção da “oposição”, bem como sobre os pedidos, e correspondentes factos, de condenação como litigante de má fé e no pagamento de indemnização nos termos do art.º 22º, do CIRE.
Efectuado o julgamento, o Tribunal a quo, por sentença de 06.6.2014, decidiu julgar improcedente, e infundado, o pedido de declaração de insolvência da requerida e, em consequência, condenou a requerente a pagar-lhe uma indemnização pelos prejuízos causados com o pedido de insolvência, a liquidar posteriormente; julgou também improcedente o pedido de condenação por litigância de má fé.
Inconformada, a requerente interpôs a presente apelação formulando as conclusões que assim vão sintetizadas: 1ª - A Mm.ª Juíza fundamenta a sua decisão (de condenação no pagamento de indemnização) no conhecimento da requerente da não aceitação do pagamento do seu crédito – pelo menos na totalidade – por parte da requerida.
2ª - A requerida[1] nunca reclamou formalmente de tais fornecimentos - a única comunicação que recebeu da requerida, foi em resposta à carta do administrador de insolvência, para tentar obviar à liquidação do valor em dívida.
3ª - Depois desta comunicação, voltou a receber nova interpelação da requerente, para pagamento, que não obteve resposta.
4ª - Já há muito que decorreu o prazo para a denúncia (dos pretensos defeitos do material fornecido pela requerente à requerida), pois estamos perante facturas, algumas delas do ano de 2011, pelo que não se coloca, em momento algum, a aceitação ou não de pagamento com base em alegados defeitos, pois os mesmos a existirem, já há muito se encontram expirados todos os prazos à disposição da requerida para fazer valer os alegados direitos.
5ª - Caso estes defeitos fossem reais, nada ficou demonstrado para sustentar qualquer dolo da requerente, mas sim da requerida, em enganar o tribunal, com argumentos falsos e extemporâneos.
6ª - A sentença refere ainda que a única intenção da requerente com a presente acção era pressionar a requerida a pagar, o que resulta da forma como se mostra gizada a petição inicial, afirmação do tribunal a quo sustentada pelo facto da requerente ter alegado genericamente, crer que a requerida tem dívidas a fornecedores, a instituições bancárias, ao fisco e à segurança social, que o passivo é superior ao activo, limitando-se a invocar desconhecimento de existência de bens e, no fundo, da real situação financeira da requerida.
7ª - A requerente procurou a existência de bens e deparou-se com os prédios com mais de € 1 000 000 em hipotecas voluntárias.
8ª - Quanto à situação fiscal ou perante a segurança social, como é do conhecimento geral, a requerente ou seus representantes ou mandatários estão impedidos de obter qualquer informação.
9ª - Pesquisou o que podia, e estava na sua disponibilidade, e fundamentou o seu pedido por duas ordens de razão: 1ª) a existência do crédito sobre a requerida, há muito vencido; 2ª) a existência de factos-índice que indicavam que a requerida se encontrava em situação de insolvência.
Ao abrigo do disposto no art.º 20º, do...
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