Acórdão nº 15/12.6GAMMV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Janeiro de 2015
Magistrado Responsável | VASQUES OS |
Data da Resolução | 21 de Janeiro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No [já extinto] Tribunal Judicial da comarca de Montemor-o-Velho o assistente M...
, desacompanhado do Ministério Público, requereu o julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, da arguida A...
, com os demais sinais nos autos, a quem imputou a prática de um crime de difamação, p. e p. pelo art. 180º e de um crime de injúria, p. e p. pelo art. 181º, ambos do C. Penal, contra ela tendo também deduzido pedido de indemnização civil, com vista à sua condenação no pagamento da quantia de € 1.500 por danos não patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora.
Por sentença de 6 de Fevereiro de 2013 foi a arguida absolvida da prática dos imputados crimes e absolvida do pedido de indemnização civil contra si formulado.
* Inconformado com a decisão recorreu o assistente, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: I. Não se concorda, nem se pode concordar com o conteúdo do proferido pelo TRP no processo 787/03.9GBMTS PI, de 10/11/2010 (embora na sentença recorrida se referencie outro acórdão), pois as conclusões e afirmações sobre a concordância da queixa nos crimes particulares com a acusação particular, como condição de procedibilidade do procedimento criminal são inconcebíveis e inaceitáveis.
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Os crimes de natureza particular, têm de ser denunciados, com a formulação de que se pretende procedimento criminal contra o denunciado, devendo o queixoso se constituir assistente, pagar a taxa de justiça e ser acompanhado de advogado. Quando o queixoso denuncia de que foi vítima de "distrates" e outras considerações ofensivas da sua honra e consideração por parte da denunciada, tal situação não é diferente de outra queixa onde outro queixoso denuncia, tão só, que foi, no dia x, no lugar y, vítima de agressão por parte de F …, sendo então apurado em inquérito, após a recolha de prova, que efectivamente F …, agrediu o queixoso, às z horas, do dia …, no lugar y, causando-lhe um hematoma na face, outro no braço, que lhe causaram n dias de doença, com incapacidade para o trabalho … E que tal seja vertido numa acusação pública de um crime de ofensas corporais! III. O inquérito nos crimes particulares, tem o mesmo fim de outros crimes, de diferente natureza, ou seja a recolha de indícios suficientes para se verificar a existência, ou não, ainda que de forma indiciária, da prática de crimes por parte do arguido.
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Não existe norma do Direito Criminal e Processual Penal, onde se esclarece/exige que a queixa que verse crimes particulares de injúria e difamação tem de mencionar as expressões injuriosas, de forma exacta e absolutamente precisa, como condição de procedibilidade do próprio inquérito, da acusação particular e do próprio procedimento criminal contra o denunciado.
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Uma coisa é não haver queixa alguma sobre injúrias, sequer referência à existência da prática do denunciado de expressões injuriosas, outra bem diferente, é existir uma denúncia de que foram proferidas pelo denunciado expressões ofensivas da honra e consideração do queixoso, mesmo que as não descrimine, desejo de procedimento criminal, constituição de assistente, paga a taxa de justiça, constituição de advogado, inquérito, prova concreta no mesmo que confirma e detalhe das injúrias proferidas e consequente acusação particular! VI. Em abono da nossa tese, basta atentar no conteúdo do art. 49º, nº 1 do CPP, onde se diz "Quando o procedimento criminal depender de queixa, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas dêem conhecimento do facto ao Ministério Público para que este promova o processo." O sublinhado é nosso! VII. O "facto" aí referido não são as expressões Injuriosas concretas, antes um comportamento ilícito do denunciado, bastando, para tal dizer, que o ofendido foi vítima por parte do denunciado de expressões atentatórias da sua honra e consideração, mesmo que as não descrimine! VIII. Em reforço de tal entendimento, deve se atentar no conteúdo do art. 246º, nº 1 do CPP "A denúncia pode ser feita verbalmente ou por escrito e não está sujeita a formalidades especiais." … Ou do seu nº. 4, onde inequivocamente, liberta a denúncia do rigor formalista e civilista enunciado no referido acórdão do TRP contestado e supra enunciado, pois aí expressamente se diz "A denúncia contém na medida do possível, a indicação dos elementos referidos nas alíneas do nº 1 do artigo 243º, este sim impondo algum rigor formal (o sublinhado é nosso).
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Nestes termos, a tese, mais civilista, fazendo lembrar o princípio do dispositivo do Processo Civil, defendida em tal acórdão citado na sentença recorrida, não tem sustentação legal, no direito processual penal vigente em Portugal, pelo que, não pode sustentar a fundamentação vertida em tal sentença, de que se recorre no presente recurso.
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Assim sendo, deveria a sentença recorrida ter apreciado todos os factos constantes da acusação particular, pelo que, em sede de reapreciação de prova neste recurso devem os mesmos ser considerados.
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Sem prescindir, ainda assim, tomando a ideia da sentença recorrida de uma queixa insuficiente, formulando-se acusação particular e dela não se requerendo instrução em devido prazo, aceitando-se a mesma e remetendo-a para julgamento, parece-nos, salvo o devido respeito, tendo o mesmo despacho de aceitação transitado em julgado, não é possível fazer retroceder o processo à fase da acusação para justificar a extinção do procedimento criminal por insuficiência de queixa relativamente a algumas expressões injuriosas! XII. O objecto do processo penal é fixado e definido pela acusação, art. 379, nº 1 al b) do CPP, pelos que, os factos nela descritos, vinculam o tribunal no decurso do processo, sendo inaceitável a sentença recorrida, nesta parte, quando limita a verificação das expressões injuriosas aquelas que são vertidas na queixa inicial ou seu aditamento, porquanto, tal não é exigível em qualquer norma do Direito Criminal em geral, e em particular por qualquer norma Processual Penal.
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O Recorrente não aceita, salvo o devido respeito, a forma como são interpretados pela Meritíssima Juiz "a quo" os poderes que lhe são conferidos nos artigos 322º e 323º do CPP e a interpretação que é feita dos mesmos no decorrer da audiência de julgamento deste processo.
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O Tribunal permitiu, livremente, que todos os intervenientes poderiam falar nas questões contabilísticas e outras que levaram à discussão e desavenças entre a arguida e o assistente, disputa de um documento, excepto ao assistente e ao seu mandatário! XV. A tomada de declarações e esclarecimentos solicitados pelo mandatário do assistente ao próprio, foram reiteradamente interrompidos e com limitações expressas de poder esclarecer a questão sobre o documento que é referido pela arguida que lhe foi "roubado" pelo assistente e demais expressões injuriosas por ela proferidas em resposta às exigências do assistente enquanto TOC, pelo que deve ser ordenada a repetição do julgamento, para que o assistente possa explicar tais factos, de forma livre e contínua, que determinam o comportamento injurioso da arguida.
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Mantendo-se o demais factos dados como provados, na sentença recorrida, existem outros factos dados como não provados que se querem ver novamente reapreciados, com base no depoimento das testemunhas F..., G... e H... e corroborado pelas declarações do assistente supra transcritos, determinam a inclusão dos seguintes pontos aos factos provados para o dia 04/01/2012: 1.1 – Foi explicado pelo assistente, no fim do ano de 2011, à arguida que por notificação do INCI, em face da existência de capitais próprios negativos no ano de 2010, teria de fazer um aumento de capital na sociedade, com a realização efectiva do montante correspondente ao aumento na conta bancária da sociedade, para que não lhe fosse retirado o alvará por aquela entidade.
1.2 – Como a realização efectiva capital correspondente a tal aumento não foi efectuada de forma a que o mesmo ficasse disponível, e perante a arguida dirigindo-se ao assistente disse-lhe que era um "vigarista" e "incompetente".
1.3 – A arguida nesse mesmo dia disse ao assistente para "ir levar no cu mais os gajos do INCL".
1.4 – Quando a arguida neste dia 04/01/2012 profere tais expressões "vigarista" e "incompetente" e para o Assistente "ir levar no cu mais os gajos do INCI", age livre e conscientemente, bem sabendo que tal conduta não lhe é permitida, com o intuito de ofender a honra e consideração do assistente.
1.5 – A arguida antes de se ir embora do referido escritório, amarfanhou um papel que tinha consigo, o qual era disputado pelo assistente.
1.6 – A arguida nesse mesmo dia, retirou-se do escritório do assistente, lá deixando uma pasta com documentos que lhe pertenciam.
1.7 – Tal pasta foi entregue pelo assistente no posto da GNR de Montemor-o-Velho, no dia 04/01/2012.
1.8 – Em queixa apresentada pela arguida A... no posto da GNR de Montemor-o-Velho e assinada por esta, a Fls. 3 dos autos consta que a pasta reclamada por esta, se encontrava naquele posto, entregue pelo assistente e lhe foi devolvida naquele acto (parte final de fls 4 ).XVI XVII. Na sentença recorrida os factos dados como não provados e que se querem ver novamente reapreciados, com base no depoimento das testemunhas F..., G... e H... e corroborado pelas declarações do assistente supra transcritos, determinam a inclusão dos seguintes pontos aos factos provados para o dia 18/01/2012: 2.1 – Tal encontro tinha sido previamente acordado entre o assistente e a arguida para entrega de pastas e pagamento dos serviços de contabilidade, em face do termo da prestação de assistência e serviços de contabilidade por parte do assistente.
2.2 – Nesse mesmo dia a arguida disse que o assistente era um "ladrão" "vigarista" e "incompetente" e que "tinha sido o causador da falência da sua empresa".
2.3 - Quando a arguida neste dia 18/01/2012 profere tais expressões "vigarista" e "ladrão" e que o Assistente...
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