Acórdão nº 4/13.3TBSAT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Março de 2015
Magistrado Responsável | FERNANDO CHAVES |
Data da Resolução | 04 de Março de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório 1.
No âmbito do processo comum singular n.º 4/13.3TBSAT, do extinto Tribunal Judicial de Sátão, realizada a audiência de julgamento, foi proferida a sentença de fls. 540 a 564 com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, decido julgar a acusação procedente, por provada e, em consequência: a) Condeno o arguido A...
, pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 108º, n.º 1, 3.º e 4.º, n. º1, al. g), do Decreto-lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro na pena de cinco meses de prisão, substituída por uma pena de multa correspondente a 150 (cento e cinquenta) dias, à taxa diária de € 10,00 (dez euros) e na pena cumulativa de 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 10,00 (dez euros); b) Ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 1 do Decreto-lei n.º 48/95, de 15 de Março, fixo o quantitativo global da pena de multa em 240 (duzentos e quarenta) dias, à taxa diária de € 10,00 (dez euros), o que perfaz um total de € 2.400,00 (dois mil e quatrocentos euros); c) Condeno o arguido no pagamento das custas penais, fixam-se em 3 UC’s a taxa de justiça.
* Proceda ao depósito legal da presente sentença, nos termos do n.º 5 do artigo 372.º e n.º 2 do artigo 373.º, ambos do Código de Processo Penal.
* Após o trânsito remeta boletins ao registo criminal (artigo 374.º, n.º 3 al. d) do Código de Processo Penal e artigo 5.º, al. a), da Lei n.º 57/98, de 18.08, na sua última versão, dada pela Lei n.º 115/2009, de 12.01).» 2.
Inconformado, o arguido A... veio interpor recurso da sentença, retirando da sua motivação as seguintes conclusões (transcrição): «1.ª- O presente recurso vem interposto da sentença proferida no âmbito dos autos em epigrafe, que condenou o arguido, pela prática de um crime de “exploração ilícita de jogo”, p. e p. pelos artigos 108.º, n.º 1, 3.º e 4.º, n.º1, al. g) do Decreto-lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, na pena de cinco meses de prisão, substituída por uma pena de multa correspondente a 150 dias à taxa diária de 10,00 Euros, e na pena cumulativa de 90 dias de multa à taxa diária de 10,00 Euros.
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- O arguido discorda da sentença recorrida por entender que nos autos não existe prova constituída nem foi produzida prova em julgamento que permita ao tribunal recorrido dar como provada a matéria de facto vertida nos pontos 6 (6.1, 6.2 e 6.3), 7 (7.1., 7.2 e 7.3), 9, 10, 12, 13 ultima parte, 15 e 16 da “ FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO” da sentença.
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- E por consequência, que a matéria de facto efetivamente provada, quando subsumida aos artigos 108.º, n.º 1, 3.º e 4.º, n.º1, al. g) do Decreto-lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, não permite condenar o arguido pela prática de um crime de “exploração ilícita de jogo”.
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- Quanto aos pontos 6 (6.1, 6.2 e 6.3), 7 (7.1., 7.2 e 7.3): Os referidos pontos da matéria de facto procuram reproduzir os termos em que a máquina apreendida nos autos funcionaria.
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- Para considerar provada aquela factualidade o Tribunal recorrido estribou-se, de forma determinante e praticamente em exclusivo, no relatório pericial junto a fls. 406 a 413.
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-Porém, o arguido considera que aquele relatório resulta de uma perícia levada a cabo de forma enviesada e, por isso, não pode merecer a concreta força probatória que o Tribunal lhe atribui.
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- E isto porque, resulta patente da leitura daquele relatório pericial, que a entidade que procedeu à perícia, para poder suprir lacunas que não consegui superar pela observação que conseguiu fazer a partir do material apreendido, decidiu vazar naquele relatório dados que obteve de outras perícias que efetuou a maquinas mais ou menos similares, e, a partir dessa “técnica” afirmou como premissas adquiridas factos que ficaram por demonstrar.
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- Do relatório pericial é possível tirar três conclusões: 1.ª Conclusão: Para que a referida máquina possa desenvolver jogos de fortuna e azar é necessária uma pendrive (ou dispositivo USB) com as credenciais de validação que permita aceder ao servidor onde se encontram os jogos; 2.º Conclusão: A quando da fiscalização essa pendrive (ou dispositivo de USB) não existia no local da apreensão, só assim se justificando que não tenha sido apreendida; 3.º Conclusão: Precisamente porque aquela pendrive não existia, não era possível desenvolver aqueles jogos a partir daquela máquina, apesar de, aparentemente, a mesma ter potencialidade para tal; da mesma forma que não foi possível a quem executou a perícia, chegar até esses jogos.
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- A entidade que procedeu à perícia, por não dispor de pen drive que lhe dava ligação válida ao servidor, não pode chegar até ao tema de jogo de fortuna e azar que a máquina “pode” desenvolver, e por isso, não pode exibir fotografias desses tema de jogo obtidas através desta máquina; e por consequência, a descrição que fez acerca do modo de funcionamento não resulta do que observou mas do conhecimento que lhe advém da observação que – por ventura – terá feito de outras maquinas.
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- Quanto ao ponto 9: não existe nos autos um único elemento de prova, seja testemunhal seja documental que permita atribuir a propriedade da máquina apreendida nos autos ao aqui arguido.
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- De resto, nenhuma das testemunhas ouvidas em julgamento revelou conhecer o arguido e muito menos essa relação do arguido com a referida máquina.
Assim, esse ponto deve ser dado como: não provado.
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- Quanto à matéria vertida no ponto 10: Mesmo admitindo, sem conceder, que entre o proprietário e anterior explorador do “ K... BAR”, a testemunha I... e o qui arguido tenha sido estabelecido um qualquer acordo acerca da forma como a máquina iria ser explorada, não existe nos autos nada que autorize que dar como assente que essa exploração tinha por base o fornecimento ao publico de jogos de fortuna e azar.
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- E assim, quando muito, poder-se-ia dar como provado que aquele máquina era explorada como “ponto de internet”, e nunca que a referida máquina fosse explorada pelo aqui arguido para desenvolver temas de jogo de fortuna e azar.
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- A partir da prova produzida em julgamento nada se diz acerca da utilização daquela máquina para exploração de jogos de fortuna e azar e quanto à repartição pelos referidos sujeitos do produto de uma tal exploração.
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- Posto isto, nada nos autos autoriza o Tribunal recorrido a dar como assente que esse acordo girava em torno do produto da exploração da dita máquina como jogo de fortuna e azar.
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- Quanto à matéria vertida na ultima parte do ponto 13: Não existe nos autos um único elemento de prova, constituída ou constituenda, que permita concluir que, no estabelecimento onde a máquina foi apreendida se procede ao pagamento aos seus clientes de prémios de jogo.
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- Quanto aos factos 15 e 16: Nestes factos estão vertidos os elementos subjetivos do tipo legal de crime pelo qual o arguido vem acusado.
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- Porém, depois de ouvidos, de fio a pavio, os depoimentos de todas as testemunhas ouvidas em julgamento, não existe uma única que permita concluir que o arguido tinha conhecimento de que a referida máquina estava a ser usada para a exploração de jogos de fortuna e azar aos quais se acedia mediante o suo de um dispositivo USB contendo as credenciais de validação do acesso a um servidor que proporcionava os referidos jogos.
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- Quanto muito, e sem conceder, poder-se-ia admitir que o arguido soubesse da existência ali da máquina apreendia e que a mesma permitia o acesso à internet.
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- Mas não existe nada que permita concluir que o arguido sabia mais do isso.
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- Subsumindo-se a matéria de facto provada, depois de expurgada aquela que não deveria ter sido dada como provada vertida nos pontos 6 (6.1, 6.2 e 6.3), 7 (7.1., 7.2 e 7.3 pelas razões expostas supra, aos referido preceito legais, forçoso será concluir não ter ficado demonstrado que o arguido procedia á exploração de uma máquina que desenvolvida jogos de fortuna e azar, não podendo, por isso, ser sancionado nos termos em que o foi.
Termos em que, deve o presente recurso ser julgado procedente, de facto e de direito, e em consequência, o arguido absolvido da prática do crime de de “exploração ilícita de jogo”, p. e p. pelos artigos 108.º, n.º 1, 3.º e 4.º, n.º1, al. g) do Decreto-lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, pelo qual vem condenado, assim se fazendo Justiça!» 3.
O Ministério Público respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência e consequente manutenção da sentença recorrida.
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Nesta instância, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, na intervenção a que se refere o artigo 416.º do Código de Processo Penal([i]), subscrevendo a resposta apresentada pelo Ministério Público na 1ª instância, emitiu parecer no sentido de que o recurso deve improceder.
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No âmbito do disposto no n.º 2 do artigo 417.º, o arguido reiterou a posição anteriormente assumida na motivação de recurso.
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Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência para decisão.
* II - FUNDAMENTAÇÃO 1. A sentença recorrida.
1.1. Na sentença proferida na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos (transcrição): «1. No dia 11 de Fevereiro de 2010, pelas 14H30m, militares do Núcleo de Investigação Criminal do Destacamento Territorial de Mangualde da Guarda Nacional Republicana levaram a efeito uma acção de fiscalização ao estabelecimento de restauração e de bebidas, denominado por "K... BAR", sito no (...), em Sátão, na sequência de informações que reportavam a existência de máquina de jogo ilícito no referido estabelecimento.
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Em resultado da acção de fiscalização acima referida, foi detectada, num compartimento do mesmo estabelecimento, que servia igualmente de armazém, uma máquina do tipo vídeo com a designação “Quiosque de Internet", ligada à corrente eléctrica e sem qualquer referência exterior quanto à sua origem, fabricante, número de fábrica ou série.
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No momento da abordagem pelas autoridades policiais, a referida máquina encontrava-se a ser utilizada por C..., que ali...
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