Acórdão nº 3475/12.1TBVIS-N.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | MARIA JO |
Data da Resolução | 24 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção): I – RELATÓRIO Por apenso ao processo onde foi declarada a insolvência da requerida D (…), Lda., foi proferida sentença de verificação e graduação de créditos que, reconhecendo todos os créditos que constam da Lista de Credores retificada apresentada pelo Administrador de Insolvência, a fls. 61 e ss., procedeu à respetiva graduação, relativamente ao único imóvel apreendido para a massa, pela seguinte forma: “Em relação ao remanescente do produto da venda do bem imóvel, graduam-se os créditos com vista ao pagamento pela seguinte ordem: A) Crédito de IMI; B) Créditos garantidos por Hipoteca (pela preferência resultante dos registos); C) Os demais créditos fiscais na parte assinalada como privilegiada; D) Crédito da Segurança Social; E) Do remanescente do produto da venda desse bem, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (neles se incluindo o crédito da credora N (...) ; F) Do remanescente do produtor da venda desse bem, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados (nomeadamente os juros de créditos comuns), pela ordem segundo a qual os créditos são indicados no art. 48º do CIRE, na proporção dos respetivos montantes, quanto aos que constem da mesma alínea, em caso de insuficiência da massa para o seu pagamento integral – art. 177º, nº1, do CIRE”.
Não se conformando com a mesma, o credor reclamante A (…) dela interpôs recurso de apelação, concluindo a respetiva motivação, com as seguintes conclusões: (…) Não foram apresentadas contra-alegações.
Dispensados que foram os vistos legais ao abrigo do disposto no nº4 do art. 658º do CPC, cumpre decidir do objeto do recurso.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639º, do Novo Código de Processo[1] –, as questões a decidir são as seguintes: 1. Se ao crédito do apelante deverá ser reconhecido o invocado privilégio imobiliário especial, graduando-o em primeiro lugar relativamente ao produto do único imóvel apreendido para os autos: 1.1. Se o mesmo pode ser tido em consideração nos presentes autos.
1.2. Em caso afirmativo, qual a sua ordem de graduação.
III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Com o presente recurso, insurge-se o apelante contra a graduação de créditos efetuada relativamente ao único imóvel apreendido nos autos, por a sentença recorrida não ter tido em consideração o privilégio imobiliário de que goza o seu crédito laboral, ao abrigo do disposto no art. 333º do atual Código do Trabalho, graduando-o, também nesta parte, como comum.
Para apreciação da questão aqui levantada pelo credor/apelante, teremos em consideração o seguinte circunstancialismo factual que sobressai dos elementos juntos ao presente recurso, instruído em separado: 1. A devedora D (…), Lda., foi declarada insolvente por sentença datada de 06-02-2013.
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O credor/Apelante veio reclamar, entre outros, um crédito no montante de 41.280,00 €, enquanto trabalhador da requerida/insolvente (créditos por retribuições salariais e pela cessação da relação laboral), alegando tratar-se de um “crédito privilegiado, beneficiando de privilégio creditório geral”.
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O Administrador de insolvência, na lista de credores reconhecidos que elaborou ao abrigo do disposto no artigo 129º do CIRE, reconheceu o reclamado crédito, quanto ao seu montante, qualificando-o, ainda, como “privilegiado”, por gozar de “privilégio mobiliário geral e imobiliário especial sobre os bens imóveis onde o reclamante prestou a sua atividade ao serviço da insolvente (art. 333º do Código do Trabalho)” – lista de fls. 61 e ss., elaborada após retificação efetuada na sequência de anterior impugnação.
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A referida Lista, tal como se mostra junta a fls. 61 e ss. do apenso de reclamação de créditos não terá sido objeto de impugnação, pelo que o juiz a quo, na sentença recorrida, considerou reconhecidos todos os créditos constantes da mesma.
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Foram aprendidos para massa vários bens móveis e um único imóvel (prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 1373) – Autos de apreensão de bens móveis 1, 2 e 3, e Auto único de apreensão de bem imóvel.
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A requerida tinha a sua sede no Parque Industrial de (...) , Viseu, correspondendo ao imóvel que se mostra apreendido nos autos.
Apesar de, na reclamação de créditos que apresentou junto do Administrador de Insolvência, o credor/apelante não ter invocado devidamente[2] a existência, a seu favor, do privilégio imobiliário especial previsto no artigo 333º do atual Código do Trabalho, o Administrador de Insolvência veio a reconhecer a existência de tal privilégio na lista que apresentou ao abrigo do disposto no artigo 129º do CIRE.
A sentença recorrida, reconhecendo os créditos constantes da Lista de Credores Reconhecidos elaborada pelo A.I. e apesar de nela efetuar uma introdução teórica sobre os privilégios mobiliários e imobiliários especiais, nomeadamente, sobre o privilégio imobiliário especial sobre os bens imóveis do empregador nos quais o trabalhador preste a sua atividade previsto no art. 377º do Código do Trabalho, e sobre o modo da sua graduação face às demais garantias reais, é completamente omissa quanto à existência do privilégio imobiliário especial que o AI reconhecera a tal credor, na Lista de Créditos Reconhecidos e não objeto de impugnação.
Desconhecendo-se quais os motivos de tal omissão, nomeadamente, se se deveu a mero lapso, pelo facto de não ter atentado no reconhecimento de tal garantia por parte do AI, ou se por considerar que o seu reconhecimento dependeria de invocação pelo seu beneficiário, poder-se-á levantar a questão do âmbito dos poderes do juiz perante a uma lista de créditos reconhecidos e não objeto de qualquer impugnação, face ao teor do nº3 do artigo 130º do CIRE.
Uma das áreas onde mais sobressai a intenção do legislador de impulsionar a desjudicialização do processo foi a da verificação e graduação de créditos.
Com a intenção de introduzir mecanismos tendentes a uma maior eficiência e celeridade processuais e a aligeirar o próprio controlo jurisdicional, o artigo 130º, nº3, do CIRE prevê que, não havendo impugnações, “é de imediato proferida sentença de verificação e graduação de créditos, em que, salvo o erro manifesto, se homologa a lista de credores reconhecidos elaborada pelo administrador de insolvência e se graduam os créditos em atenção ao que conste dessa lista”.
Quanto à determinação do exato sentido de tal norma, há...
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