Acórdão nº 726/11.3TACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDO CHAVES
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório 1.

No âmbito do processo comum singular n.º 726/11.3TACBR, do extinto 2º Juízo Criminal de Coimbra, realizado o julgamento, foi proferida a sentença de fls. 333 a 345 com o dispositivo seguinte: «Por tudo quanto ficou exposto, o Tribunal: 1.Condena o arguido A... como autor material um crime de falsidade de testemunho, p.p. pelo artº 360º nºs 1 do Cod. Penal, na pena de 4 mês de prisão.

  1. Condena o arguido B... como autor material um crime de falsidade de testemunho, p.p. pelo artº 360º nºs 1 do Cod. Penal, na pena de 4 mês de prisão.

  2. Condena igualmente os arguidos em 2 UCs de taxa de justiça: cfr. art. 512º nº1, 513º nº1 do C.P.P., art. 8º nº9 do R.C.J e Tabela III anexa ao RCJ.

  3. Notifique e deposite (artigo 372º, nº 5 do Código de Processo Penal).» 2.

    Inconformado, o arguido B... veio interpor recurso da sentença, retirando da sua motivação as seguintes conclusões (transcrição): «Conclusão Um. Julgou mal o douto Tribunal recorrido, quanto à matéria factual.

    Conclusão Dois. O douto Tribunal recorrido deveria ter dado como provado que o Arguido B... prestou falso testemunho em audiência final, tolhido por medo motivado por ameaças de morte, que sofreu.

    Conclusão Três. Devem ser aditados ao elenco dos factos provados os seguintes pontos: 15 – O Arguido B... , antes de prestar falso testemunho, recebeu ameaças de morte.

    16 - O Arguido B... teve medo.

    17 - O Arguido B... prestou falso testemunho devido ao medo que sofria, criado por tais ameaças de morte.

    Conclusão Quatro. O falso testemunho prestado é lícito, ao abrigo do art. 34º, do Código Penal, pois o perigo era actual, ameaçava a vida do aqui Arguido B... , vida que é um interesse juridicamente protegido, não foi voluntariamente provocada pelo aqui Arguido B... a situação de perigo, o direito à vida é manifestamente superior ao interesse na realização da justiça (interesse protegido pela norma pela qual o Arguido foi condenado), e é razoavelmente de impor ao Estado o sacrifício do seu interesse na realização da justiça em função do direito à vida do Arguido B... ; Conclusão Cinco. Deve ser revogada a sentença em crise e ser substituída por uma outra que absolva o Arguido, ao abrigo do art. 34º, do Código Penal, que o douto Tribunal recorrido ao não aplicar violou.

    Com o que o douto Tribunal fará Justiça.» 3.

    O Ministério Público junto do tribunal recorrido respondeu ao recurso, pugnando pela manutenção do julgado.

  4. Nesta instância, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que se refere o artigo 416.º do Código de Processo Penal([1]), concordando com a resposta apresentada pelo Ministério Público na 1ª instância, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

  5. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do CPP, não houve resposta.

  6. Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência para decisão.

    * II - FUNDAMENTAÇÃO 1. A sentença recorrida.

    1.1. Na sentença proferida na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos (transcrição): «No dia 17 de Dezembro de 2009, pelas 14 horas e 30 minutos, o arguido A... foi ouvido como testemunha no Gabinete de Investigação Criminal da PSP de Coimbra, no âmbito do processo 32/09.3TACBR, em que eram arguidos D... e E... , este último também conhecido por “ DD... ”.

    Ali, após ser devidamente advertido do dever que lhe incumbia de responder com verdade, prestou o depoimento que se encontra a fls. 3 destes autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido, declarando designadamente que: “(…) deslocava-se com alguma frequência a casa do D... , a quem vendia também com alguma frequência artigos provenientes de furtos no interior de viaturas que praticava. Pretende esclarecer que mantinha com o mesmo uma relação de “amizade”, uma vez que ele lhe dava com alguma assiduidade comida e bebida.

    Relativamente ao relatório de vigilância de fls. 88, confirma que nessa data tinha guardado um computador portátil, que furtara de uma viatura, no interior da fábrica ideal. Contactou então com o D... , através do telemóvel, combinando a venda do computador. Deslocaram-se os dois para o fim da Rua Simões de Castro, onde após o ter ido buscar, o entregou ao D... e recebeu a quantia de 100 euros.

    Relativamente à certidão constante e fls. 316, confirma que efetivamente nessa data, após ter retirado um computador portátil do interior de uma viatura, da qual não se recorda de características, ligou para o telemóvel de um indivíduo seu conhecido de nome E... , que tem a alcunha de “ DD... ”, com quem combinou a venda do computador. Combinaram então o encontro junto ao “pingo doce”, na baixa de Coimbra, tendo-se posteriormente deslocado para junto da viatura do DD... , que se encontrava estacionada na Rua Simões de Castro, local onde procederam à troca, pela quantia de 120 € (…) O produto desses furtos era quase na sua totalidade vendido ou ao D... ou a DD... , consoante quem estava disponível (…)”.

    Por sua vez, o arguido B... foi ouvido no âmbito do mesmo processo, também na qualidade de testemunha, no dia 2 de Abril de 2009, pelas 11 horas e 20 minutos, no Gabinete de Investigação Criminal da PSP de Coimbra, tendo prestado o depoimento junto a fls. 22 destes autos, após ter sido advertido do dever que lhe incumbia de responder com verdade, esclarecendo designadamente que: “(…)Relativamente ao “ D... ”, conforme já referiu, as transações eram inicialmente combinadas pelo telefone, e normalmente eram efetuadas no patamar do prédio que indicou nas diligências externas que efetuou com a Policia, no ... – Coimbra.

    O “ D... ” apenas comprava computadores portáteis, telemóveis e máquinas fotográficas, pagando cerca de 100 € (cem Euros) por cada computador, e entre os 30 € (trinta Euros) e os 50 € (cinquenta Euros) por cada máquina fotográfica ou telemóvel. (…) Pretende acrescentar que, em data que não se recorda em concreto, também vendeu ao “ D... ” uma arma de fogo, de pequeno calibre, presume ser uma 6,35 da qual desconhece a marca e modelo, e que apenas descreve como sendo toda preta, pelo valor de 80 € (oitenta Euros) e que tinha retirado do interior de uma residência na Zona de S. Martinho do Bispo – Coimbra.

    (…) Relativamente ao “ DD... ”, acrescenta que o mesmo, na altura em que lhe vendia artigos, residia no edifício que indicou à Polícia, na zona da “ ... ” (…) O “ DD... ” também costumava ficar apenas com os computadores portáteis, telemóveis e máquinas fotográficas digitais e pelos quais pagava sensivelmente os mesmos valores que o “ D... ”.

    (…) Nos contactos telefónicos que mantinha tanto com o “ DD... ” como com o “ D... ”, informava-os apenas que tinha artigos para vender, não discriminando quais e quantos, sendo então marcada uma hora para se deslocar aos dois locais acima referidos, para efetuarem a transação. (…)” Acontece que, no dia 11 de Março de 2011, após as 14h40m, no Palácio da Justiça desta cidade, os arguidos A... e B... foram ouvidos na qualidade de testemunhas na audiência de julgamento realizada no âmbito do referido processo nº 32/09.3TACBR, que correu termos na 2ª Secção da Vara de Competência Mista de Coimbra, na qual se encontravam a ser julgados D... e E... .

    Nessa sessão os arguidos, após terem sido previamente advertidos pelo Meritíssimo Juiz das consequências penais em que incorreriam caso faltassem à verdade e após prestarem juramento legal, afirmando que juravam por sua honra responder com verdade ao que lhe fosse perguntado, prestaram o depoimento que se encontra transcrito a fls. 96 ss. destes autos, quanto ao arguido A... , e a fls. 74 ss. destes autos, quanto ao arguido B... , cujo teor se dá aqui por reproduzido.

    Nesse dia, o arguido A... negou que alguma vez tivesse tido algum negócio com D... e E... e que nunca entregou um computador a este último.

    Efetivamente, este arguido disse, designadamente, o seguinte...

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