Acórdão nº 36/12.9TBALD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução27 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório 1. M (…), P (…), A (…), representada pela 1ª A., sua mãe, todos residentes em Almeida, e Herança ilíquida e indivisa por óbito de C (…), representada pelos primeiros 3 AA, intentaram a presente acção contra Companhia de Seguros F (…), S.A., com sede em Lisboa, pedindo que: - seja declarado e a ré condenada a reconhecer que por força dos contratos de seguro que identifica está obrigada a pagar à G (...) o valor do capital seguro e que era devido a este banco em 17 de Outubro de 2010, à data da morte de C (…), relativamente aos contratos de mútuo que também identifica; - seja a ré condenada a pagar à G (...) o valor do capital em dívida a 17 de Outubro de 2010, no montante de 297.600 €, de forma a liquidar totalmente o empréstimo contraído através desses contratos; - e ainda todo o capital que seja considerado em dívida à G (...) , quer por força dos contratos referentes à presente acção, quer por força dos contratos referidos na acção 1/12.6TBALD, a correr termos neste Tribunal; - seja a ré condenada a pagar aos autores o valor correspondente a todas as prestações que, relativamente aos mesmos contratos de mútuo, já pagaram à G (...) , desde a data do óbito de C (…), referentes ao capital, juros, prémios de seguro, imposto de selo e demais encargos, valor não inferior a 12.000,00 €, acrescido de juros de mora, à taxa legal, sobre tal valor desde a citação até efectivo e integral pagamento; Alegam, para tanto, em síntese, que a primeira autora é a cabeça de casal da herança deixada por óbito de C (…), sendo os demais autores também seus sucessores. O falecido C (…), funcionário da G (...) , e sua mulher, a 1ª autora, contraíram créditos hipotecários junto da G (...) e outros créditos pessoais, tendo, no âmbito de tais financiamentos, sido celebrados com a ré contratos de seguro de vida a que a autora e C (…)aderiram, os quais garantem o pagamento pela ré, à G (...) , em caso de morte dos segurados, do capital seguro em dívida à sua morte. Tais contratos de seguro são titulados pelas apólices que referem, e nos mesmos a G (...) , enquanto entidade mutuante, é a tomadora do seguro e beneficiária, e C (…) e mulher, as pessoas seguras. Mais alegam que em 17 de Outubro C (…) veio a falecer, em virtude do que está a ré obrigada a pagar o valor do capital seguro com referência aos aludidos empréstimos, acrescentando que a ré se recusa a fazer tal pagamento. Todavia, não obstante C (…) ter sido vítima de um acidente enquanto caçava, o acidente não foi provocado por disparo voluntário ou involuntário da sua arma, pelo que não foi originado por acção ou omissão sua, não o tendo sido, também, em virtude da TAS que apresentava, ou provocado por alcoolismo. Assim, não existe qualquer fundamento legal para a ré se recusar a efectuar o pagamento em dívida, inexistindo qualquer cláusula de exclusão, nem tendo sido comunicada qualquer alteração do âmbito da cobertura dos seguros titulados pelas apólices que referem.

Concluíram pela procedência da acção e requereram a intervenção provocada da G (...) , como sua associada, dado que nos contratos de seguro correspondes às apólices que identificam figura como tomador do seguro.

A ré contestou, sustentando que não podem os autores pretender nesta acção vincular a ré a efectuar pagamentos referentes a contratos invocados noutra acção e, por outro lado, que não podem também os autores deduzir os pedidos nos termos em que o fazem, ou seja, de condenação da ré a efectuar pagamentos a uma entidade terceira, no caso a G (...) , sendo esta, caso assim o entenda, quem deverá fazer tal pedido.

Alegou, também que, tendo em conta a análise toxicológica feita ao sangue do sinistrado, que revelou uma TAS de 1,48 g/l, encontra-se a cobertura por morte excluída do âmbito dos contratos de seguro em causa, tendo sido acordado com o tomador do seguro excluir do âmbito do mesmo todas as coberturas de acções ou omissões praticadas pela pessoa segura quando lhe for detectado um grau de alcoolemia superior a 0,5 g/l. Isto porque, contrariamente ao alegado pelos autores, nas condições particulares da apólice se refere, para além do mais, que o contrato se regula pelas “Condições Gerais do Seguro de Vida Grupo” e pelas condições particulares da apólice, sendo que as Condições Gerais excluem a garantia pretendida. Acrescenta que por força da entrada em vigor do novo regime jurídico do contrato de seguro, aprovado pelo DL 72/2008 de 16.4, a ré informou a tomadora do seguro da actualização das condições contratuais aplicáveis à apólice a partir da renovação subsequente, sendo do tomador do seguro a obrigação de informar os segurados sobre as coberturas contratadas e suas exclusões, nos termos do citado diploma. Por isso, nenhuma falta pode ser imputada à ré, que cumpriu todos os deveres de informação e todas as suas obrigações. Mais alega que o falecido, ao caçar com a taxa de álcool apresentada, tal determinava que não estivesse no gozo das suas capacidades, nem em condições de o fazer com destreza e segurança, pelo que foi a taxa de álcool que pôs em perigo, no caso, a sua vida e provocou a sua morte. Por outro lado, alega, ainda, que mesmo que se entendesse não ter sido feita a comunicação da alteração, como pretendem os autores, a mesma não era, sequer, necessária, na medida em que sempre estaria excluída a responsabilidade sob pena de nulidade da cláusula que previsse a mesma, por força do artigo 280º do CC, na medida em que seria proibido segurar um acto criminoso, uma vez que o falecido, tendo uma TAS de mais de 1,2 g/l, procedia ao exercício da caça, transportando consigo uma arma. Impugnou o demais alegado pelos autores e conclui pela improcedência da acção, requerendo, também, a apensação dos presentes autos e do proc.1/12.6TBALD ao proc.137/11.0TBALD.

Os autores replicaram, alegando que nem a ré nem a tomadora do seguro, informaram os autores ou o falecido de qualquer alteração dos contratos de seguro em causa, pelo que apenas aceitam o constante dos originais das apólices. No que respeita às circunstâncias da morte, referem novamente que não é verdade que tenha sido vitima de tiro da sua própria arma e que não tenha existido intervenção de terceiro, e, muito menos, que tenha sido provocada por alcoolismo. Pronunciam-se pelo indeferimento da requerida apensação. Vêm, ainda, deduzir um pedido subsidiário, de condenação da ré a pagar aos autores o montante de 297 600 €, caso se entenda que lhes está vedado pedir este pagamento para a G (...) .

Foi indeferida a requerida apensação, e admitida a intervenção principal provocada da “ G (...) , S.A” como associada dos autores.

A G (...) interveio, dizendo, além do mais, que comunicou e informou os autores de todas as cláusulas respeitantes aos respectivos seguros, nomeadamente as que previam a exclusão da cobertura de risco. Acrescenta que, a ser verdadeiro que o falecido apresentava uma TAS de 1,48 g/l, não poderão os autores beneficiar do pagamento do capital seguro, dado que em causa estava uma infracção de natureza penal, pelo que qualquer apólice que previsse a sua cobertura constituiria um negócio jurídico nulo, nos termos do artigo 280º do CC, devendo-se chegar à mesma conclusão por via do instituto do abuso de direito.

* A final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a R. F (…) dos pedidos contra si deduzidos pelos AA M (…), P (…), A (…) e Herança Ilíquida e Indivisa por óbito de C (…) 2. A A. A (…) interpôs recurso, tendo concluído como segue: (…) 3. Os restantes AA também interpuseram recurso, tendo apresentado as seguintes conclusões: (…) 4. A R. F (…) contra-alegou, tendo concluído assim: (…) II - Factos provados 1. A autora M (…) casou catolicamente com C (…) em 11 de Agosto de 1979, sem convenção antenupcial.

  1. O casamento entre a Autora e C (…) foi dissolvido por morte deste.

  2. C (…) faleceu em 17 de Outubro de 2010, com 53 anos de idade.

  3. Do casamento atrás referido nasceram os filhos P (…), maior de idade e A (…) 5. À herança por óbito de C (…) sucederam à autora, que é a cabeça-de-casal, P (…) e A (…), menor de idade.

  4. O falecido C (…) foi funcionário da G (...) desde data não concretamente apurada, mas anterior a 1990, até à data do seu óbito.

  5. À data do óbito deste, C (…) e a autora M (…) eram os donos e legítimos possuidores de um prédio rústico sito em Caleira, freguesia e concelho de Almeida, inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo (...) , descrito na Conservatória do Registo Predial de Almeida sob o nº (...) /20070112 e ali inscrita a propriedade a favor daqueles.

  6. No dia 21 de Março de 2007 a autora M (…) e C (…) celebraram com a G (...) , no Cartório Notarial de Almeida, a escritura de Mútuo com Hipoteca, através da qual a G (...) concedeu à autora e ao C (…) o empréstimo da quantia de 200.000,00€ (Duzentos Mil Euros), quantia que se destinou à construção de casa própria a edificar no prédio identificado em 7.

  7. No dia 7 de Janeiro de 2009, a autora M (…) e C (…) celebraram com a G (...) , S.A., no Cartório Notarial de Almeida, a escritura de Mútuo com Hipoteca, através da qual a G (...) , concedeu à autora e ao C (…) o empréstimo da quantia de 50.000,00€ (Cinquenta Mil Euros), quantia que se destinou igualmente à construção do imóvel atrás referido para habitação própria.

  8. No dia 29 de Outubro de 2009, a autora e o C (…) celebraram com a G (...) , S.A., no Cartório Notarial de Almeida, a escritura de Mútuo com Hipoteca, através da qual a G (...) , concedeu à autora e ao C (…) o empréstimo da quantia de 45.000,00€, quantia que se destinou a financiar a construção do imóvel atrás referido.

  9. A G (...) , através das escrituras de mútuo com hipoteca atrás referidas, concedeu à autora e ao falecido C (…), empréstimos no valor global de cerca de € 295.000,00.

  10. Como caução e garantia dos referidos empréstimos, dos juros contados à taxa ali convencionada e dos demais encargos discriminados nas escrituras referidas em 8, 9 e 10, a autora M (…) e o C (…)...

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