Acórdão nº 18/13.3GAFIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Dezembro de 2015
Magistrado Responsável | AB |
Data da Resolução | 16 de Dezembro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 4.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO 1 – Recorreu a cidadã A...
pela peça junta a fls. 456/465, cujo teor nesta sede se tem por reproduzido –,a título representativo do seu filho menor, nascido em 29/12/2001, B...
, e no seu próprio interesse, da vertente da sentença documentada na peça de fls.
397/442, por cujo conteúdo – no que ora releva – se ajuizou do direito do seu id.º filho B... ao ressarcimento de danos não patrimoniais sofridos por efeito de pessoal atropelamento – em 29/08/2012 – por veículo automóvel imprudentemente conduzido pelo cidadão C...
[1], porém pelo definido valor pecuniário de € 6.500,00 (seis mil e quinhentos euros), por contraponto ao correspondentemente peticionado de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), e se lhe irreconheceu (a si, A... ) o próprio invocado direito indemnizatório – pelo peticionado montante de € 10.000,00 (dez mil euros) – , de reflexos e pessoais danos morais, a final propugnando pela respeitante alteração sentencial no sentido atribuitivo de correspectivos valores indemnizatórios de € 15.000,00 (quinze mil euros) e € 5.000,00 (cinco mil euros), a cargo da entidade seguradora, demandada, F... , S.A.
, como emerge da respectiva motivação/justificação, máxime do concernente quadro-conclusivo[2], (consabidamente circunscritor do objecto, âmbito e fundamento do manifestado dissídio): «[…] 1. O montante da indemnização atribuída ao lesado por danosmorais deve ser significativa e não simbólica.
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Atento que no caso concreto o Demandado B... é umacriança, com 10 anos à data do acidente, que sofreu fracturada diáfase do fémur esquerdo; 3. Que teve 97 dias de défice funcional temporário total (deimobilização e repouso absoluto) e 557 dias de déficefuncional temporário parcial – ou seja, quase 2 anos derecuperação; 4. Que teve de estar imobilizado com tracção esquelética 2meses e meio no hospital; 5. Que apesar da medicação teve dores quer no hospital, querdepois durante a recuperação, ou seja, durante quase 2 anossentiu dores; 6. Sentiu medo, angústia e pânico; 7. Teve um quantum doloris de grau 4 (em 7); 8. Perdeu o ano escolar em virtude do internamento eimobilização; 9. Esteve 3 meses e meio imobilizado na cama sem se poderlevantar, fazendo as refeições, tomando banho e fazendo assuas necessidades fisiológicas na cama; 10. Teve de andar de cadeira de rodas e posteriormente decanadianas até Junho de 2013, embora com muitas dificuldades, desequilíbrio, medo de cair, dores na perna ecansaço; 11. Fez fisioterapia e diversas consultas; 12.Durante esse ano lectivo de 2012/2013 deixou de poderpraticar desporto, jogar futebol, andar de bicicleta, nadar,correr, o que lhe causou desgosto e pena; 13.Actualmente, ainda sente dores na perna esquerda quando emesforço; 14. Pelo que deve ser atribuída ao Demandante cível B... uma indemnização por danos nãopatrimoniais, de forma equitativa, realista e adequada àscircunstâncias do caso concreto de € 15.000,00 (quinze mileuros).
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Quanto à sua mãe, A... , deve serigualmente atribuída uma indemnização por danos nãopatrimoniais, 16.Pois, apesar de não se tratar (felizmente) de um caso demorte, não pode deixar de se incluir o caso dos autos – em que a mãe do lesado sofreu muito com o sofrimento do filhoe ficou angustiada quando o viu inanimado e, devido àdependência total deste de terceira pessoa por 3 meses emeio, foi quem tratou exclusivamente dele e depois oacompanhou na sua recuperação aos exames e tratamentosdurante quase 2 anos – na previsão das normas do art. 496º nº 2 e 3 do Código Civil.
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E assim se deve fazer uma interpretação extensiva (art.9º doCódigo Civil) e dentro do espírito dessas normas, para oscasos de lesões não letais mas com gravidade e que geremdependência e sofrimento atendível, dentro dos parâmetroscomuns.
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Daí, também, que tal direito de indemnizaçãopor danos indirectos ou reflexos deve ser circunscrito àspessoas indicadas no aludido nº 2 do art.496º e, consequentemente, à mãe do lesado (só esta, já que o pai dolesado já faleceu), a demandada A... .
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É nesse sentido o Acórdão uniformizador de jurisprudência doSTJ nº 6/2014 de 19/5/2014: "Os artigos 483º nº 1 e 496º nº 1 do Código Civil devem ser interpretados no sentido deabrangeram os danos não patrimoniais particularmentegravesl sofridos por cônjuge da vítima sobrevivente, atingidade modo particularmente grave" e que por analogia (art.10º nº 1 do Código Civil) também abrange a mãe da vítima como ocaso dos presentes autos.
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E essa indemnização por danos não patrimoniais reflexos daDemandante A... deve ser igualmentevalorado com recurso à equidade e demais circunstâncias docaso concreto no valor não inferior a € 5.000,00 (cinco mileuros).
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Pelo que, a douta sentença ao valorar o dano nãopatrimonial do demandado B... em € 6.500,00 (seis mil e quinhentos euros) e não em €15.000,00 (quinze mil euros) fez uma incorrectainterpretação da lei, nomeadamente do disposto nos arts.496º e 494º do Código Civil.
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Bem como ao não atribuir qualquer indemnização por danosmorais à Demandante A... fez umaincorrecta interpretação da lei, nomeadamente do disposto nos arts. 496º e 494º do Código Civil.
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Assim, ao decidir como decidiu, a douta sentença violou, entreoutras, as normas contidas nos arts.9º, 10º, 483º, nº 1, 494º e496º do Código Civil.
[…]» 2 – A referenciada demandada, empresa seguradora F... , S.A.
, pronunciou-se pela inconsequência argumentativa e pela decorrente improcedência recursória, (vide referente peça processual – de resposta –, a fls. 478/480).
II – AVALIAÇÃO II.A – CONTEXTUALIZAÇÃO § 1.º Como supra sumariamente se noticia, emerge da economia da fundamentação recursória, mormente do referente quadro-conclusivo, a nuclear demanda pela id.ª cidadã à Relação da verificação/análise do alegado cabimento legal dos convocados direitos indemnizatórios, compensatórios dos danos não patrimoniais directamente consequentes à pessoa do seu filho B... do atropelamento de que foi vítima em 29/08/2012, e reflexa/indirectamente a si própria, pelos correspectivamente quantificados montantes de € 15.000,00 (quinze mil euros) e € 5.000,00 (cinco mil euros), e, decorrentemente, do apontado afrontamento pelo órgão julgador[3]das regras postuladas sob os ns. 1, 2 e 4, 1.ª parte, máxime, do Código Civil.
§ 2.º Para cabal apreciação e dilucidação da correspectiva problemática haver-se-á de conferir a essencialidade do acervo factual judicialmente tido por adquirido, bem como da fundamentação jurídica do decidido[4]: a) Juízo factual: «[…] 1) No dia 29 de Agosto de 2012, pelas 14H15, na Rua do Casarão, Sampaio, Marinha das Ondas, área da Figueira da Foz, o arguido – C...
– conduzia, no sentido IC 1/Leirosa, o veículo ligeiro de mercadorias, da marca Renault, modelo Trafic, com a matrícula (...) DA pertencente à sociedade «D... , Lda.», a uma velocidade de cerca de 45 km/hora.
2) A estrada [por]onde o arguido circulava é uma recta com boa visibilidade, com 5,90 metros de largura, composta por duas vias com dois sentidos de trânsito e respectivas bermas, exclusivamente com passeio em frente à casa n.º 4 dessa rua, com pavimento em estado regular, seco e limpo.
3) O dito passeio possui cerca de 1 metro de largura e 20 cm de altura.
4) Tal via é precedida de curva apertada à direita, atento o sentido de marcha do veículo conduzido pelo arguido.
5) O arguido seguia o máximo encostado à sua direita, evitando a invasão da hemi-faixa de rodagem contrária.
6) Após ter completado a referida curva, o arguido avistou, a 40 metros de distância, o ofendido e os irmãos deste, todos menores e sem vigilância, em cima do passeio.
7) Quando o arguido se encontrava a circular na sua mão de trânsito, por o fazer sem a atenção devida, encostou-se demasiado à direita, junto da casa com o número de polícia n.º 4, e foi colher o ofendido B...
, que se encontrava no passeio aí existente.
8) O embate causou ao ofendido dores e fractura da diáfise do fémur esquerdo.
9) B... sofreu um défice funcional temporário total (anteriormente designado por incapacidade geral total, correspondendo a períodos de internamento e/ou repouso absoluto) de 97 dias, desde 29/08/2012 até 03/12/2012.
10) O défice funcional temporário parcial (anteriormente designado por incapacidade geral parcial, correspondendo ao período que se iniciou logo que a evolução das lesões passou a consentir algum grau de autonomia na realização desses actos, ainda que com limitações) é fixável em 557 dias, desde 04/12/2012 até 13/06/2014, data da alta da consulta externa de ortopedia, em que apresentava consolidação médico-legal das lesões, sem sequelas e sem desvalorização.
11) A repercussão temporária total na actividade escolar (anteriormente designada por incapacidade temporária profissional total, correspondendo ao período durante o qual o lesado, em virtude do período evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação médico-legal, viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos inerentes à sua actividade profissional habitual) é fixável desde o início do ano lectivo de 2012/2013 até ao final da 2.ª semana de Janeiro de 2013.
12) A repercussão temporária parcial na actividade escolar (anteriormente designada por incapacidade temporária profissional parcial, correspondendo ao período em que a evolução das lesões passou a consentir algum grau de autonomia na realização daquelas actividades, ainda que com limitações) é fixável desde o início da 3.ª semana de Janeiro de 2013 até ao final do ano lectivo de 2013/2014, isto é, até à data da consolidação médico-legal das lesões.
13) As lesões que sofreu determinaram um quantum doloris (correspondente ao sofrimento físico e psíquico vivido pela vítima durante o período de incapacidade temporária) de 4 pontos, numa escala de 7 graus.
14) O ofendido apresenta mobilidade da anca e do joelho conservadas e não dolorosas.
15) Não...
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