Acórdão nº 715/14.6JAPRT-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelJORGE FRAN
Data da Resolução23 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA Nos autos de processo comum que, sob o nº 715/14.6JAPRT, corriam termos pela Secção Criminal, J1, da Instância Central de Viseu da Comarca de Viseu, já na fase de julgamento, o arguido A... , através do requerimento de fls. 29 a 32 deste traslado, entrado a 18/3/2015, requereu que «seja ordenada perícia mediante a realização de exame às suas faculdades mentais de forma a que fique inequivocamente esclarecido se era portador de alguma anomalia psíquica que afectasse a sua capacidade de avaliação da ilicitude dos factos e de se motivar de acordo com essa e, na afirmativa, se tal perturbação afectava a sua forma de avaliar os actos e de agir».

Tal perícia sobre o estado psíquico do arguido encontra-se prevista no artº 351º do CPP, devendo considerar-se suficientemente fundamentada atento os elementos probatórios ora trazidos para os autos

«De qualquer modo, seja (a) para fundamentar o requerimento de perícia, atento o incumprimento do Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de (...) , EPE, e ainda o facto de num Estado de Direito, ser irrazoavelmente oneroso para a defesa de qualquer arguido que tenha de requerer previamente a Tribunal Administrativo e Fiscal intimação para passagem das certidões requeridas e das informações solicitadas; seja para (b) instruir a perícia, requer a V. Ex.a se digne oficiar o identificado órgão administrativo para remeter directamente ao Tribunal o processo clínico de psiquiatria do arguido.» Sobre tal requerimento recaiu despacho, proferido na sessão de julgamento que teve lugar no dia 13/4/2015, decidindo nos seguintes termos (transcrição integral): «Através do requerimento apresentado pelo Ex.mo mandatário do arguido a fls. 2107 a 2110, veio o mesmo novamente insistir pela realização de uma perícia psiquiátrica, juntando cópia dos requerimentos por si efectuados, um ao Director Executivo do Agrupamento de Centros de Saúde (...) e outro ao Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de (...) , EPE, ambos com vista à prestação de informações quanto a eventual diagnóstico (ou suspeita) do estado psiquiátrico do requerente, tendo do primeiro resultado a informação fornecida pela médica de família do arguido, que a respeito do encaminhamento do arguido para a consulta de psiquiatria, referiu não ter sido da sua responsabilidade, dado o utente já estar referenciado no SAM Hospitalar.

Já a respeito do dirigido ao mencionado CH de (...) , referiu não ter obtido qualquer resposta, embora tenha a informação verbal de que um relatório sobre o processo clínico de psiquiatria do arguido prévio à sua detenção se encontra em fase de elaboração pelo Dr. D... , requerendo, em conformidade, na parte final do seu requerimento que o tribunal o solicite ao identificado órgão administrativo.

Porém, bastando-se com o facto de o arguido estar sinalizado nos sistema de arquivo médico como tendo sido orientado para consultas de psiquiatria, concluiu, desde logo, que tal aponta manifestamente para a existência séria e real da possibilidade de o arguido não estar, no momento da prática dos factos pelos quais foi acusado em perfeito estado de discernimento quanto ao valor ou ao desvalor das suas acções e, portanto, padecer de doença do foro psiquiátrico que pudesse ter limitado a percepção da gravidade dos seus factos.

Em conformidade com tal entendimento e não podendo ser para já carreados para os autos outros elementos mais fortes – o aludido processo clínico – requer a defesa do arguido a realização de exame às faculdades mentais do arguido.

Mais uma vez cremos não existir fundamento para a requerida perícia.

E isto porque, ao contrário do que defende a defesa do arguido, não podemos aceitar que o simples facto do arguido ter sido orientado para consultas de psiquiatria ou até encontrar-se a ser acompanhado nesta área da medicina, constitua razão válida para duvidar da capacidade de entendimento e/ou autodeterminação do arguido, ou seja, da sua imputabilidade.

Com efeito, com o resulta do artº 351º do CPP, a questão da inimputabilidade ou imputabilidade diminuída do arguido deve ser suscitada “fundadamente”, ou seja, baseada em factos concretos atinentes ao comportamento do arguido que fazem nascer uma dúvida plausível sobre a capacidade de o arguido entender e querer a sua própria conduta.

Ora, ainda que se admita que o arguido em determinada fase da sua vida tenha sido orientado para o departamento de psiquiatria do CH de (...) e continue ainda frequentando consultas na área da psiquiatria, tal, por si só, não significa que o mesmo automaticamente padeça de qualquer perturbação ou anomalia psíquica que já à data dos factos lhe tenha afectado a sua capacidade de avaliação da ilicitude destes e de se determinar de acordo com tal avaliação.

A ser assim, sempre que o tribunal tivesse notícia que um arguido à data dos factos já tivesse frequentado consultas de psiquiatria ou se encontrasse a frequentá-las – na actual conjuntura, fruto da crise económica e também social que vivemos a procura deste ramo da medicina é cada vez mais frequente – estaria sempre criada a dúvida sobre a sua capacidade de entender e querer a sua própria conduta, com a consequente determinação de perícia médica sobre as suas faculdades mentais, o que nãos e pode conceber.

Também não são quaisquer distúrbios emotivos, depressivos, ou crises de ansiedade que, sem mais, são...

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