Acórdão nº 143/17.1T8GRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução15 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I - Relatório No processo supra identificado, o arguido A...

, titular do cartão de cidadão n.º (...) , residente em (...) , fls. 76 a 89, veio ao abrigo do art. 59.º, do Regime Geral das Contra-Ordenações, aprovado pelo DL n.º 433/82, de 27 de Outubro (doravante, RGCO), interpor recurso de impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) que lhe aplicou, no âmbito do processo de contra-ordenação n.º CO/001831/11, uma coima no valor de €5.000,00 (cinco mil euros), acrescida de custas no valor de €75,00 (setenta e cinco euros), pela prática de uma contra-ordenação ambiental qualificada de muito grave, p. e p. pelo 18.º, n.º 1, do DL n.º 46/2008, de 12 de Março, conjugado com o artigo 22.º, n.º 4, al. b), da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto.

*O tribunal a quo julgou totalmente improcedente a impugnação judicial do arguido e manteve a decisão da entidade administrativa.

*O arguido interpôs recurso, da sentença que manteve a condenação pela contra-ordenação, pugnando pela sua absolvição, ou quando assim se não entender que lhe seja aplica admoestação ou dispensá-lo de coima, conclusões: «1. O Recorrente agiu sem culpa, por se encontrar em erro sobre a ilicitude, atendendo a que desconhecia o regime legal que o obrigava a proceder ao encaminhamento dos resíduos para entidade de gestão licenciada para esse efeito.

  1. Se é que lhe seria alguma vez aplicável o quadro normativo – e consequente quadro contra-ordenacional nele previsto – sub iudice, em sede da respectiva imputação objectiva, o que, atendendo a todo o antes exposto, se nega uma vez que, nos termos do disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 46/2008, de 12 de Março, sob a epígrafe “Responsabilidade da gestão de RCD”, que estatui, no seu n.º 1, que a gestão dos referidos RCD (resíduos de construção e demolição) é da responsabilidade de todos os intervenientes no seu ciclo de vida, desde o produto original até ao resíduo produzido, na medida da respectiva intervenção no mesmo.

  2. Exceptuando o respectivo n.º 2 os RCD produzidos em obras particulares isentas de licença e não submetidas a comunicação prévia.

  3. Mesmo que se considere a incursão do Recorrente na contra-ordenação que lhe vem imputada, o certo é que aquele actuou fiel ao Direito, agindo no sentido e com o propósito de realizar um valor com relevância positiva para a ordem jurídica, designadamente, em benefício da comunidade onde se encontra inserido.

  4. Na ausência de imputação objectiva, deverá o processo ser arquivado e não ser aplicada qualquer coima ao Recorrente.

  5. Se assim não se entender (o que sem conceder se equaciona por mera cautela de patrocínio), e já em sede de imputação subjectiva, a culpa do Recorrente é, pelo menos, muito reduzida, devendo a respectiva punição limitar-se à prolação de mera admoestação.

  6. Impondo-se recorrer no presente caso a critérios de justiça material que melhor adaptem a decisão a proferir às especificidades do presente caso.

  7. Ainda se ainda assim não se entender, sem conceder, deverá o Recorrente ser dispensado de pena, por aplicação do disposto no artigo 74.º, n.º 1, do Código Penal.

  8. Tudo visto, o Tribunal a quo errou na aplicação do Direito ao desconsiderar o disposto no n.º 2, do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 46/2008, de 12 de Março, pois que se assim não fosse, considerando, portanto, que o Recorrente não produziu qualquer RCD resultante de obras particulares isentas de licença e não submetidas a comunicação prévia, não teria condenado o Recorrente no pagamento de qualquer coima pela suposta actuação contra o disposto no referido diploma legal.

  9. Deveria o Tribunal, nos melhores termos de Direito, proferir uma mera admoestação».

*Notificado o Ministério Público apresentou resposta, pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da decisão recorrida.

*Nesta instância a Exmo. Procurador-geral Adjunto, emitiu douto parecer, no sentido de que que deve proceder o recurso, aplicando ao arguido uma mera admoestação, atendendo ao diminuto grau d ilicitude dos factos, sendo certo que o arguido procedeu ao depósito de resíduos num caminho, provenientes de restos de telhas, em consequência da substituição do telhado de um casa de habitação.

*Cumprido que foi o disposto no art. 417.º, n.º 2, do CPP, o arguido não respondeu.

*Colhidos os vistos legais e indo os autos à conferência, cumpre decidir.

Vejamos a factualidade apurada.

Factos provados: «

  1. No dia 2 de Julho de 2011, em (...) , (...) , freguesia de (...) , concelho da (...) , existiam depositados materiais constituídos por telhas velhas e restos de cimento.

  2. Tais materiais haviam sido depositados no local pelo aqui recorrente A... , e foram provenientes de uma obra que o mesmo recorrente havia realizado na sua casa de habitação, sita na (...) , a qual consistiu na recuperação do telhado de tal habitação, nomeadamente com a substituição das respectivas telhas por outras.

  3. Caso a GNR não tivesse intervindo no dia 2 de Julho de 2011, o recorrente iria destinar e reutilizar as aludidas telhas velhas e restos de cimento na recuperação e tapagem de buracos de um caminho agrícola público existente naquele local e que se encontrava danificado e colocava em causa a segurança da circulação de tractores agrícolas que amiúde o utilizavam.

  4. No dia dos factos, a GNR explicou ao aqui recorrente que as aludidas telhas velhas e restos de cimento constituíam resíduos e que, como tal, não poderiam ter sido ali depositados nem reutilizados, antes tendo obrigatoriamente de ser encaminhados para um operador de gestão de resíduos licenciado para o efeito.

  5. E perante tal advertência por parte da autoridade, o recorrente de imediato procedeu nesse sentido, assim tendo procedido à regularização da situação, mediante o que despendeu a quantia de €73,52.

  6. Ao proceder como se deu como provado, o recorrente não procedeu com o cuidado a que estava obrigado e de que era capaz, pelo menos quanto ao dever de conhecer e de se informar sobre a legalidade da sua conduta.

  7. O recorrente declarou para efeitos fiscais um rendimento de €11.145,09 no ano de 2009».

*II - O Direito As conclusões formuladas pela recorrente delimitam o âmbito do recurso, nos termos do art. 412.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal.

São apenas as questões suscitadas pela recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso.

*Questões a decidir:

  1. Apreciar o enquadramento contra-ordenacional, designadamente se a conduta do arguido se enquadra no art. 3.º, n.º 2, do DL 46/2008, de 12/3, por se tratar de RCD (resíduos de construção e demolição), produzidos em obras particulares isentas de licença e não submetidas a comunicação prévia.

  2. Apreciar se há...

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