Acórdão nº 167/15.3GBNLS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução29 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da Comarca de Viseu – Juízo Central Criminal de Viseu – Juiz 2, o Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, do arguido A...

, com os demais sinais nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º, nºs 1 e 2, b), com referência ao art. 204º, nº 2, f), ambos do C. Penal, agravado pelo art. 86º, nº 3 da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro.

Por acórdão de 16 de Fevereiro de 2017, foi o arguido condenado, pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º, nº 1 do C. Penal, na pena de três anos de prisão.

* Inconformado com a decisão, recorreu o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: 1. O acórdão ora posto em crise concretiza alteração não substancial dos factos constantes da acusação pública deduzida, porquanto: 2. Promove a desqualificação do crime de furto pelo qual o arguido vinha acusado; 3. Ao que acresce a circunstância de, em sede de acusação, haver sido descrito que o arguido, em comunhão de esforços com o decesso B... , exibiu arma de fogo em ato contínuo à exigência de entrega da quantia de € 1.200,00; 4. Sucedendo que, em sede de acórdão, fora tido por provado que a entrega da quantia de € 1.200,00 fora precedida da exibição do tabaco pretendido adquirir e que apenas após a dita entrega do dinheiro, o decesso B... meteu a mão dentro do casaco, dando a entender que estava armado.

5. Descerra-se assim que, além da desqualificação do crime pelo qual vinha acusado, fora alterada a circunstância atinente à pretensa exibição de arma de fogo para o mero entender de que estava armado; 6. Acrescendo que, fora igualmente alterada a circunstância em que ocorrera a pretensa entrega da quantia de € 1.200,00.

7. Porém, em sede de audiência de discussão e julgamento, não fora cumprida a estatuição constante do artigo 358º do CPP, e bem assim; 8. Não fora comunicada ao arguido, a concretizada alteração não substancial dos factos; 9. Tampouco lhe fora concedida a oportunidade de requerer prazo e reorganizar a sua defesa; 10. Donde decorre nulidade do douto acórdão ora posto em crise; 11. Nulidade que desde já se invoca para todos os devidos e legais efeitos.

12. Compulsada a fundamentação da matéria de facto julgada provada, observa-se que o tribunal a quo não oferece qualquer raciocínio lógico dedutivo, mormente qualquer fundamentação quanto à opção de julgar o arguido coautor da prática de um crime de furto; 13. Não sobrevindo assim qualquer raciocínio que permita aferir quanto à opção tomada pelo tribunal a quo, em detrimento da opção de julgar o arguido mero cúmplice; 14. Pelo que é o douto acórdão nulo, por falta de fundamentação.

15. O douto acórdão ora posto em crise, julga erradamente o facto constante do parágrafo 10º da matéria de facto julgada provada; 16. Devendo a matéria de facto constante de tal parágrafo ser julgada não provada.

17. Acresce que, o douto acórdão ora posto em crise preconiza errada qualificação jurídica dos factos tidos por provados, porquanto: 18. A entrega do dinheiro ao decesso B... não fora precedida de qualquer ameaça ou ato violento; 19. Sobrevindo da matéria de facto provada, inclusive, a demonstração da inexistência de qualquer ameaça ou prática de qualquer ato suscetível de causar medo, receio o impeditivo de reação, porquanto: 20. Conforme melhor se alcança da prova gravada cuja audição se requer, os pretenso ofendidos, além de terem perseguido o arguido, ainda se propuseram esperar pelo decesso B... , em local ermo, de modo a obterem a restituição do seu dinheiro; 21. Com o que, aderindo às elementares regras de experiência comum, facilmente se conclui que, caso tivesse ocorrido a prática de qualquer ato suscetível ou adequado a causar medo ou receio, nunca os ofendidos assumiriam tais condutas.

22. O acórdão ora posto em crise faz errada interpretação da norma constante do artigo 210º do Código Penal.

Nestes termos e nos mais de direito, deve o presente Recurso ser julgado procedente, por provado, e em consequência, ser proferido acórdão que determine absolver o arguido ora Recorrente; Assim se fazendo JUSTIÇA! * Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: 1 – O arguido recorrente convoca em termos genéricos a audição da prova gravada para demonstrar a sua interpretação dos factos, mas limita-se a transcrever nas suas alegações dois excertos da gravação do depoimento prestado pela testemunha D... para demonstrar que o tribunal a quo julgou incorrectamente o facto vertido no ponto 10º da factualidade data como provada.

2 – Assim, são apenas as duas referidas passagens das declarações da referida testemunha, bem como o que resulta da própria decisão recorrida em conjugação com as regras da lógica e da experiência comum, que devem ser consideradas para sindicar o sentido da decisão do Tribunal a quo no que tange ao sobredito ponto 10º dos factos provados.

3 – Porém, e como facilmente se constata na audição dos referidos excertos do depoimento de D... , o respectivo conteúdo não abala minimamente a fundamentação do Tribunal a quo no que tange à sua opção de ter considerado provado o aludido ponto 10º.

4 – O Tribunal a quo pronunciou-se sobre todas as questões de facto e de direito relevantes para a boa decisão da causa, tendo fundamentado com acerto, precisão e sem contradições ou insuficiências a posição assumida no acórdão no que respeita à factualidade dada como provada, com respeito pelas regras da experiência comum.

5 – Não se impunha que o Tribunal observasse o condicionalismo previsto no nº 1 do artigo 358º do CPP, uma vez que não estamos perante uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação, mas antes perante uma mera concretização dos factos que já constavam do libelo acusatório, na medida em que essa descrição resulta de não se ter provado um facto que, a ter ficado demonstrado, implicaria a condenação do arguido pela prática de crime mais grave.

6 – O arguido vinha acusado pela prática de um crime de roubo agravado e foi condenado pela prática de um crime de roubo (simples), isto é, sofreu uma condenação pela prática de um ilícito penal cuja moldura penal é consideravelmente inferior, quer no seu limite mínimo, quer no seu limite máximo. O tipo fundamental é o mesmo: roubo. Só não se provou o facto que permitiria a agravação do crime, pelo que se nos afigura não haver lugar à comunicação prevista no art.358º, nº3, do Código Penal, da qual não resultaria qualquer efeito útil para a defesa do arguido.

7 – Como refere Maia Gonçalves in CPP anotado, ed. 1999 pag. 647 e segs., «não é necessária a comunicação ao arguido quando a alteração jurídica é para uma infracção que representa um minus relativamente à da acusação ou da pronúncia, pois que o arguido teve conhecimento de todos os seus elementos constitutivos e possibilidade de os contraditar (…). Em todos estes casos não é necessária a comunicação a que este artigo alude para que o tribunal altere a qualificação jurídica dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, porque ao arguido foi dada a possibilidade de se defender da nova qualificação, que é um minus relativamente á da acusação ou da pronúncia.

» . No mesmo sentido cfr. Ac. STJ de 18/6/1997, CJ, Acs. Do STJ, V, tomo 2, 245) 8 – O douto acórdão recorrido não enferma de nulidade ou de qualquer outro vício que obste à eficácia da decisão.

Afigura-se-nos, pois, que deve ser negado provimento ao recurso, mantendo-se na íntegra o acórdão recorrido.

Porém, os Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores farão, como sempre, JUSTIÇA.

* Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, acompanhando os fundamentos da resposta do Ministério Público, afirmando a inexistência das nulidades do acórdão invocadas, não poder uma conduta posterior dos ofendidos afastar o receio sentido pela sua integridade no momento do desapossamento do dinheiro, e concluiu pelo não provimento do recurso.

* Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.

Respondeu o recorrente, reafirmando a argumentação da motivação, quanto à nulidade de omissão de comunicação de alteração não substancial dos factos descritos na acusação e quanto ao erro de julgamento e concluiu pela procedência do recurso.

* Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

* II. FUNDAMENTAÇÃO Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.

Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são: - A nulidade do acórdão por falta de fundamentação e por ter condenado por factos diversos dos descritos na acusação, omitindo o disposto no art. 358º do C. Processo Penal; - A incorrecta decisão proferida sobre a matéria de facto; - A incorrecta qualificação e subsequente absolvição.

Oficiosamente – Acórdão nº 7/95, de 19 de Outubro, DR, I-A, de 28 de Dezembro de 1995 – haverá que conhecer do vício de contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão.

* Para a resolução destas questões, importa ter presente o que de relevante consta do acórdão recorrido. Assim:

  1. Nele foram considerados provados os seguintes factos: “ (…).

    1. Em data exata não apurada mas situada entre os dias 10 e 11 de Novembro de 2015, o arguido A... propôs ao ofendido C... , na localidade de (...) a venda de tabaco a um baixo preço e exibindo-lhes vários volumes de tabaco que se encontravam no interior da mala do veículo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT