Acórdão nº 231/16.1T8LMG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelFELIZARDO PAIVA
Data da Resolução10 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I- A...

, veio intentar a presente acção com processo comum contra B... B..., S.A., – SOCIEDADE ABERTA”, pedindo que a R. seja condenada a pagar ao autor: 1) A quantia de €4.307,13 (quatro mil trezentos e sete euros e treze cêntimos) relativamente à média anual da retribuição correspondente a trabalho suplementar, trabalho nocturno, complemento especial distribuição, abono de viagem, subsídio de condução e compensação especial por dedicação à empresa, não paga pela Ré ao Autor no mês de férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal nos anos de 1992 a 2003; 2) Juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor para cada ano, acrescendo e reportados às quantias supra mencionadas e a vencer desde as datas em que cada verba deveria ter sido posta à disposição do Autor, contabilizados até integral e efectivo pagamento, que neste momento atinge o montante global de €3.539,00 (três mil quinhentos e trinta e nove euros); 3) Juros à taxa legal de 5%, previstos no artigo 829-A, n.º 4 do Código Civil, relativos aos valores pecuniários supra mencionados, desde o trânsito em julgado da decisão até integral e efectivo pagamento.

Caso se entenda que o abono de viagem tem a simples natureza de compensar as despesas do Autor com o veículo próprio e nada mais, o Autor peticiona a condenação da Ré a pagar-lhe: 4) O valor de € 3.048,78€ (três mil e quarenta e oito euros e setenta e oito cêntimos) - ou caso assim não se entenda o que se vier a apurar em execução de sentença -, valor correspondente ao subsídio de condução relativamente aos meses/dias de trabalho em que o Autor se deslocou em distribuição de correio, implicando a condução de veículos automóveis ou motociclos independentemente da propriedade dos mesmos entre 1992 a 2003; 5) Os valores referentes ao subsídio de condução, relativamente aos meses de trabalho em que o Autor se deslocou em distribuição de correio, implicando a condução de veículos automóveis ou motociclos independentemente da propriedade dos mesmos, que se vencerem entre a data da propositura e a data do trânsito em julgado da presente decisão, valores a liquidar em execução de sentença; 6) Integrar para futuro, após o trânsito em julgado da presente acção, o subsídio de condução, na retribuição do Autor, sempre que este se desloque para efectuar a distribuição de correio, implicando a condução de veículos automóveis ou motociclos independentemente da propriedade dos mesmos e de acordo com o valor diário previsto pelo AE/ B... em vigor; 7) A quantia de €762,19 (setecentos e sessenta e dois euros e dezanove cêntimos) - ou caso assim não se entenda o que se vier a apurar em execução de sentença - relativamente à média anual da retribuição correspondente ao subsídio de condução nos moldes supra indicados, não paga pela Ré ao Autor no mês de férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal nos anos de 1992 a 2002; 8) Juros de mora vencidos e vincendos, reportados às quantias supra mencionadas, relativas ao subsídio de condução enunciados nos pontos 4, 5 e 7, a vencer desde a data de citação da presente contabilizados até integral e efectivo pagamento; e 9) Juros à taxa legal de 5%, previstos no artigo 829-A, n.º 4 do Código Civil, relativos aos valores pecuniários mencionados desde o trânsito em julgado da decisão até integral e efectivo pagamento.

Alegou, de forma muito abreviada que, desde que foi, em Maio de 1992, admitido para prestar serviço, por conta sob autoridade da Ré, lhe foram pagas, além do vencimento base, várias outras quantias, que pormenorizou, a título de trabalho nocturno, de compensação horário descontínuo, de complemento especial distribuição, de abono de viagem, de subsídio de condução, de compensação horário incómodo, de compensação especial e de transporte pessoal vencimento.

Acrescentou que estes complementos, contabilizados pelos respectivos valores médios, devem ser tidos como parte integrante da sua retribuição, havendo assim serem incluídos nas quantias pagas correspondentes ao período de férias e aos subsídios de férias e de Natal, pedindo a condenação da ré no pagamento das diferenças assim obtidas.

+ Na audiência de partes não foi possível a composição amigável do litígio pelo que se ordenou a notificação da ré para contestar, o que esta fez, invocando muito resumidamente, tal como consta da sentença impugnada, a excepção de prescrição do direito do Autor quanto a parte dos juros nos termos do artigo 310.º, alínea d), do Código Civil.

No mais, a Ré aceita o contrato de trabalho celebrado com o Autor bem como as funções exercidas pelo mesmo entendendo, no entanto, que não assiste razão ao Autor no que concerne à natureza de retribuição dos subsídios e abonos mencionados na petição inicial.

Alega, ainda, que o Autor actua em abuso de direito.

Pede a improcedência da acção e, caso seja procedente, que se considere que a média de pagamento dos complementos de um ano se deverá repercutir no ano seguinte, devendo ser relegada a liquidação do pedido em execução de sentença.

* A autora respondeu à contestação.

*** II – Findos os articulados as partes vieram acordar no que respeita à matéria de facto que consideraram assente, no seguimento do que veio a ser proferida sentença que decidiu julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência condenou a ré a pagar:

  1. Pagar ao Autor A... a quantia global de €4.091,26 (quatro mil e noventa e um euros e vinte e seis cêntimos), acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa anual de 4% (ou outra que entre em vigor), desde a data em que cada uma das retribuições de férias e subsídios de férias e de Natal deveriam ter sido pagas até efectivo e integral pagamento; b.) Pagar Autor A... juros à taxa de 5% ao ano, desde a data do trânsito em julgado desta decisão até efectivo e integral pagamento nos termos do artigo 829.º A; n.º 5, do Código Civil; c) Absolver a Ré “ B... , S.A. Sociedade Aberta” do demais peticionado.

    *** III – Inconformada veio a ré apelar, rematando as suas alegações com a seguinte síntese conclusiva: […] Deverá ser concedido provimento ao presente Recurso e ser revogada a Sentença Recorrida, nesta parte.

    + Também o autor veio interpor recurso subordinado, alegando e concluindo: […] Deverá o presente recurso jurisdicional subordinado ser julgado provado e procedente, revogando-se a decisão recorrida, em conformidade com o exposto, conhecendo o Venerado Tribunal, caso se justifique o pedido subsidiário do recorrente nos exactos moldes vertidos na p.i.

    + Recebida a apelação o Exmº PGA emitiu parecer no sentido da procedência do recurso subordinado.

    *** IV – Da 1ª instância vem dada como provada a seguinte factualidade: […] *** V - Conforme decorre das conclusões da alegação da recorrente que, como se sabe, delimitam o objecto do recurso, as questões a decidir são as seguintes[1]: Recurso da ré:

  2. Abuso de direito por parte do autor (Cls 1ª a 5ª).

  3. Data da constituição em mora. (Cls 6ª e 7ª).

  4. Regime legal aplicável à prescrição dos juros moratórios (Cls 8ª a 12ª).

  5. Abono quilométrico como fazendo ou não fazendo parte da retribuição e, como tal, se o valor desse abono se deve reflectir no pagamento das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal (Cls 12ª a 23ª).

  6. Critério a utilizar para se aferir da regularidade e periodicidade no pagamento das prestações ou complementos (Cls 24ª a 27ª).

    Recurso subordinado: f) Taxa de juro a aplicar no cálculo dos juros moratórios (Cls 1ª a 6ª).

  7. Decidindo-se que o abono de viagem não é retribuição se deverá proceder o pedido subsidiário formulado pelo autor na p.i. (Cls 7ª a 24ª)..

    Do abuso de direito: A recorrente invoca ainda que, no caso em apreço, se verifica o abuso de direito com base nas razões que a propósito aduz nas conclusões 1ª a 5ª Nos termos do art. 334.º do CC “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.

    De acordo com o Ac. desta Relação de 11.12.2012, www.dgsi.pt: “A concepção adoptada neste conceito é a objectiva, não sendo, assim, necessária a consciência de que com a sua autuação se estão a exceder os apontados limites.

    Importa é que o direito seja exercido em termos clamorosamente ofensivos da justiça atentas as concepções ou o sentimento ético-jurídico dominante na colectividade e os juízos de valor positivamente consagrados na lei - cf.- Vaz serra “in” Abuso de Direito no BMJ 85º/253 e Pires de Lima e Antunes Varela “in” CC Anotado, anotação ao artigo 334º O abuso de direito é um limite normativo ou interno dos direitos subjetivos – pelo que no comportamento abusivo são os próprios limites normativo – jurídicos do direito particular invocado que são ultrapassados – cf. Castanheira Neves in Questão de facto e Questão de Direito, 526 e nota 46.

    O abuso de direito representa a fórmula mais geral de concretização do princípio da boa-fé, constituindo um excelente remédio para garantir a supremacia do sistema jurídico e da Ciência do Direito sobre os infortúnios do legislador e as habilidades das partes, mas com aplicação subsidiária, desde que não haja solução adequada de Direito estrito que se imponha ao intérprete aplicar

    -. Menezes Cordeiro, in Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo 1, p, 241 e ss..

    Em suma, o direito não pode ser exercido arbitrária e exacerbada ou desmesuradamente, mas antes exercício de um modo equilibrado, moderado, lógico e racional.

    Para certos autores o efeito jurídico do instituto só se desencadeia quando se verificam três pressupostos: «1. Uma situação objectiva de confiança; uma conduta de alguém que de facto possa ser entendida como uma tomada de posição vinculante em relação a dada situação futura; 2. Investimento na confiança: o conflito de interesses e a necessidade de tutela jurídica surgem quando uma contraparte, com base na situação de confiança criada, toma disposições o...

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