Acórdão nº 5/16.0GACVL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução22 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em audiência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do PCC n.º 5/16.0GACVL do Tribunal Judicial da Comarca de Castelo Branco, C. Branco – JC Criminal – Juiz 2 foi o arguido A...

, melhor identificado nos autos, pronunciado pela prática, em autoria material e em concurso efetivo, de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º, n.ºs 1 e 2, alínea l), com referência aos artigos 22.º e 23.º, todos do C. Penal e artigo 86.º, n.º 3 da Lei n.º 5/2006, de 23.02, com a redação da Lei n.º 17/2009, de 06.05, e de um crime de detenção e uso de arma ilegal da classe D, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea c) e n.º 2, com referência ao artigo 3.º, n.º 6, alínea b), da lei n.º 5/2006, de 23.02, na redação da Lei n.º 17/2009, de 06.05.

  1. Realizada a audiência de discussão e julgamento por acórdão de 05.05.2017 decidiu o Coletivo [transcrição parcial do dispositivo]: - Julgar procedente a pronúncia e, em consequência, condenar o arguido A... pela prática, como autor material e em concurso efetivo, de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132º, n.º 1 e 2, alínea l), ambos do Código Penal, agravado nos termos previstos no artigo 86.º, n.º 3 a 5, da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, e executado na forma tentada, em conformidade com o disposto nos artigos 22.º e 23.º do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão, e de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea c), por referência ao disposto no artigo 3.º, n.º 6, alínea c), ambos da lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.

    - Proceder ao cúmulo jurídico das duas penas de prisão aplicadas ao arguido e, em consequência, condenar o arguido A... na pena única de 8 (oito) anos de prisão.

    - Julgar procedente o pedido de indemnização civil formulado pelo demandante civil B... e, em consequência, condenar o demandado A... a pagar ao demandante a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais.

    - Condenar o arguido nas custas da ação penal, fixando-se a taxa de justiça em três UC`s, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido.

    - As custas do pedido de indemnização civil formulado pelo demandante são da responsabilidade do demandado A... , sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido.

    […] Assim, nos termos do disposto no artigo 109.º, n.º 1, do Código Penal, o Tribunal Coletivo declara perdida a favor do Estado a caçadeira apreendida ao arguido a fls. 12 dos presentes autos, assim como os componentes da munição a que se aludiu, determinando que, após trânsito em julgado desta decisão, se solicite à PSP que providencie, nos termos previstos no artigo 78º, n.º 1, da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, pela atribuição do destino que tiver por conveniente relativamente a esses bens.

    […].

  2. Inconformado recorre o arguido, formulando as seguintes conclusões: 1 - O Acórdão em crise padece de uma nulidade insanável, por manifesta falta de fundamentação, pelo que, deve ser revogado, com as legais consequências, nos termos da al. a), do n.º 1 do artigo 379.º, conquanto, não cumpre os requisitos do n.º 2, do artigo 374.º, do CPP.

    2 - No Acórdão, ora posto em crise, no que à fundamentação diz respeito, verifica-se, efetivamente, a existência de uma enumeração dos factos dados como provados e dados como não provados, contudo, a exposição que é feita dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, não é completa, limitando-se a fazer uma súmula (de parte) das declarações e depoimentos prestados em sede de audiência, não fazendo qualquer referência quanto à credibilidade que cada um mereceu e, bem assim, as razões de tal merecimento.

    3 - Não existe um exame crítico das provas produzidas, o que é o mesmo que dizer que não houve uma indicação completa das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.

    4 - O Tribunal a quo descredibiliza por completo o que foi dito pelo Arguido em sede de audiência de discussão e julgamento, com exceção da confissão quanto ao disparo realizado, sem referir qual o motivo da credibilidade, sem escalpelizar qual foi a demais prova produzida que infirma as declarações do Arguido e outra em manifesta contradição com o demais.

    5 - Pelo contrário, relativamente à tese apresentada pelo Assistente e pelas testemunhas de Acusação, colegas de profissão deste, o Tribunal a quo atribui-lhes credibilidade, conquanto se revelam coerentes e sinceros, sem adiantar qualquer fundamento quanto à razão do seu merecimento, assim como, não faz uma súmula dos factos por eles trazidos a estes autos que levem a tal merecimento.

    6 - A única referência a algumas destas testemunhas – D... e G... – cinge-se à referência da sua credibilidade, nada mais sendo adiantado quanto a eles.

    7 - Por sua vez, e ao contrário do que sucedeu com as testemunhas da Acusação, o Tribunal a quo retira toda e qualquer credibilidade às testemunhas da defesa, por, pasme-se, serem familiares do Arguido. Mas não faz o mesmo com as testemunhas de Acusação, não obstante serem colegas de profissão do Assistente e de estarem todos em risco de ver insaturado um procedimento disciplinar, por não cumprirem com o protocolo e de serem Arguidos num processo-crime pelos mesmos factos.

    8 - Apesar disto, e de não ser atribuída qualquer credibilidade a estes testemunhos, o Tribunal recorrido faz uso de partes dos depoimentos dessas testemunhas para descredibilizar o que foi dito pelo Arguido. Estranha-se que tal suceda. De facto, como pode uma testemunha sem credibilidade infirmar o que é dito pelo Arguido ou por qualquer outra testemunha? 9 - O Tribunal a quo, uma vez mais, sem qualquer tipo de fundamentação, dá como não provado que o Arguido não sabia que o Assistente era militar da GNR, mas sem dizer qual a prova que o infirme.

    10 - O Tribunal a quo vai mais longe, concluindo que o Arguido se apercebeu imediatamente que se tratava de um militar da GNR, mas, como até aqui, nenhum fundamento é adiantado para concluir desse modo.

    11 - Os factos provados 4 e 26 carecem de absoluta fundamentação, nada sendo adiantado quanto a tal, nem ao motivo pelo qual se conclui que depois do disparo o Arguido continuou a apontar a arma.

    Da Contradição Insanável da Fundamentação: 12 - A decisão em crise padece de contradição insanável na sua fundamentação, mormente nos factos dados como provados e não provados, que culminam na nulidade do Acórdão, que levam, necessariamente, à necessidade de ser revogada a decisão prolatada e à realização de novo julgamento.

    Senão vejamos, 13 - O Acórdão recorrido dá como provado, no facto 4, que o Arguido continuou a apontar a caçadeira na direção do Assistente, está em manifesta contradição, com o facto não provado 1, que dá como não provado que o Arguido se preparava para efetuar um segundo disparo.

    14 - De facto, não se percebe como se pode dar como não provado que o Arguido se preparava para dar um segundo disparo e, ao mesmo tempo, dar como provado que manteve a arma apontada, sendo manifestamente contraditório.

    15 - O mesmo sucede em relação ao facto provado 27 e ao não provado 11, conquanto, não se percebe como se conseguem concatenar estes dois factos, dando-se como provado que o disparo foi feito com a arma ao nível da cintura e, imediatamente a seguir, se dá como não provado que que o Arguido não fez pontaria.

    16 - De igual modo, estão em contradição os factos provados 3 e 27, conquanto se dá como provado que o Arguido fez pontaria ao peito do Assistente quando disparava com a arma ao nível da cintura.

    17 - Mais se estranha que na fundamentação de Direito o Acórdão em crise faça referência a doutrina e jurisprudência que vão num sentido e acabe por decidir num sentido absolutamente oposto.

    Senão vejamos, 18 - Relativamente à verificação da qualificação do artigo 132.º, do CP, o Tribunal a quo cita Figueiredo Dias para concluir, e bem, que para que se verifique o preenchimento do tipo subjetivo se torna necessária a verificação de um tipo de culpa agravado.

    19 - Acaba decidindo que a simples atuação do Arguido é bastante para concluir pela existência de culpa – que não a agravada – e do preenchimento da norma, em manifesta contradição com a fundamentação expandida.

    20 - O mesmo sucede, mas desta vez com uma maior gravidade e de forma mais clara, com a agravação do n.º 3, do artigo 86.º, da Lei das Armas, onde o Tribunal recorrido cita um Acórdão do STJ para fundamentar a sua decisão que refere expressamente, em jeito de conclusão, que esta agravação é apenas de aplicar quando se não aplique qualquer outra, mas, em manifesta contradição com o referido Acórdão, o Tribunal a quo decide que se verifica a agravação, não obstante ter dado por verificada a qualificação do artigo 132.º, do CP.

    21 - O mesmo sucede com a condenação do Arguido pela prática do crime de detenção de arma proibida e da escalpelização do que seja concurso aparente, onde, não obstante a decisão em crise citar Acórdãos e Doutrina que vão no sentido da verificação do concurso aparente – como infra se escalpelizará – decide pela verificação do concurso efetivo, em manifesta contradição.

    22 - O mesmo sucede com a fundamentação da escolha da pena, que não obstante referir, e bem, que não pode haver uma dupla valoração dos factos, nomeadamente, do uso da arma e do facto do Assistente ser militar da GNR, o que é certo, é que fundamenta a escolha da pena e da sua medida atentos esses elementos.

    23 - Aqui chegados, o Acórdão prolatado pelo Tribunal a quo padece de contradições insanáveis, nos termos da al. b), do n.º 2, do artigo 410.º, do CPP, que, nos termos do artigo 426.º, do CPP, determinam que seja revogada a decisão e a sua remessa para novo julgamento.

    Erro Notório na Apreciação da Prova: 24 - Por força do já citado artigo 426.º, do CPP, deve, ainda, o Acórdão em crise ser revogado por se verificar um erro notório...

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