Acórdão nº 790/16.9T8GRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Novembro de 2017
Magistrado Responsável | FONTE RAMOS |
Data da Resolução | 28 de Novembro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Associação (…) (AAT) instaurou a presente acção declarativa comum contra J (…) e F (…) , pedindo que seja declarada nula ou, pelo menos, seja anulada a transacção judicial (aludida nos autos), ao abrigo do art.º 291º do Código de Processo Civil (CPC) [a)]; os Réus sejam condenados a devolver a primeira prestação recebida no valor de € 45 000 (quarenta e cinco mil euros) [b)]; a A. seja absolvida da obrigação de pagar a segunda prestação no valor de € 45 000 (quarenta e cinco mil euros) [c)]; a acção judicial que terminou com a transacção judicial retome a sua legal tramitação [d)].
Alegou, em síntese: no âmbito de um processo que correu termos na Instância Local de Seia, no qual foi interveniente, sendo AA. os aqui Réus, foi celebrada uma transacção homologada por sentença; deverá ser declarada a nulidade de tal transacção, na medida em que o seu mandatário nessa acção não tinha poderes de representação da A., dado que a procuração foi outorgada por quem não tinha poderes para o efeito; também o Presidente (da AAT), apesar de estar presente, não tinha, sozinho, poderes para representar a A.; formou tal vontade com base em informações transmitidas pelo seu mandatário, que não correspondiam à realidade, sendo que, de todo o modo, a sua vontade não foi devidamente ponderada e esclarecida, até porque o mandatário que a representava era também representante e prosseguia interesses de outrem, não tendo acautelado devidamente os seus interesses.
Os Réus contestaram, por excepção, aduzindo a sua ilegitimidade e concluindo pela sua absolvição da instância; por impugnação, alegaram não ser verdade a factualidade vertida na petição inicial e, nomeadamente, que inexistia qualquer conflito de interesses entre a aqui A. e a interveniente E (…) S. A. (então E (…), S. A.), dado que a posição pelas duas assumida, naquela acção, era idêntica, sendo que nunca o alegado pela A. seria oponível aos aqui Réus, totalmente alheios às relações que refere. Concluíram que sempre a A. actua em claro abuso de direito, peticionando a sua condenação como litigante de má fé.
Requerida e admitida a intervenção principal provocada E (…), esta apresentou o articulado de fls. 131, concluindo pela improcedência da acção.
Na sequência da audiência prévia de fls. 149, a Mm.ª Juíza a quo, por sentença de 03.5.2017, julgou improcedente a dita excepção de ilegitimidade passiva e, conhecendo do mérito, julgou a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolveu os Réus e a Interveniente do pedido; julgou ainda improcedente o pedido de condenação como litigante de má fé deduzido pelos Réus contra a A..
Inconformada e reafirmando o pedido deduzido na acção, a A. apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - O Tribunal a quo deu como provado que, antes de se começar a elaboração dos termos da transacção, a Mm.ª Juíza (no âmbito do processo n.º 220/12.5TBSEI) verificou se as partes estavam presentes e se tinham poderes para o acto.
2ª - A referida decisão foi fundamentada com recurso à acta da audiência prévia.
3ª - Tal não corresponde à realidade, uma vez que a procuração forense foi outorgada pelo Sr. Presidente e pelo Sr. Vice-Presidente da AAT e não pelo Sr. Presidente e pelo Sr. Tesoureiro.
4ª - Não ficou provado que o Sr. Presidente e o Sr. Vice-Presidente tenham comunicado, no prazo máximo de 8 dias, aos restantes membros da Direcção.
5ª - Pelo que não foi assinada por quem tinha poderes para tal, nem foi sanada a assinatura pelos Srs. Presidente e Vice-Presidente mediante comunicação aos restantes membros.
6ª - Ao decidir diferentemente, o Tribunal a quo violou o que resulta do disposto nos pontos 42.2.1 e 42.2.2 dos Estatutos da AAT.
7ª - Também o Sr. Advogado não verificou a identidade dos representantes da AAT.
8ª - Ao decidir diferentemente, o Tribunal a quo violou o que resulta do disposto do art.º 90º, n.º 2, alínea c) do Estatuto da Ordem dos Advogados.
9ª - No que concerne à inexistência de poderes por parte do Sr. Advogado, ainda que se admita que conferir poderes forenses por meio de uma procuração forense é um acto de mera administração, o acto concreto praticado – transacção – envolveu a transferência de € 90 000, o que não consubstancia um acto de mera administração. Pelo que não estava o Sr. Advogado legitimado para representar a AAT e efectuar tal transacção.
10ª - Ao decidir diferentemente, o Tribunal a quo violou o que resulta do disposto no ponto 42.3 dos Estatutos da AAT.
11ª - E no que toca à ausência de poderes do Sr. Presidente, este também não podia representar a AAT visto que sozinho não tem poderes para dispor dessa quantia monetária.
12ª - Ao decidir diferentemente, o Tribunal a quo violou o que resulta do disposto nos pontos 36., alínea c), 42.2.1, 42.2.2 e 42.3 dos Estatutos da AAT.
13ª - No que se refere ao fundamento do erro-vício, não pode o Tribunal a quo decidir sobre tal questão sem permitir à A. demonstrar o que alegou, em sede de petição inicial, com recurso aos meios de prova, entre outros, prova testemunhal.
14ª - Ao decidir diferentemente, o Tribunal a quo violou o que resulta do disposto no art.º 392º do Código Civil.
15ª - O pagamento da primeira prestação não pode ser entendido como uma ratificação da transacção na medida em que a AAT não dispôs de tempo suficiente para se aconselhar devidamente e limitou-se a cumprir uma obrigação que foi criada por virtude da transacção.
16ª - Ao decidir diferentemente, o Tribunal a quo violou o que resulta do disposto nos art.ºs 217º, n.º 2 e 268º, n.º 2 do Código Civil.
17ª - Por conseguinte, não actuou a AAT em abuso do direito. Ao decidir diferentemente, o Tribunal a quo violou o que resulta do disposto no art.º 334º do Código Civil.
A interveniente e os Réus responderam, pugnando, a primeira, pela rejeição do recurso face à perda do direito a recorrer, pela apelante[1], ou, assim não se entendendo, pela sua improcedência, e, os segundos, pela mesma improcedência.
Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, e, como se verá, não se mostrando afectado o direito de recorrer, importa, pois, verificar e decidir da validade da questionada transacção de 04.02.2016. * II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: a) J (…) e F (…) propuseram uma acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum ordinário contra a E (…), que correu termos no processo sob o n.º 220/12.5TBSEI, na Comarca da Guarda, Instância Local, Secção de Competência Genérica...
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